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A repetição do indébito tributário: o pedido de devolução de tributo pago indevidamente.

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Agenda 29/09/2017 às 15:40

Nem sempre o que é indevido para o contribuinte, nos termos da lei, o é para o Fisco e o simples fato de ser o tributo considerado indevido não implica necessariamente em sua devolução. Saiba quais os requisitos para o pedido de ressarcimento e como solicitá-lo.

INTRODUÇÃO

O tema devolução de tributo está na pauta do dia, tanto do contribuinte, quanto do próprio Fisco. Pois, muito comum, no dia a dia do contribuinte, empresário ou não, efetuar o pagamento de tributo, de forma incorreta ou equivocada, resultante muito pela própria complexidade da legislação tributária. Além de naturalmente não ser nada desejável perceber que se pagou um tributo indevidamente, mais indesejável ainda, e cansativo, é correr atrás do prejuízo, na busca de sua restituição junto ao Fisco.

Dificuldades também surgem para o agente fiscal na análise do pedido, em especial pelas características e especificidades de cada tributo, decorrentes de uma lei, a quem a atividade fiscal está vinculada, sem qualquer margem à discricionariedade.

As causas para um pagamento indevido de tributo são muitas. Podem ocorrer tanto pela falta de atenção, de conhecimento, que resulta num pagamento a maior, em duplicidade ou por erros nos cálculos; de contribuintes agraciados por isenção ou imunidade tributária; assim como, de um tributo considerado ilegal ou inconstitucional, após uma demanda judicial.

Há mais de 20 anos como Auditor Fiscal da receita tributária distrital, tivemos a oportunidade de trabalhar diretamente na análise de pedido de repetição de indébito tributário, também denominado de restituição ou devolução de tributo que foi pago indevidamente, como julgador de primeira instância administrativa. E hoje, como Conselheiro, julgador de segunda instância, no Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais – TARF, do Distrito Federal, observamos o quão importante é, tanto para o contribuinte, interessado na devolução do tributo, quanto para o agente fiscal, que vai analisar esse pedido, conhecer e aplicar determinados critérios definidos em lei, relacionados, em especial: (a) ao prazo para se pedir. Porquanto, se não atendê-lo, estará extinto o seu direito de pedir; (b) à causa de pedir? Pois, se não houver pagamento indevido, não há se falar em restituição; e (c) à legitimidade para pedir? Porque, sem legitimidade, não se pode pedir, em especial, nos tributos classificados como indiretos.[1]

Tudo isso porque “nem sempre o que é INDEVIDO para o contribuinte, o é para o Fisco, nos termos da lei!” e “o simples fato de ser considerado INDEVIDO o tributo não implica necessariamente em sua devolução!”[2]


2. O PRAZO PARA O PEDIDO DE DEVOLUÇÃO

O primeiro critério a ser observado está relacionado ao prazo para realizar o pedido de devolução do tributo.

Pelo artigo 168 do CTN,[3] o direito para se postular a repetição do indébito tributário fenece com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos a contar: a) da data da extinção do crédito tributário, nas hipóteses de cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido (CTN, art. 165, I) e de valores resultantes de erros relacionados ao pagamento (CTN, art. 165, II); e, b) da data em que se tornar definitiva a decisão, nos casos de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória (CTN, art. 165, III).

Para os tributos sob a modalidade de lançamento de ofício (CTN, art. 149), que são aqueles cujo lançamento é efetuado pelo agente público competente, sem nenhum auxílio do sujeito passivo, a exemplo do IPTU e IPVA, o prazo de 5 anos conta-se da data do efetivo pagamento indevido, segundo dispõe o art. 156, I, do CTN. Nesse sentido, tem-se jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ.[4]

Contudo, muitas dúvidas e discussões surgiram quando se está diante de tributos sujeitos ao lançamento por homologação (CTN, art. 150), que são aqueles em que o sujeito passivo realiza todos os procedimentos de lançamento, sem o prévio exame do Fisco, a exemplo do IR, IPI, ICMS e ISS. Nesses casos, o problema estava em demarcar a exata data da extinção do crédito tributário, disciplinada no inciso I do art. 168 do CTN, tendo em vista o que dispõe o inciso VII, do art. 156 do CTN,[5] em que se exige, para a extinção do crédito, além do pagamento antecipado, também a homologação do lançamento.

Interpretando-se o art. 168, inciso I, combinado com o art. 156, inciso VII, todos do CTN, o STJ criou, na década de 1990, a tese dos “cinco mais cinco” anos, ou seja, o contribuinte tinha até 10 anos, a contar do fato gerador, para solicitar a devolução do tributo, que foi aplicada, por diversos anos, nas ações de repetição de indébito dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação.[6]

Porém, com a edição da Lei Complementar (Lcp) nº 118, de 9 de fevereiro de 2005,[7] pelo seu artigo 3º, deu-se nova interpretação ao tema, e a data da extinção do crédito tributário, disciplinada no art. 168, I, do CTN, ficou definida como sendo a data do pagamento, antecipado ou não.[8]

E assim, para que o pedido de repetição de indébito seja admitido pelo Fisco, o interessado deverá protocolizá-lo dentro do prazo de 5 anos, a contar da data em que efetuou o pagamento do tributo, alegado indevido, sob pena de seu pedido ser considerado intempestivo, e extinto o seu direito de pedir pela prescrição.[9]

ESTUDO DE CASO 01: A empresa JH Ltda, prestadora de serviços, protocolou pedido de restituição em 30/08/16, alegando ter efetuado pagamentos indevidos de ISS, no ano de 2010, nos seguintes montantes: R$ 200 mil em 20/04/11; R$ 50 mil em 20/07/11; R$ 30 mil em 20/09/11; e R$ 80 em 20/10/11.

ANÁLISE: quando da análise do pedido, estará extinto o direito de pedir referente aos valores dos meses de abril e julho de 2011, porquanto efetuado (30/08/16) após o prazo de 5 anos das datas do pagamento (20/04/11 e 20/07/11). Ou seja, todos valores recolhidos anteriormente ao dia 30/08/11 não serão devolvidos, pois extintos pela prescrição.


3. O PAGAMENTO INDEVIDO DO TRIBUTO

Verificado que o interessado efetuou o seu pedido dentro do prazo de 5 anos, a contar da data do efetivo pagamento, parte-se para a próxima etapa, relacionada ao critério da existência ou não de pagamento indevido, com a seguinte indagação: nos termos da lei, o pagamento do tributo foi indevido?

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Pode parecer óbvio, mas para que se devolva um tributo é necessário que haja, inicialmente, além da comprovação do recolhimento em si, que seja ele considerado indevido.[10] Porquanto, “nem sempre o que é INDEVIDO para o contribuinte, nos termos da lei, o é para o Fisco!”.

Muito comum, perante a Fazenda Pública, requerimento de restituição de tributos, como do IPTU ou IPVA, sob a alegação de ter efetuado o pagamento, por engano, em nome de outrem, por inobservância ou coincidência de endereços, nomes dos proprietários, etc, sem, contudo, ter havido pagamento em duplicidade ou a maior que o devido.

Nessas hipóteses, o contribuinte pode considerá-lo indevido, porém, nos termos da lei, não o é, pois se refere a uma obrigação tributária existente, não havendo, a princípio, base legal para a restituição do referido tributo. Há quem se utilize, para esses casos, do provérbio ou dito popular: "quem paga mal paga duas vezes".  Ver o artigo de HABLE, José: “Pagamento indevido e restituição tributária”, disponível o jus.com.br[11]

Diversas são as causas para se pagar um tributo indevidamente, resultado muita das vezes, de erros na identificação do sujeito passivo, da alíquota ou base de cálculo, por falta de atenção ou conhecimento da legislação, e entre as mais comuns, podemos citar a existência de pagamento de tributo: (a) a maior ou em duplicidade (erros nos cálculos, na alíquota ou base de cálculo aplicadas, por falta de atenção ou conhecimento); (b) para outro ente tributante, que o legalmente previsto (retenções de tributo, para outro ente da federação, ou seja, erros na identificação do sujeito ativo; muito comum na tributação do ISS, entre municípios); (c) considerado ilegal ou inconstitucional (a posteriori, por decisão judicial); e (d) efetuado por beneficiário de isenção ou imunidade tributária (por entidade, mesmo sendo imune ou isenta de tributo, efetua o pagamento do imposto).

Destarte, importante salientar que o agente fiscal responsável pela análise do pedido de restituição somente vai tratar da restituição em si, após ficar demonstrado ou comprovado que houve algum pagamento indevido. Porquanto, se não houver, não há se falar em repetição de indébito.


4. A REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO

Se o contribuinte vier a pagar valores a título de tributos que acabam se revelando indevidos, tem ele direito de pedir a sua devolução, independente de protesto judicial, isto é, de uma providência cautelar que notifique judicialmente a Fazenda, para que lhe seja assegurado o seu direito (CTN, art. 165).[12]

O termo repetição de indébito tributário está disciplinado no CTN, nos seus arts. 165 a 169, e significa o retorno de importância paga indevidamente. O principal fundamento para a sua restituição está na ausência de causa jurídica para a cobrança pela Fazenda Pública, com amparo no princípio do enriquecimento ilícito ou sem causa,[13] que é norma geral de repúdio ao locupletamento, e que gera direito a devolução.

Verificado no processo que houve pagamento indevido, cabe então à Administração tributária tratar da repetição de indébito tributário em si, suas formas e, principalmente, a quem cabe a devolução do tributo pago indevidamente.

4.1 Os requisitos para a devolução do tributo

A doutrina, para fins didáticos, ao tratar da repercussão dos tributos, que é a característica de transferir, “passar adiante” o encargo financeiro do tributo para outrem, classifica os tributos em: direto e indireto e os contribuintes em: de direito e de fato, nesses termos:

(a) contribuinte de direito – é aquela pessoa, física ou jurídica, eleita pela lei, que mantém relação pessoal e direta com o Estado, e que tem a obrigação de recolher o tributo; e,

(b) contribuinte de fato – é aquela pessoa, física ou jurídica, que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo, mesmo não fazendo parte da relação jurídico-tributária principal.

Nos denominados tributos diretos, a exemplo do IPVA, IPTU e ISS profissional autônomo, os contribuintes de direito e de fato estão na mesma pessoa, ou seja, a pessoa, que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação, é a mesma que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo. Nessa hipótese, o peso do imposto não pode ser "passado adiante".

No caso do IPTU, por exemplo, o proprietário do imóvel é o contribuinte de direito e de fato. Assim, em um contrato de aluguel, em que o inquilino assume a responsabilidade, por força de contrato particular de locação, de efetuar o pagamento do IPTU, não o torna responsável tributário.[14] E caso haja pagamento indevido do IPTU, não terá ele, o inquilino, legitimidade para pleitear a repetição do indébito, porquanto ele não faz parte da relação jurídico-tributária entre o fisco e o sujeito passivo, que, no caso, é o proprietário do imóvel. Relevante ainda ressaltar que nos tributos diretos pouco importa quem efetuou o efetivo pagamento.

ESTUDO DE CASO 02: A empresa JH Ltda, prestadora de serviços, protocolou pedido de restituição de IPVA, considerado indevido, de um veículo de sua propriedade, pago por João, pessoa física, para cumprir dívida de um contrato particular. Quem tem legitimidade para pedir a restituição? A empresa JH ou João?

ANÁLISE: Tem legitimidade a empresa, porquanto é a contribuinte, como proprietária do veículo.

Por sua vez, nos tributos indiretos, a exemplo do IPI, ICMS e ISS, entre outros, diz-se que os contribuintes de direito e de fato estão em pessoas diversas, isto é, a pessoa que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação (contribuinte de direito), não é a que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo (contribuinte de fato).

Assim, tratando do ICMS, ou ISS, como impostos indiretos, onde o valor do imposto integra o preço da mercadoria ou do serviço, pago pelo consumidor final ou tomador do serviço, o contribuinte de direito é obrigado a recolher (repassar) o imposto, por uma ficção jurídica, objetivando facilitar a arrecadação, mas quem realmente suporta de fato o encargo financeiro do tributo é o consumidor final ou tomador de serviço, por estar o imposto embutido no preço da mercadoria ou serviço.

Tratando especificamente da restituição dos tributos indiretos, dispõe o CTN:

Art. 166 - A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.

Por esse dispositivo legal,[15] a restituição de tributos classificados como indiretos, ou seja, daqueles que têm a característica de transferir o respectivo encargo financeiro, a exemplo do IPI, ICMS e ISS, tão somente poderá ser feita à pessoa física ou jurídica que atender a uma das seguintes condições:

1ª) que comprove que efetivamente suportou o encargo financeiro do imposto; ou,

2ª) que esteja, por quem suportou o encargo, expressamente autorizado a receber a devolução.

4.1.1 A comprovação que efetivamente suportou o encargo financeiro

Quando o interessado protocoliza o pedido de devolução de tributo considerado indireto, a exemplo do ICMS, é comum a Administração tributária notificá-lo para apresentar documentos que comprovem ter assumido o encargo financeiro do imposto pago indevidamente.

O interessado, por sua vez, alega simplesmente que assumiu o encargo financeiro, por dever contratual, ou porque foi ele quem realmente recolheu (repassou) o imposto aos cofres públicos.

Os deveres contratuais, no entanto, de estar a empresa regularizada com suas obrigações fiscais, não são prova de que tenha assumido o encargo financeiro do imposto pago indevidamente. E ainda, o recolhimento em si, efetuado aos cofres públicos, pelo comerciante ou prestador do serviço, é apenas fruto de responsabilidade obrigacional tributária de ter que repassar ao fisco o imposto devido na operação.

Em realidade, o que está a determinar quem assumiu o encargo financeiro tributário é a própria natureza do imposto, se direto ou indireto, em que haja ou não a repercussão tributária, de se passar a diante o encargo financeiro.

Em termos práticos, torna-se muito difícil ao contribuinte de direito, no caso o comerciante, comprovar que assumiu o ônus financeiro do imposto, porquanto é da natureza da operação comercial estar embutido no valor do bem, produto ou serviço vendido, o montante do imposto, que deve vir destacado na nota fiscal, e que é pago e suportado integralmente pelo consumidor final, pois integra no preço pago da mercadoria ou serviço.

4.1.2 A autorização para pedir a repetição por quem suportou o encargo

Pelo artigo 166 do CTN, o outro requisito necessário para ser deferido o pedido de restituição é “estar por quem suportou o ônus expressamente autorizado a recebê-la.”

É muito comum o interessado pela devolução do tributo, em não conseguindo comprovar que assumiu o ônus financeiro, buscar uma declaração autorizativa de restituição, junto ao destinatário da mercadoria comprada. Além da normal e grande dificuldade em conseguir a autorização do consumidor final, ou tomador do serviço, pelos mais variados motivos, exige-se, pelo art. 166 do CTN, que a autorização seja expressa, e não apenas uma declaração afirmando que não se opõe ao pleito pela restituição do tributo. Ou seja, na autorização deve estar expressamente demonstrado o interesse ou intenção do contribuinte de fato em autorizar o pleito ao contribuinte de direito. Sem essa autorização expressa, torna-se muito difícil a devolução do tributo, mesmo considerado indevido.

4.2 A legitimidade para pedir do contribuinte de fato

A relação jurídico-tributária é formada pelo sujeito ativo e sujeito passivo (CTN, arts. 119 e 121). E segundo o art. 121 do CTN, o sujeito passivo, contribuinte ou responsável, "é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária." Ou seja, só pode ser contribuinte aquela pessoa, física ou jurídica, que assim a lei elegeu, no caso, denominado de contribuinte de direito.

Há muito se defende que o contribuinte de fato é fruto de uma construção doutrinária, e por isso não está ele presente na relação jurídico-tributária, pois, pela norma legal, somente o contribuinte de direito é considerado sujeito passivo.

E nesse caminhar, o STJ[16] tem várias decisões no sentido de que o contribuinte de fato, no caso o consumidor final, não faz parte da relação jurídica entre o sujeito ativo e sujeito passivo e assim é parte ilegítima para pleitear a repetição do indébito. Em outras palavras, contribuinte de fato não pode pleitear a devolução do imposto pago indevidamente, mesmo que consiga comprovar ter assumido o encargo financeiro, por ser pessoa estranha na relação jurídico-tributária e lhe faltar assim legitimidade para pedir.

Destarte, segundo essa interpretação jurisprudencial, somente será feita a restituição do tributo pago indevidamente ao contribuinte de direito, se este conseguir provar que assumiu o referido encargo, ou estar pelo contribuinte de fato expressamente autorizado a recebê-la. Ou seja, restaria ao contribuinte de fato, consumidor final, tão somente autorizar expressamente o contribuinte de direito, no caso o comerciante, para poder receber a desejada devolução.

Há se colocar que, em outros julgados, o STJ,[17] firmou orientação, sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.299.303-SC, DJe 14/8/2012) que o “consumidor final de energia elétrica tem legitimidade ativa para propor ação declaratória cumulada com repetição de indébito que tenha por escopo afastar a incidência de ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada de energia elétrica.” Ou seja, ficou, ao que parece, restrita a consumidor final de energia elétrica.

ESTUDO DE CASO 03: (a) DONA MARIA, que gosta de viajar, comprou passagem aérea para Paris no ano de 1998, na Cia VARIG do BRAISL, passagem essa que incidiu o ICMS no seu preço. (b) a Cia VARIG recolheu regularmente o ICMS ao Estado, e ingressou no STF questionando a constitucionalidade de sua cobrança. (c) o STF, em 1999, julgou procedente a ação, considerando inconstitucional a incidência do ICMS nas passagens aéreas de passageiros. Tendo em vista que houve pagamento indevido do ICMS, quem pode pedir a sua restituição?

ANÁLISE: (d) quem efetivamente suportou o ônus financeiro? Em regra, foi DONA MARIA; (e) assim, a Cia VARIG somente poderá pleitear se tiver autorização de DONA MARIA; e ainda, (f) se o contribuinte de fato não tiver legitimidade, pelo STJ, apenas a Cia VARIG, se: 1º. comprovar que assumiu o ônus; ou, 2º. tiver autorização de DONA MARIA.

ESTUDO DE CASO 04: (a) Empresa JH Ltda, de SP, prestou serviço de software, ao ente público SENADO FEDERAL, que efetuou a retenção do ISS ao DF, local da prestação do serviço. (b) segundo a legislação, o ISS era devido ao município do local do domicílio do prestador, em SP. (c) o município de SP autuou a empresa JH Ltda, exigindo o ISS devido. Tendo em vista que houve pagamento do ISS, retido indevidamente ao DF, quem pode pedir a sua restituição?

ANÁLISE: (1º) quem efetivamente suportou o ônus financeiro? (d) em regra, foi o SENADO FEDERAL, pois consta expressamente do contrato de prestação do serviço, que o ISS está embutido no preço do serviço, pago pelo tomador do serviço; (e) assim, a empresa JH Ltda somente poderá pleitear se tiver autorização expressa do SENADO FEDERAL, o tomador do serviço.

4.3 Tributo pago, mesmo considerado indevido, não implica necessariamente em devolução

A afirmação de que “o simples fato de ser INDEVIDO o tributo pago não implica necessariamente em devolução” torna-se verdadeira quando:

1º) nos termos do art. 166 do CTN, não se permite a devolução, caso haja ilegitimidade da parte para pleitear a devolução, ou seja, não consiga comprovar que efetivamente suportou o encargo financeiro do imposto; ou, não esteja, por quem suportou o encargo, expressamente autorizado a receber a devolução, mesmo comprovado que o pagamento foi indevido. Ou seja, mesmo indevido, não se devolve!

2º) Se o Supremo Tribunal Federal - STF vier a decidir pela inconstitucionalidade de uma lei tributária, modulando seus efeitos a partir da decisão ou apenas para quem já estiver demandado na justiça, pode-se não devolver o tributo mesmo sendo indevido. Citamos dois exemplos clássicos, entre muitos:

a) a modulação de efeitos que ocorreu no RE 556.664/RS,[18] com a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei 8.212, de 1991, que ampliava os prazos de decadência e prescrição para 10 anos.

Nesse julgado, os Ministros da Corte, por maioria de votos, decidiram que os recolhimentos já realizados, sob a égide dos artigos 45 e 46 da Lei, são legítimos e não podem ser restituídos, a não ser que tenham sido demandados, por meio administrativo ou judicial, até a data do julgamento da ADIn, ou seja, até 11 de junho de 2008. Assim, os contribuintes que aguardaram o pronunciamento do STF, sem se manifestar, perderam o direito à repetição do indébito.[19]

b) em outubro de 2016, no julgamento do RE 593.849/MG-RG,[20] o STF, com repercussão geral reconhecida, alterou o entendimento sobre o regime de substituição tributária do ICMS, entendendo que o contribuinte tem direito à diferença entre o valor do tributo recolhido previamente e aquele realmente devido no momento da venda.

Foi também definida a modulação dos efeitos do julgamento, de forma que o entendimento passou a valer para os casos futuros e somente deve atingir casos pretéritos que já estejam em trâmite judicial. Ou seja, mesmo indevido, não se devolve!

Sobre o autor
José Hable

Auditor Fiscal da Secretaria de Fazenda do Distrito Federal. Conselheiro e Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais (TARF). Mestre em Direito Internacional Econômico pela Universidade Católica de Brasília. Pós-graduado em Direito Tributário, com o título de especialista docente em Direito Tributário, pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF e Instituto de Cooperação e Assistência Técnica – ICAT (2000). Graduado em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília – CEUB (1999). Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade Católica de Administração e Economia - FAE (1990). Graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná UFPR (1990). Professor de Direito Tributário. Autor de livros.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HABLE, José. A repetição do indébito tributário: o pedido de devolução de tributo pago indevidamente.: Indaga-se: Quais são os critérios a serem cumpridos e analisados, tanto pelo fisco quanto pelo contribuinte, diante de um tributo pago indevidamente?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5203, 29 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58288. Acesso em: 22 dez. 2024.

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