Conclusões: análise da primeira green tax à luz do exposto
Levando-se em conta tudo que foi exposto, e em especial as últimas afirmações sobre o dever de proporcionalidade, seria possível questionar: e a CIDE prevista no artigo 177, § 4º da Constituição, estaria ela atingindo seu objetivo de proteger o meio ambiente?
A pergunta é importante porque, caso a resposta seja negativa, pode-se chegar à conclusão de que o tributo é inconstitucional [21], pois estaria limitando o direito à igualdade, ao incidir somente sobre uma parcela de contribuintes, sem critérios razoáveis de discriminação. Isso porque o critério razoável de discriminação da CIDE era tributar os que poluem, para evitar a poluição. Caso não se evite a poluição, tal critério não subsiste.
Contudo, a resposta definitiva só pode ser dada com avaliação de circunstâncias fáticas, o que extrapola o objetivo do presente trabalho. Sem a análise dessas circunstâncias, é possível adiantar que, a produção de automóveis e caminhões bateu recordes em 2004, o que poderia ser um indício de que a CIDE não está atingindo seus objetivos. Por outro lado, a pesquisa de combustíveis ecologicamente corretos, como o biodiesel, foi acelerada e tem apresentado resultados positivos; o mercado para automóveis 1.0, que poluem menos, continua a crescer, mesmo com a revogação do benefício de IPI diferenciado; e houve um recente retorno aos veículos que utilizam álcool, com os carros bi-combustível e multi-combustíveis.
Em resumo, chegou-se às seguintes conclusões no presente texto:
- há autorização constitucional para a instituição de tributos ambientais, devido ao previsto no artigo 170, VI, da Constituição;
- a espécie tributária mais adequada a servir como um tributo ambiental é a CIDE, por seu caráter finalístico de intervenção no domínio econômico;
- essa CIDE só será constitucional na medida em que atingir sua finalidade de individualizar os custos ambientais, e desde que essa individualização traga efetivos benefícios ao meio ambiente.
Referências bibliográficas
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PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
Notas
- MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação Ambiental: A Função do Tributo na Proteção do Meio Ambiente. Curitiba: Juruá, 2003. p. 84-5.
- FERRAZ, Roberto. Tributação e Meio Ambiente: O Green Tax no Brasil (A Contribuição de Intervenção da Emenda 33/2001). In: MARINS, Tributação e Meio Ambiente. Curitiba: Juruá. 2002. p. 102.
- European Environmental Agency. Environmental Taxes: Implementation and Environmental Effectiveness. 1996. Disponível em <http://reports.eea.eu.int/92-9167-000-6/en/gt.pdf>. Acesso em 10/03/2004. Tradução livre: "Considerando que os produtores e consumidores não vão cessar completamente as atividades que estão sendo tributadas, os tributos gerarão receitas. Estas podem ser utilizadas diretamente para resolver problemas ambientais; ou podem ser adotadas para subsidiar o redirecionamento de produtores e consumidores para atividades mais benéficas ao meio ambiente, gerando um segundo incentivo à melhora deste;...".
- SOUZA, Fátima Fernandes Rodrigues de; PAVAN, Cláudia Fonseca Morato. Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: RT, 2002. p. 111.
- Sobre a intervenção no domínio econômico por indução e o conceito de atividade econômica em sentido estrito, vide: GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 127 et. seq. Discordando da tese de que a CIDE tem função de indução negativa, e entendendo que essa espécie tributária não pode restringir a atividade econômica, vide: GRECO, Marco Aurélio. Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – Parâmetros para sua Criação. In: GRECO, Marco Aurélio (Coord.). Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico e Figuras Afins. São Paulo: Dialética, 2001. p. 24-25.
- BORGES, José Souto Maior. Apud CEZAROTI e SILVEIRA, Aspectos Relevantes das..., p. 54.
- BALEEIRO, Aliomar; DERZI, Misabel Abreu Machado (atualizadora). Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 2.
- GRECO, Marco Aurélio, apud PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 142.
- BALEEIRO; DERZI (atualizadora). Limitações Constitucionais ..., p. 593.
- ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 22-23.
- Idem, p. 109.
- FERNANDES, Edison Carlos. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. In: MARTINS, Contribuições de Intervenção..., p. 270. Grifei.
- GRAU, A Ordem Econômica..., p. 219-220.
- MUKAI, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 31.
- BELLAN, Daniel Vitor. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, nº 78, p. 26, março-2002. Grifei.
- NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: Introdução ao Direito Econômico. São Paulo: RT, 1997. p. 429.
- MODÉ, Tributação Ambiental..., p. 116.
- EEA, Environmental Taxes...
- Os direitos fundamentais são princípios, não devendo ser aplicados através de um critério de "tudo ou nada", como se faz com as regra jurídicas. Isso porque os princípios frequentemente colidem entre si, devendo ser aplicados com ponderação, de forma a garantir o máximo de eficácia de todos os princípios colidentes, com a preponderância do mais relevante no caso concreto (sobre o assunto, vide DWORKIN, Ronald. Is a law a system of rules? In DWORKIN, R. (editor). The Philosophy of Law. Oxford: Oxford University Press, 1977. p. 38-65). Conseqüentemente, é impossível afirmar no plano teórico se existem direitos fundamentais limitados por um tributo, e quais são esses direitos; bem como se essa limitação é proporcional à finalidade perseguida pela norma tributária.
- ÁVILA. Sistema Constitucional Tributário, p. 96-98.
- Não se trata aqui de inconstitucionalidade de norma constitucional, doutrina essa não recepcionada pelo sistema constitucional brasileiro, mas de inconstitucionalidade da Lei 10.336/01, que criou o tributo autorizado pela Constituição.