Um casal de adquirentes de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Cidade Maia, localizado na Avenida Bartholomeu de Carlos, nº 901, no bairro Cidade Maia em Guarulhos, região da grande São Paulo, perante a Construtora Ez Tec (o nome da SPE era: E.Z.L.I. Empreendimento Imobiliário Ltda.), obteve vitória perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através da manutenção da sentença de primeira instância que havia decretado a rescisão do “Contrato de Compromisso de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato dos compradores que já não mais suportavam arcar com o pagamento das parcelas, determinando à incorporadora a devolução à vista de 80% sobre os valores pagos em Contrato, acrescidos de correção monetária desde a data do ajuizamento da ação e juros legais de 1% (um por cento) a.m. até o momento da efetiva restituição dos valores.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em dezembro de 2013, quando então os compradores assinaram o contrato perante a incorporadora.
Passados cerca de 3,5 anos da data da compra, os adquirentes se viram impossibilitados de continuar a arcar com o pagamento das parcelas e procuraram pela incorporadora, a fim de obter o distrato amigável do negócio. Porém, a incorporadora informou devolveria o equivalente a 30% (trinta por cento) dos valores pagos em Contrato. Inconformados com a resposta obtida perante a vendedora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos compradores, bem como a condenação da incorporadora na restituição de grande parte dos valores pagos.
O Juiz de Direito da 35ª Vara Cível, Dr. Eduardo Palma Pellegrinelli, em decisão datada de 08 de junho de 2017, afirmou que, de fato, os compradores tinham direito à rescisão do negócio por insuportabilidade financeira e a incorporadora deveria restituir boa parte das importâncias pagas, condenando-a em primeira instância na restituição à vista do equivalente a 80% (oitenta por cento) dos valores pagos em contrato, acrescido de correção monetária desde a data do pagamento de cada parcela e juros legais de 1% a.m. a partir da data da citação até o momento da efetiva devolução.
Inconformada com a sentença proferida na primeira instância, a incorporadora decidiu seguir com o processo mediante recurso de apelação interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Recurso processado e devidamente distribuído perante a 9ª Câmara de Direito Privado, tendo como Relator a Desembargadora Angela Lopes, acompanhada dos Desembargadores Costa Netto, Piva Rodrigues, Galdino Toledo Júnior e Alexandre Lazzarini, para analisar se o Juiz de Direito na primeira instância agiu corretamente ou não ao condenar a incorporadora na restituição de parte dos valores pagos em contrato.
Por votação unânime datada de 10 de outubro de 2017, os Desembargadores entenderam por bem reformar parcialmente a sentença de primeira instância, apenas para o fim de fixar a incidência dos juros a partir da data do trânsito em julgado da decisão, mantendo a condenação da incorporadora na restituição do equivalente a 80% (oitenta por cento) dos valores pagos em contrato, devidamente corrigidos.
Para os Desembargadores, com a rescisão do negócio motivada por ato do comprador, as partes devem retornar ao estado anterior à compra, observando que no caso em análise a incorporadora deve devolver parte considerável dos valores pagos pelo comprador, uma vez que sequer tomou posse do imóvel, o que não gera grandes despesas para a incorporadora.
Nas palavras dos Desembargadores:
- “Com efeito, é incontroverso que a rescisão contratual foi causada por desistência dos compradores, motivada pelas dificuldades financeiras que inviabilizaram o prosseguimento do negócio. Não se vislumbra, portanto, que a ré tenha logrado com culpa pela extinção da relação jurídica.
- No entanto, a rescisão do contrato é direito inquestionável dos compradores, que mesmo inadimplentes - o que não é o caso - fazem jus à devolução da quantia paga pelo negócio. Cabe ressaltar que a rescisão foi pleiteada antes do recebimento das chaves, não tendo os autores obtido a posse de nenhuma das unidades.
- Por outro lado, a ré tem direito à retenção de parte do montante pago, consoante jurisprudência dominante deste e. TJSP, consolidada com a edição da Súmula 1, in verbis:
- “O compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem.”
- Assim, superada a questão a respeito da rescisão, com a qual a ré não se opôs, necessária a verificação do quantum a ser restituído, pois a ré apelante insurge-se contra o montante fixado na sentença, ao argumento de que, como a rescisão se deu por iniciativa dos compradores, deve ser aplicada a cláusula contratual que estipula a retenção de acordo com as despesas ali elencadas.
- Todavia, não lhe assiste razão, na medida em que a referida cláusula encerra nítida abusividade, pois as deduções previstas reduzem a restituição à quantia extremamente irrisória, em violação às normas consumeristas (art. 51, II e IV, e art. 53, ambos do CDC).
- Afinal, dispõe a cláusula décima (fls. 43/44), que, deduzido o equivalente a 10% a título de despesas administrativas, a restituição ao comprador se dará na seguinte proporção:
- “Se já tiverem sido pagos até 30% (trinta por cento) do preço total da venda, a restituição será de 30% (trinta por cento) do saldo encontrado;
- Se já tiverem sido pagos mais de 30% (trinta por cento) do preço total da venda, a restituição será de 50% (cinquenta por cento) do saldo encontrado.”
- Evidente, portanto, que a forma como estipulada a devolução das parcelas coloca os consumidores em desvantagem exagerada, já que a restituição se limitaria à quantia irrisória, ou nenhuma, dependendo do valor pago pelos compradores, o que se mostra inadmissível.
- Por fim, quanto aos juros de mora, assiste razão à ré. Não obstante esta Relatora, nos casos semelhantes aos dos autos, já tenha se posicionado no sentido de que os juros de mora deveriam incidir a partir da citação, filio-me ao entendimento majoritário e já pacificado do c. STJ, a fim de rever posicionamento anterior e acolher a tese defendida pela ré, para fixar que os juros de mora incidentes sobre o valor da condenação, sejam computados a partir do trânsito em julgado.
- Em conclusão, a r. sentença comporta reforma unicamente para que os valores devidos pela ré aos autores sejam acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado.
- Mantem-se, no mais, a r. sentença como lançada.”
Ao final, por votação unânime, os Desembargadores da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deram parcial provimento ao recurso de apelação interposto pela incorporadora apenas para fixar a incidência dos juros a partir da data do trânsito em julgado da decisão, mantendo a condenação na restituição do equivalente a 80% (oitenta por cento) dos valores pagos em contrato, devidamente corrigidos.
Processo nº 1035198-82.2017.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.