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O direito de propriedade versus a função social da propriedade

Agenda 10/06/2018 às 23:21

Reflexões sobre as limitações impostas ao exercício do direito à propriedade privada, bem como as formas de intervenção estatal presentes no ordenamento jurídico.

RESUMO

 

Neste trabalho serão abordadas as limitações impostas ao exercício do direito à propriedade privada, bem como as formas de intervenção estatal presentes no ordenamento jurídico, utilizando, para este fim, considerações acerca do direito de propriedade e da função social, mostrando assim, a necessidade de reformulação do conceito de propriedade e do acesso ao direito de propriedade, para maior de garantia dos direitos fundamentais defendidos em nossa Constituição Federal. Para alcançar tal objetivo, faz importante a defesa da função social da propriedade que, apesar de ser defendida em nossa Constituição Cidadã, ainda possui um papel banal e de pouco valor quando verifica-se sua defesa na prática. A finalidade social da propriedade é elemento fundamental para a própria legitimidade da propriedade, pois evita as revoltas e preserva a paz social. Ao passo que a propriedade é um direito fundamental do proprietário sendo, por isso, um direito privado, a função social da propriedade é um direito coletivo da sociedade de não sofrer violações diante de uma propriedade que se apresente mal utilizada ou inutilizada pelo seu proprietário.

 Palavras-chave: Direito de Propriedade. Função Social da Propriedade. Limitações Constitucionais. Direito fundamental. Lutas sociais.

 

ABSTRACT

 This work will address the limitations imposed on the exercise of the right to private property, as well as forms of state intervention in the present legal system, using, for this purpose, considerations of property rights and social function, thus showing the need for reformulation of the concept of ownership and access to property rights, to the greatest guarantee of fundamental rights enshrined in our Federal Constitution. To achieve this goal, is important to the defense of the social function of property which, despite being defended in our Constitution Citizen also has a banal and invaluable role when it turns out his defense in practice. The social purpose is fundamental to the legitimacy of the property element, it prevents riots and preserving social peace. While the property is a fundamental right of the owner and therefore a private right, the social function of property is a collective right of society to not suffer violations on a property that presents misused or discarded by its owner.

 

Keywords: Property Law. Social Function of Property. Constitutional limitations. Fundamental right. Social struggles. 

 

SUMÁRIO

 

1

INTRODUÇÃO...........................................................................................

10

2

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROPRIEDADE......................................

11

3

O DIREITO DE PROPRIEDADE..............................................................

12

3.1

A Função Social da propriedade.................................................................

13

3.2

A Função Social da propriedade na Constituição Federal de 1988.............

14

3.3

A Função Social da propriedade no Código Civil de 2002.........................

15

4

LIMITAÇÕES AO DIREITO DE PROPRIEDADE..................................

15

4.1

Requisição....................................................................................................

16

4.2

Ocupação Temporária..................................................................................

16

4.3

Limitação Administrativa............................................................................

16

4.4

Servidão.......................................................................................................

17

4.5

Tombamento................................................................................................

17

4.6

Desapropriação............................................................................................

17

4.7

Confisco.......................................................................................................

17

5

CONSIDERAÇÕES SOBRE A FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE..............

18

5.1

A Função Social da Posse na Constituição Federal de 1988.......................

18

5.2

A Função Social da Posse No Código Civil de 2002..................................

19

6

CONCLUSÃO.............................................................................................

20

7

REFERÊNCIAS...........................................................................................

21

1.     INTRODUÇÃO

Em seu artigo 5º, inciso XXII, a nossa Constituição da Republicana estabelece a garantia do direito de propriedade, sendo este um direito e uma garantia fundamentais. Da mesma forma, no inciso XXIII da referida carta, principia que a propriedade deverá atender a sua função social, o que, sem dúvidas, mostra-se como um limitante ao referido direito. Outras limitantes também estão expressas no ordenamento, como os institutos que regulam a utilização da propriedade e que possibilitam a intervenção do Estado no domínio privado.

Além disso, a Carta ainda dá permissão para que ordenamentos inferiores criem outras formas de intervenção. Portanto, é visível que o atual conjunto de normas constitucionais sobre a propriedade revelam que ela não pode mais ser considerada como um simples instituto de direito privado, pois devido ao seu caráter constitucional, lhe são atribuídos também as condições de direito fundamental e de princípio. Além disso, relativizou-se seu conceito e aplicação, pois a partir da função social, das limitações e da interferência estatal, houve perda do caráter absoluto que possuía, passando atualmente a ser considerada como um dos instrumentos capazes de assegurar a todos uma existência justa socialmente.

A necessidade dessa relativização de conceito e aplicação se deu devido à percepção de que, ao longo da história, a propriedade privada sempre foi um foco de conflitos e disputas socioeconômicas, que desestabilizam as relações jurídico-sociais, tanto entre os particulares, como entre esses e o Estado. Sendo assim, o Estado, através do exercício do Direito, passa a buscar meios para a proteção desse direito, bem como tentar regular seus efeitos, no sentido de alcançar um equilíbrio social, como se percebe disposto no Código Civil em seu art. 1.228:

“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.”

É notório, portanto, que as pressões sociais surtiram efeito positivo na efetivação e concretização da função social da propriedade. Entretanto, ainda reside o empasse na busca de uma solução pacífica para os conflitos resultantes da propriedade privada versus o cumprimento da função social que lhe é imposta, sobre essa inesgotável discussão será o trabalho exposto a seguir.

2.               EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROPRIEDADE

Na época anterior ao período romano, a propriedade só era atribuída às coisas móveis, somente se fossem objetos de uso pessoal. Bens imóveis, como a terra, pertenciam a toda comunidade, formada por membros das tribos ou das famílias, pois sendo o homem nessa época nômade, não possuía uma ligação mais forte à terra, já que a ocupava apenas enquanto dela podia usufruir dos seus recursos naturais.

Foi só com a Lei das XII Tábuas, que estimulava a ideia do ius utendifruendi et abutendi e instaurada pela já formada sociedade romana, que a concepção de propriedade imóvel individual surgiu. Nesse momento, o conceito de propriedade era temporário, pois se dava da seguinte maneira: o indivíduo recebia uma porção de terra para que cultivasse, no entanto, terminada a colheita, esta terra voltava a ser coletiva. Após um tempo, foi-se adquirindo o costume de entregar a terra sempre para as mesmas pessoas, que foram se instalando, construindo as suas moradias e só então surgiu o conceito de propriedade individual e perpétua na sociedade romana, tendo o domínio sobre a terra agora caráter absoluto. A ideia de propriedade privada estava ligada à religião e ao culto de antepassados, como os Deuses Lares. A propriedade era o lar da família, lugar onde era praticado o culto e habitação dos Deuses, se originado daí o conceito ocidental de lar como um lugar sagrado e que deve ser preservado.

Já na Idade Média, após entrar em contato com as culturas bárbaras, o conceito de propriedade passa a ser sinônimo de poder, sendo ligado à soberania nacional, o que faz com que perca o caráter unitário e exclusivista antes atribuído ao pater familias.

No Direito Canônico, a propriedade privada é interpretada como uma garantia da liberdade individual do homem, reforçada através do direito de propriedade que traz consigo.

A partir do séc. XVIII, escola do direito natural passou a reivindicar uma legislação que tratasse sobre a propriedade privada. Então veio o código de napoleão que definiu uma concepção altamente individualista desse conceito e que acabou influenciando diversos ordenamentos jurídicos pelo mundo.

Somente no séc. XIX, esse individualismo é modificado através das doutrinas sociais resultantes das revoluções e pressões sociais, que buscavam atrelar à propriedade um valor também que buscasse mais justiça social.

3.     DIREITO DE PROPRIEDADE

 

No começo, a propriedade era vista como uma relação jurídica entre o indivíduo e a coisa, da qual poderia dispor da maneira que quisesse. No entanto, visto que não há relação jurídica entre indivíduo e uma coisa, o conceito de propriedade teve sua interpretação modificada, vindo a ser a uma relação jurídica entre um indivíduo e um sujeito passivo universal integrado por todas as pessoas, o qual tem o dever de respeitá-lo. Sendo assim, cada indivíduo tem um poder subjetivo sobre seus pertences e essa relação deve ser respeitada pelos demais membros da coletividade.

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Essa concepção individualista, também conhecida como função individual ou privada da propriedade, é bastante influenciada pelo capitalismo e entende que a propriedade existe apenas para a satisfação exclusiva de seu dono e obtenção dos interesses econômicos do indivíduo e sua família. Com efeito, segundo este pensamento, as coisas com valor econômico são apropriadas, produzidas ou transformadas para servir aos fins individuais. (MONTEIRO, 2003, p. 79)

Assim, temos o direito de propriedade como o direito de usar, gozar, usufruir e dispor de um determinado bem, e de reavê-lo, de quem quer que injustamente o esteja possuindo. Assim sendo, de acordo com Washington de Barros Monteiro: “O direito de usar compreende exigir da coisa todos os serviços que ela pode prestar, sem alterar-lhe a substância. O direito de gozar consiste em fazer frutificar a coisa e auferir-lhe os produtos. O direito de dispor, o mais importante dos três, consiste no poder de consumir a coisa, de aliená-la, de gravá-la de ônus e de submetê-la ao serviço de outrem.” (2003, p. 83).

Portanto, o direito de propriedade pode ser classificado como complexo, pois à propriedade se faculta usar, gozar, dispor e reivindicar; como absoluto, devido a sua oponibilidade erga omnes e por ser dos direitos reais o direito que mais oferece amplitude ao titular, quanto ao desfrute e disposição de seu domínio, restringindo-se tal desfrute apenas aos parâmetros determinados em respeito ao interesse público e a outras titularidades de terceiros; como perpétuo, pois a propriedade pode ter duração eterna, passando inclusive para herdeiros através do direito das sucessões; como exclusivo, também devido à sua oponibilidade erga omnes, o que impede o direito de terceiro sobre o bem, com exceção da situações condominiais; e, finalmente, como elástico, pois o proprietário pode ampliar ou reduzir o exercício do domínio nas situações em que seus respectivos poderes possam ser acrescidos ou retirados.

 

3.1 A Função Social da Propriedade

Com o reconhecimento pelo sistema jurídico de que o direito de propriedade, em seu exercício, deveria voltar-se aos interesses gerais da coletividade em detrimento dos interesses particulares. E, assim, a propriedade funcionalizou-se socialmente. Agora, a propriedade, além de exercer o seu papel interno, que é o constituído pelos poderes do proprietário, deve exercer, também, uma função externa, representada pela função social que deve ser cumprida no sentido de evitar subutilização da propriedade que possa vir a causar descontentamentos sociais.

É de suma importância destacar a diferença entre função social e fim social, para isso, destacamos a explicação da autora Cássia Celina Paulo Moreira da costa, em sua obra A constitucionalização do direito de propriedade privada, que diz:

“Importante se faz alertar que o reconhecimento de que há na propriedade privada uma função social não é o mesmo que afirmar ter essa um fim social, vez que fim e função são conceitos inconfundíveis. Quando nos referimos ao fim de um determinado enunciado é o mesmo que delimitar sua destinação a um exercício fixado e imutável, estando o fim sob o aspecto externo do respectivo enunciado. Por sua vez, quando utilizamos o termo função, estamos mencionando sobre a “atitude histórica e concreta diante de situações sempre renovadas e diversas”, algo que está presente sob o aspecto interno do enunciado. Pelo exposto, constatamos que fim e função social não são sinônimos, já que o fim atinge a estrutura do enunciado e, assim, a natureza de uma situação jurídica, enquanto a função pertine a sua eficácia no ordenamento jurídico.” (Págs. 85 e 86).

Indo mais além, Carlos Roberto Gonçalves nos esclarece que, o princípio da função social da propriedade tem origem nos postulados de Léon Duguit, no começo do século XX. Duguit pregava que os direitos só podem se justificar pela missão social para a qual devem contribuir, ou seja, o proprietário não pode agir com abusividade e ao seu bel prazer, pois assim poderia ferir direitos e interesses coletivos e difusos, interesses esses que devem interagir com o seu direito subjetivo e não serem subjugados por ele.

3.2

A Função Social da propriedade na Constituição Federal de 1988

A função social da propriedade é abordada de maneira explícita em nossa Constituição Federal. Nela, a propriedade é mencionada em vários momentos distintos, a saber:

- Em seu art. 5º, inciso XXII, no qual diz: "é garantido o direito de propriedade".

- No inciso XXIII, do mesmo artigo: "a propriedade atenderá a sua função social".

- No Art. 170, inc. III, a Carta Magna ainda dispõe que a ordem econômica deverá observar a função social da propriedade, como pode ser observado:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: III - função social da propriedade;”

Em relação às propriedades rurais, a Carta Magna também se manifestou, determinando quais as exigências e critérios a serem seguidos para que o imóvel cumpra a sua função social e prevendo a desapropriação no caso do não segui-los. É importante destacar a preocupação do legislador em evitar que surjam conflitos advindos do não-uso ou da sua subutilização da propriedade pois, como se sabe, a questão fundiária no Brasil é bastante difícil e marcada por conflito de interesses:

- No Art. 186:

“A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

- No Art. 184:

“Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.”

3.3

A Função Social da propriedade no Código Civil de 2002

 

A função social da propriedade é tratada no código civil de 2002, no art. 1.228, §§ 01 ao 04:

“§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.

§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

Na esfera civil, o legislador almeja proteger a propriedade de atos abusivos por parte do próprio proprietário, de maneira a impedi-lo de usa-la como bem entender, o que caracterizaria um abuso e um desrespeito à função social que deve ser cumprida. Além disso, a propriedade não poderá ser utilizada para causar prejuízo a outrem. No § 4º, vem estipulada a perda do imóvel no caso de proprietário de área extensa não lhe dar destinação social devida, e lá viverem um número grande de pessoas que houverem realizado obras e serviços de interesse social e econômico.

4.               LIMITAÇÕES AO DIREITO DE PROPRIEDADE

            Como já observado, a legislação brasileira em vigor estabeleceu limites ao direito de propriedade, que perdeu seu caráter absoluto e intangível de antes e que permitia ao titular usar do imóvel da maneira indiscriminada. Agora, o Poder Público impõe limitações a esse uso e exige que haja colaboração em prol do interesse coletivo. A observância dessas exigências tornou-se condição para a sobrevivência jurídica do domínio privado, pois caso contrário, existe a possibilidade de perda da propriedade.

            José Afonso da Silva, em sua obra Curso de Direito Constitucional Positivo, conceitua que:

Limitações ao direito de propriedade consistem nos condicionamentos que atingem os caracteres tradicionais desse direito, pelo que era tido como direito absoluto, exclusivo e perpétuo. Absoluto, porque assegura ao proprietário a liberdade de dispor da coisa do modo que melhor lhe aprouver; exclusivo, porque imputado ao proprietário, e só a ele, em princípio, cabe; perpétuo, porque não desaparece com a vida do proprietário, porquanto passa a seus sucessores, significando que tem duração ilimitada (CC, art. 1.231), e não se perde pelo não uso simplesmente.”

Os meios de intervenção a propriedade estão previsto na Constituição, visto que a propriedade é cláusula pétrea e serão visto a seguir:

4.1 Requisição

Traz restrições quanto ao uso da propriedade, implicando na perda temporária da posse posse por razões de iminente perigo público. Ex: requisição de um imóvel para combater um incêndio. Está prevista no art. 5º, XXV da CF: “No caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar a propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano”.

4.2 Ocupação temporária

Traz restrições ao uso da propriedade, podendo ou não implicar na perda temporária da posse por razões de interesse público. Só haverá indenização posterior no caso de dano praticado pela Administração Pública. Ex: Ocupação de um imóvel para deixar maquinário em razão de um serviço público

4.3 Limitação administrativa

Traz restrições ao uso da propriedade, não implicando na perda da posse, mas traz restrições quanto ao uso por meio de uma imposição geral, gratuita e unilateral, não gerando direito à indenização. Ex: Limite de altura para construção de prédio; Recuo de calçada.

4.4 Servidão

Traz restrições ao uso da propriedade não implicando na perda da posse, mas traz restrições quanto ao uso por meio de uma imposição específica, onerosa e unilateral. Há direito de indenização correspondente ao prejuízo causado no imóvel. Ex: A colocação de postes de eletricidade recai sobre alguns imóveis e não sobre todos.

4.5 Tombamento

Traz restrições ao uso da propriedade não implicando na perda da posse, mas traz restrições quanto ao uso para preservação do patrimônio histórico, artístico, cultural, científico e de coisas ou locais que devam ser preservados. O proprietário pode ter direito à indenização no caso de despesas extraordinárias para conservação do bem; interdição do uso do bem e prejuízos à sua normal utilização.

4.6 Desapropriação

 É um meio de intervenção na propriedade de caráter compulsório, que ocasiona a sua transferência ao Poder Público, em razão de interesse público ou descumprimento de função social, mediante indenização.

4.7 Confisco

 É um meio de intervenção na propriedade que ocasiona sua transferência, em razão de o proprietário ter cometido um ato ilícito. Em regra o confisco é proibido, havendo apenas uma única exceção no artigo 243 da Constituição: 

 

“As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei

5. CONSIDERAÇÕES SOBRE A FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE

Derivando uma análise do princípio analisado, entende-se que exista também o princípio da função social da posse, pois apresenta semelhança substancial com aquele. Esse princípio estaria caracterizado pela necessidade de preservação do direito fundamental e imediato à moradia e ao sustento material da família, em conjunto com o princípio da dignidade humana.

“A função social da posse como princípio constitucional positivado, além de atender à unidade e completude do ordenamento jurídico, é exigência da funcionalização das situações patrimoniais, especificamente para atender as exigências de moradia, de aproveitamento do solo, bem como aos programas de erradicação da pobreza, elevando o conceito da dignidade da pessoa humana a um plano substancial e não meramente formal. É forma ainda de melhor se efetivar os preceitos infraconstitucionais relativos ao tema possessório, já que a funcionalidade pelo uso e aproveitamento da coisa juridiciza a posse como direito autônomo e independente da propriedade, retirando-a daquele estado de simples defesa contra o esbulho para se impor perante todos” (ALBUQUERQUE, 2002, p. 40)

5.1 Função Social da Posse na Constituição Federal

A Constituição Federal de 1988 não tratou de maneira expressa a função social da posse como fez com a função social da propriedade, no entanto, tratou de forma implícita, cabendo assim interpretar para identificar esse princípio constitucional implícito que está localizado nos arts. 191 e 183, ambos da Constituição Federal, que dizem respeito, respectivamente, a usucapião especial rural e a usucapião especial urbana, a saber:

- Art. 183, CF:

“Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.”

- Art. 191, CF: 

“Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.”

 

5.2 Função Social da Posse No Código Civil de 2002

O Código Civil de 2002 também não tratou de forma expressa da função social da posse, entretanto é possível identificá-la nos arts. 1.238, parágrafo único, 1.239, 1.240 e 1242, parágrafos únicos. Nesses artigos, que dizem respeito a usucapião imobiliária, o legislador reconheceu uma posse qualificada pela função social e por consequência a protegeu reduzindo-se assim os prazos que anteriormente eram previstos para adquirir-se a usucapião imobiliária.

Mais detalhadamente, no Art. 1.238, parágrafo único, que trata da usucapião extraordinária, estabeleceu-se uma causa especial de redução do prazo geral para a posse que estiver atendendo uma função social. Assim,caiu de quinze para dez anos o prazo para os casos em que o possuidor resida no imóvel ou nele desenvolva atividade produtiva. Já no art. 1.239, que trata da usucapião especial de imóvel rural, o legislador estabeleceu prazo especial com a finalidade de privilegiar a posse daqueles que moram na terra e a tornam produtiva pelo seu trabalho ou de sua família, percebam que a fixação dos requisitos “trabalho” e “moradia”, nada mais são do que o reconhecimento de uma função social da posse.

Lembra-se que o artigo acima regularizou o art. 191 da Constituição Federal (usucapião especial rural). No art. 1.240, que trata da usucapião especial urbana, o legislador estabeleceu prazo especial para o possuidor usucapi, desde que obviamente atenda além dos demais requisitos exigidos no artigo, utilize a posse para fins de moradia sua e de sua família, percebe-se mais um vez o reconhecimento de uma posse funcionalizada. Vale salientar que o artigo acima regularizou o art. 183 da Constituição Federal (usucapião especial urbana). E finalmente, no art. 1.242, parágrafo único do CC/02, que trata da usucapião ordinária, reduziu-se o prazo para cinco anos para proteger aquele que adquirira de boa-fé e a título oneroso determinado imóvel, cujo título tenha sido cancelado posteriormente, desde que tenha no imóvel estabelecido moradia ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

6.    CONCLUSÃO

Longe de exaurir o tema, o presente trabalho tratou do direito de propriedade face à função social que lhe é atribuída. Ficou claro que, mesmo sendo a propriedade um direito fundamental que é defendido constitucionalmente, ficou explícito também que este direito deve sofre limitações para que um bem maior seja alcançado, o do equilíbrio e justiça sociais. Sendo a função social da propriedade um instituto largamente defendido no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro, ele tem servido de base para exercício das atividades econômicas e das políticas urbana e agrária, além de regular o exercício do direito de propriedade em seus atributos uso, gozo e disposição. Além disso, o descumprimento da função social pode vir a resultar na perca do bem, mas nunca do direito de propriedade, já que este é garantido à todos constitucionalmente. Por fim, entenda-se que a interferência do Estado nesse instituto é para evitar que ocorram abusos e desperdícios cometidos pelos titulares do direito de propriedade em face da potencialidade do bem, pois, como é sabido, o Estado deve zelar pela justiça, paz social e princípios como o da dignidade humana.



7.               REFERÊNCIAS

 

COSTA, Cássia Celina Paulo Moreira da. A constitucionalização do direito de propriedade privada. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2003.

 

GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves. Direito das Coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, vol. 3: Direito das Coisas. 37ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.


PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. 4: Direito das Coisas. 19ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais, vol. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

FRANÇA, Vladimir da Rocha (1999). Perfil constitucional da função social da propriedade.http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/Pdf/pdf_141/r141-02.pdf. Acesso em: 20 out 2014

 

LÉPORE, Paulo Eduardo (2005). Função social da propriedade.http://www.revistajuridicaunicoc.com.br/midia/arquivos/ArquivoID_14.pdf. Acesso em: 15 out 2014

 

EVANGELISTA, Eduardo Rodrigues. A função social da propriedade e o conceito de princípio jurídicoJus Navigandi, Teresina, ano 18n. 35944 maio 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/24354>. Acesso em: 13 out. 2014.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 11 de janeiro de 2002.  Institui o Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 out 2014

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