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O ciclo completo de polícia: uma solução?

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O ciclo completo de polícia pode ser caracterizado pelo conjunto de ações policiais com o objetivo de reduzir a violência e levar fatos criminosos ao conhecimento do Judiciário.

RESUMO: A Polícia brasileira tem sua organização definida pelo artigo 144 da Constituição Federal de 1988. Esse modelo traz em bojo o estabelecimento de 5 corporações Políciais: A Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, a Polícia Ferroviária Federal, a Polícia Civil e a Polícia Militar. Dentre essas, as que mais se vê nas ruas e que tem o maior numero de ocorrências sob sua responsabilidade são a Polícia Civil e a Militar, porém, as duas só podem fazer uma ‘parte do serviço’. Ficou designado para a Polícia Civil as funções de Polícia judiciária e para a Polícia Militar as de Polícia administrativa. Quando a Polícia Militar detém algum infrator, ela, obrigatoriamente, deve encaminhá-lo à Polícia Civil para que essa investigue o caso e proceda à confecção do inquérito que será remetido ao judiciário. Esse modelo, além de gerar grandes desgastes institucionais desnecessários também traz em si uma perda mui grande no que diz respeito a logística Policial, porque em cada ocorrência a Polícia Militar precisa destacar uma viatura que está em rua para levar o criminoso a Delegacia. A metodologia do trabalho foi bibliográfica, o objetivo é a demonstração do conceito do ciclo completo de policia. A primeira parte falou sobre a história e a organização atual da policia brasileira. O segundo capítulo dispôs sobre a policia administrativa e judiciária, sobre o poder de policia e sobre a prisão em flagrante. Na ultima parte, o trabalho discorre sobre o conceito do ciclo completo de polícia, Polícia espanhola, TCO e PEC 102/11. O sistema de ciclo completo é a solução para esse caso de excessiva burocracia no inicio da persecução penal brasileira.

Palavras-Chave: Policia espanhola; Logística Policial; Polícia Militar


INTRODUÇÃO

Um dos problemas que mais tem preocupado a população brasileira é a segurança pública. Com leis brandas, baixo efetivo Policial, sistema carcerário ineficiente (sendo até apelidado de escola do crime) e justiça lenta, o Brasil sofre  com o aumento da criminalidade e diminuição da sensação de segurança. O atual modelo dicotômico de organização das Polícias brasileiras, preconizado pelo artigo 144 da Constituição Federal, limita a Polícia Militar ao trabalho das funções de Polícia administrativa, qual seja, fazer patrulha, usar fardas caracterizadas e prevenir os crimes e a Polícia Civil as funções de Polícia judiciária. Esse modelo traz desgastes institucionais desnecessários além de gerar grande confusão na população.

Com o objetivo de trazer celeridade à persecução penal, a Espanha estabeleceu, em seu modelo de Policiamento, o ciclo completo de Polícia, para todas as corporações daquele país. O ciclo completo de Polícia consiste em todas as funções do trabalho Policial, como: patrulhar, prender, investigar e dirigir o inquérito. No Brasil, a lei n° 9.099 inovou ao trazer o artificio do TCO que, em alguns estados brasileiros, já pode ser confeccionado pela Polícia Militar, evitando que a sociedade fique com uma viatura a menos na rua e que a delegacia de Polícia fique com inquéritos além de sua possibilidade e capacidade.

O objetivo do presente estudo é a demonstração do conceito de ciclo completo de polícia, sendo que a principal problemática é o estabelecimento daquilo que pode ser chamado de ‘meias Polícias’ no Brasil, ou seja, Polícias que não cumprem com o ciclo. A pesquisa pode ser classificada como bibliográfica, tendo em vista o uso de vários livros, artigos científicos e entrevistas para a confecção desta.

Foi tratado sobre a história da Polícia no Brasil e como atualmente ela é organizada, bem como dos conceitos de poder de Polícia, Polícia administrativa e judiciária e sobre a prisão em flagrante delito que é, hoje, o principal meio pelo qual a Polícia Militar e Civil se encontram nos procedimentos administrativos. Bem como a demonstração do modelo de organização da Polícia espanhola. A PEC 102/11 tem certa importância no estudo, tendo em vista ser a única em tramitação no Congresso Nacional que tem como objetivo mudar a organização da Polícia brasileira.

Como base para a pesquisa foi utilizado a monografia O ciclo completo de polícia na atividade de Policiamento ostensivo dos capitães da Polícia Militar Sanyo Ferreira Fernandes e Wanderson Carolino que teve como objetivo a qualificação do curso de Especialização em Gerenciamento de Segurança Pública da Academia da Polícia Militar do Estado de Goiás.

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Também foi utilizado o livro do Dr. Rogério Greco, Procurado no Estado de Minas Gerais, Atividade Policial: Aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais. Bem como da legislação espanhola que rege a organização das Polícias daquele país. Além das obras de Maria Silvia Di Pietro sobre o Direito Administrativo e Alexandre de Moraes sobre o Direito Constitucional.

É necessário o debate sobre tal tema, tendo em vista o desgaste institucional entre as duas instituições policiais brasileiras. A escolha do tema se deu devido ao atraso brasileiro em relação a países evoluídos no que diz respeito à organização policial. Não há justificativa plausível para o excesso de burocracia no começo da persecução penal brasileira.


CAPÍTULO I - DA POLÍCIA NO BRASIL

HISTÓRICO

A polícia no Brasil tem seu ponto de origem na chegada da corte portuguesa no Rio de Janeiro, em 1808. Com a vinda de tais pessoas para terras cariocas, criou-se dois corpos de Polícia: A Intendência Geral de Polícia ( em 1808) e a Guarda Real de Polícia (em 1809). Esses dois corpos acima citados, foram os primeiros organismos públicos a carregarem em seu nome a concepção de Polícia.

Antes disso, as atribuições correspondentes ao cargo de intendente geral da Polícia no Brasil eram desempenhadas por várias autoridades, como os quadrilheiros, que eram oficiais inferiores de justiça ligados à Camara Municipal, o ouvidor, os capitães-mores de estradas e assaltos, conhecidos como capitães-do- mato, também ligados à câmara, e os alcaides, encarregados de diligencias especificas. Além disso, desde a carta régia de 22 de Julho de 1766, o desembargador ouvidor geral do crime da Relação do Rio de Janeiro acumulava a função de intendente da Polícia (REIS, 1983, p.11).

A Intendência Geral de Polícia no Brasil seguia o modelo português que por sua vez teve por inspiração o molde francês. Os chefes dessa polícia, os Intendentes, por muitas vezes eram chamados de prefeitos devido a visão de Policiamento àquela época abarcar funções que ao passar do tempo foram delegadas a outros órgãos da administração pública. “A Intendência de Polícia se associará fortemente ao nome do primeiro intendente, Paulo Fernandes Vianna, que vai dirigi-la até 1820, caracterizando-se como um quase prefeito da cidade do Rio de Janeiro” (BRETAS ; ROSEMBERG, 2013, p. 167).

Em 1841, a Intendência Geral de Polícia foi extinta, criando-se o cargo de Chefe de Polícia, ocupado até 1844 por Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara. A lei de 03 de dezembro de 1841 proporcionou uma mudança radical, com a criação, em cada província e também na Corte, de uma Chefatura de Polícia. Nela, o Chefe de Polícia passou a ser auxiliado por delegados e subdelegados de Polícia:

No que tange às instituições Políciais, a maior inovação da contra-reforma foi a redefinição do papel do chefe de polícia, secundado agora por delegados e subdelegados, com atribuições muito parecidas às que tiveram os juízes de paz e os prefeitos e subprefeitos. O juiz Policial deu lugar ao Policial juiz, personificado no chefe de polícia e nos delegados e subdelegados. Cada um, em seu espaço de atuação, devia prevenir delitos, prender infratores, proceder à formação de culpa dos acusados, podendo julgar os crimes menores. Nesse duplo papel de Policial e juiz, estavam inseridos em duas instituições entrecruzadas, que ora estavam sobrepostas, ora atuavam com competências distintas. (MARTINS, 2007, p.86)

Com a guerra do Paraguai em 1864 veio algumas mudanças robustas no Policiamento brasileiro, com o ingresso de Políciais dessas províncias, que em alguns locais eram militarizados, servindo na infantaria (RIBEIRO, 2011, p. 4), momento este em que esses Políciais começam a fazer parte de uma força aquartelada, trabalhando menos no serviço de proteção a sociedade e mais nas questões de Defesa do Estado. (MEZZOMO, 2005, p. 127)

Com a proclamação da República em 1889 e a desconstrução do poder do Império foi dada uma maior autonomia as polícias estaduais. Para Ribeiro (2011, p. 4):

Com a formulação da constituição da República que nascia em 1891, os estados começam a se tornar mais autônomos, e ao mesmo tempo começam a ser criadas as forças públicas, que seriam uma representação da segurança nesses Estados, ou seja, servia para a defesa do Governo do Estado perante aos excessos da união, é nesse momento que a força pública se coloca como uma organização militar dos estados e passa a viver aquartelado.

Esse modelo de corpo Policial estadual tomou força considerável, principalmente nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais que reforçaram de grande maneira na área bélica. Com o aumento dessa força, a união com receio do poder dessas forças Políciais edita a Lei n° 1860, de 4 de Janeiro de 1909 que em seu artigo 7° e 32°, ordenava o serviço militar obrigatório e colocava as forças estaduais como forças auxiliares da guarda nacional a disposição da União.

O que se pode destacar é que no período da Primeira República as Polícias Militares estiveram envolvidas em um papel fundamental nas rebeliões e revoltas ocorridas no Brasil nesse lapso temporal, “[...] ou seja, vemos a ação dessas forças de polícia, [...] contra o movimento de Canudos, passando por ações no Contestado ao sul e na revolução de 1924 em São Paulo e também na sustentação da Revolução de 1930”. (RIBEIRO, 2011, p. 8)

Justamente por conta do envolvimento da Força Pública de São Paulo na revolta Constitucional de julho a agosto de 1932, é que se vê a intervenção do Governo Federal nas Polícias estaduais para o fim de desmobilizar e centralizar os Exércitos estaduais (como eram conhecidos a época). Como assevera Ribeiro (2011, p. 9):

Com a consolidação do Estado Novo e a aprovação da Constituição, a Segunda República e o centralismo do Estado sobre as competências das polícias militares aumenta e é a partir dessa nova constituição que vemos as polícias militares ser definidas como forças de reserva do Exército voltadas para a segurança interna e manutenção da ordem.

Após o fim do Estado em 1945 e a deposição de Getúlio Vargas é eleito pelo voto direto, Eurico Gaspar Dutra, que no ano seguinte promulga uma nova constituição que ainda continua preconizando a Polícia Militar como força auxiliar das Forças Armadas e ainda dando a União prerrogativas de legislar sobre organização, efetivos, instrução e garantias das Polícias militares.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE GOIÁS NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS

A constituição estadual preconiza em seu artigo 124 a missão da Polícia Militar perante a população goiana.

A Polícia Militar é instituição permanente, organizada com base na disciplina e na hierarquia, competindo-lhe, entre outras, as seguintes atividades:

I - o Policiamento ostensivo de segurança; II - a preservação da ordem pública;

III- a polícia judiciária militar, nos termos da lei federal;

IV- a orientação e instrução da Guarda Municipal, quando solicitadas pelo Poder Executivo municipal;

V- a garantia do exercício do poder de polícia, dos poderes e órgãos públicos estaduais, especialmente os das áreas fazendária, sanitária, de uso e ocupação do solo e do patrimônio cultural.

Parágrafo único - A estrutura da Polícia Militar conterá obrigatoriamente uma unidade de polícia florestal, incumbida de proteger as nascentes dos mananciais e os parques ecológicos, uma unidade de polícia rodoviária e uma de trânsito (GOIÁS, 1989).

É possível encontrar em todas as constituições estaduais desde a de 1935, a competência residual sendo entregue a Polícia Militar Goiana. Segundo alguns doutrinadores tais como Lazarinni (2003) a competência residual é o "exercício de toda atividade Policial de segurança pública não atribuída aos demais órgãos”.

A constituição estadual de 1935 já designava a Polícia Militar para o trabalho de preservação da ordem pública:

Art. 17 – A Polícia Militar do Estado de Goiás, considerada reserva do Exército Nacional, pelo art. 167 da Constituição Federal, é uma instituição estadual permanente, e, dentro da lei, essencialmente obediente aos seus superiores hierárquicos.

§ Único – Destina-se à manutenção da ordem pública e da lei, no interior, e a cooperar, na defesa da Pátria, nas guerras externas e comoções internas (CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE GOIÁS,1935)

Já o texto da carta politica de 1945 não mencionou qual função seria desempenhada pela Polícia Militar, a qual chamou de Força Policial do Estado:

Art. 130 – Os títulos, postos e uniformes da Força Policial do Estado são exclusivos dos militares de carreira, sendo vedada adoção de denominações e uniformes semelhantes aos privativos do Exército Nacional para as corporações militares do Estado e para as suas respectivas escolas de preparação (GOIÁS, 1945).

Na constituição de 1964 o termo Polícia Militar volta a ser empregado, bem como suas funções expressas na norma, nesse caso, no artigo 164:

A Polícia Militar, corporação obediente ao Governador do Estado, a quem ficará diretamente, subordinada, é instituição permanente, reserva do Exército e se destina à manutenção da ordem e segurança pública (GOIÁS, 1964).

A constituição 1967 seguiu a mesma esteira de sua antecessora, nomeando como Polícia Militar e colocando as funções de uma forma expressa, desta feita no artigo 57: “A Polícia Militar é uma força auxiliar permanente e regular, reserva do Exército, organizada com base na hierarquia e na disciplina, para manter a ordem pública e a segurança interna no Estado” (GOIÁS, 1967).

Sobre os autores
Rodrigo da Paixão Pacheco

Advogado. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, Família e Sucessões e Advocacia Jovem, da OAB seccional Goiás. Mestrando em Serviço Social pela PUC Goiás. Possui graduação em Direito e Administração PUC Goiás. Pós graduando em Direito Civil e Processo Civil e Direito Penal e Processo Penal pela UCAM/RJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PACHECO, Rodrigo Paixão; PAIXÃO, Pedro Afonso Santos. O ciclo completo de polícia: uma solução?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5650, 20 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67963. Acesso em: 2 nov. 2024.

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