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Julgamento antecipado parcial do mérito e sua execução

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4. A DECISÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO PARCIAL DA LIDE

O julgamento antecipado parcial do mérito não pode ser considerado como uma sentença, mas sim como sendo uma decisão interlocutória, pois, sua função é resolver parcialmente o mérito da lide, com base nas situações elencadas pelo artigo 356 do Código de Processo Civil, e não colocar fim ao processo, característica que é própria da sentença.

Art. 356.  O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:

I - mostrar-se incontroverso;

II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355. (BRASIL, 2015)

Além disso, a redação do artigo 203, § 1o do CPC, traz o seguinte conceito de sentença:

Art. 203.  Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.

§ 1o Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução.

Dessa forma, quando ocorre o julgamento parcial do mérito, o juiz pode resolver apenas um ou parcela dos pedidos, mesmo que depois o restante da causa ainda tenha que ser prosseguida, logo, observa-se o seguinte trecho: “Se algum(s) pedido(s) resta(m) sem julgamento, o procedimento deve continuar para se chegar a sentença (que será a decisão que colocará “fim” ao processo ou fase de conhecimento, julgando o mérito ou não).” (MEDINA, 2016, p. 372).

Portanto, com base no exposto acima, e ainda, de acordo com a definição de sentença empregada pelo Código de Processo Civil de 2015, fica nítido que o julgamento antecipado parcial do mérito se trata de uma mera decisão interlocutória, não sentença.

4.1 HIPÓTESES DE JULGAMENTO ANTECIPADO PARCIAL

O Código de Processo Civil de 2015 elencou as hipóteses de ocorrência do julgamento antecipado parcial do mérito a partir do artigo 356 e seguintes.

Dessa forma, o intuito principal deste dispositivo é permitir que o juiz resolva de maneira definitiva a parte do conflito quando presente os requisitos necessários. Assim, havendo a existência de um pedido ou parcela dele que se mostre incontroverso, de modo que não necessite mais da fase de instrução, ou seja, que estiver em condições de um imediato julgamento, este já poderá ser decidido de forma parcial.

 Além disso, caso ainda haja necessidade de produção de provas relativamente ao outro pedido, esse deverá ser prosseguido.

O julgamento antecipado parcial do mérito também pode incidir somente à uma pretensão, como, “por exemplo: o autor pede a condenação do réu ao pagamento de um milhão de reais, e o réu desde logo reconhece a procedência de duzentos mil reais, defendendo-se quanto ao resto.” (TALAMINI, 2016). Veja-se que neste caso, o réu, ao reconhecer a procedência de duzentos mil reais ao autor, já está revelando que realmente devia esta quantia, pois não contestou a obrigação propriamente dita.

Diante disso, ressalta-se que a decisão que fora decidida de forma parcial, terá a natureza definitiva no processo, e dessa, operar-se-á coisa julgada material.

4.2 RECURSO CONTRA A DECISÃO

O julgamento antecipado parcial do mérito é considerado uma decisão interlocutória, logo, se diz respeito ao mérito, portanto não é uma sentença. Desse modo, contra a sua decisão o recurso cabível é o agravo de instrumento, conforme o § 5º do artigo 356 e 1015, inciso II, do CPC:

Art. 356.  O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:

§ 5o A decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento.

Art. 1.015.  Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

II - mérito do processo; (BRASIL, 2015) 

Sendo assim, nota-se que o julgamento antecipado parcial do mérito proporciona uma eficácia imediata ao modo de provimento do recurso, atingindo os seus principais objetivos de proporcionar isonomia e racionalidade à parte beneficiada.

4.4. EXECUÇÃO DA DECISÃO

O cumprimento de sentença ou processo de execução, é a denominação dada à etapa final do processo, onde se realiza a concretização do direito do vencedor da lide.

Desse modo, o julgamento antecipado parcial do mérito pode ser executado de forma imediata, reconhecendo a parte líquida ou ilíquida da obrigação, como se observa nos § 1º ao 4º, do artigo 356, do CPC:

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Art. 356.  O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:

§ 1o A decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida.

§ 2o A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto.

§ 3o Na hipótese do § 2o, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva.

§ 4o A liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser processados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz. (BRASIL, 2015)

Sendo assim, se no caso não houver atribuição de efeito suspensivo no agravo contra a decisão, ela poderá ser executada de forma provisória.

Mas, além da possibilidade acima, se caso a decisão já houver transitada em julgado, poderá ser cabível a execução definitiva, mesmo se a outra parcela do mérito ainda estiver sendo discutida no processo.

4.4.1 EXECUÇÃO PROVISÓRIA

            É a execução que se perfaz como cumprimento de uma decisão provisória que tenha sido impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo.

A maneira de requerimento da presente execução é realizada por petição e caso sejam necessários, a juntada de documentos, conforme elencado no artigo 522 do Código de Processo Civil:

Art. 522.  O cumprimento provisório da sentença será requerido por petição dirigida ao juízo competente.

Parágrafo único.  Não sendo eletrônicos os autos, a petição será acompanhada de cópias das seguintes peças do processo, cuja autenticidade poderá ser certificada pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal:

I - decisão exequenda;

II - certidão de interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo;

III - procurações outorgadas pelas partes;

IV - decisão de habilitação, se for o caso;

V - facultativamente, outras peças processuais consideradas necessárias para demonstrar a existência do crédito. (BRASIL, 2015)

Sua execução pode ser classificada como integral, tendo em vista que por meio dela é possível alcançar a alienação de bens do executado ou até mesmo a entrega de dinheiro ao exequente. Porém, para a prática desses atos, é importante se observar o disposto no artigo 520, inciso IV:

Art. 520.  O cumprimento provisório da sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo, sujeitando-se ao seguinte regime:

IV - o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos. (BRASIL, 2015)

            De modo diverso, também há a possibilidade da dispensa de exigência da caução, o que torna esse recurso mais vantajoso, conforme os seguintes casos:

Art. 521.  A caução prevista no inciso IV do art. 520 poderá ser dispensada nos casos em que:

I - o crédito for de natureza alimentar, independentemente de sua origem;

II - o credor demonstrar situação de necessidade;

III - pender o agravo fundado nos incisos II e III do art. 1.042;

III – pender o agravo do art. 1.042; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)(Vigência)

IV - a sentença a ser provisoriamente cumprida estiver em consonância com súmula da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em conformidade com acórdão proferido no julgamento de casos repetitivos.

Parágrafo único. A exigência de caução será mantida quando da dispensa possa resultar manifesto risco de grave dano de difícil ou incerta reparação. (BRASIL. 2015)

            Ainda, o cumprimento provisório de sentença é a chamada execução provisória de uma sentença, cabível nos casos que exista a pendência de análise de recurso sem efeito suspensivo, conforme o aludido:

“O cumprimento provisório da sentença tem como pretensão dar a quem já foi contemplado com um pronunciamento judicial favorável, portanto, já objeto de decisão no sentido de quem tem razão, a oportunidade de buscar a satisfação do quanto lhe atribuído pela sentença recorrida que não obteve efeito suspensivo”. (OLIVEIRA, 2016, p.405)

Diante disso, é possível afirmar que a aplicação dessa execução pelo Código de Processo Civil visa principalmente proporcionar maior celeridade, garantia e proteção àquele cujo direito se afigura incontroverso, por meio de sentença recorrida cujo recurso não tenha efeito suspensivo, sendo então, por meio desta, diminuída a possibilidade de que a parte possa correr o risco de sofrer maiores danos enquanto espera pela decisão do recurso.

4.4.2. EXECUÇÃO DEFINITIVA

A chamada execução definitiva, é aquela fundada por um título extrajudicial ou sentença transitada em julgado, de modo que não seja possível sua impugnação por qualquer recurso.

Dessa maneira, expõe-se o seguinte trecho:

“A execução definitiva, é dotada de eficácia plena, imutável, porquanto sob a mesma pende a coisa julgada, não podendo mais haver modificação no título executivo judicial apresentado à execução.” (OLIVEIRA, 2016, p. 409)

            Inicialmente, é importante destacar que a execução definitiva da decisão que condena ao pagamento de quantia certa, torna a obrigação exigível.

Ainda, no que tange ao caso de julgamento parcial antecipado do mérito, destaca-se que ocorrendo o reconhecimento de obrigação com trânsito em julgado, é possível a aplicação da execução definitiva, conforme disposto no artigo 356 do Código de Processo Civil, em seus §§ 2º e 3º:

§ 2o A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto.

§ 3o Na hipótese do § 2o, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva. (BRASIL, 2015)

   Ademais, com base no Código de Processo Civil, diz-se que:

Art. 523.  No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

§ 1o Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento.

§ 2o Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput, a multa e os honorários previstos no § 1o incidirão sobre o restante.

§ 3o Não efetuado tempestivamente o pagamento voluntário, será expedido, desde logo, mandado de penhora e avaliação, seguindo-se os atos de expropriação. (BRASIL, 2015)

Dessa forma, é possível identificar que a definitividade da execução se caracteriza pelo trânsito em julgado que resulta na imutabilidade necessária no processo.

Sendo, então, admissível o cumprimento da parte incontroversa da sentença, mesmo que pendente o recurso de apelação, pois a “execução da parte incontroversa é, portanto, execução definitiva, técnica processual diferenciada direcionada a efetividade concreta da tutela jurisdicional.” (OLIVEIRA, 2016, p. 414).

Logo, não restam dúvidas sobre a possibilidade de execução definitiva da parte incontroversa dos pedidos reconhecidos mediante julgamento antecipado parcial da lide, conforme destaca-se:

“A incontrovérsia, para dar ensejo ao cumprimento definitivo (NCPC, art. 523), é adstrita, assim, ao transito em julgado da decisão, seja mediante a não interposição de recurso no meio (agravo de instrumento) ou no final (apelação) da fase cognitiva, ou seja, no julgamento parcial ou final do mérito.            (OLIVEIRA, 2016, p. 417).

Sendo assim, esse dispositivo visa principalmente a prática do princípio da razoável duração do processo, a fim de proporcionar maior celeridade à sua tramitação.


CONCLUSÃO

            Mesmo por não se tratar de uma matéria absolutamente recente no sistema processual brasileiro, pois já era admitida pelo art. 273, § 6º do CPC de 1973, o julgamento antecipado parcial do mérito representa um grande marco de avanço processual trazido pelo Código de Processo Civil de 2015, pois reconhecido o julgamento antecipado parcial da lide, há a possibilidade das partes terem parte de seu direito julgado.

            Tendo em vista a forma de julgamento que era realizado por meio de antecipação da tutela, ainda cabia à parte aguardar até o trânsito julgado de seu processo para a realização de sua execução.      

A estes são conferidos e efetivados com eficácia os princípios processuais que garantem principalmente a eficiência, economia e celeridade ao sistema de prestação jurisdicional brasileiro.


9 REFERÊNCIAS

______. Lei 13.105 de 16 de março de 2015. Instituio código de processo civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 15 out. 2017.

BUENO, Fábio Ferreira. Antecipação dos Efeitos da Tutela e a Parte Incontroversa da Demanda. 2005. 162 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Paranaense, Umuarama, 2005.

DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Processo Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento.11. ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2009. 600 p.

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória, Julgamento Antecipado e Execução Imediata da Sentença. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. 296 p.

MARINONI, Luiz Guilherme.; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 766 p.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Código de Processo Civil Comentado e Interpretado. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2008. 1433 p.

MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. 1805 p.

MEDINA, J. M. G. Direito processual civil moderno. 2 ed. São Paulo: Revisa dos Tribunais, 2016, p. 372.

NERY JUNIOR, Nelson.; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. 2286 p.

NEVES, Daniel Assumpção.; FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Código de Processo Civil: para concursos. 5. ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2014. 862 p.

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SANTOS, Antônio Jeová da Silva Santos. A Tutela Antecipada e Execução Específica: A Análise dos artigos 273, 461 e 632 da Reforma do CPC. 1. ed. Campinas: Copala Livros, 1995. 86 p.

TALAMINI, E. Julgamento “antecipado” e julgamento parcial do mérito. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI235085,41046 -Julgamento+antecipado+e+julgamento+parcial+do+merito>. Acesso em: 15 out. 2017.

Sobre os autores
GISLAINE YURI MIAMOTO

Acadêmica do Curso de Direito da UNIPAR.

Fábio Ferreira Bueno

Possui graduação em Direito pela Universidade Paranaense - UNIPAR (1997). Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Paranaense - UNIPAR (2001). Mestrado em Direito Processual e Cidadania pela Universidade Paranaense - UNIPAR (2005). Advogado em exercício desde 1998. Foi docente da Escola da Magistratura do Paraná. É Professor da Universidade Paranaense - UNIPAR, Umuarama/PR, no Curso de Graduação em Direito, desde 2000, ministrando as disciplinas de Direitos Difusos e Coletivos e Direito Processual Civil. Professor em cursos de Pós-graduação ofertados pela Universidade Paranaense - UNIPAR.

Informações sobre o texto

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