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Limites ao controle judicial das sanções aplicadas pelo PROCON

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Agenda 08/12/2017 às 07:33

O PROCON é uma autoridade administrativa que detém as atribuições de fiscalizar e controlar o mercado de consumo, aplicando sanções estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor.

INTRODUÇÃO

Em que pese a relação consumerista, observa-se que existem divergências quanto aos limites e possibilidades do controle judicial das sanções administrativas aplicadas pelo PROCON.

Em síntese, constatada irregularidade por meio de fiscalização, os Órgãos de Proteção e Defesa do Consumidor, através de um ato administrativo, irão aplicar uma penalidade ao infrator, sem a necessidade de recorrer ao Judiciário. Isto é possível pelo poder de polícia que é atribuído a esses órgãos. 

Dentro desta ótica, o PROCON é uma autoridade administrativa que detém as atribuições de fiscalizar e controlar o mercado de consumo, aplicando sanções estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor. As sanções administrativas são meios de o Estado cumprir efetivamente a sua função de amparo aos direitos do consumidor.

Os PROCONS são concebidos como entidades ou órgãos estaduais e municipais de proteção ao consumidor, criados no âmbito das respectivas legislações competentes para fiscalizar as condutas infratoras, aplicar penalidades administrativas correspondentes, orientar os consumidores sobre os seus direitos, planejar e executar a política de defesa do consumidor nas suas respectivas áreas de atuação.

Incialmente, considerando o cenário do Judiciário, tem-se que muitos atos administrativos são levados à apreciação judicial pelos fornecedores, que se sentem lesados pelas decisões proferidas pelo órgão.

Nesse contexto, esclarecem-se as atividades que são atribuídas aos PROCONS por meio do Código de Defesa do Consumidor, estabelecendo quais os limites de sua competência no poder de punir os atos praticados em desfavor do consumidor, bem como analisar algumas decisões administrativas que são levadas ao poder judiciário para controle dos atos praticados pelo Órgão da Administração Pública.


1.    AS RELAÇÕES DE CONSUMO E OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O DIREITO DO CONSUMIDOR

Em análise ao sistema jurídico brasileiro, observa-se que existem elementos imprescindíveis para a adequada aplicação do Direito. Em todos os âmbitos do Direito, a legislação, seja ela geral ou especifica, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor, é aplicada à luz dos princípios constitucionais.

Não obstante aos princípios constitucionais aplicados aos conflitos de consumo, o Código de Defesa do Consumidor trás em seu texto legal, princípios que devem ser observados para justa aplicação do direito, com o fito de tutelar o elo mais fraco da relação de consumo, conforme veremos a seguir.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prevê a defesa do consumidor como uma de suas cláusulas pétreas decorrentes dos direitos e garantias fundamentais de todo cidadão previsto em seu artigo 5º.

Respectivamente, em 1990 foi editado o Código de Defesa do Consumidor na busca de garantir a eficácia constitucional atribuída ao instituto e dada a necessidade de regulamentação por ser um instrumento sólido que aos poucos ganhou autonomia para regular e tutelar as relações de consumo.

Leonardo de Medeiros{C}[1] enfatiza: “O CDC constitui um microssistema jurídico multidisciplinar na medida em que possui normas que regulam todos os aspectos da proteção do consumidor, coordenadas entre si, permitindo a visão de conjunto das relações de consumo”.

Sobre esse assunto o autor Marco Antônio traz o seguinte esclarecimento:

Para efetivar as normas constitucionais indicadas, as quais possuem um conteúdo programático e com eficácia limitada, o legislador tratou de estabelecer, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o prazo de seis meses para edição do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Entretanto, apenas praticamente dois anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988 é que foi sancionada a Lei 8.078/1990, regulamentando, em nível infraconstitucional, o direito fundamental da defesa do consumidor.[2]

Nesse sentido, Marco Antônio considera ainda que o consumo é uma conduta natural do ser humano em sociedade, surgindo assim, a necessidade de sua proteção e disciplina jurídica.

A partir da análise deste núcleo de pensamento, constata-se que o direito brasileiro deve ser regulamentado para proteger a mais parte vulnerável da sociedade. Para Grinover e colaboradores “o legislador procura proteger os mais fracos contra os mais poderosos, o leigo contra o melhor informado; os contratantes devem sempre curvar-se diante do que os juristas modernos chamam de ‘ordem pública econômica’”. Assim, continua, “depois de ter-se manifestado com grande nitidez nas relações entre empregadores e assalariados, a diminuição da liberdade contratual concentra-se hoje nas relações de consumo que se estabelecem entre profissionais fornecedores ou distribuidores de produtos e serviços, e os usuários particulares”.[3]

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Dessa forma, a Constituição Federal reconheceu a necessidade de proteger o consumidor, por ser o elo mais fraco da relação jurídica, em um país onde é patente a carência de tutela por parte da ordem pública.

Nesse sentido, tem-se que a Constituição Federal é o grande alicerce para aplicação do direito como um todo, inclusive a legislação que versa sobre os direitos do consumidor, submetendo ao seu texto legal não só os particulares, como também o próprio Estado.

Assim sendo, tem-se que os princípios gerais do Código de Defesa do Consumidor é o ponto de partida para criação das leis que regulamentam a relação jurídica entre consumidor e fornecedor, fazendo com que a norma tenha maior eficácia e aplicabilidade, devendo o legislador utilizar-se de princípios que são a base para uma aplicação justa e eficaz do direito em defesa do consumidor, tendo em vista que o consumidor está a mercê do que o mercado de consumo oferece.

Primordialmente, o Código de Defesa do Consumidor tem como base o princípio da vulnerabilidade que deve ser reconhecida pelo legislador para direcionar a interpretação e aplicação das leis, estando especificado no artigo 4º, parágrafo I da Lei 8.078/90.

Conforme citado por José Geraldo Brito Filomeno[4], o célebre magnata da indústria automobilística Henry Ford, considerado como o “pai da produção em série”, expõe seu parecer sobre a vulnerabilidade do consumidor explicando que nenhuma corrente pode ser mais forte que o elo mais fraco, e coloca o consumidor como o elo mais fraco da economia.

Para Anna Berquó[5] “a vulnerabilidade do consumidor decorre da superioridade contratual e econômica do fornecedor que impõe os modelos de produção unilateralmente sem qualquer participação do consumidor”.

Em síntese, expõe que o consumidor não possui qualquer domínio sobre o que irá consumir, sendo que este está vulnerável ao que é impelido pelo mercado, sujeitando o consumidor aos interesses do fornecedor.

Do mesmo modo que Filomeno[6]explana que o consumidor muito provavelmente não dispõe de controle sobre os bens de produção e, por conseguinte, é submetido ao poder dos titulares deste, isto é, os empresários. E ainda relembra o que afirmava o célebre Rui Barbosa “a democracia não é exatamente o regime político que se caracteriza pela plena igualdade de todos perante a lei, mas sim pelo tratamento desigual dos desiguais”.

Os princípios destinam-se a instituir o equilíbrio necessário na relação entre consumidor e fornecedor, sendo que o consumidor ocupa um posto de subordinação em relação aos grandes mercados, surgindo assim, a necessidade de intervenção do Estado para nivelar tais relações.

Em sua obra Rizzato Nunes[7] identifica dois aspectos da vulnerabilidade, sendo elas de ordem técnica e de ordem econômica. Sendo assim frisa que, o consumidor encontra-se em vulnerabilidade técnica em razão do conhecimento do produto, sendo que somente poderá escolher entre o que já foi produzido. Em contrapartida, o consumidor é vulnerável economicamente, referindo-se a maior capacidade econômica, ressaltando que não é uma máxima exata, pois nem sempre o consumidor apresentará menor capacidade econômica do que a do fornecedor.

Dessa maneira, temos que o consumidor não detém o poder de controle e nem conhecimento técnico sobre os meios utilizados para a produção de produtos ou serviços, ficando a mercê do que o fornecedor coloca a disposição para comercialização. Já a vulnerabilidade econômica do consumidor, nem sempre estará presente em uma relação de consumo.

No mais, de acordo com Nery Junior[8] o comportamento das partes em concordância com a boa-fé tem como consequência a possibilidade de revisão do contrato celebrado entre elas, em aplicação da clausula rebus sic stantibus. Tal clausula utilizada para determinar a Teoria da Imprevisão, uma exceção ao princípio pacta sunt servada.

O Código de Defesa do Consumidor[9] tutela o princípio da boa-fé objetiva em seus artigos, conforme a seguir:

Art. 4º (...) III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

Portanto, o princípio da boa-fé está acolhido não só pelo Código do Consumidor, como também está consagrado no Código Civil, impõe a transparência nos contratos, a boa-fé e equidade exigindo a interpretação de modo a não inviabilizar a prestação, para conter a prática abusiva no mercado de consumo, garantindo que exista transparência para validade do negócio jurídico, sendo um princípio basilar para todo negócio jurídico, garantindo fidelidade as relações contratuais.

Sobre o princípio da informação Anna Berquó[10] ressalta que, o objetivo vital do fornecedor é obter lucros, dessa forma o consumidor ficaria sujeito a desinformação e as medidas injustas e unilaterais praticadas pelo mesmo.

Para Rizzatto Nunes[11] a informação é mais do que um princípio e sim um direito, exemplificando três espécies abordadas pela Constituição Federal, sendo elas o direito de informação, o direito de se informar e o direito de ser informado, sendo os dois últimos na sua concepção obrigações de grande relevância quando se trata de questões que envolvem relações de consumo.

Isso posto, a informação é uma obrigação imposta ao fornecedor, pelo qual o consumidor tem o direito de ser informado sobre os produtos e serviços que são colocados à sua disposição no mercado de consumo, devido a vulnerabilidade técnica que o consumidor possui perante a mercadoria.

Corroborando com isso, Lôbo utiliza-se da seguinte argumentação:

A presunção de vulnerabilidade jurídica impõe ao direito a imensa tarefa de estabelecer o equilíbrio material nas relações de consumo. O acesso à informação, em especial, é indeclinável, para que o consumidor possa exercer dignamente o direito de escolha, máxime quando as necessidades não são apenas reais, mas induzidas pela publicidade massificada.[12]

Ademais todos são consumidores e em algum momento se encontrará em posição de submissão ao mercado de consumo, sendo que o ordenamento jurídico deve utilizar-se de todos os meios possíveis para garantir a dignidade humana.

Dessa forma, por força constitucional e em decorrência do direito de ser informado, os órgãos públicos detêm o dever de informar nos seus atos regulares de forma aberta e transparente.

Ao analisar a relação de consumo, mister se faz especificar as raízes que a relacionam, esclarecendo sobre os elementos formadores dessa relação. Nesse sentido, vamos adentrar especificamente ao conceito utilizado pelo Código de Defesa do Consumidor:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.[13]

Por sua vez, Fabrício Bolzan[14] especifica que a relação de consumo é definida com uma relação firmada entre os elementos subjetivos, sendo eles o consumidor e o fornecedor, e possuindo como objeto os elementos objetivos, quais sejam o produto ou serviço prestado.

Nesse contexto, cumpre destacar a forma que os doutrinadores Claudia Lima Marques e Antônio Herman V. Beijamim, defensores da teoria finalista, definem tal corrente de interpretação:

O destinatário final é o consumidor final, o que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico) e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é consumidor final, ele está transformando o bem, utilizando o bem, incluindo o serviço contratado no seu, para oferecê-lo por sua vez ao seu cliente, seu consumidor, utilizando-o no seu serviço de construção, nos seus cálculos do preço, como insumo da sua produção.[15]

Nesse sentido, o doutrinador exclui desta linha todos os que adquirirem o produto ou serviço para integrar a cadeia produtiva, se este for utilizado para elaborar novos produtos ou para auxiliar na prestação de outro serviço.

Miragem[16] por sua vez salienta que a característica dessa interpretação está ligada ao fato de não existir a finalidade de obter lucro em uma determinada relação jurídica e nem como fomento a uma atividade negocial.

Portanto, o produto ou serviço adquirido no mercado não pode ser utilizado para auferir lucro, ou seja, este será retirado do mercado rompendo a circulação econômica, para suprir necessidades pessoais de quem o adquire.

Não obstante, o fornecedor, por sua vez, é aquele que oferece os produtos e serviços no mercado de consumo, não tendo o legislador feito qualquer distinção de natureza, regime jurídico ou até mesmo de nacionalidade do fornecedor, como está prescrito no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor:

Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.[17]

Nesse sentido pode-se dizer que a habitualidade da atividade de fornecimento é que a tona profissional, sendo este o ponto primordial para se definir o fornecedor, de modo que se possa aplicar o Código de Defesa do Consumidor.

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