Introdução
É sabido que o assunto tratado neste estudo não é fato novo, pois é verificado na convivência humana desde o principio da história, podendo-se afirmar que surgiu praticamente junto ao trabalho. E, de acordo com Hirigoyen (2002, p.76) “o assédio moral existe em toda a parte”, contudo, é uma questão delicada e pouco discutida. As políticas organizacionais de prevenção contra o caso são quase raras e incipientes e, muitas vezes, ficam apenas na prescrição legal devido à falta de interesse ou conhecimento em sua execução.
No Brasil, a legislação é bastante limitada, ainda não existe uma lei específica a respeito do assunto, e, apesar do grande transtorno que pode causar no indivíduo, a prática ainda não é considerada crime. Alguns projetos de lei estão em debate, entretanto, é preciso aprofundar os estudos sobre o assunto, porque envolvem outras áreas do conhecimento humano, em especial, as que se referem às relações interpessoais no trabalho. Contudo, podemos ver que, ultimamente, o assunto tem sido recepcionado e sido causa de pesquisa em muitas áreas, principalmente na medicina e na área jurídica, especialmente pelo Direito do Trabalho, onde é discutido e observado que o poder do empregador para com o empregado deve ser limitado, não podendo este ser exercido de maneira abusiva, pois, caso isso ocorra, gerará ao empregado o direito de rescisão contratual, tendo o empregador a obrigação de pagar as verbas rescisórias na totalidade, além das indenizações a serem pagas tanto na esfera moral, como também na material. Além disso, as intimidações, afrontas, rebaixamentos, humilhações, entre outras ocorrências que são obrigados a enfrentar os trabalhadores que são atormentados pela prática abusiva do assédio moral, fazem com que o seu resultado tenha sido apontado gradualmente como doença profissional, com todos os impactos que a pode causar na vida do indivíduo.
Ademais, a prática tem criado força e se intensificado devido ao capitalismo e a globalização, pois estes trazem consigo egocentrismo e a ambição, aumentando a desvalorização do homem. E, consequentemente, o medo do desemprego, que sujeita os empregados a suportarem abuso moral de seus superiores hierárquicos.
É o que aponta o site da BBC Brasil, o qual expõe que quase metade dos brasileiros (47%) já sofreu assédio moral, sendo estes 52% mulheres e 48% homens, sendo que 39% destes não denunciaram o agressor por medo de perder o emprego.
Enfim, o trabalho tem por objetivo discutir e analisar os danos causados na vida do empregado devido ao assédio moral no âmbito trabalhista, bem como buscar meios de preveni-lo e encontrar meios mais eficazes para a punição do assediador.
Metodologia
O método de abordagem a ser utilizado será o método indutivo. A temática será desenvolvida através da técnica de documentação indireta, envolvendo pesquisa bibliográfica e o ordenamento jurídico nacional vigente.
Resultados e Discussão
1. Conceito de assédio Moral
Para entender as particularidades do assédio moral na relação de trabalho será exposta uma explicação, com propriedade, concludente e categórica ao termo.
O assédio moral acontece desde o começo da história e pode ser observado em toda e qualquer relação social, porém vem sendo apresentado na sociedade de maneira mais abrangente desde a obra da francesa Marie France Hirigoyen[1], que, em sua visão, define a prática da seguinte forma:
“O assédio moral no trabalho é qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”.
Já Heinz Leymann[2] o conceitua da seguinte forma:
“assédio moral é a deliberada degradação das condições de trabalho através do estabelecimento de comunicações não éticas (abusivas) que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um superior ou colega (s) desenvolve (m) contra um indivíduo que apresenta, como reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura”.
Mas, independentemente do conceito, o importante é compreender que o assédio moral se determina pelo abuso de poder de forma sistematizada e repetida. Vale salientar que mesmo que os fatos isolados não pareçam violências, o acúmulo das pequenas perturbações é que geram a agressão. O assédio surge e se propaga em relações hierárquicas, desumanas e sem ética, marcadas pelo abuso do poder e manipulações perversas que podem ser evidentes, sutis ou dissimuladas.
2. Caracterização do assédio moral
O assédio moral é caracterizado pelo comportamento abusivo, que pode emanar do próprio empregador ou chefe, que, aproveitando-se de seu poder hierárquico, ofende ou humilha outro empregado que esteja em um cargo abaixo do seu. A conduta abusiva não necessita ser de forma explícita, inclusive, na maioria das ocorrências, o assediador apresenta predileção pela exteriorização não verbal de seu comportamento e conduta, ocorrendo este de forma tácita, podendo se dar através de indiferença, olhar de maneira irônica, justamente por serem fáceis de serem negados em caso de reação, atrapalhando e impossibilitando a identificação do assediador e o desarme de sua estratégia, visto que o individuo que assedia não costuma assumir seus atos, sendo comum se proteger, quando acusado, alegando que ocorreu apenas mal-entendido, ou, às vezes, coloca-se na posição de vítima, alegando que a pessoa está com paranóia ou que está procurando confusão, dentre inúmeros motivos pretextados.
Em outros casos, de gravidade maior e mais evidente, a prática se apresenta de maneira expressa, por meio de comportamento e determinações diretas do empregador, a exemplo de deixar a vítima excluída do grupo sem nenhuma justificativa, passando esta a ser humilhada e diminuída perante os seus colegas, e estes, em virtude de temerem sofrer humilhações ou pelo receio da perda do emprego, acabam repetindo condutas do agressor no âmbito de trabalho, realizando assim o “pacto do silêncio e da tolerância”. O empregador pode cometer assédio moral, ainda, ao mudar atividades profissionais do empregado, estabelecendo a realização de tarefas inferiores às de sua capacidade.
De fato, um dos elementos que caracterizam tal prática é a frequência da conduta degradante e ultrajante, ressaltando que não há um limite de tempo determinado para que ele seja reconhecido. Nesse seguimento, o TRT do Espirito Santo[3] entendeu que:
“(...) a humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do assediado de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte, constituindo um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho.”
Logo, assediar é subjugar alguém a afrontas repetidas, propondo, assim, a persistência de práticas incongruentes, comentários nefastos, com o objetivo de expor alguém a situações vexatórias. Portanto, a destrutibilidade decorrente da humilhação frequente que sofre a vítima, passa afetar a sua vida particular, comprometendo sua honra e relações sociais, de forma a ocasionar irreparáveis danos à sua saúde mental, podendo diminuir inclusive a habilidade laborativa, de forma a constituir um risco oculto, porém, real, nas condições e relações de trabalho, podendo levar a vítima ao desemprego e, na pior das hipóteses, até mesmo, à morte.
3. Postura do assediador
A postura da pessoa que comete o assédio é insensata e variável. Com uma personalidade narcisista, ataca a autoestima e domina seu empregado por meio da relação de trabalho, desestruturando-o emocionalmente, transferindo-lhe a dor e as contradições que não aceita em si mesmo. O assediador sente supremacia com o assédio e o seu objetivo é massacrar o trabalhador, alguém mais fraco, oprimindo-o e consequentemente fazendo com que, não só a vitima, mas os outros empregados obedeçam a ele. Trata-se de uma pessoa perversa, que quer em praticar o mal, mesmo que destrua moralmente a vítima. Ele sente necessidade de demonstrar poder, sem quaisquer limites éticos. Para atingir o gênero feminino e masculino, o agressor se utiliza de meios diferentes. Para atingir homens, atacam sua virilidade, preferencialmente. Já com as mulheres a prática pode se dar por meios diversos, tais como a intimidação, a submissão, a proibição da fala, controle de tempo e frequência nos banheiros, relacionando atestados médicos e faltas a suspensão de cestas básicas e promoções, por exemplo. Seu propósito é obtido quando destrói alguém, tornando-o inútil ou improdutivo ou quando elimina do ambiente do trabalho alguém que não aguentou as agressões. O assediador é substancialmente um ser privado de ética e de moral, importante para ele é o domínio sobre todos.
4. Implicações causadas pelo assédio moral
Como já analisamos, o assédio moral acarreta várias consequências na vida profissional e pessoal do ofendido, e podem atingir diretamente o talento deste, bem como, a sua autoestima, imagem, boa-fama, honra, saúde física e mental, e, consequentemente, pode destruir o seu intelecto e potencialidade, ocasionando a ele inúmeras consequências, como improdutividade, desemprego, fragilidade na saúde emocional do trabalhador, depressão e, nos piores casos, o suicídio. Devido ao abalo sofrido pelo empregado, também sofrerá implicações a empresa em que este trabalha, podendo ocasionar baixa qualidade de serviço e diminuição da produtividade. Além disso, compromete a imagem e reputação da empresa junto ao mercado de trabalho e causam também dano econômico ao empregador.
A depender da conduta do empregador em relação ao empregado, este poderá retirar-se da empresa e pleitear a reparação do dano no judiciário, podendo ser aplicada a Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995, art. 1º, que proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeitos de acesso a relação de trabalho, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, entre outros casos, acrescentando, ainda, o art. 4º da Lei 9.029 que diz em caso de quebra da relação de trabalho por ato discriminatório, além do direito à reparação pelo dano moral, o empregado pode escolher pela reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais, ou pode escolher pela remuneração em dobro do período de afastamento.
O ofendido pode pleitear, ainda, sendo amparado pela CLT[4], que no art. 483, alíneas a e b, contem a seguinte redação:
Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo.
Além do dano moral causado, o assédio moral pode provocar também dano material, sendo um dos exemplos, as despesas com tratamento psicológico e médico, ou a perda do emprego.
Conclusão
O assédio moral no âmbito trabalhista, apesar de ser um fato frequente e que ocorre na sociedade há muito tempo, onde ocorre exposição de empregados a situações ultrajantes e injuriosas de maneira rotineira, passou a ser discutido com mais ênfase há pouco tempo. E deve ser levado bastante a sério, devido aos distúrbios causados na saúde física e mental na vida da vítima.
A jurisprudência e a doutrina têm se desenvolvido a respeito do assunto, embora não tenha, ainda, uma legislação vigente especifica. Contudo, é extremamente necessário que haja intervenção do Poder Legislativo para que a criação de uma legislação adequada e severa, assegurada pela Constituição Federal, a respeito do assunto, para que a prática do assédio passe a ser considerada um crime, e, assim, auxilie o Poder Judiciário no julgamento quando houver demandas sobre determinado assunto. Ainda, necessita-se que sejam tomadas medidas visando aniquilar o problema, ou seja, exponham e conscientizem a sociedade a respeito do valor e a importância do trabalhador para com todos. É imprescindível a fiscalização e a denúncia do Ministério Público.
Por fim, que se estabeleça um projeto elucidativo e explicativo para advertir a sociedade da ilicitude e gravidade de tal prática cruel e proteger o trabalhador, alertando a todos por meio de intervenções em repartições, sindicatos, organizações não governamentais, associações ensinado sobre as normas de bom convívio, nas relações de trabalho.
Notas
[1] HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Tradução Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: editora Bertrand do Brasil: São Paulo, 2002, p.17.
[2] LEYMANN, Heinz. Mobbing La Persécution au Travil, 1996, Seuil Trad. Fr, Paris, 1986.
[3] TRT 17ª R. 1141.2001.006.17.00.9, Ac 9029/2002, DOE 15.10.2002.
[4] BRASIL, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO – CLT, Decreto –Lei N° 5.452, de 1° de maio de 1943.