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A responsabilidade civil do advogado

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Agenda 11/07/2018 às 18:13

Aspectos relevantes sobre a responsabilidade civil do advogado e suas implicações no exercício da atividade.

Resumo: O objetivo deste trabalho é fazer algumas breves considerações sobre a responsabilidade civil do advogado. É sabido que as relações sociais, assim como a sociedade, encontram-se em constante transformação, com isso as normas jurídicas precisam adequar-se a essas mudanças, possibilitando maior e melhor acesso à eventuais reparações de danos para aqueles que, porventura, sofram algum tipo de dano. Nesse sentido, a responsabilidade civil, de modo geral, em especial a responsabilidade profissional, são temas constantemente tratados pela doutrina, notadamente a do profissional do direito. Este tema é de extrema importância, quer pelo fato de ser atual, quer pelas exigências de proteção aos direitos subjetivos e de realização de justiça social, as quais orientam o exercício da advocacia, atividade esta de cunho técnico e humanista, buscando sempre seu exercício de forma ética e responsável.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Responsabilidade do Advogado. Parecer Jurídico.

Sumário: 1 A Responsabilidade Civil do Advogado. 1.1 Espécies de Obrigações na Atividade Advocatícia. 1.1.1 A Obrigação de Meio. 1.1.2 A Obrigação de Resultado. 1.2 A Responsabilidade Contratual do Advogado. 1.3 A Responsabilidade Extracontratual do Advogado. 1.4 A Responsabilidade do Advogado Público à Luz da Lei de Licitações. 1.5 A Responsabilidade do Advogado à Luz do Estatuto da Advocacia. 1.6 A Teoria da Perda de uma Chance.


1 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO

A advocacia lida diariamente com conflitos, sejam eles humanos ou sociais. Muito embora a advocacia preventiva tenha ganhado destaque, ela é mais voltada para a área empresarial, no mais, o profissional da advocacia é solicitado no momento de intensos conflitos, pessoais ou sociais.

O exercício da advocacia é considerado uma profissão livre e independente, marcada na sua essência pela prestação de serviços. Visa à preservação de interesses individuais e coletivos e é exercida sob o regime da livre concorrência, impondo aos profissionais um comportamento probo e leal, seja entre seus pares, seja na relação com os clientes.

De acordo com o Art. 133 da Constituição Federal “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Ao lado dele, tem-se o juiz e o representante do Ministério Público.

Conforme esclarece Sílvia Vassilieff (2006), o advogado é um dos principais atores do Estado Democrático de Direito, defensor e vigilante da ordem jurídica em vigor, disposto a denunciar abusos e violações a bens juridicamente protegidos, quer sejam legais ou morais.

A função do advogado passa também pela busca da realização do princípio da igualdade de tratamento dos envolvidos no processo, por tal razão a Constituição Federal coloca o advogado em destaque das demais, por ser uma atividade essencial à realização da justiça.

São por meio dos advogados que as pessoas exercem seus direitos via judicial ou mesmo extrajudicial, conforme prevê a lei.

O exercício da advocacia é privativo de advogado, embora tenham a mesma formação que os bacharéis em direito, o exercício se dá com a aprovação no Exame de Ordem, pois assim o diz a regulamentação da profissão.

Nesse sentido, a capacidade postulatória em juízo do advogado legalmente habilitado é concedida por meio do art. 103 do Código de Processo Civil (CPC) c/c art. 1º, inc. I c/c art. 3º, do EOAB). Além disso, somente poderá representar a parte se lhe for outorgada procuração (CPC, art. 104), salvo exceções previstas em lei.

O bacharel em direito torna-se advogado após a aprovação no Exame de Ordem, cuja inconstitucionalidade da referida prova já foi arguida por meio do Recurso Extraordinário nº RE 603.583, de Relatoria do Ministro Marco Aurélio[1], e por meio do Mandado de Injunção nº MI 2.342, de Relatoria do Ministro Ayres Britto[2], cujas decisões foram no sentido da legalidade da exigência, pois decorre da lei e da Constituição.

De acordo com os juristas Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald e Felipe Peixoto Braga Netto (2016), o advogado goza de ampla autonomia para desempenhar suas atividades.

Assim como todo profissional, também o advogado deve exercer seu mister com lealdade, boa-fé, empenho e correção para honrar e engrandecer sua classe, capacitando-se adequadamente, conforme dispõe o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.

A atuação do advogado é legalmente obrigatória e imprescindível nas demandas judiciais, assim como nas demandas em que representa determinadas classes ou entidades.

Entretanto, quando o exercício da profissão não for realizado de modo adequado, poderá o advogado, causar danos e, assim, ser responsabilizado civilmente, sem prejuízo das demais cominações legais, se couber.  O advogado no exercício da profissão tem constitucionalmente assegurada a inviolabilidade de seus atos e manifestações (art. 133, CF).

Estão impedidos de exercer a advocacia os membros e funcionários do Poder Judiciário, o chefe do Poder Executivo e seus substitutos legais, os ocupantes de cargos ou funções de direção em órgãos da administração pública, os policiais, os militares da ativa, os diretores e gerentes de instituições financeiras.

Do mesmo modo que os profissionais da área médica, também os advogados podem responder por ações ou omissões em decorrência de suas atividades. No entanto, é importante destacar que não basta que o advogado tenha agido de forma inadequada, é preciso que a ação ou omissão por ele perpetrada gere um dano indenizável.

A responsabilidade civil do advogado insere-se dentre os casos de responsabilidade contratual conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ)[3].

Segundo a lição de Matiello (2014), a natureza jurídica da prestação de serviço advocatício é, na essência, prestação de serviço, contudo, submete-se ao interesse público, revestida, nesse sentido, de uma grande função social, pois contribui para a solução de conflitos.

Com efeito, grande parte da doutrina entende que a relação entre advogado e cliente é predominantemente contratual, pois diversas são as figuras da legislação civil que se amoldam na relação em referência.

A procuração, como instrumento de mandato, traça os limites dos poderes conferidos pela outorgado ao outorgante. Tal instrumento dá poderes ao advogado para que aja judicialmente, em qualquer grau, em nome do cliente. De acordo com os autores Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald e Felipe Peixoto Braga Netto (2016), desses poderes podem decorrer graves danos, especialmente se a procuração compreender poderes especiais. Segundo esses autores, a cláusula ad judicia habilita o advogado para atuar em nome do cliente em juízo, em princípio o advogado poderá praticar qualquer ato para o bom desempenho do seu mandato, ressalvando aquelas situações em que a lei exige poderes especiais, a exemplo do art. 105 do CPC[4].

De acordo com Matiello (2014), para que exista efetivamente a responsabilidade civil do advogado é necessária a existência de alguns requisitos, pressupostos, sem os quais não será possível ser imputado ao advogado qualquer responsabilidade, tampouco reparação pelos danos, em tese, experimentados pela parte. Em síntese, são: a) existência prévia de uma relação contratual entre advogado e cliente; b) ação ou omissão culposa por parte do advogado em algum momento da obrigacional contratual; c) conduta contrária à lei; d) dano em decorrência da ação ou omissão; e, e) nexo causal entre a ação ou omissão doloso produzido pelo advogado e o dano causado ao cliente.

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1.1 ESPÉCIES DE OBRIGAÇÕES NA ATIVIDADE ADVOCATÍCIA

O advogado responde civilmente por atos ou omissões contrárias ao ordenamento jurídico. A questão da responsabilidade civil do advogado envolve diversas questões, as quais exigem intenso esforço no sentido de sua interpretação. A existência da culpa não é diferente no que se refere a responsabilidade dos advogados, basta a constatação de que houve conduta culposa e que dela resultou dano para que o agente, não existindo excludentes, seja obrigado a indenizar.

A seguir veremos as principais obrigações inerentes à atividade advocatícia, que se não forem adimplidas de acordo com as boas práticas profissionais poderão ser passíveis de responsabilidade do profissional contratado.

1.1.1 A Obrigação de Meio

Segundo a doutrina de Matiello (2014), as obrigações inerentes ao exercício da atividade profissional, em regra, são de meios e não de resultado. Por esse motivo o inadimplemento do profissional não se caracteriza pela simples falta de obtenção do resultado esperado pelo cliente. É necessário, imperativamente, que o lesado comprove que a perda se deu por culpa do advogado.

Ainda sobre a natureza da obrigação profissional do advogado, deste modo se manifesta Matiello (2014, p. 98-99):

[...] se de meios ou de resultado, pode-se dizer que existirá a primeira nos casos em que o desfecho não dependa exclusivamente da vontade do advogado, mas sim de um terceiro, que pode ser o juiz, a parte contrária, etc. Afinal, o advogado não pode ser responsabilizado por um ato do órgão judicial, a quem é dado posicionar-se contra as teses e argumentações deduzidas na defesa dos interesses do cliente.

Com efeito, nesta situação, a responsabilidade do advogado será a de vigilância, cujo objetivo primordial é a obtenção do resultado almejado pelo cliente, embora o causídico não tenha a obrigação, necessariamente, desse resultado, pois, como dito, o resultado dependerá de uma intervenção de terceiro, geralmente do juiz.

Segundo entendimento de Maria Helena Diniz (2010), a responsabilidade profissional está inserida na obrigação de meio, prossegue a autora:

[...] seu conteúdo é a própria atividade do devedor, ou seja, os meios tendentes a produzir o escopo almejado, de maneira que a inexecução da obrigação caracteriza-se pela omissão do devedor em tomar certas precauções, sem cogitar do resultado final.

Infere-se que na obrigação de meio o que se exige do devedor é pura e simplesmente o emprego de determinados meios sem ter em vista o resultado. É a própria atividade do devedor que está sendo objeto do contrato, essa é o tipo de obrigação que aparece em todos os contratos profissionais, como médicos, advogados, publicitários, etc.

Assim, o vínculo obrigacional é contratual, é a responsabilidade do advogado para com o cliente. Contudo, sua obrigação não é de resultado, mas de meio, razão pela qual o advogado, ao aceitar o encargo, obriga-se a conduzi-lo com todo o esmero e diligência, não lhe sendo obrigado entregar um resultado certo.

Nesse sentido, o STJ, decidiu que:

A reponsabilidade do advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual. Embora não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual do exercício do mandato (STJ, RESp 1.079.185, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJ 4.8.2009).

A responsabilização do profissional, ligada a uma obrigação de meio, é excluída se ele agiu com perícia, prudência e diligências, independentemente de ter ou não alcançado o fim pretendido pela contratante, haja vista que na obrigação de meio, o profissional tem o dever de empregar todos os seus conhecimentos, aptidões e recursos, visando ao resultado pretendido, no entanto, não prometido.

No caso específico dos advogados, embora utilizem todas as técnicas jurídicas disponíveis, sempre terão suas pretensões submetidas à decisão do juiz, podendo terem ou não o pleito atendido, razão pela qual não podem se comprometer com o resultado final.

1.1.2 A Obrigação de Resultado

Para alguns doutrinadores, a exemplo de Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald & Felipe Peixoto Braga Netto (2016), não deveria haver a separação das obrigações em meio e resultado, entre outras pelas seguintes razões:

[...] (a) após longos anos de debates, aqui e em outros países, não se chegou a um critério preciso para definir quais seriam as obrigações de meio e de resultado; (b) ainda que se chegasse a um critério – e não se chegou – não haveria diferenciação pragmática entre as obrigações (FARIAS, ROSENVALD & BRAGA NETTO, 2016, p. 838).

Para aqueles que adotam a separação da obrigação, a exemplo de Orlando Gomes (2010), que de sua lição se extrai a definição para obrigação de resultado como sendo aquela em que o cumprimento só se verifica se o resultado planejado for atingido. O profissional é obrigado a atingir o objetivo previamente fixado, pois do contrário terá havido o descumprimento e, por consequência, a necessidade de reparar os danos causados ao contratante. Assim, caso o objetivo não seja alcançado, arcará com os possíveis resultados negativos assumidos pelo encargo.

O simples fato de um causídico assumir o encargo de ajuizar uma ação ou assumir uma demanda em curso, estará assumindo uma obrigação de meio, não lhe podendo ser imputado qualquer responsabilização pela parcial procedência, ou mesmo a improcedência, só haverá algum tipo de responsabilização se houver atos negligentes, com falta do dever de cuidado.

Nesse sentido, Matiello (2014) esclarece que é preciso analisar a situação assumida entre o advogado e o contratante com bastante prudência para que haja a adoção de um mecanismo de responsabilização que tome como regra geral a ideia de imputação objetiva contra o profissional.

Por certo, a obrigação do advogado não envolve os riscos inerentes a toda ação judicial, pois a incerteza própria das lides e as controvertidas posições que delineiam os temas em questão fazem com que sobre o advogado recaia, unicamente, o compromisso de agir de forma zelosa e diligente na proteção dos interesses e expectativas do seu cliente.

No entanto, no caso de advocacia consultiva se esta contrariar flagrantemente a lei poderá acarretar o dever de indenizar eventuais prejuízos sofridos pelo cliente. A doutrina e a jurisprudência majoritárias têm reiterado que pareceres e conselhos feitos de forma inadequada, sem fundamentação e conhecimentos jurídicos adequados, provocam danos ao cliente pelo fato dele ter seguido tais orientações, caberá a responsabilização do advogado (MATIELLO, 2014).

1.2 A RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DO ADVOGADO

De modo geral, a relação entre os profissionais liberais e seus contratantes se sujeita às normas relacionadas à responsabilidade contratual a partir do momento em que ajustam seu termo. Nasce daí a relação jurídica entre contratante e contratado, direitos e deveres são assumidos de imediato pelas partes envolvidas.

O contrato origina-se da autonomia da vontade, autonomia esta que confere liberdade aos indivíduos para regulamentar suas atividades profissionais. Por sua vez, a responsabilidade civil origina-se do dano causado pelo inadimplemento contratual. Dessa forma, pode-se dizer que há responsabilidade contratual quando houver o descumprimento, por uma das partes, de obrigação constante do instrumento contratual. Nesse sentido, colhe-se da lição sempre esclarecedora de Orlando Gomes (1997, p. 144), que:

O dever contratual do obrigado consiste em tudo fazer para cumprir a prestação devida evitando que se impossibilite. Por isso se de qualquer modo concorre para o inadimplemento, descurando do dever de diligência, a inexecução é culposa.

Conforme preceitua Venosa (2006), não é preciso que o advogado ingresse com a ação em juízo para que surja a relação contratual entre eles. O vínculo obrigacional da relação se forma anteriormente de forma verbal ou escrita, cuja eficácia se faz presente de modo imediato.

Matiello (2014) leciona que no período compreendido entre o início das negociações e a celebração do acordo entre as partes, o profissional tem alguns deveres para com a pessoa que o solicita. Segundo este autor, haveria três momentos distintos antes do fechamento do contrato propriamente dito: a) negociações preliminares, esta etapa seria anterior a formação do vínculo; b) proposta; e, c) aceite. Na fase preliminar haveria o interesse no fazimento do negócio, a proposta seria a etapa de formação do contrato e com a aceitação ele completaria como um instrumento entre as partes.

Os contratos firmados pelos advogados e seus clientes, no exercício profissional, são o mandado judicial e a prestação de serviços; mandado judicial quando houver representação em juízo e prestações de serviço na emissão de pareceres, elaboração de contratos, etc. Contudo, mesmo que a contratação seja verbal, resta claro que há o contrato entre o advogado e seu cliente, portanto, em razão da natureza contratual dessa prestação, eventual prejuízo advindo da inobservância, ou mesmo da inexecução das regras entabuladas, acarretará a responsabilidade contratual para o advogado, sendo passível de indenização, exceto se houver alguma excludente de responsabilidade (VASSILIEFF, 2006).

Do Código Civil, extraem-se os fundamentos para o descrito acima:

Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível.

Art. 248. Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos.

Em razão da possibilidade do contrato ser firmado de forma escrita ou verbal, geralmente, é o que determina a natureza particular e a extensão das obrigações assumidas, razão pela qual é em decorrência das obrigações assumidas que poderá ser graduada a culpa.

Destaca-se, ainda, que o contrato celebrado entre o advogado e seu cliente é de índole pessoal, o que significa dizer que o contratante decidiu contratar o contratado em razão de sua diferenciada qualidade. Contudo, é importante sempre deixar bastante claro no instrumento contratual que espécie de obrigação foi ajustada entre as partes, se de meio ou de resultado, visando possibilitar aferir o comprometimento do advogado na condução do serviço para o qual foi contratado (MATIELLO, 2014).

1.3 A RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ADVOGADO

A responsabilidade extracontratual tem sua origem na lesão de direito subjetivo, sem que entre o agente e a vítima exista qualquer relação contratual preexistente. Não há entre as partes uma relação contratual firmada com delimitação de direitos e obrigações, sendo esta uma das diferenças da responsabilidade contratual, além do ônus da prova (VASSILIEFF, 2006).

Segundo a lição de Matiello (2014), a responsabilidade subjetiva está fundamentada na lei, ela é consequência do ato ilícito, tendo origem no descumprimento do dever geral de não causar nenhum tipo de prejuízo a outrem mantendo sempre o dever de cuidado e vigilância.

Na lição de Vassilieff (2006, p. 99), “é a lei e não a vontade que torna o agente sujeito passivo de obrigação de reparar o dano, impondo-lhe prestação indenizatória. A fonte dessa obrigação, criada pela lei, e o fato danoso”.

A responsabilidade profissional é extracontratual no caso de não haver assunção de obrigação contratual, o que se dá em relação a terceiros e à parte contrária. Estar-se-ia diante da ocorrência de responsabilidade extracontratual na hipótese de os terceiros serem alheios à relação contratual entre o advogado e o cliente, ainda que o dano resulte de execução daquele contrato, a exemplo do que ocorre nos embargos erradamente interpostos contra terceiros, abusivos em face da parte contrária ou pedido doloso ou culposo de falência improcedente (VASSILIEFF, 2006).

Não havendo contrato prévio entre o advogado e seu cliente, está-se diante de responsabilidade extracontratual do profissional, haja vista que o que se verifica na sua nomeação de ofício pelo juiz como advogado dativo, tutor ou curador, síndico, ou se o contrato é nulo ou anulável e como tal não produz efeitos, salvo quanto aos atos ilícitos, que devem ser reparados (DIAS, 1997). Embora para alguns autores, mesmo não havendo contrato formal nas nomeações pelo juízo, ambas as partes podem, fundamentadamente, recusar a nomeação ou a indicação, o que caracterizaria relação contratual.

No que diz respeito aos contratos nulos e anuláveis, importante trazer a lição do mestre Aguiar Dias (1997, p. 134), que com a propriedade que lhe é peculiar, desta forma se manifesta: “a responsabilidade resultante de um contrato nulo oferece à parte a quem compete a respectiva ação a escolha entre demandar com fundamento nas relações do contrato e pedir a reparação do dano extracontratual”.

Infere-se que a responsabilidade extracontratual também pode acontecer naquelas situações em que a relação existente entre advogado e seu cliente tenha se pautado em um contrato nulo ou anulável, conforme o caso.

De acordo com as suas características, a responsabilidade extracontratual pode fundamentar-se na culpa e ser subjetiva, ou ser retirado esse elemento da obrigação de indenizar e ser denominada de objetiva (GOMES, 1997).

No caso específico dos advogados, em se tratando de responsabilidade extracontratual, por se referir à profissional liberal, ela se funda exclusivamente na culpa, cabendo à vítima, que se sente lesada, provar a culpa. Porém, na situação de advogado público a serviço do Estado, na ausência de relação contratual, em relação à parte adversa ou terceiros alheios ao processo, pode ser caraterizada na hipótese de responsabilidade extracontratual objetiva de advogado na função de agente público (VASSILIEFF, 2006).

1.4 A RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO PÚBLICO À LUZ DA LEI DE LICITAÇÕES           

Em relação à Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93), é importante destacar que a atuação do advogado se limita a emissão de parecer jurídico sobre o processo administração para o qual foi demandado, onde decorre a força da própria norma, parágrafo único, do art. 38 da Lei nº 8.666/93.

Em decorrência da atuação do advogado quando subscritor do parecer jurídico, em excepcionalíssimas situações cabe-lhe a responsabilidade, como na ação de improbidade, caso o parecer tenha sido dolosamente elaborado e tenha servido para a realização de ato ímprobo, esse foi o entendimento adotado pela Segunda Turma do STJ nos autos do REsp nº 1.184.504/DF[5], cuja relatoria foi do Min. Humberto Martins.

1.5 A RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO À LUZ DO ESTATUTO DA ADVOCACIA

Do mesmo modo que o Código Civil tratou da responsabilidade civil do advogado, com destaque para a existência da culpa, a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 – Estatuto da Advocacia –, determinou que o advogado somente terá responsabilidade pelos danos que causar no exercício de sua atividade profissional, se o praticar com dolo ou culpa.

O artigo 32 da mencionada Lei dispõe que: “O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa”.

O Estatuto da OAB determina que a conduta do profissional que reiteradamente comete erros, evidenciando desídia e, portanto, constituindo infração disciplinar é passível de punição. Com efeito, o advogado no exercício de sua atividade se praticar algum ato culposo ou doloso, vindo em prejuízo de seu cliente, será responsabilizado conforme determina o Estatuto, na medida do dano causado.

É importante mencionar que a responsabilidade civil do advogado está adstrita àquilo que efetivamente contratou com o cliente, pois o exercício profissional deve ser entendido como sendo aquele realizado em decorrência do mandado judicial ou do contrato de prestação de serviço firmado entre as partes, situação em que se configura a responsabilidade subjetiva, tal como ocorre nas relações contratuais de modo geral.

1.6 A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE

Um dos principais pontos estudados pela responsabilidade civil no que se refere ao exercício profissional dos advogados, diz respeito à perda de uma chance. Geralmente tal invocação se dá em demandas em que o advogado agiu de forma desidiosa, irresponsável na condução ou no retardamento na propositura de uma ação judicial, a qual tem por característica a perda, pelo cliente, de ter reconhecido pelo Poder Judiciário um direito que entende devido.

A respeito dessa teoria colhe da lição de Farias, Rosenvald & Braga Netto, (2016, p. 835):

Tem sido progressivamente comum que se invoque a teoria da perda da chance em demandas contra advogados. Argumenta-se, por exemplo, que a ausência de interposição de determinado recurso, ou mesmo a não contestação de uma demanda, subtraem à vítima (autor ou réu, sob o prisma processual) a chance de vitória na causa. Que danos podem existir, na matéria (ligados à atuação profissional do advogado), parece não haver dúvida. O que temos de indagar, de modo cuidadoso e investigativo, é se as lesões às expectativas do cliente estão conectadas em nexo causal às ações ou omissões do advogado. Não basta que as expectativas do cliente sejam legítimas, em relação à demanda. É preciso que elas se frustrem em razão da atuação desastrada do advogado.

Esses mesmos autores complementam dizendo que não é o fato de ter havido, por parte do advogado, a perda do prazo, que por si só, dará ensejo a caracterizar dano passível de indenização. É necessário apurar se existe nexo causal entre a perda do prazo e o dano que o cliente alega ter tido e a possibilidade real de êxito na ação pretendida. Sem dúvida que a teoria poderá ser aplicada, no entanto, após uma rigorosa análise de todos os fatos que permeiam a situação no caso concreto.

A teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance tem sido usada para buscar a indenização pelo exercício profissional de profissionais de outras áreas, como médicos, engenheiros, publicitários, entre outros. Seriam as situações passíveis de se invocar a teoria de quando o agente frustra da vítima da possibilidade de um ganho.

Normalmente em ações dessa natureza, se configurado o dano indenizável, a quantificação deste se dará por arbitramento do magistrado, a teor do que determina o art. 946 do Código Civil: “Se a obrigação for indeterminada, e não houver na lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a lei processual determinar”.

Importante destacar, que ao se aplicar a teoria da perda de uma chance, para fins de apuração de responsabilidade do advogado, quando contratado para representação na esfera judicial, deve ser levada em consideração a dificuldade de prever o resultado, tendo em vista as muitas variáveis, tais como: a percepção do julgador, a interpretação do caso concreto, entendimento acerca de situações análogas, etc. É o conjunto desses elementos que levam o julgador a decidir de uma ou outra forma.

 No entanto, quando configurado erros técnicos grosseiros na condução do processo os Tribunais têm entendido cabível a indenização por aplicação da teoria da perda de uma chance, sendo devidamente indenizável por parte do causídico[6].

Assim, deve-se entender por dano o prejuízo que deriva direta e imediatamente da conduta comissiva ou omissa do agente ou, ainda, que conduz, pela extensão e gravidade a determinado dano futuro, impedindo aquilo que ocorreria naturalmente se não fosse a atitude culposa deflagrada, sendo necessário ainda, para que haja o dever de indenizar, a comprovação do nexo causal e dano (ROSSI, 2007).

O valor da indenização nos casos de responsabilidade civil pela perda de uma chance, segundo entendimento consolidado dos Tribunais, é um percentual do valor que seria devido, caso não houvesse tido o ato negligente ou irresponsável do profissional contratado, o valor do bem tem ficado entre 70-80% do valor reclamado ou do prejuízo sofrido[7].

No próximo capítulo, tratar-se-á especificamente sobre o parecer jurídico emitido pelo advogado, suas espécies e as possíveis consequências advindas de sua emissão.

Sobre o autor
Alexandre André Vissotto

Advogado e Contador, com especialização em Auditoria Governamental (UFSC); Gestão Estratégia do Serviço Público (UNISUL); Direito Público (GAMA FILHO); Gestão Pública Avançada (ENA/Brasil); e Direito das Família e Sucessões (CESUSC).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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