4 DOS LIMITES OBJETIVOS E SUBJETIVOS DA COISA JULGADA
Os limites da coisa julgada são divididos em objetivos e subjetivos. De início, mister esclarecer que, em suma, duas são as preocupações sobre a autoridade da coisa julgada. A primeira delas, ligada aos limites objetivos, refere-se em estabelecer qual das partes da sentença faz, de fato, a coisa julgada. Isso porque, a sentença divide-se em relatório, fundamentação e dispositivo. A segunda, que está relaciona aos limites subjetivos, consiste em identificar quais são as pessoas atingidas pela caracterização da coisa julgada.
Pode-se afirmar, desde logo, que a parte atingida pela coisa julgada (limite objetivo) é o dispositivo da sentença, onde há a efetiva decisão da lide. Isso não só é verdade, que o Código de Processo Civil/2015, em seu art. 504, assevera sobre a questão de maneira expressa, senão vejamos:
Art. 504. Não fazem coisa julgada:
I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;
II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.
Os motivos e os fatos não são aptos a fazer coisa julgada em razão de fazerem parte tão somente da fundamentação da sentença, não integrando a parte dispositiva. Destefenni, ao citar os ensinamentos do saudoso Liebman, com maestria, colaciona:
Liebman, há muito tempo, já ensinava que é exato restringir a coisa julgada à parte dispositiva da sentença. Porém, segundo o próprio Liebman, a essa expressão (parte dispositiva) deve-se dar um sentido substancial e não formalista, de modo que abranja não só a parte final da sentença, como também qualquer outro ponto em que tenha o juiz eventualmente provido sobre os pedidos das partes. (LIEBMAN apud DESTEFENNI, p. 219, 2009).
Nos termos do art. 503, caput, do Código de Processo Civil/2015, a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida. Além disso, o § 1º do referido diploma legal, disciplina que a coisa julgada material alcança também a resolução da questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente na demanda, se: (1) essa resolução depender o julgamento do mérito; (2) a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; e, (3) o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.
Todavia, a hipótese prevista no § 1º não se aplica se na demanda houver restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial, conforme prescreve o § 2º do dispositivo legal em comento. Ou seja, havendo no processo questão prejudicial, o magistrado obrigatoriamente deve decidi-la antes de resolver o mérito. Entretanto, para que essa decisão gere coisa julgada material, devem ser observados no caso sub judice os requisitos previstos nos incisos do §1º, art. 503, do Mencionado Códex.
Noutro norte, os limites subjetivos da coisa julgada estão ligados às pessoas que são atingidas (ou não) pela imutabilidade da coisa julgada. A regra geral, positivada pelo Código de Processo Civil/2015, em seu art. 506, é que a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. Ensina Daniel Amorim Assumpção Neves:
A doutrina acertadamente ensina que todos os sujeitos – partes, terceiros interessados e terceiros desinteressados – suportam naturalmente os efeitos da decisão, mas a coisa julgada os atinge de forma diferente. As partes, inclusive o Ministério Público quando participa do processo como fiscal da ordem jurídica504, estão vinculadas à coisa julgada, os terceiros interessados sofrem os efeitos jurídicos da decisão, enquanto os terceiros desinteressados sofrem os efeitos naturais da sentença, sendo que em regra nenhuma espécie de terceiro suporta a coisa julgada material. (NEVES, p. 1460, 2009).
Em que pese a regra contida no art. 506 do Código de Processo Civil/2015 prever que a coisa julgada não prejudica terceiros, a interpretação a contrário sensu é perfeitamente possível. No mais, existem duas exceções à essa regra, de modo que os sucessores e os substituídos processuais, ainda que não tenham participado do deslinde processual como partes, suportarão negativamente os efeitos da coisa julgada. Isso porque, são titulares do direito, sendo incoerente se não suportassem os efeitos, ainda que negativos, da coisa julgada material.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vê-se, com o exposto, que a objetividade jurídica do instituto da coisa julgada é a segurança das decisões, sejam elas proferidas por meio de sentenças, decisões interlocutórias ou acórdãos. Não bastasse ser uma garantia constitucionalmente prevista, a imutabilidade das decisões, como regra, foi abordada de forma peculiar pela nova processualística civil.
Salvo taxativas exceções, o mérito de uma demanda não poderá novamente ser discutido em um processo (coisa julgada material). Isso porque, se o contrário ocorresse, além de ir em desencontro ao princípio da segurança jurídica, em nada contribuiria para a celeridade da prestação jurisdicional efetiva, tendo em vista que a demanda tomaria o tempo do judiciário para discutir as lides que ainda não obtiveram respostas do Estado. Portanto, fica evidenciado que coisa julgada, enquanto um efeito da decisão, tem o escopo de torná-la imutável por uma razão de controle do Estado da prestação jurisdicional.
REFERÊNCIAS UTILIZADAS
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9. ed. rev. atual. de acordo com a emenda constitucional nº 83/2014 e os últimos julgados do Supremo
DESTEFENNI, Marcos. Curso de processo civil: processo de conhecimento: tutela antecipada, provas, recursos e cumprimento de sentença. 2º tol. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2009.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
Tribunal Federal. São Paulo: Saraiva, 2015.
MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Milenium, 1999. p. 343.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8. ed. vol. único. Salvador: Jus Podivm, 2016.