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A vigência do crédito-prêmio do IPI e o governo federal

Agenda 19/01/2005 às 00:00

O crédito – prêmio do IPI foi instituído em 1969, ano em que o Brasil encontrava-se em estágio econômico subdesenvolvido, não possuindo condições de competir em igualdade com os demais países no comércio exterior. Em razão disso, visando privilegiar a economia nacional no exterior, o governo, através da edição do Decreto-Lei 491/69, diminuiu a carga tributária das empresas nacionais, tornando os produtos brasileiro mais competitivos no mercado externo.

Dentro deste contexto e visando premiar as empresas nacionais que promovem exportação e elevam positivamente a balança comercial brasileira, após 10 anos de vigência mansa e pacífica, o crédito-prêmio do IPI sofreu uma abrupta e arbitrária tentativa de supressão do cenário jurídico.

O Governo Federal, através da edição de diversos decretos-lei, flagrantemente ilegais e inconstitucionais, dos quais surgiram portarias e instruções normativas de âmbito administrativo, dentre outros atos, tentou extinguir o benefício.

Após o julgamento do pleno do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria em destaque, reconhecendo o direito das exportadoras ao crédito-prêmio do IPI, as empresas sentiram-se mais seguras para reaver o direito que lhes cabe. Devido ao grande número de empresas que decidiram buscar o seu direito judicialmente, várias notícias e reportagens tendenciosas – afirmando que o crédito-prêmio do IPI trata-se, na verdade, de um "roubo" planejado entre empresários e setores do governo - foram publicadas nos principais jornais brasileiros a respeito do assunto.

Ocorre que a opinião pública, por não conhecer o histórico da legislação que instituiu o crédito-prêmio do IPI e ainda, por ignorar o controle de constitucionalidade das leis, toma a informação veiculada como referência.

Todavia, a favor das exportações, e porque não dizer do Brasil, ainda se pode contar com a prodigiosidade do governo brasileiro em criar armadilhas jurídicas para ele mesmo - armando bombas de efeito retardo por não prestar a atenção devida ao editar leis ou revogá-las, passando por cima de tudo quanto é direito, na ânsia de aumentar e aumentar a arrecadação pública - e com a existência de verdadeiros estudiosos do direito, como o Sr.. Dr Ministro José Delgado, que afirmou não ceder à pressão do governo e ao " terrorismo financeiro da PGFN" [1].

Além do que foi tratado, cabe esclarecer que, as "razões econômicas" que são apresentadas como a justificativa do atual governo para que o crédito-prêrmio do IPI não seja concedido às exportadoras, são descabidas, visto que o crédito-prêmio do IPI pode ser utilizado, de acordo com os §§ 1º 2 º do Decreto-Lei 491/69, não apenas na dedução do valor do imposto de produtos industrializados incidentes sobre as operações do mercado interno, mas também, havendo excedente de crédito, na compensação de pagamento de outros impostos federais, ou no aproveitamento de outras formas indicadas no seu regulamento, Decreto 64.833/69.

Isto significa que o Crédito Prêmio do IPI vem promover indiretamente um crescimento das exportações, a medida que desonera a carga tributária delas. E, consequentemente, favorece o crescimento econômico do país, a geração de empregos, a circulação da moeda, (informações não veiculadas pelos meios de comunicação).

A necessidade de tornar os produtos brasileiros mais competitivos no mercado externo dispensa maiores comentários. Acompanhando o desenvolvimento econômico e financeiro de outros países e analisando o quadro mundial da formação e desenvolvimento dos grandes blocos econômicos, conclui-se que a exportação competitiva torna-se peça indispensável ao crescimento e sobrevivência do Brasil. Daí a necessidade de o governo desonerar a cadeia tributária que incide sobre a produção brasileira com o intuito de incentivar as exportações.

Como se pode notar, o crédito-prêmio do IPI consiste na alavanca da economia brasileira. Por óbvio que o pagamento integral do crédito aos empresários brasileiros não poderá ser efetuado de uma vez em sua integralidade. Contudo, o Governo Federal pode estudar formas de pagamento para que os empresários não tenham um direito seu violado e para que a Constituição Nacional seja respeitada.

Ainda é relevante comentarque os ministros da primeira turma do STJ que julgaram, em maio deste ano, o polêmico Resp 591708, votaram favorável ao incentivo fiscal crédito-prêrmio do IPI, no RESP 576873, publicado no DJ em 16/02/2004, afirmando:

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" A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que o benefício denominado Crédito-Prêmio do IPI não foi abolido do nosso ordenamento jurídico tributário.

Precedentes: RE186.359/RS, STF, Min. Arco aurélio, DJ de 10/05/2002, AGA 398.267 /DF 1ª Turma, DJU 20/10/2000, AGA 422627,/DF, 2ª Turma, STJ, DJU 23/09/20003, entre outros."

Como compreender a mudança repentina de entendimento de alguns dos Ministros da Primeira Turma do STJ, se os Ministros da Primeira Turma, inclusive e especialmente, os Ministros que votaram contra o aproveitamento das empresas ao incentivo fiscal crédito-prêmio do IPI, reconhecem em outras decisões, que o benefício denominado Crédito-Prêmio do IPI não foi abolido do nosso ordenamento jurídico tributário.

A mudança repentina de entendimento, não apenas intriga os jurisdicionados, mas também, fere um dos pilares do Sistema Jurídico Constitucional Brasileiro: a segurança jurídica!

Tema extremamente caro a qualquer País de índole democrática é o da segurança jurídica, eis que representa a estabilidade das relações sociais.

Na precisa lição de Paulo de Barros Carvalho, a segurança jurídica corresponde a um valor que tem o " sentido de propagar no seio da comunidade social o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da regulação da conduta. Tal sentimento tranqüiliza os cidadãos, abrindo espaço para o planejamento de ações futuras, cuja disciplina jurídica conhecem, confiantes que estão no modo pelo qual a aplicação das normas do direito se realiza" [2]

O Superior Tribunal de Justiça exerce papel fundamental para se alcançar a segurança jurídica, pois, a partir da interpretação que ele faz da Constituição e das leis, em situações de conflito entre as pessoas em geral (naturais ou jurídicas, de direito público ou privado), é que poderemos ter certos referenciais de conduta e de ação.

O que está ocorrendo na Corte Superior vai de encontro às expectativas dos cidadãos brasileiros. O Superior Tribunal de Justiça passa anos e anos declarando a legalidade e a vigência de um incentivo fiscal à exportação, confirmando o direito das exportadoras brasileiras de se beneficiarem deste crédito. As exportadoras programam-se e fazem seus projetos de viabilidade econômica confiando na Corte Superior, nas decisões sucessivas por ela emanadas. De repente, esta mesma Corte muda seu entendimento já pacificado há anos.

O Decreto-Lei 491/69 continua em vigor!

Tanto é verdade que, não apenas o judiciário em suas jurisprudências, mas também, o próprio Poder Executivo, através do Ministério da Fazenda, ratificou a vigência do crédito-prêmio do IPI ao editar portarias, atos declaratórios, instruções normativas, regulamentando o incentivo fiscal em comento, inclusive, após o ano de 1981. Vide Portaria MF nº 176 de 1984, Instrução Normativa 226/2002, Ato Declaratório 31/99, entre outras.

Se o próprio Poder Executivo, ao longo dos anos, inclusive após o ano de 1983, continuou regulamentando o crédito-prêmio do IPI, certamente é porque este incentivo fiscal, para o Executivo, ainda vige, restando derrogados os Decretos-Leis 1.658/79 e 1.722/79. Acredita-se que o Ministério da Fazenda jamais perderia seu tempo regulamentando matéria inexistente, incapaz de efetuar mudanças no mundo jurídico, não é mesmo? Qualquer resposta em contrário, certificaria que o Ministério da Fazenda, ao editar as normas infralegais regulamentando o crédito-prêmio do IPI, após o ano de 1983, estaria agindo fora da legalidade estabelecida.

Ainda cabe ressaltar que, não apenas o Poder Judiciário e o Poder Executivo ratificaram a vigência do crédito-prêmio do IPI, mas também o Poder Legislativo. Em 1.989, após a nova Constituição Federal, foi editada a Lei 7.739 que, entre outras coisas, referiu-se ao crédito-prêmio do IPI, considerando-o como incentivo fiscal vigente, em seu artigo 18.

Dentro de todo este contexto, não há como negar a vigência do Decreto-Lei 491/69, principalmente se a tese que defende a extinção do mesmo estiver galgada em argumentos que defendem a vigência dos Decretos-Leis 1.658/79 e 1.722/79. Caso contrário, todos os posicionamentos aqui comentados dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário poderiam ser considerados ilegais e inconsequentes, situação inadmissível em um Estado de Direito.

Seguindo o mesmo raciocínio, cabe a seguinte indagação: considerando que o Governo Federal e o Poder Judiciário, há mais de dez anos, recebem pedidos administrativos e judiciais de reconhecimentos do direito ao crédito-prêmio do IPI e, considerando que o Governo Federal entende que o benefício fiscal foi extinto em 1983,. por qual razão não houve a edição de uma norma compatível extinguindo expressamente e em definitivo o crédito-prêmio do IPI, simplificando assim a atuação dos demais Poderes e dos próprios cidadãos brasileiros?

Todos os questionamentos aqui expostos levam a crer que, qualquer saída legal não é bem vista pelo Governo Federal, pois ela depende dos votos dos representantes populares, os quais têm a responsabilidade de representar o povo brasileiro na edição de normas jurídicas legais. Conflitos de interesses poderiam ser abertos!


Notas

1 Gazeta Mercantil, 10/05/2004, STJ pode poupar 10 bilhões para..., continuação da pág. A-1.

2 in Curso de Direito Tributário, Saraiva, 2002, p. 146).

Sobre a autora
Nicole Barão Raffs

Advogada, pós-graduada em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos em Curitiba – PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAFFS, Nicole Barão. A vigência do crédito-prêmio do IPI e o governo federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 561, 19 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6182. Acesso em: 25 dez. 2024.

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