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O sinal de tv por assinatura equiparado como coisa móvel do artigo 155, §3º do Código Penal: tipicidade ou lacuna?

A prática da captação clandestina de sinal de TV por assinatura é comum no Brasil. Todavia, há dúvidas quanto à aplicação do art. 155, §3º do Código Penal, para penalizar criminalmente a conduta como furto.

1. INTRODUÇÃO:

A prática da captação clandestina de sinal de TV por assinatura é comum no Brasil. Todavia, há dúvidas quanto à aplicação do art. 155, §3º do Código Penal, para penalizar criminalmente a conduta como furto. Nesse sentido, entendimentos jurisprudenciais divergem sobre o assunto, indicando uma espécie de lacuna na lei penal.

2. OBJETIVO:

Abordar sobre a possibilidade de aplicação do art. 155, §3º do Código Penal, à captação
clandestina de sinal de TV por assinatura.

3. DESENVOLVIMENTO:

O tipo penal previsto no art. 155 do Código Penal, estabelece que ao apropriar-se de coisa, alheia e móvel, estará então cometendo o crime de Furto. Além disso, segundo o §3º do referido dispositivo “equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico” (BRASIL, 2014). Destarte, o dispositivo supracitado, trouxe uma evolução consigo no que tange ao objeto material do crime, já que a energia elétrica passou a ser tratada como coisa móvel pelo Direito Penal.

Sendo assim, com a evolução das tecnologias, verificou-se uma problemática, que são os casos de sinais de TV por assinatura. Segundo pesquisa realizada a pedido da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (2014) a captação clandestina de sinal alcança 4,2 milhões de residências no País, não prejudicando apenas financeiramente o setor, mas também o Estado que deixará de colher tributos, bem como, o assinante que pagará um preço maior e também afeta a geração de empregos formais, ou seja, lícitos. Dessa forma, há indagações, se estes sinais podem ser equiparados à coisa móvel do art. 155, §3º, por ter valor econômico, sendo então, objeto de furto.

O Superior Tribunal de Justiça (2011) defende posição favorável à tipicidade da conduta, sustentando que a e revolução tecnológica deve ser abrangida pelo Código Penal, nos seguintes termos: “Independentemente da definição técnica, certo é que, a rigor, estamos diante de uma espécie de energia, o que é suficiente para a tipificação penal”. Segundo Guilherme de Souza Nucci (2017, p. 561), partidário dessa corrente, “não se trata de analogia in malam partem, mas sim de interpretação analógica, autorizada no art. 3.º do Código de Processo Penal, (...) sendo uma forma de energia por equiparação com valor econômico”.

Em contrapartida, o Supremo Tribunal Federal (2011) é contrário a posição do STJ, pois entende que o sinal de TV não pode ser considerado energia e ser objeto material do crime de furto, visto que “na esfera penal não se admite a aplicação da analogia para suprir lacunas, de modo a se criar penalidade não mencionada na lei (analogia in malam partem), sob pena de violação ao princípio constitucional da estrita legalidade”. Sobre tal assunto, Cezar Roberto Bitencourt (2012, p. 176) sustenta a mesma posição do STF, alegando que o sinal de TV, não é energia elétrica, justificando que o “sinal tampouco pode ser subtraído, (...) e quem utiliza clandestinamente “sinal de televisão” não o retira e tampouco dele se apossa, não havendo qualquer diminuição do patrimônio alheio, que é o bem jurídico protegido no crime de furto”.

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Diante disso, há um projeto de lei, que tramita na Câmara dos Deputados, com o objetivo de incluir sinais de TVs a cabo ao §3º do art. 155 do Código Penal (PLC 188/2015). Todavia, o projeto ainda não foi sujeito à apreciação do Plenário.

4. CONCLUSAO:

Diante do que foi abordado, destaca-se que a tipicidade da conduta descrita no crime de furto depende do objeto material do crime ser móvel. Dessa forma, o sinal de TV por assinatura não pode ser considerado coisa móvel, haja vista que o Código Penal só equipara a energia elétrica para fins de adequação ao tipo penal. Sendo assim, há uma lacuna da lei penal e conforme entendimento do STF, a conduta é atípica pelo Código Penal Brasileiro. Ademais, o agente que pratica essa imoralidade, mesmo que atualmente não se enquadre no crime de furto, deve ser responsabilizado na esfera civil, como também, penal (ao utilizar aparelhos receptores, frutos de contrabando ou descaminho).


5. REFERÊNCIAS:

ABTA. 4,2 milhões de domicílios furtam sinal de TV por assinatura, aponta pesquisa. Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2014/08/42-milhoes-de-domicilios-furtam-sinal-de-tv-por-assinatura-aponta-pesquisa.html> Acesso em: 18 de agosto 2017.

BITENCOURT, C. R. Tratado de Direito Penal. Parte especial. 8. ed. rev. e ampl. - São Paulo: Saraiva, 2012, vol. 3.

BRASIL. Código Penal e Constituição Federal. 52. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

_______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial nº 1.123.747, da 5º Turma do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Brasília, DF, 01 de fevereiro de 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Habeas-corpus nº 97.261. Parte Litigante: Luís Fernando Aliatti, Relator Joaquim Barbosa, 4 mar. 2005. Diário da Justiça da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 81, p. 20, maio 2011.

_______. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei Complementar PL 188/2015. Altera o Decreto Lei nº 2.848, de 1940. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=945885>Acesso em: 18 de agosto 2017.

NUCCI, G.de S. Código Penal Comentado. 17. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

Sobre os autores
Alessandro Dorigon

Mestre em direito pela UNIPAR. Especialista em direito e processo penal pela UEL. Especialista em docência e gestão do ensino superior pela UNIPAR. Especialista em direito militar pela Escola Mineira de Direito. Graduado em direito pela UNIPAR. Professor de direito e processo penal na UNIPAR. Advogado criminalista.

Hugo Henrique Ferreira Lima

Bacharel em Direito pela Universidade Paranaense, (2015-2019); Pós-graduando em Direito e Processo Previdenciário pela Faculdade IBMEC SP (Conclusão em 2021); Foi pesquisador no Programa de Iniciação Científica da Universidade Paranaense (2018-2019); Aprovado no XXVIII EXAME DE ORDEM UNIFICADO (OAB). OAB/PR sob o nº 102.867.

Informações sobre o texto

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