9.
O Controle das Atividades Desenvolvidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público.Caberá ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar originariamente "as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público". Essa competência alcançará, do mesmo modo, as ações decorrentes de atos praticados pelo Corregedor Nacional, que atua como longa manus do Conselho.
Ainda sob a ótica do controle das atividades do Conselho, merece ser lembrado o papel desempenhado pelo Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil: na dicção do art. 130-A, § 4º, da Constituição, caberá a esse agente oficiar junto ao Conselho. Essa atuação se dará na condição de órgão interveniente - o que, por evidente, não exclui a possibilidade, conferida a qualquer do povo, de encaminhar notícias de ilícitos ao Conselho – devendo emitir pronunciamento e podendo fazer uso da palavra, na forma prevista no regimento interno, em todos os procedimentos da alçada do Conselho. Não intervindo, ter-se-á o descumprimento da Constituição e uma causa de nulidade das decisões tomadas.
Quanto à responsabilidade pessoal dos membros do Conselho, embora não seja propriamente um mecanismo de controle externo, deve ser mencionado que caberá ao Senado Federal processá-los e julgá-los nos crimes de responsabilidade (26).
10. Epílogo.
A criação dos Conselhos Nacionais do Ministério Público e de Justiça, como todos bem sabem, estaria associada à alegada necessidade de serem acessados e revisados atos praticados com base na autonomia administrativa e financeira do Ministério Público e do Poder Judiciário, muitas vezes inacessíveis aos mecanismos de controle já existentes. No que concerne ao aspecto disciplinar, a atuação desses Conselhos decorreria de uma reconhecida condescendência dos mecanismos de controle interno quanto aos ilícitos praticados pelos respectivos membros. Abstraindo-nos de concepções corporativas e ideológicas, não se pode negar a existência de uma certa razoabilidade nesses fundamentos.
Espera-se, no entanto, que o lenitivo não termine por gerar mal maior que aquele que buscou combater. Uma interpretação adequada e o uso moderado de seus poderes e atribuições mostram-se imprescindíveis à coexistência dos Conselhos com os órgãos controlados. O agigantamento dos primeiros, com o correlato encolhimento dos últimos, pode trazer consigo a semente do arbítrio e da própria desestabilização do Estado brasileiro, isto porque o contínuo enfraquecimento da autonomia administrativa e financeira conduzirá à indefectível certeza de que a autonomia funcional dos órgãos controlados não tardará em ser alcançada.
As normas constitucionais que disciplinam a atuação dos Conselhos devem ser interpretadas com cautela e responsabilidade, evitando, a todo custo, o desenfreado alargamento dos seus poderes. A não ser assim, o controle externo se transmudará em interno e o Conselho, hoje dissociado das estruturas controladas, em breve absorverá suas atribuições e prerrogativas, terminando por sedimentar uma deletéria subordinação hierárquica.
Notas
1) Art. 103-B, da CR/1988.
2) Art. 130-A, da CR/1988.
3) Art. 128, § 1º, da CR/1988.
4) Art. 103-B, § 1º, da CR/1988.
5) Art. 103-B, § 1º, da CR/1988.
6) Art. 130-A, VI, da CR/1988.
7) Note-se que tal argumento tem cunho meramente propedêutico, pois é possível que a Constituição altere a natureza jurídica de normas infraconsticionais, merecendo ser lembrados, a título de exemplos, o Código Tributário Nacional, sancionado com o status de lei ordinária e recepcionado pelo Constituição de 1988 com o de lei complementar, isto sem olvidar a antiga Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, que tinha o status de lei complementar, mas, em razão do disposto no art. 61, § 1º, II, d, da Constituição da República, foi revogada por uma lei ordinária (Lei nº 8.625/1993).
8) Consoante o referido preceito, "o Congresso Nacional instalará, imediatamente após a promulgação desta Emenda Constitucional, comissão especial mista, destinada a elaborar, em cento e oitenta dias, os projetos de lei necessários à regulamentação da matéria nela tratada, bem como promover alterações na legislação federal objetivando tornar mais amplo o acesso á Justiça e mais célere a prestação jurisdicional".
9) Art. 130-A, § 2º, da CR/88.
10) Art. 130-A, § 2º, I, da CR/88.
11) Consoante o art. 103-B, § 4º, I, da CR/88, dentre as atribuições do Conselho Nacional de Justiça, está a de "zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências." Como não há qualquer limitação quanto à autonomia a ser preservada, não se tardaria em concluir pela possibilidade de serem estabelecidas diretrizes ao exercício da própria função judicante. Além da súmula vinculante, passaríamos a ter o "regulamento vinculante".
12) Com a aceitação do caráter normativo dos princípios, que terminaram por normatizar inúmeros valores de cunho ético-jurídico, a concepção de legalidade cedeu lugar à noção de juridicidade, indicativo de que a atuação do Estado deve estar em harmonia com o Direito, afastando a noção de legalidade estrita – com contornos superpostos à regra –, passando a compreender regras e princípios. O princípio da legalidade passou a ser visto como integrante de um princípio maior: o princípio da juridicidade. Como exemplo desta tendência, pode ser citada a Lei Fundamental de Bonn (após a unificação, entenda-se Constituição), cujo art. 20 estatui que tanto o Poder Executivo como os Tribunais estão vinculados an Gesetz und Recht (à lei e ao Direito). A cunhagem do termo deve-se a Merkl, o qual incluía sob o signo do princípio da juridicidade todo o ordenamento jurídico, abrangendo os regulamentos, os princípios gerais, os costumes etc., tendo reservado a nomenclatura de princípio da legalidade unicamente à lei em sentido formal (Cf. Eduardo García de Enterría y Tomás-Ramon Fernández, Curso de Derecho Administrativo, vol. I, 12ª ed., 2004, p. 443). A exigência de conformação da atividade administrativa ao Direito também indica que o Poder Público não está vinculado unicamente às normas que cria, sendo detectada uma esfera subtraída à sua disponibilidade (Cf. Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, O Sentido da Vinculação Administrativa à Juridicidade, Coimbra: Livraria Almedina, 2003, p. 15), o que é especialmente sentido na carga de valores que repousam sobre os princípios administrativos.
13) Cf. René Chapus, Droit Administratif Général, Tome 1, 15ª ed., Paris: Editions Montchrestien, 2001, p. 1011.
14) Cf. Franco Bassi, Lezioni di Diritto Amministrativo, 7ª ed., Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 2003, p. 65.
15) Art. 130-A, § 2º, V, da CR/1988.
16) Art. 103-B, § 4º, VII, da CR/1988.
17) Art. 130-A, § 2º, III, da CR/1988.
18) Nesse particular, merece menção o inciso LXXVIII do art. 5º da CR/1988, inserido pela EC nº 45/2004: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
19) Art. 130-A, § 2º, III, da CR/1988.
20) Derecho Administrativo Sancionador, 3ª ed., Madrid: Editorial Tecnos, 2002, p. 310.
21) Op. cit., p. 311.
22) Op. cit., p. 312.
23) "Embora o Judiciário não possa substituir-se à Administração na punição do servidor, pode determinar a esta, em homenagem ao princípio da proporcionalidade, a aplicação de pena menos severa, compatível com a falta cometida e a previsão legal" (STF, 1ª T., RMS nº 24.901/DF, rel. Min. Carlos Britto, DJU de 11/02/2005).
24) Art. 130-A, § 3º, da CR/1988.
25) Vide art. 128, §§ 2º e 4º, da CR/1988.
26) Art. 52, II, da CR/1988.