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Desconsideração inversa da personalidade jurídica nas sociedades limitadas

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Agenda 09/11/2017 às 20:56

5 DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA

5 1 Conceito

Será tratada, neste capítulo, a desconsideração da personalidade jurídica na sua modalidade inversa. Sendo assim, diante da teoria da desconsideração na modalidade inversa da personalidade jurídica, a responsabilidade ocorrerá em sua forma no sentido oposto. De modo ao que os bens da sociedade respondem também por atos praticados pelos sócios.

Nas sábias palavras de Fábio Ulhoa Coelho (2008. p. 47), a “desconsideração inversa é o afastamento do principio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigação do sócio”.

E mais:

Em síntese, a desconsideração é utilizada como instrumento para responsabilizar sócio por dívida formalmente imputada à sociedade. Também é possível, contudo, o inverso: desconsiderar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizá-la por obrigação de sócio (BASTID DAVID LUCHAIRE, 1960, p. 47).

No entanto, serão aplicados os princípios da teoria da desconsideração da personalidade jurídica clássica, que veremos adiante. A desconsideração da personalidade jurídica, em sua forma inversa, terá pressuposto que lhe garante o ato, assim como na forma clássica, sempre que for apurado o uso abusivo do direito, fraudulento, que desta forma, venha a prejudicar terceiros, ou credores interessados. Então, nesse entendimento, o princípio da separação da personalidade jurídica da sociedade dos sócios, ou até mesmo, o principio da autonomia da vontade, ao que se preze pela sua integridade, não será completamente desfragmentado. Não atinge o ato constitutivo da sociedade em sua validade. Porém, o que ocorre é que vai ser atingida de fato a parte fraudulenta.

Importante destacar que o instituto da desconsideração inversa, no âmbito empresarial ainda é fato novo, ainda é raro estudos sobre o tema, uma vez que o instituto em sua modalidade clássica, cada vez é mais crescente, e recebido com atenção pela parte da doutrina jurídica.

5 2 Possibilidade da desconsideração na modalidade inversa

A desconsideração inversa da personalidade jurídica será objeto de estudo no direito de família. Ao que se preze, pode ser feito então, ao invés de solicitar a desconsideração inversa, pedir anulação da transferência dos bens. Ensejando assim, não se caracterizaria a desconsideração inversa.

Marlon Tomazette (2014, p, 286) diz que: “em casos extremos, pode-se anular ou mesmo declarar a nulidade do ato de transferência dos bens para a sociedade, não havendo qualquer necessidade de se recorrer à desconsideração inversa”. Concordando com o posicionamento, Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 47), acredita ser amparado “de forma especial, os direitos de família.

Na desconstituição do vinculo de casamento ou de união estável, a partilha de bens comuns pode resultar fraudada”. Nota-se que Carlos Roberto Gonçalves, fazendo citação a Fábio Ulhoa Coelho (2011, p. 255) discorre:

Caracteriza-se a desconsideração inversa quando é afastado o principio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigação do sócio, como, por exemplo, na hipótese de um dos cônjuges, ao adquirir bens de maior valor, registrá-los em nome de pessoa jurídica sob o seu controle, para livra-los da partilha a ser realizada nos autos da separação judicial. Ao se desconsiderar a autonomia patrimonial, será possível responsabilizar a pessoa jurídica pelo devido ao ex-cônjuge do sócio.

Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 48) acrescenta:

Outro exemplo de aplicação da desconsideração inversa encontra-se na hipótese de responsabilização da sociedade empresaria, mediante a execução de bens empregados na exploração da atividade econômica (e, portanto, que deveriam estar mesmo em nome dela, sociedade), por obrigação do sócio, uma vez demonstradas a fraude e a confusão patrimonial entre os dois sujeitos de direito.

Não se pode dizer que o instituto da desconsideração inversa é uma prática comum, pelo fato de que tomados por algum tipo de sentimento não compreensível, os cônjuges ao saber que estão prestes do divórcio, possam subtrair bens em comum, que até então seriam bens de partilha, acrescendo em uma pessoa jurídica próxima, ou até mesmo o qual possa ser sócio. Fazendo assim a extinção de bens divisíveis. Se ocorrer isto em determinada empresa, o juiz poderá desconsiderar autonomia patrimonial da pessoa jurídica, colocando até mesmo outros sócios em situação de responsabilidade solidária, uma vez que iniciou ato com má-fé. É preciso verificar cada caso em concreto.

5 3 Princípio da Autonomia Patrimonial

Conforme vimos anteriormente, a respeito da criação da pessoa jurídica, a partir do momento em que determinada sociedade empresária arquiva seus atos constitutivos em respectivo órgão competente, está formada a pessoa jurídica. Que por sua vez, esta, diferentemente da pessoa física de seus sócios, tem existência própria e distinta.

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Observado isso, a pessoa jurídica passa a ter então, com a administração de seus sócios, bens, direitos e obrigações. E o principio da autonomia patrimonial, reluz, o que está dentro da legalidade, regido pelo ato constitutivo da sociedade. Diante disso, a pessoa jurídica, passa a responder, sem que se confunda ou se caracterize, a vinculação do patrimônio pessoal dos sócios. Tomamos por fundamento as sábias palavras de Rubens Requião (2007, p. 390), que nos traz a diferenciação acerca dos bens pessoais dos sócios e das dívidas empresariais:

Partindo das premissas rigidamente estabelecidas pela teoria da personalidade, de que a pessoa dos sócios é distinta da pessoa da sociedade, e de que os patrimônios são inconfundíveis – pois apenas ocorre a responsabilidade subsidiaria, pessoal, do sócio solidário – não se poderia compreender, dentro dos ditames da logica, pudessem fatos da sociedade envolver a pessoa física do sócio, ou, ao revés, vicissitudes dos sócios comprometer a vida social.

A teoria menor em sua aplicabilidade, não demostra a sua implicância, em analisar quais são os reais motivos que levam determinada sociedade a exercer a sua função de obrigação diante de terceiros, de modo que pressupõe a simples relação de não pagamento, para com seus credores. Esta teoria ao ser adotada, pode gerar danos aos sócios, diretores, ou até mesmo os administradores da pessoa jurídica, já que por sua adoção, não se leva em conta, o abuso do direito da personalidade. É realmente levado em consideração apenas a garantia do recebimento pelo credor, que tenha sido lesado. Essa teoria pode também ser aplicada, nos casos de falência da pessoa jurídica.

Por sua vez, a teoria maior, mais elaborada e mais eficiente, tem mais consistência e maior destaque em sua aplicação, já que apresenta a retirada da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas no caso de fraude ou de abuso do direito.

É importante ressaltar que na teoria maior, não é apenas observado o não pagamento do credor. É levado em consideração as causas do não pagamento.

Sendo assim, percebe-se então que dentre essas teorias adotadas, a maior, é aplicada por permitir ao juiz, a autorização de não levar em consideração a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, para coibir a fraude. A teoria menor deve ser aplicada se o credor apresentar algum prejuízo, independentemente das circunstâncias da fraude.

5.4 Ocorrência da desconsideração inversa

Em uma breve comparação com a desconsideração da personalidade jurídica na sua modalidade clássica, o administrador de uma sociedade incorre de abuso de poder, fraudando uma sociedade, desviando seus bens para si.

No caso da desconsideração inversa da personalidade jurídica, ocorre devido à transição de bens do sócio, de seu patrimônio pessoal, para os da pessoa jurídica. Claro, tendo como objetivo fraudar interesses de terceiros. Diante disso, pode acontecer que venha a ocorrer à confusão patrimonial, sem que realmente se saiba a quem pertence determinado bem: à pessoa física ou à pessoa jurídica. Sobre essa confusão patrimonial, Henrique Geaquinto (2005. p. 38), esclarece:

Ocorre confusão patrimonial quando os sócios registram bens da pessoa jurídica como seus, ou vice-versa, ou quando fazem despesas em favor com numerário do outro depositam cheques ou valores de um em cota bancaria de outro, utilizam bens da pessoa jurídica para beneficio pessoal alugam como seus imóveis da pessoa jurídica etc. A simples troca constante e injustificada entre o patrimônio social e o particular já mplica confusão. E quem provoca a confusão patrimonial abre mão exatamente da separação que o beneficiaria.

Dessa forma, Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 47) nos ensina:

A fraude que a desconsideração invertida coíbe é, basicamente, o desvio de bens. O devedor transfere seus bens para a pessoa jurídica sobre a qual detém absoluto controle. Desse modo, continua a usufrui-los, apesar de não serem de sua propriedade, mas da pessoa jurídica controlada. Os seus credores, em principio, não podem responsabilizá-lo executando tais bens.

Em razão dessa ilicitude, ocorrida pela pessoa jurídica, ao ser desconsiderada inversamente sua personalidade, gera efeitos no desenrolar processual. Sendo um efeito primordial que pode se levar em consideração é o rompimento do princípio da autonomia patrimonial, que faz a distinção entre os patrimônios do sócio e os da sociedade. Podendo neste caso, acarretar o alcance dos bens patrimoniais da sociedade para pagamento de dívidas inicialmente caracterizadas como pessoais de seus sócios.


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A personalização da sociedade empresária, tal qual a limitada, ora analisada, faz com que ela tenha existência, direitos, obrigações e patrimônio próprio, distintos dos que oss sócios eventualmente possuam. Essa é a regra.

Porém, por conta do mau uso da personalidade jurídica, para praticar fraudes, por exemplo, há que se desconsiderar a personalidade jurídica, para atingir o patrimônio particular dos sócios pelas obrigações originariamente pertencentes à sociedade. Essa é a modalidade de desconsideração tradicional, comum.

Como pode acontecer o inverso também, ou seja, o sócio transfere seus bens pessoais para a sociedade da qual faz parte para lesar terceiros -como por exemplo, um cônjuge do qual se divorcia - há que se desconsiderar inversamente a personalidade, para que esse bem, que está na sociedade, seja atingido por questões afetas apenas ao sócio. Se não o fizéssemos, haveria prejuízos e injustiça.

A fraude que a desconsideração invertida veda é a do desvio de bens. O devedor transfere seus bens para a pessoa jurídica sobre a qual possui o controle. Desse modo, continua a usufruir deles, embora não seja seu, mas da sociedade para a qual foi transferida.

Necessário salientar que, durante a aplicação da desconsideração inversa da personalidade jurídica, amparada pela decisão, pode-se concluir que ainda é norteador o princípio da autonomia patrimonial da sociedade. A desconsideração precisa ser aplicada com extrema cautela, para que na medida em que o efeito dessa desconsideração seja apenas momentâneo, a fim de liquidar aquela dívida contraída por determinada obrigação não prestada por uma das partes.

Importante destacar que ainda não há, em nosso ordenamento jurídico vigente, legislação especifica que aborda a desconsideração inversa da personalidade jurídica, sendo merecedor de deixar registrado também, que esse instituto, o da desconsideração inversa, está ainda em estágio de aperfeiçoamento, a não ser a previsão trazida pelo novo Código de Processo Civil, já em vigor.

Há a necessidade de pensarmos sobre o futuro do direito comercial, levando em consideração o rumo que está tomando. O próprio direito empresarial precisa disciplinar essas questões. Devido a isso, existe, em andamento no Congresso, o projeto de lei 1.572/2011, que trata da criação de um novo Código Comercial.

O diploma comercial vigente é originário ainda de 1850, na época do Império, restando ainda somente apenas uma parte em vigor, qual seja, o direito marítimo. As demais normas foram resgatadas e emaranhadas juntamente com outras normas inclusive no Código Civil, ressaltando que a própria Constituição Federal de 1988, trata o direito empresarial (comercial como também é chamado) como sendo uma matéria distinta do direito civil.

Entendemos que é necessária a separação da legislação civil e empresarial, pelos princípios particulares de cada um, não obstante a interdisciplinaridade. Há nele previsão dessa forma de desconsideração.

É preciso deixar claro que a desconsideração vem aperfeiçoar o direito empresarial, capacitando-o a atingir os seus fins. É que a atividade empresarial é extremamente relevante. Gera empregos, tributos, auxilia os consumidores na obtenção de bens e serviços de que precisam. Daí a sua função social, que acarreta o princípio da preservação da empresa.

A desconsideração não encerra a atividade empresarial, não fecha a empresa. Apenas a aperfeiçoa. Mas a sociedade continua existindo normalmente, motivo que justifica a extrema importância da desconsideração da personalidade jurídica, seja na modalidade clássica, seja na inversa.

Sobre o autor
Tarley Sousa de Lima

Assistente Jurídico - Simiema e Lima Advogados. Bacharel em Direito pela Faculdade Católica de Uberlândia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito da Faculdade Católica de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção de título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profa. Ma. Vilma aparecida Moreira Bartasson.

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