Sumário: 1. Introdução; 2. Locação de imóveis; 2.1 Dos deveres e direitos do locador; 2.2 Dos deveres e direitos do locatário; 2.3 Extinção do contrato; 3. Regras processuais da locação; 3.1 Mudanças da lei do inquilinato em relação ao fiador; 4. Conclusão.
RESUMO: O contrato de locação de coisas é disciplinado pelo Código Civil de 2002, porém, o contrato de locação de imóveis é abordado de maneira mais especifica pela Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/18-10-1991). Inicialmente, será traçado um paralelo entre as obrigações e direitos do locador e do locatário determinados por essa lei. Em um segundo momento, cabe analisar sobre as alterações realizadas pela Lei 12.112/2009 na Lei do Inquilinato, analisando especialmente a respeito das regras da “nova fiança”, que surgiu justamente com as mudanças provocadas por essa lei de 2009.
PALAVRAS CHAVES: Locação de imóveis. Lei do Inquilinato. “Nova Fiança”
1 INTRODUÇÃO
Os romanos estipulavam a existência de três espécies de contratos, locatio conductio rerum (locação de coisas), locatio conductio operarum (locação de serviços) e locatio conductio operis (locação de obras). Essa divisão era adotada até no século passado, inclusive o Código Civil de 16 utilizava-se dessa divisão.
Entretanto, criar um conceito único para definir todas esses tipo de locações ao mesmo tempo é uma tarefa muito difícil, já que se referem a contratos diferentes.
“Assim, desde a codificação de 1916, a locação de obra passou a ser denominada empreitada, com regras próprias e específicas para as suas peculiaridades.
Nessa esteira, a antiga locação de serviços passou a ser chamada formalmente, no Código Civil de 2002, de contrato de prestação de serviço, também com disciplina particular, adotando-se expressão que já vinha sendo utilizada na doutrina e na prática das relações jurídicas.”. (GAGLIANO, 2011, p. 190)
A locação de coisa possui um capítulo próprio dentro do Código Civil de 2002 a fim de disciplinar os procedimentos dessa relação. Entretanto, nem tudo se encontra determinado pelo CC/2002, por exemplo, a locação de bens imóveis urbanos é regida pela Lei do Inquilinato ou Lei de Locações (Lei n. 8.245/91) e a locação de imóveis rurais pelo Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/64).
Destarte, a fim de buscar aprofundamento na locação de imóveis urbanos para fins residenciais, serão analisados todos os deveres e direitos do locador e do locatário, descrevendo todas as situações que lhes obrigam ou lhes garantem diante deste contrato.
Recentemente, a Lei das Locações sofreu algumas mudanças pela Lei 12.112/2009, aperfeiçoando algumas regras que dizem respeito à locação de imóveis. Com isso, a fiança no contrato de locação sofreu algumas alterações, o que será, no presente trabalho, avaliado, sobretudo o que mudou em relação ao fiador.
2 LOCAÇÃO DE IMÓVEIS
O contrato de locação de coisas encontra-se disciplinado pelo Código civil de 2002, sendo nele encontrado o seu conceito: Art. 565. Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso ou gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.
Quanto à sua natureza jurídica, o contrato de locação de coisas é bilateral porque exige obrigações de ambas as partes e envolve reciprocidade. É oneroso devido ao fato que uma das partes deve retribuir a prestação dada pela outra parte. A onerosidade é uma característica essencial do contrato de locação, já que sem ela receberia o nome de comodato. É consensual uma vez que exige o acordo da vontade entre as partes. É comutativo, isso porque as prestações são certas, recíprocas e não aleatórias. É não solene porque pode ser admitido na modalidade escrita ou verbalmente, porém vale frisar que para haver algum acessório formal, como a fiança, é necessário que ele seja realizado na forma escrita.
Para que haja locação de coisa, três elementos são essenciais, sendo eles o tempo, pois esse tipo de contrato tem duração e embora esse prazo não seja expresso não pode ser considerado vitalício. O objeto que pode ser móvel ou imóvel, e indispensavelmente deve ser bem fungível, isso porque a própria coisa que foi alugada deve ser devolvida. E por fim, deve haver a retribuição que pode ser chamada de preço, aluguel ou renda e é acertada entre as partes no momento de elaboração do contrato.
O Código Civil não rege sobre a locação de imóveis urbanos, sendo essa questão é disciplinada pela Lei do Inquilinato ou Lei de Locações (Lei n. 8.245/91). Essa lei dispõe acerca da locação de residência urbana, locação para temporada e locação para fins comerciais.
A classificação em imóveis urbanos não utiliza como critério a localização, mas a finalidade que é dada ao mesmo. Um imóvel urbano é aquele que não é usado com a finalidade de explorar atividade econômica rural, como fortalece Coelho (2013, p.190):
“Não será urbano o imóvel em que, independentemente da localização, o contrato de locação autorizar a exploração de atividade rural, como tal entendida a extração de produtos diretamente da natureza (agricultura, pecuária, granja, pesca, caça, extrativismo etc.)”
DAS OBRIGAÇÕES E DIREITOS DO LOCADOR
De uma forma mais abrangente, as obrigações do locador encontram-se dispostas no art. 566 do Código Civil de 2002. O inciso I inicia descrevendo sobre a entrega da coisa. O locador deve prestar ao locatário a coisa junto com todos os seus acessórios.
O mesmo inciso determina que seja dever do locador manter a coisa no estado que permita o fim a que se destina enquanto perdurar o contrato, devendo para isso, realizar todos os reparos necessários para o uso ou gozo da coisa.
O inciso II do mesmo artigo chama atenção ao comportamento do locador diante do imóvel, no caso, deve ele garantir “o uso pacífico da coisa” como diz o código.
Na locação de imóveis urbanos, as obrigações do locador estão descritas nos incisos do artigo 22 da Lei n. 8.245/91. O inciso I trata sobre a entrega do imóvel, que deve estar em estado que permita o seu uso, ou seja, a entrega deve ser feita com todos os acessórios que são essenciais para o uso da residência.
O inciso II diz respeito ao uso pacífico do imóvel¸ por isso entende-se que o locador deve proteger o imóvel contra terceiros e deve respeitar o uso da posse cedido ao locatário (Monteiro, 2003, 5:161 in Coelho, 2013, p.192).
No inciso III esta explicita a obrigação do locador quanto à manutenção da forma e destino do imóvel, tomando como exemplo o mesmo dado por Gonçalves (2013, p.315) onde se um imóvel for destelhado devido a fortes chuvas é obrigação do locador arcar com o reparo, isso porque ele é responsável pela forma e pelo finalidade a que se destina o imóvel.
Quanto à responsabilização pelos vícios está disposta no inciso IV do mesmo artigo, e disciplina que cabe ao locador os reparos dos vícios que manifestarem-se após a realização do contrato, a não ser que o locatário seja o responsável por esse vício. Conforme Gonçalves (2013, p.316):
“Aplica-se a hipótese, portanto, a teoria dos vícios redibitórios. Se o locador conhecia os vícios ou defeitos restituirá o valor da locação mais perdas e danos. Se não os conhecia, somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato (CC, art. 443)”.
O inciso V obriga o locador a prestar descrição minuciosa do imóvel, isso para manter o locatário informado sobre o estado que se encontra o bem alugado. No inciso VI contem a obrigação de fornecer recibo com todos os recebimentos dos valores que foram pagos pelo locatário.
O locador é obrigado, pelo inciso VII, a pagar as taxas sendo elas administrativas ou de intermediação. As taxas de administração seriam aquelas resultantes da contratação feita pelo locador de profissional para organizar a contabilidade do imóvel, e as taxas de intermediações seriam as resultantes do trabalho de intermediação entre o locador e o locatário, como por exemplo, o corretor.
Ainda no artigo 22 da Lei do Inquilinato, o inciso VIII cabe ao locador o pagamento de seguros e tributos, como o IPTU. Normalmente, essa obrigação fica por cona do locatário e isso porque essa transferência é possível caso haja previsão expressa no contrato. O inciso IX aborta sobre a obrigação do locador de apresentar comprovantes de obrigações passadas, o que significa que nos casos em o locatário se compromete em reembolsar o pagamento de tributos realizado pelo locador, deve exigir o comprovante desse pagamento.
E, finalmente, o inciso X exige que o locador pague as despesas extraordinárias de condomínio. O parágrafo único desse artigo explica que essas despesas extraordinárias são aquelas que se referem “aos gastos rotineiros de manutenção do edifício” e exemplifica essas situações nas suas alíneas.
Quanto aos direitos garantidos ao locador, a Lei n. 8.245/1991 expressa em seu art. 17 que é livre a convenção do aluguel, desde que não use o salário mínimo como base, seja moeda nacional e não sofra com a variação cambial.
Quando o locatário não oferecer nenhuma garantia (fiança, caução ou seguro de fiança locatícia) ao locador, esse último tem direito de exigir que o inquilino pague as prestações que estão por vencer e não as vencidas. O art. 42 da Lei do Inquilinato confirma que esse pagamento deve ser realizado até o sexto dia útil do mês vincendo.
Por fim, o art. 13 da mesma lei determina que é direito do locador decidir sobre a cessão do aluguel, a sublocação e o empréstimo do imóvel, não podendo o locatário realizar nenhum desses atos sem consentimento do locador.
DAS OBRIGAÇÕES E DIREITOS DO LOCATÁRIO
Da mesma maneira que dispõe sobre as obrigações do locador, a lei n. 8245/91, no seu art. 23 traz o rol de deveres do locatário. O inciso I obriga o locatário a pagar o aluguel pontualmente no prazo estipulado, e nos casos em que não houver determinação de prazo, o pagamento deve ser efetuado até o sexto dia útil do mês vencido. Coelho (2013, p.201) diz que:
“Cuida-se, de longe, da obrigação mais importante do locatário. [...] Nenhum outro título legitima ou autoriza o uso do bem pelo locatário a não ser a remuneração devida ao locador. Descumprindo essa obrigação, caberá a resolução do contrato.”. Pelo inciso II, o locatário deve obedecer a destinação da locação, portando se no contrato determinar que o imóvel será usado para fim residencial não pode ser utilizado com finalidade comercial. Ainda no inciso II, há uma segunda responsabilidade, que é conservar o imóvel, o próprio código diz que deve “rata-lo com o mesmo cuidado como se fosse seu.”.
O inciso III do art. 23, determina que o locatário deve restituir o imóvel ao término do contrato, sendo que ele deve encontrar-se no estado em que se encontrava, salvo os gastos normais do uso. O inquilino deve avisar o locador do surgimento de qualquer dado ou defeito, como expressa o inciso IV.
É obrigação do locatário consertar os danos que tenha sido causado por ele, por seus dependentes, familiares, visitantes e prepostos, como enfatiza o inciso V. O inciso VI preconiza que o locatário deve conservar a forma do imóvel, ou seja, não pode realizar reformas que modifiquem a forma do imóvel, a não ser que tenha autorização prévia e escrita do locador.
O locatário deve entregar ao locador documentos endereçados ao imóvel alugado, isso inclui qualquer tributo, citação, intimação ou cobrança, como esclarece o inciso VII. O inciso VIII obriga o inquilino a pagar as contas de consumo, nesse caso é sua a responsabilidade das contas de água, luz, telefone e gás.
O locatário deve permitir as visitas do locador, o que geralmente serve para inspeção do imóvel e essa visita deve ser realizada com data e hora previamente combinada como direciona o inciso IX. O inciso X determina que o locatário deve cumprir as regulações do condomínio, portanto deve seguir todas as normas impostas aos condôminos. O inciso XI, de maneira direta determina o locatário deve pagar pelo prêmio de seguro da fiança.
Finalizando, o último inciso do artigo, o inciso XII impõe que o locatário pague as despesas ordinárias do condomínio. Com o propósito de esclarecer o que são essas tais despesas ordinárias, o artigo ainda conta com algumas alíneas e parágrafos.
O locatário, em muitos casos é a parte mais fraca do contrato de locação, e dessa forma alguns direitos lhe são garantidos com a intenção de lhe prestar proteção. A primeira delas é a impossibilidade que o locador tem de desfazer o contrato sem nenhuma justificativa.
Antes de 1991, o locatário estava à mercê do locador que podia tirar-lhe o direito do uso ou do gozo do imóvel a qualquer momento. Porém, com a criação da Lei de locações o locatário ficou defeso contra essa atitude abusiva do locador.
“Nas locações residenciais contratadas por menos de trintas meses, o locador não tem direito de reaver o imóvel sem justa causa, mesmo após o vencimento do prazo contratual, enquanto não transcorridos cincos anos de vínculo. Já nas contratadas por trinta meses ou mais, vencido o prazo contratual, o locador pode retomar o imóvel sem justificativa.”. ( COELHO, 2013, p. 216)
O artigo 4º da Lei do Inquilino ainda traz como direito do locatário que, nos casos de contrato e locação com prazo determinado, o locador não pode reaver o imóvel antes do término desse período, porém essa disposição é permitida ao locatário desde que pague uma multa proporcional ao tempo de utilização que não foi cumprido.
O artigo 11 também dispõe, como direito à sub-rogação do aluguel nos casos de falecimento do locatário, desta forma o cônjuge, os herdeiros necessários e os seus dependentes econômicos que moram no imóvel, podem assumir o contrato de locação com as mesmas condições auferidas ao antigo proprietário. Entre outros direitos, o art. 12 determina que nos casos de separação judicial, o contrato de locação fica sobre a responsabilidade daquele que continuar ocupando o imóvel.
EXTINÇÃO DO CONTRATO
A extinção do contrato de locação pode dar-se através de algumas maneiras. O art. 573 do Código Civil de 2002 e os art. 46 e 47 da Lei n. 8.245/91 tratam sobre a forma mais simples de extinção desse contrato. Conforme esses artigos, o contrato firmado por escrito e com tempo determinado, finda com o termino do prazo preestabelecido.
O art. 46 da Lei de Locações faz ainda mais uma ressalva, pois esse prazo deve ser igual ou superior a trinta meses. Caso decorra o prazo e o locatário continuar ocupando o imóvel por mais de trinta dias considera-se prorrogado o contrato porém a qualquer tempo o locador pode reclamar que o imóvel seja devolvido, dando um prazo de trinta dias para a desocupação.
Caso o contrato de locação seja escrito e por tempo determinado, porém, o prazo sendo menor que trinta meses, ao terminar o prazo a locação se prorroga automaticamente com prazo indeterminado e nesses casos só poderá ser desfeito nos casos descritos nos incisos do art. 47 da Lei do Inquilinato:
“Art. 47. Quando ajustada verbalmente ou por escrito e com prazo inferior a trinta meses, findo o prazo estabelecido, a locação prorroga – se automaticamente, por prazo indeterminado, somente podendo ser retomado o imóvel:
I – Nos casos do art. 9º;
II – em decorrência de extinção do contrato de trabalho, se a ocupação do imóvel pelo locatário relacionada com o seu emprego;
III – se for pedido para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio;
IV – se for pedido para demolição e edificação licenciada ou para a realização de obras aprovadas pelo Poder Público, que aumentem a área construída, em, no mínimo, vinte por cento ou, se o imóvel for destinado a exploração de hotel ou pensão, em cinquenta por cento;
V – se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos.”
A locação também poderá ser desfeita a termos do art. 9º da Lei n. 8.245/91, ou seja, o contrato de locação poderá ser desfeito através de acordo entre as partes, em casos de prática de infração legal ou contratual, por falta de pagamento de aluguel ou demais encargos, em detrimento de reparações determinadas pelo Poder Público as quais não podem ser realizadas com a permanência do imóvel.