Resumo: O presente trabalho tem como finalidade a análise da adequação da execução provisória da pena ao princípio da presunção de inocência, conforme a decisão prolatada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 17 de fevereiro de 2016, no Habeas Corpus n° 126292, em que admitiu o início de cumprimento de pena a partir da publicação do acórdão condenatório pelo órgão de segunda instância. Com a nova orientação do Supremo Tribunal Federal, admitindo tal medida, trouxe acalorados debates por parte da doutrina no tocante se esta decisão seria inconstitucional por conta do que esta previsto no art. 5°, LVII da Constituição Federal de 1988, que estabelece em sua redação não admitindo tratar o indivíduo como culpado fosse, se não tão somente depois do transito em julgado da sentença condenatória. Ademais, ao fazer um estudo minucioso sobre a questão, e se atentando a diversos fatores, como por exemplo, um estudo epistemológico de termos utilizados de forma distinta pela Constituição de 1988, juntamente com a Declaração Universal de Direitos Humanos, pode se chegar a um consenso sobre a problemática, consistindo neste concerne o questionamento deste presente trabalho.
Palavras-chave: execução provisória. presunção de inocência. terminologia.
Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. NOÇÕES HISTÓRICAS DA EXECUÇÃO DA PENA. 3. EXECUÇÃO DA PENA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 3.1. Princípios orientadores da execução penal. 4. DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA. 4.1. Execução provisória como causa interruptiva da prescrição. 5. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA NÃO-CULPABILIDADE/PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. 5.1. Distinção terminológica entre o princípio da presunção de inocência com o princípio da não culpabilidade. 5.2. Regras decorrentes do princípio da presunção de inocência. 6. ADEQUAÇÃO DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. 6.1. Solução para a problemática apresentada. 7. DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS. DAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
1. INTRODUÇÃO
Como se sabe a liberdade é intrínseca à natureza do ser humano, uma vez que desde os primórdios, sem que ainda houvesse civilização ou qualquer tipo de poder estatal, ela já estava presente em seu meio, firmando-se verdadeiramente um direito natural deste, de forma indissociável.
Sem sombra de dúvida, a liberdade do indivíduo é um dos maiores bens jurídicos tutelado pelo Direito, como um dos mais preciosos no ordenamento pátrio, de modo que a Carta Magna de 1988, trouxe-a expressamente em seu bojo como direito e garantia individual (art.5° caput.), devendo o encarceramento do indivíduo, acontecer em última hipótese, depois de ter garantido a este o direito de se defender devidamente por meio de um processo legal.
Sobre isto, há muito vem-se desencadeando calorosos debates em relação a nova decisão do Supremo Tribunal Federal proferida no HC 126.292 em 17 de Fevereiro de 2016, sobre a hipótese da execução provisória da pena no ordenamento jurídico brasileiro, que a grosso modo admite a possibilidade do indivíduo iniciar o cumprimento de pena a partir da publicação do acórdão condenatório pelo órgão de segundo grau, ainda que pendentes recursos de natureza constitucional.
Parte da doutrina se manifestou contrariamente sobre tal decisão, afirmando que violaria o postulado constitucional da presunção de inocência, de modo que não deveria ser a admitida pela nossa bíblia política entretanto, outra parte da doutrina abraçou o novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, dizendo que não houve nenhuma inconstitucionalidade na referida decisão prolatada.
Todavia, sendo o Direito uma ciência jurídica a ser tratada de forma dinâmica, visto que seus institutos e conceitos jurídicos se transformam a cada momento social, deve-se para uma melhor compreensão da problemática, analisar sobre a execução penal no decorrer da história, qual era a sua finalidade e como ela acontecia.
Um dos maiores travões aos delitos não é a crueldade das penas, mas sua infalibilidade (...) A certeza de um castigo, mesmo moderado, causará sempre impressão mais intensa que o temor mais severo, aliado à esperança de impunidade.
(Cesare Beccaria)
2. NOÇÕES HISTÓRICAS DA EXECUÇÃO DA PENA
Para compreender a possibilidade de execução provisória da pena, é imprescindível uma análise histórica sobre a ideia de execução da pena no decorrer dos tempos, observando sua evolução em cada marco histórico.
Na antiguidade, o encarceramento do imputado não era com o objetivo primordial de aplicação de pena, mas sim de que ele permanecesse preso aguardando o julgamento, impedindo-o assim, de uma provável fuga, sendo realmente a sanção imposta cruel ou de morte.
Percebe-se que o indivíduo ficava preso antes do seu julgamento, tornando a natureza dessa prisão a título cautelar, com a finalidade de assegurar a real execução de pena acima citado.
No período da idade média o objetivo da prisão não era uma possível sanção penal pelo delito cometido por alguém, mas sim com o objetivo de que o suposto réu esperasse na prisão o seu julgamento. Sendo que em raras exceções a mutilação seria um exagero de pena imposta. Outra vez, tem-se o cárcere antes da tomada nota de culpa definitiva, para garantir a efetiva punição.
Também aderindo a forma de encarceramento antes do juízo estatal, como método de purificação espiritual, a Igreja mantinha o indivíduo no confinamento com a intenção de que esse através de um processo introspectivo chegasse a um consenso de seu erro e reconciliasse com Deus.
No Brasil entre o intervalo do descobrimento até a vinda da família real ao Brasil, da reforma das Ordenações Manuelinas, sobre forte influência do movimento Iluminista, estabeleceu na Constituição de 1824 que “ainda em sendo formada a nota de culpa, ninguém será conduzido a prisão ou nela mantido, desde de que prestasse fiança” (BRAZIL, 1824).1
Com o decorrer das alterações constantes das Constituições do Brasil de 1824, 1891, 1934, 1937, 1967 e 1988, seja durante a fase do Império (1824), ou após a Proclamação da República, com as demais Cartas Constitucionais, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamados pela ONU em 10 de dezembro de 1948, em Paris, aprovada em Assembléia da Organização da Nações Unidas; A Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988 instituiu como regra basilar que “ninguém seria levado ao cárcere ou nele mantido antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória” , que somente a título de exceção é que o individuo poderia ser levado ao cárcere.
Nota-se as garantias individuais distribuídas pela Constituição frente ao poder Estatal, visto que o confinamento do individuo aconteceria em última ratio.
3. EXECUÇÃO DA PENA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Tendo o legislador penal aderido pelo sistema vicariante, e reputando que a execução penal tem precipuamente como finalidade primordial cumprir as ordenanças de uma sentença ou decisão criminal, com base nessa premissa, dispõe o art.1° da Lei de Execução Penal, n° 7210/84 que estabelece como condição, a existência de sentença criminal que tenha uma pena aplicada, seja ela privativa de liberdade ou não, ou medida de segurança, seja para um tratamento ambulatorial ou a custódia do apenado em se tratando de um tratamento psiquiátrico (MARCÃO, 2015).
Conforme preleciona a melhor doutrina, dentre os doutos doutrinadores, como Renato Marcão conceituando de forma clara a execução penal, abrangendo também as decisões homologatórias proferidas em sede de Juizados Especiais Criminais:
Visa-se pela execução fazer cumprir o comando emergente da sentença penal condenatória ou absolutória imprópria, estando sujeitas á execução, também, as decisões que homologam transação penal em sede de Juizado Especial Criminal. (MARCÃO, 2015, p.31).
Observe-se que para uma possível execução penal exige-se o bom direito como pressuposto para tal medida coercitiva, uma sentença ou decisão criminal prolatada por uma autoridade judiciária competente, sendo que esta sentença ou decisão criminal, em regra, tenha sido corroborada dentro de um devido processo legal.
A seguir apresentam se apontamentos divergentes pela doutrina e jurisprudência em relação à natureza jurídica da execução da pena.
De acordo os ensinamentos de Ada Pellegrini Grinover ela afirma que:
Na verdade, não se nega que a execução penal é atividade complexa, que se desenvolve, entrosadamente, nos planos jurisdicional e administrativo. Nem se desconhece que dessa atividade participam dois Poderes estaduais: o Judiciário e o Executivo, por intermédio, respectivamente, dos órgãos jurisdicionais e dos estabelecimentos penais. (GRINOVER, 1987, p.7).
Chega-se ao consenso dominante pela doutrina, que a execução penal acaba sendo de natureza jurisdicional.
Contudo, deve-se levar em consideração a intensa atividade administrativa que a envolve, não se alterando, até porque, visto que qualquer incidente que eventualmente possa ocorrer, deve ser submetido ao crivo do judiciário, por determinação constitucional (art. 5°, XXXV, da CF. Ainda que não possa abstrair-se de determinado rol de atividades administrativas, sua natureza não se transforma, predominado a atividade jurisdicional (MARCÃO,2015).
Observando a redação do art.194 da Lei de Execução Penal, na qual extrai-se que: “ o procedimento correspondente às situações previstas nesta Lei será judicial, desenvolvendo-se perante o Juízo da Execução”, verificando também os arts. 2° e 65 da mesma lei.2
Dessa forma, tem-se consagrado com precisão que a execução criminal tem incontroversa natureza de processo judicial amparado por um contraditório. Incontestavelmente de caráter jurisdicional.
Entende-se que a execução penal, também tem como vetores os princípios da legalidade, da proporcionalidade, do contraditório, da ampla defesa, da imparcialidade do juiz, da razoabilidade e do devido processo legal.
3.1. Princípios orientadores da execução penal
Os princípios são diretrizes que o intelectual do direito utiliza-se como uma espécie de bússola, para ter a noção de como se portar diante das dicotomias jurídicas existentes. Como visto, a execução penal deve ser lastreada por um devido processo legal, garantido ao preso garantias frente ao Poder Estatal, assegurando ao confinado a paridade de armas.
Destacam-se os princípios que norteiam a execução penal:
O princípio da Legalidade, visto que não são poucos os artigos da Lei das Execuções Penais que a legalidade é reconhecida, como o art.2°, que estabelece que, “A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade dessa lei e do Código de Processo Penal”.3
Percebe-se, a obrigatoriedade de que todos os atos praticados no âmbito das execuções penais devem ser devidamente fundamentados na lei, não permitindo ao alvitre de quem incumbe á prática do ato.
Não havendo qualquer margem a discricionariedade, o que poderia causar imensa insegurança jurídica no tocante a aplicação da pena, visto que esta poderia ser influenciada pelo ânimo do julgador que deixaria de atentar aos critérios objetivos da norma. Sendo que o art. 3°, por sua vez contempla que: “Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”.4
Há ainda o princípio da Igualdade que certifica-se que na execução da pena não se admitirá quaisquer tipo de concessão de vantagens ou restrições em caráter indiscriminados, quer por origem política, racial, religiosa etc. Visto que até nos dias atuais diante da ineficiência de tal princípio, este ideal esta longe de se tornar realidade.
O que está sendo provado através dos anais da história das execuções penais no Brasil, lastreada de todo tipo de desigualdade no tocante a execução da pena, de modo que até hoje a condição social do indivíduo lhe assegura mais privilégios aos que nada tem. Mas sendo o Direito uma ciência humana e não matemática, que não trata do ser, mas do dever ser, dispõe o art. 3°, parágrafo único da LEP, “Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política”.
O princípio da individualização da pena que conforme estipula o art.5° da Lei de Execuções Penais, Lei n°7210/84 que: “Os condenados serão classificados, segundos os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal”.5
O que acontece no artigo em questão não é uma mitigação ao princípio da igualdade acima citado, visto que tal princípio não se admitirá em hipótese alguma qualquer tipo de distinção para concessão de benefícios ou restrições, seja por natureza racial, social ou política, isso se dá porque o princípio da individualização da pena, trata-se de um método utilizado para catalogar os condenados de acordo com o tipo de crime por ele praticado, levando em consideração os seus antecedentes e personalidade, afim de delimitar a pena a ser imputada.
Por fim, há ainda, o princípio da jurisdicionalidade que segundo qual nos orienta que, em se tratando de um processo de execução, este deverá ser presidido por uma autoridade judiciária competente, qual seja o juiz de direito, vedando a possibilidade de apreciação da execução penal por qualquer outros meios no ordenamento jurídico pátrio.
Conforme está estabelecido no art.2° da LEP: “A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária , em todo Território Nacional, será exercida...”.6
Conforme discorrido sobre os princípios da legalidade, igualdade, individualização da pena e o da jurisdicionalidade, deve-se observar seus reflexos nos institutos jurídicos do ordenamento jurídico brasileiro, orientando o aplicador do direito durante toda a marcha processual até a prolação da sentença e sua consequente execução.
4. DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA
Anteriormente tinha-se a orientação dominante nos Tribunais Superiores de que, o único gênero de prisão cautelar capaz de submeter o réu a uma eventual execução provisória é a prisão preventiva, que poderia ser decretada durante a fase de inquérito policial ou durante o trâmite processual (arts. 311. a 316 e 413, parágrafo 3°,todos do Código de Processo Penal). Até então era impensável a execução provisória por encarceramento em se tratando de prisão temporária, em razão de sua limitação expressa em lei (MARCÃO,2015).
Até no ano de 2007 preponderava-se de forma consistente nos Tribunais Superiores, a orientação na qual estabelecia que caso o réu viesse a ser condenado por um Tribunal de segunda instância, a pena aplicada na sentença, poderia ser executada ainda que provisoriamente, visto que os recursos extraordinários não são dotados de efeitos suspensivos, exatamente a cargo do que está previsto no art.637 do Código de Processo Penal:
Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão a primeira instância, para a execução da sentença.7
Nesse período já era possível de acontecer a execução provisória da pena, de forma que a pena seria executada a título provisório, visto que não houve o trânsito em julgado da sentença definitiva.
Sobre o assunto o Supremo Tribunal Federal até o ano de 2007 tinha o entendimento sólido nesse sentido:
(...) A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de ser possível a execução provisória da pena privativa de liberdade, quando os recursos pendentes de julgamento não tem efeito suspensivo. (...). (STF – HABEAS CORPUS HC 91675 PR).8
Entretanto, logo após um curto período de tempo, o Supremo Tribunal Federal decidiu de maneira diversa, conforme está predito no HC 84.078-7/MG de extrema relevância. Neste habeas corpus o Supremo Tribunal Federal entendeu que, de acordo com os critérios estabelecidos pela hermenêutica jurídica, esta não o permitiria na qualidade de interprete da Constituição Federal, alterar o sentido do texto constitucional.
Sendo a Constituição Federal de 1988, convincente ao tratar do assunto, nos termos da redação do seu art. 5°, LVII, estabelecendo que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”, não tendo o Supremo Tribunal Federal outra alternativa, se não reconhecer que a execução da pena somente poderia acontecer depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, não se permitindo até nesse período a execução provisória da pena.
Todavia, com esse entendimento do Supremo Tribunal Federal em não admitir a execução provisória da pena, não afastou a possibilidade de prisão do individuo durante a persecução penal, desde que estivesse presente uma das hipóteses que autorizaria a sua prisão cautelar, não podendo contundo, executar a pena, ainda que provisoriamente:
HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART.5°, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART.1°, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.1. O art.637 do CPP estabelece que “[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão á primeira instância para a execução da sentença”. (...) A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art.5°, inciso LVII, que “ ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.2. Daí que os preceito veiculados pela Lei 7.210/84, além de adequados á ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art.637 do CPP.3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar.4. Ampla defesa, não se pode visualizar e modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão.
(STF – HABEAS CORPUS HC 84078 MG).9
A partir desse julgado de 2009, o Supremo Tribunal Federal concluiu ser inconstitucional a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado de sentença condenatória.
Contudo, esse entendimento persistiu até o dia 17 de fevereiro de 2016 que passou compreender o Supremo Tribunal Fderal ser possível a execução da pena após o julgamento do recurso em segunda instância, conforme evidenciado neste julgamento:
(...) por maioria de votos, o Plenário do STF entendeu que a possibilidade de início da execução da pena condenatória após a confirmação da sentença em segundo grau não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. Isso porque a manutenção da sentença condenatória pela segunda instância encerra a análise de provas que assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o início da execução da pena, até mesmo porque os recursos extraordinários ao STF a ao STJ comportam exclusivamente discussão acerca de matéria de direito; (...).
(STF – HABEAS CORPUS HC 126292 SP).10
Diante da repercussão que tal decisão ocasionou, ficou evidente a mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal no tocante quanto à possibilidade do início de cumprimento de pena a partir do esgotamento das vias ordinárias recursais.
Não se tratando de prisão cautelar, mas sim de prisão penal a partir da segunda instância, inovando o ordenamento jurídico brasileiro com mais uma modalidade de prisão antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, que a grosso modo foi um grande avanço para o direito brasileiro, sendo mais eficaz no tocante ao início do cumprimento da pena, retirando a imensa sensação de impunidade que lastreava quem aguardava o seu julgamento.
Entretanto, mesmo com o novo entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, o Tribunal de Justiça do estado do Paraná em uma de suas decisões recentes, não seguiu a orientação dada pelo S.T.F., conforme demonstra o habeas corpus 1.645.500-0, que:
Denota-se dos autos, bem como de uma simples consulta de andamento processual da Apelação Crime n°1.417.088-4, que foram interpostos embargos de declaração do acórdão que deu parcial provimento aos recursos do réus pelo paciente e pelo correu José Fabiano Mottin que inviabilizaram o cumprimento provisório da pena, uma vez que (i) não houve o esgotamento da jurisdição por este Egrégio Tribunal e (ii) pode ocorrer a integração ao acórdão pela decisão dos embargos de declaração. (...) Ademais, denota-se da parte dispositiva do acórdão, que não foi determinado o cumprimento provisório da pena ao paciente, outro motivo que demonstra a ilegalidade da expedição da guia provisória de recolhimento.
(TJ – PR – HABEAS CORPUS HC 1.645.500-0).11
Observe que o Tribunal de Justiça do Paraná relativizou o entendimento do Supremo Tribunal Federal, não admitindo ser possível a execução provisória da pena quando no próprio teor da sentença trazer como condição o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Contudo, esta decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, não ficou limitada somente no tocante a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas se estendeu a outros institutos jurídicos de natureza penal, como por exemplo, a possibilidade da execução provisória da pena como causa interruptiva da prescrição.
4.1. Execução provisória como causa interruptiva da prescrição
Admitida pelo Supremo Tribunal Federal a execução provisória da pena no ordenamento jurídico brasileiro, está trouxe reflexos não somente no que tange a possibilidade de sua incidência antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas também a respeito da temática prescrição, obrigando uma releitura em relação ao tema. Sobre o assunto Rogério Sanches se posiciona sobre a questão:
A decisão proferida pelo STF permitindo a execução provisória da pena após o pronunciamento da segunda instância impõe, a nosso ver, um novo marco interruptivo e impede o decurso do prazo prescricional pelo início do cumprimento da pena. A causa interruptiva do inciso V do art. 117. sempre foi tratada como sendo relativa apenas à prescrição da pretensão executória porque vedava-se a execução provisória da pena. O dispositivo legal, no entanto, não contém nenhuma menção expressa ao fato de que sua aplicação se restringe à prescrição da pretensão executória. Se a decisão do STF permite – ainda que a título provisório – o início do cumprimento da pena, não há nenhum motivo para impedir a incidência da mencionada causa interruptiva. E, uma vez interrompido o prazo, a prescrição não volta a correr em virtude do disposto no § 2º do art. 117. (seria evidentemente inconcebível que, durante a execução da pena, ao Estado fosse imposta a prescrição, incidente nas situações de inércia estatal)12.
(CUNHA, Rogério Sanches. Execução provisória da pena e prescrição. Meu Site Jurídico,fev.2.017 Disponível em: <https://meusitejuridico.com.br/2017/02/07/execucao-provisoria-da-pena-e-prescricao/>. Acesso em: 25/09/2017.
Conforme esboçado, faz-se necessária uma análise do tema prescrição sob a ótica do direito penal em relação ao assunto.
Para uma melhor compreensão da problemática, imagina-se que o juiz de primeiro grau venha a sentenciar e eventualmente condenar o réu, aplicando-lhe a pena imposta, não havendo recurso interposto por parte da acusação, e vindo a transitar em julgado a sentença para a mesma, pode-se argumentar em duas espécies de prescrição da pretensão punitiva que poderia vir-se a beneficiar o réu a saber, a prescrição superveniente e a prescrição retroativa.
Sendo que o último marco interruptivo da prescrição seria apenas a da publicação da sentença ou acórdão recorríveis (art.117,IV, do Código Penal), não tendo como causa interruptiva da prescrição, a publicação da decisão em um Recurso Especial ou a publicação da decisão num Recurso Extraordinário, o que poderia acarretar na demora o quanto possível do trânsito em julgado.
De modo que entre o último marco interruptivo, que era a publicação do acórdão e enfim o julgamento pelo S.T.F. do Recurso Extraordinário poderia ocorrer uma das hipóteses de prescrição ora já mencionado.
Entretanto, com a nova decisão do Supremo Tribunal Federal, se no caso hipotético o tribunal para qual foi interposto o recurso confirma a condenação e posteriormente executa provisoriamente a pena, vindo ocasionalmente o réu recorrer para os Tribunais Superiores, quais sejam S.T.J. ou S.T.F., ele poderá iniciar cumprimento de pena a título provisório, ainda que os recursos constitucionais estejam em trâmite para serem julgados.
Sendo que o cumprimento provisório da pena interrompe a contagem do prazo prescricional motivo pelo qual não existiu inércia por parte do Estado e consequentemente não poderia vir a sofrer este uma sanção por ter agido dentro dos ditames legais.
Diante dos reflexos que a execução provisória da pena vem causando na seara Penal e Processual Penal, devem se levar em conta a sua reverberação diante dos princípios constitucionais previsto na nossa Carta Magna vigente, qual seja a Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu artigo 5°, LVII que fala a respeito sobre o princípio da presunção de inocência ou não culpa, que será abordado no próximo tópico.