Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

O terceiro mundo e a globalização

Exibindo página 2 de 2
Agenda 01/05/2000 às 00:00

QUARTA PARTE – A CONSTITUIÇÃO

Se para Sieyés, apenas a Nação teria o poder de elaborar uma Constituição, e conseqüentemente, a França não possuía uma verdadeira Constituição, no Mundo de hoje, sob o enfoque das relações internacionais, podemos afirmar, do mesmo modo, que inexiste uma "Constituição", no sentido de um conjunto de normas jurídicas elaboradas de modo a que o poder delegado (pelo povo) jamais possa tornar-se prejudicial a seus constituintes.

"A Nação existe antes de tudo, dizia Sieyés. Ela é a origem de tudo. Sua vontade é sempre legal, ela é a própria lei. Antes dela e acima dela, existe apenas o direito natural. "

Na mesma linha de raciocínio e admitida a vitória dessas idéias defendidas pelos revolucionários franceses, a tal ponto que hoje todos os Países se dizem democráticos, então é evidente que, no plano internacional, também o povo existe antes de tudo e sua vontade deve ser sempre a lei suprema. Sua vontade será sempre legal e não poderá ser subordinada aos interesses particulares dos diversos Estados e nem mesmo aos do "condomínio oligárquico" que dividiu entre si o governo do Mundo.

A Constituição Brasileira, apesar de ter sido elaborada por um Órgão Constituinte, que seria, teoricamente, capaz de representar o povo, e que aliás é a nossa sétima Constituição, não passa de uma folha de papel, desvinculada da realidade e incapaz de garantir os direitos e deveres que teoricamente assegura. E o Governo representa menos o povo do que os interesses do sistema financeiro e da globalização, recebendo ordens externas, conforme a notícia acima transcrita, a respeito das exigências do Bird.

O Estado é criação do Homem, existindo assim para cumprir a destinação que lhe foi reservada, sem no entanto poder sobrepujar, por si só, seu criador. Tudo deve ter sempre sua origem e sua finalidade na pessoa humana e em seus direitos fundamentais, considerada sua preexistência. O que vem sendo feito, a nível mundial, não desmente, absolutamente, essas assertivas, mas comprova, tão-somente, a eventual preponderância da força sobre o Direito, embora essa eventualidade seja, de certo modo, crônica.

A força da Monarquia Absolutista foi substituída pela das grandes potências. As masmorras da Idade Média e as da Bastilha cederam seu lugar às dependências policiais e dos órgãos de espionagem e informações. As torturas e os canhões têm hoje sucedâneos muito mais eficientes no emprego dos meios de extermínio de massa, tais como o Napalm e a chamada guerra química ou bacteriológica. Finalmente, o aparelhamento tributário da Monarquia foi substituído pelo sistema financeiro internacional e pela inflação.

O povo continua sendo o Terceiro Estado – ou o Terceiro Mundo - que apesar de ser reconhecido como o titular do Poder Constituinte, nada tem sido até a presente data e que apenas deseja "tornar-se algo".

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Mas seria isso possível, em uma ordem mundial que, curiosamente, pode ser descrita, também, com as palavras de Sieyés, quando se referia à separação existente, na França, entre clero, nobreza e povo?

"Não existe, diz uma máxima do Direito Universal, maior falta do que a falta de poder. Sabemos que a nobreza não foi indicada pelo clero e pelo terceiro estado para representá-los . O clero não está, absolutamente, encarregado da procuração dos nobres e dos comuns. Decorre daí que cada ordem é uma nação distinta, que não é mais competente para se imiscuir nos negócios das outras ordens, do que os Estados Gerais da Holanda ou o Conselho de Veneza, por exemplo, possam votar nas deliberações do Parlamento Inglês. Um procurador não pode ligar senão seus comitentes, um representante não tem o direito de falar senão por seus representados. Se se desconhece essa verdade, é preciso anular todos os princípios.

"Vê-se, assim, que é, na realidade, perfeitamente inútil, procurar a relação ou a proporção de acordo com a qual cada ordem deva concorrer para formar a vontade geral. Essa vontade não pode ser una, enquanto subsistem três ordens e três representações. No máximo, essas três assembléias poderão se reunir no mesmo intento, como três nações aliadas podem ter o mesmo desejo. Mas não conseguireis jamais uma nação, uma representação e uma vontade comum. Eu sinto que essas verdades, por mais seguras que sejam, tornam-se embaraçosas em um Estado que não se formou sob os auspícios da razão e da eqüidade política. Que quereis? Vossa casa só se sustenta por artifício, com o auxílio de uma floresta de esteios informes colocados sem gosto e sem esquema, que não seja o de escorar as partes à medida em que elas ameaçam cair; é preciso reconstruí-la, ou resolver-vos a viver ao relento, no dia em que a tortura e a inquietude de ser, enfim, derrubem essas ruínas."

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:

Qual poderia ser a relação, ou a proporção, segundo a qual cada País deveria concorrer para formar a vontade geral ? Essa vontade não pode ser uma, enquanto subsistir a distinção entre os Países Ricos e o Terceiro Mundo. É evidente que o Mundo também não se formou sob os auspícios da razão e da eqüidade política. Hoje, nem mesmo o relento restaria aos sobreviventes dessas ruínas, fundadas na injustiça e no absurdo.

Para que se possa esperar um futuro melhor, há que introduzir, nas relações internacionais, dois novos princípios: o da razão e o da eqüidade. Afinal, como perguntaria Sieyés, se pudéssemos colher da injustiça e do absurdo os mesmos frutos que da razão e da eqüidade, onde estariam então as vantagens destas?

Resta-nos esperar, apenas, que prevaleçam esses princípios e que o LUCRO seja derrubado do altar em que o colocaram, para que seja abolida, no âmbito internacional, por parte das multinacionais que decidem os destinos dos povos, essa atuação injusta e predatória.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Fernando. O terceiro mundo e a globalização. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 41, 1 mai. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69. Acesso em: 19 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!