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O caráter punitivo da multa de mora e sua inexigibilidade diante da denúncia espontânea

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Agenda 16/11/2004 às 00:00

IV – MULTA ISOLADA E PARCELAMENTO

4.1 – MULTA ISOLADA

Ainda antes de encerrarmos nosso humilde trabalho, não podemos deixar de fazer algumas considerações acerca da multa isolada, que seria a imposta quando do atraso no cumprimento de uma obrigação tributária acessória (fazer ou não fazer), especificamente entrega de Declaração, pois há doutrinadores e julgadores que, mesmo aceitando o caráter sancionatório da multa de mora teima em não incluir a chamada multa isolada, Multa Por Atraso na Entrega da Declaração, fundamentando no fato de que não caracteriza denúncia espontânea, e portanto excluída do art. 138 do CTN.

Ora, reproduzamos novamente o artigo em verificação para constatar o que nos parece bastante claro, ou seja não há distinção entre a multa que já tratamos e esta isolada:

Art. 138 – A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.

Assim, desde já podemos verificar onde sublinhamos, que o pagamento do tributo devido tem que ser efetuado SE FOR O CASO, ou seja, se não houver tributo a ser pago basta a espontaneidade e a inexistência de prévia fiscalização, para elidir a responsabilidade. Quando o inadimplemento é de obrigação tributária principal, há a necessidade de pagamento do tributo pois a obrigação é exatamente esta, porém só não vai ser necessário o pagamento quando se tratar de outro tipo de obrigação ( a acessória), entrega da Declaração, não tendo assim tributo a ser pago, caracteriza-se a exclusão da responsabilidade pela simples entrega voluntária da Declaração.

Para reforçar nossa defesa, podemos enumerar alguns acórdãos judiciais e "administrativos":

MULTA-DCTF – A denúncia espontânea da infração exclui por inteiro a responsabilidade pela infringência, excluindo a aplicabilidade de multa, seja ela compensatória ou punitiva, distinção que a regra não faz. Considera-se espontânea a denúncia que precede o início de ação fiscal, e eficaz quando acompanhada do recolhimento do tributo, na forma prescrita em lei, se for o caso. O aposto ‘se for o caso’, constante do artigo 138 do CTN, evidencia que a norma abrange por igual infrações de obrigação acessória. (Acórdão CSRF/02-0.732, Rel. Cons. Sérgio Gomes Velloso, j. 09.11.1998, 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais)

Diga-se de passagem a divulgação deste acórdão da Câmara Superior de Recursos Fiscais provocou uma avalanche de procedimentos administrativos junto à Secretaria da Receita Federal visando a impugnação das ditas multas bem como restituição dos valores pagos indevidamente.

MULTA POR ATRASO NA ENTREGA DA DIRPF – ESPONTANEIDADE – ART. 138 DO CTN – IMPROCEDÊNCIA – IRPF – O art. 138 do CTN exclui a responsabilidade do contribuinte que se utiliza da denúncia espontânea da infração para sanar faltas ou irregularidades relacionadas com o cumprimento de obrigações tributárias, aplicando-se indistintamente às obrigações principal como a acessória." (Acórdão 102-43211, Rel. Cons. Valmir Sandri, j. 17.07.1998, provimento por unanimidade, 2ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes)

DCTF – DENÚNCIA ESPONTÂNEA DA INFRAÇÃO – MULTA DE MORA – INAPLICABILIDADE – Denunciado espontaneamente ao Fisco o descumprimento de uma obrigação tributária acessória, descabe, nos termos do art. 138 do CTN, a exigência da multa de mora prevista na legislação tributária. Recurso a que se dá provimento. (Acórdão 201-71208, Rel. Cons. Fasouto Valdemar Ludvig, Dar Provimento por Maioria, j. 08.12.1997, 1ª Câmara do 2º Conselho de Contribuintes)

DCTF. A entrega a destempo, desse documento, desde que espontaneamente, não importa imposição da penalidade prevista no art. 11 do Decrto-Lei n. 1.968/82, ex vi do disposto no art. 138 do CTN. (Ac. 201-68.995. 2º CC, 1ª C, Rel. Cons. Lino de Zevedo Mesquita. DJU 07.02.1994.)

A doutrina nacional há muito já tem engendrado a impugnância do absurdo da exclusão da multa isolada do instituto da Denúncia Espontânea, demonstrando claramente que não há o por quê distinguir entre o descumprimento da obrigação principal e acessória.

José Jayme de Macedo Oliveira (1999), resume "Em escorço, este art. 138 elide a responsabilidade pela prática de infrações tributárias substanciais e formais (quaisquer que sejam), exonerando o agente infrator de multa de toda espécie"

Luciano Amaro (1999), embora defensor do caráter indenizatório desta multa, mostra que não há diferença entre as duas:

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A expressão ‘se for o caso’ explica-se em face de que algumas infrações, por implicarem desrespeito a obrigações acessórias, não acarretam, diretamente, nenhuma falta de pagamento de tributo, embora sejam também puníveis, porque a responsabilidade não pressupõe, necessariamente, dano.

Segue a mesma tendência Antônio S. Poloni (internet) ao comentar Sacha Calmon Navarro Coelho, em Teoria e Prática das Multas Tributárias:

"É sabido que o descumprimento de obrigação principal impõe além do pagamento do tributo não pago, e do pagamento dos juros e da correção monetária a inflação de uma multa, comumente chamada de moratória ou de revalidação e que o descumprimento de obrigação acessória acarreta tão somente a imposição de uma multa disciplinar, usualmente conhecida pelo apelido de ‘isolada’. Assim, pouco importa ser a multa isolada ou de mora. A denúncia espontânea opera contra as duas"

A esta altura, já podemos adiantar, sem medo, que o artigo em questão do CTN aplica-se indistintamente às infrações substanciais e formais, senão vejamos:

I – em primeiro lugar, o legislador, ao redigir o artigo 138, disse que: "A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração...". Assim não vez distinção de infrações, falou apenas em infração, seja substancial ou formal.

Se fosse sua intenção excluir uma ou outra, teria adjetivado a palavra infração ou teria dito que a denúncia espontânea elidiria a responsabilidade pela prática de infração à obrigação principal excluindo a acessória, ou vice-versa. Ora, onde o legislador não distingue não é lícito ao intérprete distinguir, segundo conhecido princípio de hermenêutica;

II – em segundo lugar, no próprio corpo do art. 138 está explícita a intenção do legislador de alcançar ambos os tipos de infração. Como já comentamos anteriormente o legislador disse: "A denúncia espontânea exclui a responsabilidade acompanhada, sendo o caso, do pagamento do tributo devido..."

Se a exclusão da responsabilidade fosse apenas em relação às infrações formais, não faria sentido falar em pagamento de tributo devido.

Se a infração formal, como vimos decorre apenas de descumprimento de obrigação acessória (fazer ou não fazer), como admitir que possa haver "pagamento de tributo devido" (porque não pago) para convalidar o perdão da multa?

Só existe uma explicação. Evidentemente é porque o dispositivo em questão abrange a responsabilidade pela prática de infrações substanciais e formais indistintamente. Só haverá pagamento de tributo quando a infração tenha sido não pagá-lo. Nesse caso, o autodenunciante, ao confessar-se, deverá pagar o tributo não pago.

4.2 – DO PARCELAMENTO

Dos temas abordados neste trabalho, o que tem mais opiniões jurisprudenciais e doutrinárias contrárias ao nosso entendimento é justamente o parcelamento.

Defende-se que quando o legislador refere-se ao pagamento do tributo, se for o caso, está limitando ao pagamento total, à vista, conforme poderemos notar nos acórdãos a seguir:

"TRIBUTÁRIO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. PARCELAMENTO DA DÍVIDA. O parcelamento da dívida não se assimila à denúncia espontânea, que supõe o pagamento do tributo e dos juros de mora. Súmula nº 208 do extinto Tribunal Federal de Recursos." (Resp. 140562/RS, Min. Ari Pargendler, j. 16.11.1998, Por maioria. 2ª Turma, STJ)

Para os adeptos desta tese só haveria a exclusão da responsabilidade quando juntamente com a denúncia espontânea houver o pagamento integral do tributo devidos e dos juros de mora, a simples confissão de dívida acompanhada de seu pedido de parcelamento, não configuraria a denúncia espontânea e consequente exclusão da responsabilidade. Baseiam-se ainda na Súmula 208 do extinto TRF, que a meu ver, frente as reiteradas decisões dos Tribunais Superiores está completamente revoga, se é este o termo correto.

A dita súmula enuncia que a simples confissão da dívida, acompanhada do seu pedido de parcelamento, não configura denúncia espontânea.

Pois vejamos alguns selecionados Acórdãos:

"TRIBUTÁRIO – DENÚNCIA ESPONTÂNEA – RECOLHIMENTO DO TRIBUTO PARCELAMENTO – EXCLUSÃO DA MULTA – CTN, ART. 138.

I – Considera-se denúncia espontânea, para os efeitos do Art. 138 do CTN, a confissão de dívida, efetivada antes de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização.

II – Em havendo parcelamento, exclui-se a responsabilidade, se o contribuinte efetuou uma oportuna denúncia espontânea da infração tributária. Em tal hipótese, não se cogita em pagamento integral do tributo devido, ou depósito de seu valor" (Resp 181083/SC, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 24/08/1998)

"TRIBUTÁRIO. COFINS. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. MULTA MORATÓRIA. INEXIGIBILIDADE.

1 – Procedendo o contribuinte a denúncia espontânea de débito tributário em atraso, com o devido recolhimento do tributo, ainda que de forma parcelada, e afastada a imposição da multa moratória" (Resp. 117031/SC, Rel. Min. José Delgado, j. 16.06.1997, Por unanimidade, 1ª Turma do STJ).

"TRIBUTÁRIO. PIS. IRPJ E CSL. DÍVIDA DECLARADA ESPONTANEAMENTE. MULTA DE MORA. INEXIGIBILIDADE.

Na hipótese de denúncia espontânea, realizada formalmente, com o devido recolhimento do tributo, é inexigível a multa de mora incidente sobre o montante da dívida parcelada, por força do disposto no artigo 138 do CTN." (REsp 207377/BA, Rel. Min. Demócrito Reinaldo. J. 25.05.1999. Por unanimidade. 1ª Turma. STJ)

Parece-nos claro que em o artigo 138 não rezando que o pagamento tenha que ser integral no ato da denúncia espontaneidade, não tem porque o intérprete inserir esta limitação.

O que importa é a confissão da dívida, pois o parcelamento é um direito subjetivo diante da administração tributária, conforme legislação específica, e o contribuinte não poderia ser prejudicado por estar exercendo um direito seu.

Apesar das controvérsias jurisprudenciais, o parcelamento do tributo também não deixa de ser pagamento, estando também abarcado pelo artigo 138, quando ao denunciar espontaneamente, antes de qualquer procedimento administrativo específico e solicitando o parcelamento estará excluída a responsabilidade e, consequentemente, fundamentada a inexigibilidade da multa.


V – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Resta cristalino que o § único do artigo 138 do CTN elide a espontaneidade da denúncia se antes de apresentação tiver início qualquer procedimento administrativo fiscal, relacionado com a infração. Interpretando-se a contrário sensu, conclui-se que o procedimento fiscal não relacionado com a infração denunciada não tem o condão de impedir sua exclusão. Daí a inconstitucionalidade das disposições legislativas ordinárias das três entidades estatais tributantes, que elidem a espontaneidade da denúncia pela simples lavratura do termo de início de fiscalização. Ressalta-se, portanto, que não se considera espontânea a denúncia apresentada no início de qualquer procedimento administrativo ou mediante fiscalização, desde que relacionados com a infração (§ único do art. 138 do CTN).

Portanto, podemos resumir que caracteriza a excludente os seguintes elementos: a) comunicação formalizada à autoridade administrativa da existência da infração (declaração por exemplo); b) comunicação espontânea, isto é, não provocada por procedimento fiscal; c) pagamento do tributo, dos juros e da correção monetária.

Quanto ao ato de fiscalização, a autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências nesse sentido, deverá lavrar os termos necessários à documentação do início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará o prazo máximo para a conclusão daquelas. Este termo de início ou abertura de fiscalização produz conseqüências muito importantes, sendo a principal delas representada pela elisão dos efeitos que são normais ao procedimento corretivo espontâneo do sujeito passivo (exclusão das multas punitivas por atraso na entrega de declaração ou de recolhimento do tributo).

Do mesmo modo, início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização não significam meras visitas fiscais ao contribuinte, fiscalizações genéricas, ou mesmo pendências de processos (administrativo ou judicial) sobre outras matérias tributárias que não guardem correspondência com os fatos irregulares (objeto da denúncia espontânea).

A prejudicial da espontaneidade (§ único do art. 138 do CTN) só se positiva no caso das providências fazendárias serem substancialmente pertinentes à matéria tributária, não bastando que o agente fiscal lavre simples termo de início de fiscalização sem especificar o âmbito do trabalho fiscal. Não é crível admitir e conceber que o simples registro da presença fazendária no domicílio do contribuinte possa inibir e torpedear a salutar prática da boa-fé compreendida no direito à espontaneidade.

Ficou claro, em nosso trabalho, que a multa aplicada pela demora no adimplemento da obrigação tributária, trata-se tão somente de sanção e não de indenização como querem alguns poucos. Ainda está pacificado para nós que está incluso, na exclusão da responsabilidade que trata o art. 138, tanto a multa aplicada por atraso no cumprimento da obrigação principal quanto no da acessória, e ainda que não há necessidade do pagamento integral, quando é o caso de pagamento de tributo, podendo ser mesmo parcelado.

Assim, à guisa de conclusão, pelo exposto, resulta defeso, em nossa estrutura jurídica tributária, a aplicação de multa de mora, no caso de denúncia espontânea acompanhada do pagamento do tributo, sendo esta suprida, pelo depósito ou parcelamento do valor declarado.


Notas:

1.Carvalho, Paulo de Barros. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. Saraiva, SP – 1999

2.Coelho, Sacha Calmon Navarro e outros. COMENTÁRIOS AO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. Forense, RJ – 1998

3.OLIVEIRA, JOSÉ JAYME DE MACEDO. Código Tributário Nacional: Comentários, doutrina e jurisprudência, SP – 1998

4.AMARO, LUCIANO. Direito Tributário Brasileiro. Saraiva, SP – 1999

5.POLONI, ANTÔNIO S. Denúncia Espontânea, Multa de Mora e O Parcelamento de Débito. Artigo publicado na home page www.tributario.com.br

Sobre o autor
Ciro Afonso de Alcantara

Servidor Público Federal há 15 anos; bacharel em Direitopelas Faculdades Adamantinenses Integradas; Especialista em Direito Tributário,extensão em Direito Administrativo Disciplinar

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALCANTARA, Ciro Afonso. O caráter punitivo da multa de mora e sua inexigibilidade diante da denúncia espontânea. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 497, 16 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5933. Acesso em: 22 nov. 2024.

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