1. INTRODUÇÃO
A obra aristotélica Política, é composta pela reunião de oito livros redigidos pelo filósofo nascido em Estagira, em que compilou seus pensamentos acerca de assuntos políticos. Contudo, para que não se incorra aos riscos do anacronismo, interpretando algum aspecto do passado empregando-lhe injustamente significados contemporâneos, cabe-se notar que o cenário no qual Aristóteles e outros autores que abordaram a política da pólis grega vivenciavam, como destaca Fioravanti (2001), o pensamento político da época era proveniente de um período marcado pela profunda crise e decadência da estruturação política, decorrente da mercantilização criou um temor da stásis, situação na qual o conflito entre ricos e pobres chegaria em um ponto em que a solução não estaria presente no que as condições políticas existentes poderiam oferecer. A reflexão se voltava aos elementos essenciais e originários do Estado e somente estes teriam capacidade de oferecer uma resposta ao conflito que poderia salvar a pólis. É imprescindível o reconhecimento de que a noção de constituição é fundamentalmente divergente do que é convencionado pós-positivismo, extremamente formal e complexo; de sorte que, o termo no sentindo clássico é empregado pela busca de um governo que viabilize a unidade e indissolubilidade da sociedade e dos poderes públicos, ou seja, um sistema que permita organizar e controlar os componentes sociais, de forma pacífica e que se finde esgote na sensação de pertencimento a um Estado que é superior à todas as subdivisões de classes e conseguintes conflitos inerentes a ele. (FIORAVANTI, 2001)
Realizadas as devidas considerações, o presente trabalho tem por objetivo, se valendo do aprendizado adquirido na matéria de Ética e Direito em cotejo com a bibliografia de outras disciplinas, realizar uma análise tópicos precisos da obra Política de Aristóteles, tais como a contraposição do conceito de política da teoria aristotélica e as evidentes divergências no caso da modernidade, ou no caso das formas de governo e suas respectivas corrupções e a ponte traçada à luz da teoria kelseniana, além de um estudo das motivações da multiplicidade de formas de governo, e ainda a definição da melhor forma de governo e necessidade de sua aproximação para que haja um equilíbrio para as tensões originadas pelos conflitos entre classes.
2. CONCEITO DE POLÍTICA: ARISTÓTELES X MODERNIDADE
Em seu discurso, Aristóteles enfatiza que toda sociedade é construída em torno de algum bem, onde todos os homens tomam atitudes que condizem com aquilo que lhes parece bom.Assim, todas as comunidades estão vinculadas por algum bem, ou seja, possuem um bem o qual permite que se alcancem um fim (finalidade). Dessa maneira, o autorevidencia a necessidade dos homens de viverem em sociedade para se obter uma melhor qualidade de vida, onde o Estado surge como provedor da ordem e a justiça como base da sociedade.
Para o filósofo, a política é uma das ciências mais importante, senão a principal, pois ela coordena as outras a fim de servirem-se mutuamente na cidade. A função da política se baseia na pesquisa de qual o melhor regime de governo e quais são as associações capazes de assegurarem a felicidade coletiva. Ao contrário de Platão, Aristóteles realizou uma filosofia prática e não ideal, onde o Estado age com a finalidade de constituir a máxima satisfação da comunidade, enfatizando a sua relação com a natureza e tornando impossível a existência do indivíduo sem o Estado. Daí surge a expressão que o homem é um “animal político”:
Fica evidente, portanto, que a cidade participa das coisas da natureza, que o homem é um animal político, por natureza, que deve viver em sociedade, e que aquele que, por instinto e não por inibição de qualquer circunstancia, deixa de participar de uma cidade, é um ser vil ou superior ao homem. Esse indivíduo é merecedor, segundo Homero, da cruel censura de um sem-família, sem leis e sem lar. Pois ele tem sede de combates e como as aves rapinantes, não é capaz de se submeter a nenhuma obediência (ARISTÓTELES, 2003, p. 14).
Assim, o homem possui uma necessidade por natureza de conviver em comunidade, para a obtenção da felicidade e do bem comum, sendo até enfatizado por ele que, aquele homem que não precisa viver em sociedade, é considerado um Deus ou uma Besta. “Ora, o que não consegue viver em sociedade, ou que não necessita de nada porque se basta a si mesmo, não participa do estado; é um bruto ou uma divindade. A natureza faz assim com que todos os homens se associem” (ARISTÓTELES, 2003, p. 15).
Em suma, toda comunidade é uma forma de associação e organização que visa como finalidade algum bem. Assim, há uma tendência natural das pessoas se agruparem para a formação da comunidade política, visto que a garantia do próprio bem não advém sem família ou sem governo. Portanto, há um apoio coletivo para a manutenção de uma vida boa e saudável para todos. O autor evidencia também o aspecto da diferença entre escravos e senhores, onde a cidade é dividida entre as classes superiores, que são os homens livres e virtuosos como magistrados e guerreiros, e as classes inferiores, que são escravos os quais são incapazes de governar a si mesmo e, assim, devem ser governados. Dessa maneira, o cidadão é caracterizado como politicamente ativo, que participa das atividades públicas, ao contrário do escravo e artesão, os quais não são livres e não possuem tempo para exercer a cidadania, e que, por consequência, não atingem sua virtude conflitante com a vida mecânica.
Fica demonstrado, de modo evidente, o que o escravo é em si, e o que pode ser. Aquele que a si mesmo não se pertence, porém pertence a outro, e, contudo, é um homem, esse e naturalmente escravo. Ora se um homem é de outro, é algo possuído, ainda que seja homem. E uma coisa possuída é um instrumento de uso, separado do corpo a que pertence (ARISTÓTELES, 2003, p. 17).
A respeito dos governos de alguns estados, o autor pressupõe que um estado bem construído se caracteriza quando possui uma constituição que se vincula com a melhor legislação do sistema e se esse sistema político não seja desviado, suprindo as primeiras necessidades da vida dos cidadãos, um dos aspectos mais árduos de se estabelecer. Examinado o conceito de política segundo Aristóteles, é possível afirmar que se trata de uma dimensão ideal quando comparada a nossa realidade atual, pois a política e os que a governam forneceram um sentido totalmente oposto ao conceito citado. O que podemos visualizar desse panorama é que muitos tratam a política como uma carreira e deixam de lado o verdadeiro compromisso que possuem com a comunidade. Muitas vezes, os políticos aproveitam a oportunidade do poder a eles concedidos para benefício pessoal, por meio da corrupção que gera desordem e atraso social.
Tomemos como exemplo o caso do Brasil, que, no transcorrer da história, tanto no Império, quanto na República é possível e lamentável reconhecer muitas barbaridades e brutalidades políticas que ocorrerem contra a população como enforcamento e esquartejamento, apenas para afirmar o poder e a força que alguns governantes possuíam.Ainda hoje, mesmo após muitos anos, encontramos atrocidades, nem todas de cunho físico, mas de toda ordem. Governantes que dispõem da responsabilidade de assegurar o bem comum, que é justamente o que caracteriza o argumento-base de Aristóteles sobre a política, desfrutando dos impostos da própria população, por meio de desvio de verbas, em favor de benefícios e fins pessoas. Ou seja, políticos que dizem honrar o interesse público acima de tudo, sempre portam consigo segundas intenções para satisfazer as vontades individuais e construir seu próprio patrimônio.
Retornando a perspectiva de Aristóteles, a causa desses homens buscarem o aumento do dinheiro sem fim está baseada na concepção de que os homens se preocupam em viver de qualquer jeito, não se interessam em viver bem, que é justamente o conceito de viver segundo a virtude. De fato, se quiserem viver segundo a virtude, simplesmente se contentariam com aquilo que contribuísse para a manutenção da natureza. Mas infelizmente, rejeitaram essa alternativa e optaram por cada um viver segundo a sua vontade e aspiração. É lamentável ver a ganância dos representantes políticos, no sentido de não importar o que se deve fazer para chegar e alcançar os objetivos que desejam, mesmo que isso custe o senso de ética e a responsabilidade social. Outrossim é a utilização da mídia como forma de direcionar o pensamento e a opinião pública que, em sua maioria, não possuem informação e discernimento, para justificar seus projetos sociais repletos de segundas intenções.
3. FORMAS DE GOVERNO: DA PERSPECTIVA ARISTOTÉLICA À VISÃO KELSENIANA
Na obra sobre comento, Política de Aristóteles (384 - 322 a.C.), foi construído um raciocínio a fim de se estabelecer o que vinham a ser as clássicas Formas de Governo existentes na Antiguidade, não passando por processos de variância durante um grande intervalo de tempo. São dedicados dois livros da obra, o terceiro e o quarto, com o intuito de descrever e classificar tais formas. Para se formular essa argumentação o autor descreve outros termos específicos, como por exemplo cidade, cidadão e constituição, com a finalidade de conceituar tais modelos de modo mais fidedigno.
No texto em questão encontrar-se-á uma síntese a respeito das formas clássicas de governo, além de se fazer uma ligação com uma outra matéria cursada ao longo do semestre, Teoria Geral do Estado, com o professor Menelick. Uma espécie de ponte será construída para que se possa fazer uma contraposição entre os ensinamentos expostos nas duas disciplinas. Por um lado, será feito uma exposição das formas de governo clássicas, encontrada em Política de Aristóteles, como dito anteriormente, situada no âmbito da Ética e Direito, já pelo outro será feito uma análise a respeito da mudança ocorrida na classificação das formas de governo proposta por Kelsen na obra Teoria Pura do Direito e do Estado.
Os primeiros capítulos do livro III se iniciam com a elaboração de algumas sentenças fundamentais para o desenrolar da obra, tais palavras passam por uma espécie de evolução conceitual, uma vez que os significados variam ao longo do texto, até se chegar concepção final consensual. A pergunta introdutória consiste em definir o que é uma cidade, posteriormente tem-se outra arguição visando chegar a ideia do que é um cidadão, além de se procurar entender o que podia ser qualificado como constituição. Todos esses termos amalgamados forneceram os fundamentos necessários para a formulação da categorização das formas de governo.
Para se entender o que é cidade é necessário primeiramente definir o cidadão, pois segundo Aristóteles cidade é porção de cidadão. Dessa forma cidadão, em Aristóteles, é definido como aquele que possui “a participação legal na autoridade deliberativa, e na autoridade judiciária” (ARISTÓTELES, 2002, p. 79), em suma, cidadão é aquele indivíduo cujo a característica principal é o fato de apresentar o poder de participar da administração da justiça e de cargo público, todavia ressalvando que tal conceituação só pode ser atribuída à membros da Democracia. Cidadão é definido como “o que desfruta o direito de chegar às magistraturas” (ARISTÓTELES, 2002, p.85). Já a cidadania é delineada como algo proveniente da relação de igualdade entre os homens perante a lei, e não relacionado ao estabelecimento em um território.
Ainda levando em consideração o conceito de cidadania descrito por Aristóteles pode ser feito um paralelo com a teoria do Marcelo Neves, estabelecida na modernidade, uma vez que segundo ele o princípio da igualdade é o núcleo da cidadania, como um aparato mecanicista responsável pela inclusão social no âmbito jurídico político, em síntese é “uma pluralidade de direitos reciprocamente partilhados e exercitáveis contra o Estado” (NEVES, 1994, p.175), sendo uma conceituação um pouco semelhante com o escrito em Política.
A partir da definição de cidadão foi possível determinar o que o termo cidade poderia significar, assim chegou-se a conclusão de que o termo representaria “a multidão de cidadãos capaz de ser suficiente a si próprio, e de conseguir, de modo geral, quanto seja necessário à sua existência” (ARISTÓTELES, 2002, p. 79).
Cabe ainda afirmar em relação ao estabelecido, segundo Aristóteles, que a cidade é sempre a mesma desde que os homens continuem a residir em um mesmo local, juntamente com a estatização da espécie de seus membros, isto é, seus moradores. Ainda conforme esse raciocínio percebe-se que devido ao fato de a cidade consistir em uma espécie de comunidade, uma tipologia de governo entre os cidadãos, a partir do momento em que a forma de governo sofre uma modificação e passa a representar algo diferente do estabelecido anteriormente, torna-se obrigatório que a cidade também se apresente como algo alterado.
Em um outro momento, Aristóteles descreve uma ideia geral de virtude do cidadão. Fazendo uma análise dos fatos verifica-se que a “salvação da comunidade é a ocupação de todos os cidadãos” (ARISTÓTELES, 2002, p.82), independente das disparidades existentes entre os indivíduos. Define-se que a composição da comunidade é forma de governo atribuída, dessa forma “é necessário, portanto que a virtude do cidadão esteja em relação com a forma política” (ARISTÓTELES, 2002, p.82). A virtude perfeita é aquela que caracteriza o homem de bem, que conforme o autor é mandar, já a virtude do cidadão é obedecer e mandar.
A partir do capítulo IV do terceiro livro, Aristóteles começa a desenvolver o conceito de constituição de um Estado como sendo a “organização regular de todas as magistraturas, sobretudo da magistratura que é dona e rainha de tudo. Em todo lugar o governo do Estado é soberano. A Constituição mesma é o governo” (ARISTÓTELES, 2002, p.87), conforme Norberto Bobbio, essa classificação de constituição, como uma ordenação de magistraturas, corresponde:
A “grosso modo”, ao que entendemos hoje como constituição Digo “grosso modo”porque hoje incluiríamos algo mais numa constituição: quando nos referimos à constituição italiana, francesa ou chinesa falamos da lei fundamental de um Estado, que estabelece seus órgãos, as respectivas funções, relações reciprocas, ete (BOBBIO, p.55).
Bobbio afirma em sua obra que o termo empregado por Aristóteles como forma de governo é traduzido como constituição. No Livro Política existem diversas definições de constituição, uma delas está presente no livro III e pode ser simplificada em representar uma estrutura que é responsável por dar ordem à cidade, “determinandoo funcionamento de todos os cargos públicos e sobretudo da autoridade soberana ” (BOBBIO, p.55).
Aristóteles considera, após a análise de mais de 150 constituições, pelo método indutivo, percebe que não existe um governo ideal para todo os povos, há, todavia, um governo específico que depende das especificidades dos povos a serem governados, assim ele afirma que as palavras constituição e governo querem dizer a mesma coisa, “considerando-se que o governo é autoridade suprema nos Estados” (ARISTÓTELES, 2002, p. 89), e que certa autoridade suprema deve estar concentrada, necessariamente, nas mãos de uma pessoa apenas, ou em diversas ou em uma multidão, infere-se a possibilidade de que esses se indivíduos que estão no governo utilizarem da autoridade tendo como referência o interesse coletivo, a constituição é “pura e sadia, obrigatoriamente”. Se em vez dessa possibilidade o governo usufrui da autoridade a fim de se realizar algo visando o seu interesse particular, “quer dizer no interesse de um apenas, ou de muitos, ou da multidão, a constituição é viciada, corrompida” (ARISTÓTELES, 2002, p. 89). Em suma, Aristóteles classifica tais formas tendo vista dois critérios, um moral que divide as formas em puras e impuras, conforme a qualidade e a quantidade exercida, e o segundo classifica o governo conforme a concentração do poder exercido, se está nas mãos de um só, de poucos, de muitos ou de todo o povo.
Dessa forma ele diz que os governos que perseguem interesses coletivos, consideradas as formas não corrompidas, isto é, as benéficas são a monarquia – realeza que visa o comum – a aristocracia – um governo de um pequeno grupo de homens – e a república – uma multidão que governa em direção ao comunitário. Pelo outro lado é afirmado que os governos viciados são a tirania para a monarquia, a oligarquia para a aristocracia e a demagogia para a república, todas essas formas são corrompidas pelo mal devido o fato de não perseguirem interesses coletivos, ou seja, são governos que realizam suas funções tendo como guia de suas ações o particularismo de cada governante. Assim dentre as piores formas de governo afirma-se que a Democracia é a melhor, e tendo em vista as formas boas de governo, a Monarquia é considerada a mais eficiente.
BOM |
RUIM |
|
UM |
MONARQUIA |
TIRANIA |
POUCOS |
ARISTOCRACIA |
OLIGARQUIA |
VÁRIOS |
REPÚBLICA |
DEMOCRACIA |
A partir do exposto nas aulas de Teoria Geral do Estado é possível fazer um paralelo no qual as formas de governo são vistas no primeiro artigo das constituições, indicando o fundamento de legitimidade do poder, sendo o princípio estruturante e fundamental deste, consistindo no fundamento filosófico do exercício de poder, isto é, como o poder se justifica filosoficamente, organizando e disciplinando as relações entre governantes e governados, a partir do fundamento da soberania. Já os regimes de governo são identificados por representar a organização dos poderes para o exercício de um poder mais técnico, referindo-se a forma como o poder se estrutura para o seu exercício, sendo o primeiro tópico da organização estatal, mais operacional e técnico, que envolve as regras de articulação politica, além de indicar como os órgãos se encadeiam para o exercício de tal.
Logo após a Segunda Guerra Mundial, Kelsen propõe autocracia e democracia no lugar de monarquia – relacionado com o que ocorreu com as monarquias constitucionais (na qual o rei governa, ele é chefe do Estado e do Governo) ao final da primeira guerra mundial, que desaparecem devido graves problemas (como a própria Alemanha). A monarquia então deixa de ser forma de governo pois deixa de afetar a titularidade do poder, devido a uma profunda alteração nos sistemas jurídicos – o sufrágio universal, movimentos sociais e sociedades de massas – Kelsen propões um novo binômio a fim de classificar as formas de governo, passando a considerar a Monarquia e a República como formas históricas e adotando a Democracia e a Autocracia como especificações mais atuais.
A teoria política da Antiguidade distinguia três formas de Estado: monarquia, aristocracia e democracia, onde a organização do poder soberano era apresentada como critério de dessa classificação.
O principal critério utilizado era embasado no poder soberano e na quantidade numérica dos detentores desse poder, assim quando o poder soberano pertencia a apenas um indivíduo, dizia-se que o governo, ou a constituição, era monárquica, por outro lado, quando o poder pertencia a vários indivíduos, a constituição era chamada de republicana. Contudo, para Kelsen, o número de pessoas em cujas mãos se encontram o poder soberano é, porém, um critério bastante superficial de classificação, logo insuficientes, uma vez que o poder do Estado é a validade, a eficácia da ordem jurídica. As novas formas propostas (Democracia e Autocracia) são estabelecidas fundamentadas na ideia de liberdade política.
A modificação na classificação foi feita tendo vista a função da defesa da Democracia, do compromisso filosófico, sendo que para ter igualdade é necessário o aspecto formal. A Teoria Pura do Direito foi formulada com o intuito de coibir abusos das autoridades.
Assim a Democracia significa que a vontade representada na ordem jurídica do Estado é idêntica as vontades dos sujeitos. O ideal de autodeterminação exige que a ordem social seja criada pela decisão unânime de todos os seus sujeitos e que permaneça em vigor apenas enquanto goza da aprovação de todos. A ordem social pode ser modificada apenas com a aprovação de todos os sujeitos; e cada sujeito é obrigado pela ordem social na medida em que o consinta.
A Autocracia é o oposto da Democracia, é a escravidão da Autocracia. Os sujeitos são excluídos da criação da ordem jurídica, não existindo harmonia entre a ordem jurídica e as vontades pessoais, não havendo garantia. A forma mais pronunciada da Autocracia é a Monarquia Absoluta, também conhecida como despotismo, a ordem jurídica, em todos os seus estágios, é criada e aplicada diretamente pelo monarca ou por órgãos que ele nomeou. O monarca não pode ser responsabilizado pessoalmente; não está sob a lei, já que não está sujeito a quaisquer sanções jurídicas(KELSEN, 1998, pp. 405-406).
No real cenário político, não existe nenhum Estado que se enquadre completamente a uma ou outra tipologia classificada como ideal. Cada Estado representa uma compilação de ambos os elementos presente na democracia e autocracia. Entre os dois extremos existe uma imensidão de estágios intermediários, nos quais os Estados formulam os melhores formatos de governo a fim de atender à todas as necessidades. Segundo Kelsen e conforme a terminologia usual, um Estado é chamado democracia se o princípio democrático prevalece na sua organização, e um Estado é chamado de autocracia se o princípio autocrático se sobrepõe(1998, p. 407).
Hodiernamente fala-se em regime ou sistema de governo, e não formas. A forma de todas monarquias, a título de citação, seria atualmente a democracia. A coroa ocupa um dos lugares mais poderosos que há, pois envolve a totalidade (representação), tendo função simbólica – sendo que para Carl Schimitt essa característica é ainda mais relevante que a aplicação da razão. Na sociedade de massas nascentes no século XX, esse aspecto passa a ser extremamente importante, tendo como exemplo os regimes nazistas e fascistas presentes na Europa, nos quais se têm a junção da posição de presidente e de chefe de Estado. Assim a função da coroa deveria ser garantir que o poder de mando no Estado fosse de responsabilidade do parlamento, isto é, a grande maioria.