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Assédio moral no ambiente do trabalho e a responsabilidade civil.

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Agenda 26/01/2005 às 00:00

3 ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DO TRABALHO E A RESPONSABILIDADE CIVIL: EMPREGADO E EMPREGADOR

3.1 Assédio Moral como Dano Pessoal

No assédio moral, os direitos essenciais da pessoa é que são atacados. Nesse passo, o dano moral está inserido dentro do aspecto do dano pessoal, segundo entendimento do professor Paulo Eduardo Vieira de Oliveira:

[...] se entenderemos, pois, que o dano moral tem a mesma compreensão que o dano pessoal, isto é, que ele se verifica pela lesão à integridade física, psíquica, intelectual, ética e social da pessoa humana, ambos se identificam. 70

Segundo Márcia Novaes Guedes, "no terror psicológico são precisamente os direitos essenciais da pessoa, aqueles que compõe a medula da personalidade e que resultam da entrada do ser humano no mundo jurídico, que são atacados". 71 Portanto, o dano sofrido pela vítima é pessoal, porquanto são atacados tanto atributos psíquicos que se compõe de direitos à liberdade, à intimidade, à integridade psíquica e ao segredo, e quanto os direitos morais propriamente ditos, formados pelo direito à identidade, à honra, ao respeito, à dignidade, ao decoro pessoal e às criações intelectuais.

Nesse passo, a doutrina define o dano moral partindo da idéia de negar o que é dano patrimonial, e da idéia de conceituá-lo positivamente, como fez Antônio Jeová Santos citado na obra de Oliveira:

O que configura o dano moral é aquela alteração do bem-estar psicofísico do indivíduo. Se do ato de outra pessoa resultar alteração desfavorável, aquela dor profunda que causa modificações no estado anímico, aí está o início da busca do dano moral. 72

A definição de Ramón Daniel Pizarro, ainda citado pelo mesmo autor, se refere ao aspecto não patrimonial e enfoca entendimento amplamente aceito:

El daño moral importa, pues, una minoración en la subjetividad de la persona, derivada de la lesión a un interés no patrimonial. Com mayor precisión, una modificación disvaliosa del espíritu, en el desenvolvimiento de su capacidad de entender, querer o sentir, consecuencia de una lesión a un interés no patrimonial, que abrá de traduzirse en un modo de estar diferente de aquel al que se hallaba antes del hecho, como consecuencia de éste y animicamente perjudicial. 73

Tanto doutrina como jurisprudência apaziguaram o entendimento em relação ao conceito do que seja o dano moral, e deste estar inserido no âmbito do dano pessoal, como bem conclui Oliveira:

Há de se reconhecer, todavia, que o termo tecnicamente correto, porque melhor exprime o conceito jurídico do instituto, é dano pessoal ou dano à personalidade, tomado o termo pessoa em toda sua ampla dimensão, compreendendo a integridade psicofísica, a intelectual, a afetiva, a moral e a social. 74

De nossa conclusão, concordamos e o assédio moral está inserido em uma espécie de dano moral e, por conseqüência, um dano pessoal, pois tal fenômeno pode transgredir diferentes faculdades da pessoa humana, seja moral, intelectual ou social. E, portanto, resguardado o princípio do artigo 5°, X, da Constituição Federal 75, as vítimas por tal dano podem buscar o justo ressarcimento pelo prejuízo moral.

3.2 Assédio Moral como Acidente de Trabalho

O assédio moral, além de ser um dano pessoal, pode ser interpretado como acidente do trabalho, sendo aquele que decorre pelo exercício do trabalho, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou redução da capacidade permanente ou temporária para o trabalho. 76 Ou seja, trata-se de um evento único ou continuado, imprevisto e com conseqüências geralmente imediatas, no qual o assédio moral está inserido.

A Constituição Federal em seu artigo 7º, XXVIII, assim se pronuncia quanto aos acidentes de trabalho:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...]

XVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

A norma constitucional colocou o ressarcimento dos danos decorrentes dos acidentes do trabalho nos campos objetivos e subjetivos. Ademais, a lei infraconstitucional subdivide as doenças ocupacionais em doenças profissionais e doenças do trabalho, estando previstas no artigo 20, I e II da Lei 8.213/91. 77 As primeiras são desencadeadas pelo exercício profissional peculiar a determinada atividade, e decorrem de micro traumas que cotidianamente agridem e vulneram as defesas orgânicas, que por efeito cumulativo deflagram o processo mórbido. Já as doenças do trabalho são desencadeadas em função das condições especiais em que o trabalhado é realizado e com ele se relacionem diretamente, também havendo a incidência de microtraumatismos acumulados.

Ambas diferenciam-se devido às doenças profissionais resultarem de risco específico direto (característica do ramo de atividade), e pela necessidade de comprovação do nexo causal via vistoria no ambiente laboral, enquanto as doenças do trabalho têm como causa o risco específico indireto, e há uma presunção legal da comprovação do nexo de causalidade. 78

Ao comentar sobre o rol de doenças ocupacionais expostas no Regulamento da Previdência Social, Antônio Lopes Monteiro ensina:

De acordo com o Regulamento, apenas as doenças profissionais causadas pelos agentes patogênicos relacionados no Anexo II poderiam ser assim consideradas. Contudo, a jurisprudência ao longo das diversas legislações, já consolidou o entendimento de que tal relação é meramente exemplificativa. 79

O Regulamento prevê uma série de agentes patogênicos causadores de doenças ocupacionais no seu Anexo II, conforme o artigo 20 da Lei 8.213/91, sendo, portanto, seu rol meramente exemplificativo e não exaustivo. Há, ainda, previsão na própria legislação previdenciária de que doenças não existentes enquadradas naquelas referidas acima, podem ser consideradas como acidente de trabalho. 80

Somando-se a isso, há ainda na legislação referida, enquadramento em acidente de trabalho aquele que, embora não tenha sido causa única, haja contribuído diretamente para morte do segurado, para a redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para sua recuperação. E ainda, considera-se acidente de trabalho, a agressão praticada por terceiro ou companheiro de trabalho em horário e em local de trabalho, e ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho. 81

Cabe ressaltar, nesse ponto, que o trabalhador que é assediado moralmente e, por conseqüência desta agressão, é acometido de qualquer moléstia, poderá reclamar o benefício do auxílio-acidente 82 desde que segurado pela Previdência Social, tendo ainda garantia de estabilidade como reza o artigo 118 da Lei 8.213/91 83.

É o que decidiram os magistrados no seguinte acórdão, onde a empregada foi despedida sem respeito à estabilidade do referido artigo:

ESTABILIDADE – REINTEGRAÇÃO – INDENIZAÇÃO – Caracterizada a doença do trabalho, estando a reclamante em gozo do respectivo benefício, encontra-se suspenso o contrato de trabalho, sendo nula, portanto, a despedida e, ao término do benefício, ainda terá estabilidade por doze meses, como reconhecido na sentença. Incabível, no presente caso, a substituição do direito à reintegração pelo pagamento de indenização compensatória, uma vez que o objetivo da lei é de garantia no emprego. Provimento negado. COMPENSAÇÃO – Considerada nula a despedida, incabível o pagamento de aviso prévio e das demais parcelas rescisórias, impondo-se a compensação dos valores pagos sob tais rubricas. Recurso provido.

TRT 4ª R. – RO 01368.030/98-0 – 3ª T. – Relª Juíza Vanda Krindges Marques – J. 14.11.2001. 84

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Conclui-se, portanto, conforme o referido acima que as moléstias originadas por agressões morais podem constituir acidente de trabalho, e, por conseqüência, o trabalhador assediado buscar os benefícios de auxílio-acidente, bem como a estabilidade de 12 meses do contrato de trabalho após a cessação de tal benefício.

3.3 Responsabilidade Civil do Empregado e do Empregador

Sobre a responsabilidade civil, importante não se olvidar dos ensinamentos de Caio Mário da Silva Pereira, sobre a pessoa jurídica:

Sendo, como muitos a entendiam, uma ‘ficção’, a pessoa jurídica seria ‘incapaz de querer’ e, em conseqüência, não seria possível imputar-lhe o fato danoso [...]. Por outro lado, não dispondo de órgãos físicos que permitam uma ação direta, e devendo elas mesmas proceder por ação ou omissão de seus prepostos e de seus órgãos, seriam esses os responsáveis e não a pessoa jurídica, contra os quais o lesado haveria de agir. 85

Assim, demonstrados os malefícios empregados às vítimas do assédio moral, bem como que os danos aplicados são de natureza pessoal (moral) devendo haver a devida reparação no âmbito civil, cabe questionar quem será compelido a reparar os prejuízos sofridos, visto haver empregado e empregador sujeitos e vítimas do assédio moral.

Preliminarmente, cabe extrair da agressão os elementos principais para buscar a reparação. Primeiro, a identificação dos sujeitos, ou de quem parte a agressão e a quem é dirigida. Trazendo os sujeitos elencados na primeira parte deste trabalho, verifica-se que a agressão pode partir de: a) empregado, b) superior hierárquico ou c) colega de mesma linha hierárquica. Podendo ser dirigida, da mesma forma a empregado, colega ou superior hierárquico. Após os outros elementos pré-requisitos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam o dano, a existência de culpa, dolo ou risco, e o nexo de causalidade.

Segundo as referências expostas no capítulo anterior em relação ao nexo causal, não podemos olvidar do art. 2º da Resolução nº 1.488 de 11 de fevereiro de 1998, do Conselho Federal de Medicina, o qual diz que:

Art. 2º - Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar:

I - a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;

II - o estudo do local de trabalho;

III - o estudo da organização do trabalho;

IV - os dados epidemiológicos;

V - a literatura atualizada;

VI - a ocorrência de quadro clínico ou sub-clínico em trabalhador exposto a condições agressivas;

VII - a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;

VIII - o depoimento e a experiência dos trabalhadores;

IX - os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde.

Quanto ao conjunto de diretrizes acima, acrescentaríamos ainda a análise do lapso temporal da agressão, ou seja, o quanto perdurou a agressão sofrida pelo trabalhador. Dito isso, passamos a análise de cada caso e qual a responsabilidade civil concernente.

3.3.1 Empregado que assedia superior hierárquico ou empregador

Como já referido, esse caso é bem mais difícil de acontecer, porém não impossível, caracterizando-se pelo ataque do empregado ou empregados ao superior hierárquico ou o próprio empregador. Segundo a legislação trabalhista, a empresa ao identificar a agressão, deve apenas dispensar o empregado naquelas hipóteses que incidam sobre a justa causa, elencados na CLT no artigo 482 da CLT 86.

Dentre as hipóteses do referido artigo, notamos as seguintes que podem ser interpretadas como assédio moral do empregado: o mau procedimento; a indisciplina e o ato lesivo da honra praticado contra o empregador e superiores hierárquicos. Senão vejamos, mau procedimento, segundo Amador Paes de Almeida, é quem "dolosamente, (...) faz ameaças a colegas de serviço, é agressivo ou hostil aos fregueses da empresa para a qual trabalha". 87 Ou como diz o professor Wagner D. Giglio:

De uma maneira geral, ou doutrinadores classificam como mau procedimento o comportamento incorreto do empregado, através da prática de atos que firam a discrição pessoal, as regras do bem viver, o respeito, o decoro e a paz; atos de impolidez, de grosseria, da falta de compostura, que ofendem a dignidade. 88

Indisciplina, segundo o mestre Valentin Carrion, é o "descumprimento de ordens gerais do empregador dirigidas impessoalmente ao quadro de empregados." 89 Enquanto que o ato lesivo contra a honra do empregador e superiores hierárquicos, Almeida ensina que:

As ofensas podem ser dirigidas ao empregador ou a superiores hierárquicos, assacando contra eles fatos extremamente ofensivos a sua dignidade pessoal e que, sabidamente, não são verdadeiros. Entendemos que, sobretudo em relação ao empregador, irrelevante que tais ofensas tenham sido proferidas fora do local de serviço; alcançada repercussão na comunidade, caracterizada está a falta nominada. 90

Os atos de mau procedimento, indisciplina e ato lesivo da honra, não só poderiam como deveriam ser interpretadas ampliativamente, de modo a afastar o empregado que assedia moralmente superior hierárquico ou empregador.

Se a agressão não for alguma daquelas elencadas nas hipóteses, e também não se enquadrar em mau procedimento ou ato lesivo à honra, pode o empregador promover a dispensa sem justa causa, indenizando o empregado-assediador.

Cumpre salientar, que após este trâmite, pode o empregador promover ação com vistas a responsabilizar objetivamente o empregado-agressor, buscando o ressarcimento material ou/e moral que entender necessário a demanda, tendo como competência a Justiça do Trabalho se o agredido for o empregador ou superior hierárquico. Porém, aqui se torna necessário a reflexão: se o agredido é o superior hierárquico, a competência poderá ser a Justiça Civil, se entendermos que o superior também é empregado, não se amoldando na competência do artigo 114 da Constituição Federal, visto ser uma agressão de empregado direcionado a outro empregado. 91

Nossa opinião é de que o preposto, superior hierárquico, que exerce cargo de chefia, de direção, de liderança dentro da empresa, está por refletir a política, bem como as ordens do proprietário empregador. Ele é a pessoa quem repassa os comandos do chefe mor, daí decorrendo ser ele próprio a figura fictícia do empregador, portando incompetente a justiça comum.

Ademais, para o caso de ser superior hierárquico o assediado, a alternativa do remanejamento da vítima para outro setor de trabalho é resolução paliativa para o problema, pois tal alternativa não tem o condão de coibir futuras agressões por parte do empregado agressor ou empregados agressores. Ainda, em relação às micro e pequenas empresas, as quais não contam com muitos setores, seria impossível o remanejamento por ser a empresa de pequeno porte, supondo-se não haver estrutura que comporte tal procedimento.

3.3.2 Empregado que assedia empregado

Aqui, o caso é mais comum e consiste quando o agressor é o próprio colega de trabalho na mesma linha hierárquica que o agredido. Acontece freqüentemente na concorrência por cargos melhores e ainda mais em empresas com uma gestão de competição interna voltada especificamente ao lucro sem limites.

Em uma primeira análise, verifica-se a incompetência da Justiça do Trabalho em abarcar agressões entre trabalhadores, pois da análise do artigo 114 da CF depreende-se:

Art.114. Compete a Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.

In casu, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é o de afastar os Juízos Trabalhistas para julgar os danos entre trabalhadores, porém, verificado um nível da culpa in vigilando e in eligendo por parte do empregador, pois houve desídia do empregador em cuidar dos atos de seus prepostos, bem como elegeu mal o empregado que assediou, torna-se responsável subjetivamente pelo ato de seu preposto. Sob essa análise, verifica-se portanto a competência da Justiça do Trabalho, ainda mais quando há a súmula 341 do STF, dizendo que "é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto".

Ademais, há a Súmula 736 do STF na qual afirma que "compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores."

Ainda, há o projeto de lei n º 6.671 de 2002 que pretende ampliar a competência da Justiça do Trabalho para comportar julgamentos de litígios decorrentes de relações entre representantes comerciais autônomos, corretores, empreiteiros, sub-empreiteiros, parceiros, arrendatários, cooperados e os tomadores de seus serviços.

A justificativa do projeto baseia-se na alegação de que a transformação da realidade social obriga a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, como medida de aprimoramento da eficácia da prestação jurisdicional e também na alegação de que o Juiz do Trabalho tem vocação a decidir as demandas que envolvam prestação de serviços do homem. Porém, tal projeto em nada contribui para abarcar litígios entre os próprios trabalhadores.

Após essa referência à competência do dano, há que se verificar se o agredido busca uma solução no decorrer do contrato de trabalho, seja alertando superiores sobre as agressões sofridas, seja buscando ajuda de médico da empresa, ambas atitudes com a intenção de solucionar o problema. Surtindo efeitos, e a empresa colaborar com a vítima no sentido de dispensar o agressor ou remanejá-lo, cabe à vítima buscar a indenização que entender possível junto à Justiça do Trabalho contra o agressor.

E ainda, mesmo que a empresa tenha ajudado a vítima, poderá incluí-la no pólo passivo da demanda, por força da teoria objetiva imposta pelo Código Civil, art. 932, III. Porém, isto não será eticamente bem vindo aos olhos do magistrado que julgar a ação, podendo ser minorada a indenização, visto ter a empresa auxiliado a vítima quando careceu, ou ainda podendo não ser condenada por seu ato positivo auxiliando o empregado agredido, a qual dependerá da hermenêutica do julgador.

Se a empresa não colaborar com o empregado agredido, o trabalhador assediado poderá rescindir o contrato de trabalho e pleitear uma indenização pelo assédio moral dos agressores, empresa e agressor, por força das alíneas "c" e/ou "e", do artigo 483 da CLT, que dizem que o "empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:(...) c) correr perigo manifesto de mal considerável (...) e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e da boa fama".

Risco de mal considerável, como ensina a doutrina, é aquele mal originado da inércia da empresa em prover aos empregados um ambiente de trabalho saudável, cumprindo com normas de segurança e medicina do trabalho. Antônio Lamarca citado pelo professor Amador Paes de Almeida esclarece:

Há profissões em que o risco é inerente [mineiros, aviadores, pára-quedistas, escafandristas, homens-rã, etc.]. Esses riscos, porém, devem ser os normais da profissão; se agravados pela incúria patronal, cabe o direito de resistência. 92

A inércia da empresa na busca de resoluções para o conflito, bem como na busca pela melhora constante do ambiente do trabalho implicará em um nível de culpa na relação contratual. Quanto aos atos lesivos da honra e da boa fama, estes também compreendem a calúnia, difamação ou a injúria. 93

Em relação ao meio ambiente do trabalho, Rodolfo de Camargo Mancuso citado por Julio Cesar de Sá da Rocha averigua que é o "habitat laboral, isto é, tudo que envolve e condiciona, direta e indiretamente, o local onde o homem obtém os meios para prover o quanto necessário para sua sobrevivência". 94

Aqui, aplica-se a teoria subjetiva, pois a empresa deixou, ou vacilou em vigiar corretamente (culpa in vigilando) atos de seus prepostos, devendo o agredido incluir a empresa na demanda. Concorrendo ainda com isso, a empresa responde objetivamente, agora, segundo o Código Civil, por atos de seus prepostos. 95 E ainda, havendo interesse do lesado, poderá incluir o agressor-preposto no pólo passivo da demanda aplicando-lhe também a responsabilidade objetiva por ato doloso.

Diga-se que poderá perseguir a indenização durante o contrato de trabalho, mas é sabido que isso é quase humanamente impossível. Marie-France se posiciona da seguinte forma:

Quando as ocorrências de assédio moral provêm de colega ou de pertinentes à hierarquia, será necessário, se forem graves, processar o autor diretamente, da mesma maneira que o empregador. [...] A responsabilidade do empregador deve ser por ele assumida a partir do momento em que toma ou deveria tomar conhecimento, mas não adota as providências necessárias para coibir tais comportamentos. As empresas são responsáveis por seus empregados, sendo, pois, absolutamente normal que sejam condenadas juridicamente se um de seus empregados adotar um comportamento inadmissível. 96

Pois, então, concordamos com a autora no sentido de incluir a empresa na demanda, tendo como competente a Justiça Trabalhista, porém, aos olhos dos magistrados, estes devem ter um nível de precaução ao aplicar a teoria objetiva do empregador, pois se levada ao extremo, o ambiente de trabalho pode se tornar verdadeiro campo de batalhas, onde há apenas um responsável: o empregador.

3.3.3 Superior hierárquico ou empregador que assedia empregado

Deste tipo de assédio moral, já estamos mais convencidos de que a empresa responde objetivamente por força da nova legislação cível. O preposto não deixa de ser o representante hierárquico da empresa, exprimindo seu poder de chefia originado da política da empresa, e por vezes de comando diretos dos patrões. "Normalmente, ela age por via de seus administradores ou dirigentes, que são seus órgãos" 97 afirma Rui Stoco ao comentar a responsabilidade da empresa, e ainda, citando De Page, que:

[...] a pessoa jurídica responde como proponente pelos atos de seus empregados ou prepostos [responsabilidade por fato de terceiro], como também pelo de seus órgãos [diretores, administradores, assembléias etc.], o que vai dar na responsabilidade direta ou por fato próprio. (98)

Por vezes, os responsáveis recebem poder que extrapola e como demonstrado, faz crescer o descontrole das pessoas que exercem a liderança no ambiente do trabalho. Nessa coerência de idéias, o superior que dolosamente assedia trabalhador incorre objetivamente com a intenção de lesar, enquanto a empresa que coaduna com atos que tendem a incorrer em lesões, responde objetivamente ao caso específico do artigo 932, III, do novo Código Civil, o qual reza que são "também responsáveis pela reparação civil: (...) o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele".

Arnold Wald citado por Terezinha Lorena Pohlmann Saad ensina que:

[...] a primeira condição para que haja responsabilidade do comitente pelo fato do preposto é, pois, a existência do vínculo de preposição. O segundo requisito é que o dano tenha sido causado no exercício ou por ocasião do trabalho. Não é necessário que o dano tenha sido oriundo de uma atividade do preposto devidamente ordenada pelo comitente. Basta, para que haja responsabilidade do comitente, que o ato danoso tenha sido produzido ou facilitado pela situação do preposto como empregado ou comitente. Há, pois, responsabilidade desde que o trabalho tenha propiciado ao preposto a oportunidade de causar o dano. Há responsabilidade do patrão mesmo no caso de abuso das funções por parte do empregado, desde que os terceiros estejam de boa-fé, ignorando que o preposto tinha ultrapassado os limites das suas atribuições. (99)

Também é esta a posição de Washington de Barros Monteiro, por entender de modo amplo o dispositivo que assume a responsabilidade do empregador por ato de seus propostos:

Em qualquer hipótese, porém, para que se subsista a responsabilidade do patrão, por ato culposo do empregado, preciso será que este se encontre a serviço, no exercício do trabalho, ou por ocasião dele. Sem demonstração dessa circunstância, não é lícito concluir pela responsabilidade do preponente. Entretanto, para a caracterização dessa responsabilidade, pouco importa que o ato lesivo não esteja dentro das funções do preposto. Basta que essas funções facilitem sua prática. 100

Assim, ambos são responsáveis, sendo coerente que o agredido pleiteie o ressarcimento somente da empresa, por ser, os atos do agressor tirano, aqueles representados pela política da empresa, podendo a empresa reaver o que pagar, por força do artigo 934 do Código Civil. 101

3.3.4 Superior hierárquico ou empregador juntamente com empregados que assediam outro empregado

É o caso do assédio misto descendente, onde as agressões podem partir do chefe ou superior hierárquico e se alastrar, fazendo com que os colegas da vítima também lhe dirijam agressões. Ou ainda, as agressões partem dos colegas e o chefe é parcial com tal atitude.

Importa, aqui, verificados os sujeitos, observamos a inserção da responsabilidade objetiva e subjetiva a ambos os casos. Porém, ao primeiro caso, o qual as agressões partem do chefe ou superior, observamos que, não raras vezes, envolve-se tomada de posição. Ou seja, o grupo toma o partido do chefe pois é ele de quem o grupo depende, é ele quem decide quem "vai" e quem "fica".

Cabe analisarmos o nível de participação dos colegas, até que ponto eles contribuíram para as agressões. Não se pode negar, que há aqueles que concordam com o chefe e o auxiliam a pisotear e agredir a vítima. Mas também não se pode olvidar daquelas pessoas que, por estar em grupo, e por medo de represálias ou de perder o emprego, aplicam a tomada de posição porém sem desferir agressões.

Assim, tem-se que o primeiro caso onde as agressões partem do chefe, aplica-se a teoria objetiva, sem verificação da culpa, enquanto no segundo caso onde o chefe age com cumplicidade aos atos de seus prepostos, incorre na teoria subjetiva, pois age com omissão aos atos de subordinados. Importante nesse caso, ao demonstrar o dano que a vítima sofreu, e mesmo que já haja previsão da teoria objetiva consagrada no nosso ordenamento jurídico, demonstrar provas que possam aferir a culpabilidade da omissão da chefia.

Passa-se à analisar, no próximo capítulo, a importância da legislação estrangeira e a tutela jurídica do assédio moral, verificando a preocupação da Organização Internacional do Trabalho com a saúde mental dos trabalhadores, e as ações do Direito Brasileiro e sua posição jurisprudencial concernente ao tema.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOLON, Rodrigo Cristiano. Assédio moral no ambiente do trabalho e a responsabilidade civil.: Empregado e empregador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 574, 26 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6173. Acesso em: 5 nov. 2024.

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