RESUMO: O presente trabalho tem como enfoque o uso do instituto da condução coercitiva para interrogatório do réu. É cediço que a medida a que se faz alusão recebe tratamento no ordenamento jurídico brasileiro e está presente tanto no Código de Processo Penal quanto na legislação extravagante, sendo utilizada, notadamente, para garantir o comparecimento de determinados sujeitos aos atos processuais, diante de sua respectiva recalcitrância. Não obstante, no presente estudo, o aprofundamento do assunto recaiu sobre a utilização do referido procedimento para consecução do interrogatório do acusado ou investigado. É nítida a relevância do instituto em análise, principalmente no que tange à abordagem dos aspectos relacionados com os direitos fundamentais estatuídos na Constituição Federal. Nesse sentido, em um primeiro momento, buscou-se fazer uma explanação acerca do interrogatório, destacando-se sua natureza jurídica, características e formalidades. Após, visou-se abordar o conceito da condução coercitiva e de suas duas principais modalidades, evidenciando-se sua aplicabilidade como decorrência do poder geral de cautela do juiz. Em seguida, adentrou-se mais especificamente no estudo do tema em apreço, com exposição da concepção adotada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental 395 e 444, sendo constados os argumentos invocados e os votos dos Ministros do Pretório Excelso. Para o alcance dos objetivos propostos, utilizou-se a pesquisa qualitativa, com emprego do método dedutivo, partindo-se, então, de uma premissa geral para se chegar às especificidades do tema escolhido. Em sede de considerações finais, foi aduzida a inconstitucionalidade da condução coercitiva do acusado ou investigado por ser considerada ofensiva à presunção de não culpabilidade e à liberdade de locomoção.
Palavras-chave: Condução coercitiva. Interrogatório do réu. Supremo Tribunal Federal. Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental 395 e 444. Inconstitucionalidade.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como precípua finalidade realizar uma abordagem acerca do instituto da condução coercitiva determinada com o fito de se proceder à realização do interrogatório do réu.
O procedimento em estudo sempre constituiu objeto de questionamentos jurídicos, sob o argumento que estaria ferindo vários preceitos estampados no bojo da Constituição Federal.
Calha trazer à baila que o assunto ganhou relevo e foi alvo de discussão no âmbito nacional quando o juiz Sérgio Moro, durante a persecução da Operação Lava Jato, determinou a condução coercitiva do ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ocorrida no dia 04 de março de 2016.
Em razão disso, houve deflagração de duas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental junto ao Supremo Tribunal Federal, questionando a (in) constitucionalidade da medida. Nesse viés, buscou-se explicitar as teses que foram acolhidas pelo Pretório Excelso, bem como os termos da decisão definitiva prolatada.
Como forma de consubstanciar as alegações explicitadas no decorrer do presente estudo, imprescindível se faz a transcrição de entendimentos doutrinários, bem como a posição exarada nas aludidas ações judiciais. Nesse sentido, para alcançar os desideratos propostos, o trabalho se desdobra em três capítulos.
O capítulo inaugural se dedica à apresentação do interrogatório, explicando-se seu conceito, principais características, natureza jurídica e algumas formalidades a serem observadas.
O segundo capítulo trata da condução coercitiva, notadamente no que tange à sua definição e aspectos legais, com enfoque na pessoa do acusado ou investigado.
O último desdobramento do trabalho diz respeito aos tópicos mais específicos do tema escolhido, sendo realizada uma análise acerca do julgamento proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, em sede de medida cautelar, nas ADPF’s 395 e 444, destacando-se os direitos que foram afrontados pela aludida medida. Em seguida, houve exposição dos votos dos demais Ministros quando do julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.
Por fim, há a exposição das considerações finais relativas ao percurso da pesquisa realizada, momento em que são expostos pensamentos conclusivos do presente trabalho, mormente no que concerne à concepção adotada pela Corte Suprema a respeito do assunto em evidência.
2. INTERROGATÓRIO DO RÉU
Antes de proceder à análise da condução coercitiva, primeiramente se faz necessário discorrer a respeito do fim que a justifica, mormente no que diz respeito à realização do interrogatório.
Nesse sentido, dedica-se este capítulo à exposição acerca do interrogatório, destacando-se sua definição, natureza jurídica, características e formalidades.
2.1 Definição
O interrogatório encontra-se previsto nos artigos 185 a 196 do Código de Processo Penal, consistindo no momento processual em que é conferida àquele sobre o qual recai imputação de natureza penal a oportunidade de relatar, caso assim deseje, sua versão a respeito dos fatos.
No que tange ao conceito do instituto estudado, insta salientar que:
[...] é a fase da persecução penal que permite ao suposto autor da infração esboçar a sua versão dos fatos, exercendo, se desejar, a autodefesa. Terá o imputado contato com a autoridade, o que lhe permite indicar provas, confessar a infração, delatar outros autores, apresentar as teses defensivas que entenda pertinente, ou valer-se, se lhe for conveniente, do direito ao silêncio. (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 552).
Nessa senda, infere-se que consiste em ato personalíssimo, haja vista que o réu, quando da realização de seu interrogatório, não poderá ser representado por outrem. .
2.2 Natureza jurídica
Quanto à natureza jurídica, imperioso se faz mencionar que existem quatro correntes doutrinárias que tratam do assunto. Antes de proceder à análise de cada uma delas, faz-se mister destacar:
Que continue a ser uma espécie de prova, não há maiores problemas, até porque, as demais espécies defensivas são também consideradas provas. Mas o fundamental, em uma concepção de processo via da qual o acusado seja um sujeito de direitos, e no contexto de um modelo acusatório, tal como instaurado pelo sistema constitucional das garantias individuais, o interrogatório do acusado encontra-se inserido fundamentalmente no princípio da ampla defesa. (OLIVEIRA, 2014. p. 380).
A primeira delas leva em consideração a posição topográfica que o interrogatório ocupa no âmbito do Código de Processo Penal e, por conseguinte, considera o interrogatório como meio de prova. Nesse diapasão, colaciona-se que:
[...] num sistema inquisitorial, em que o acusado é objeto de prova, a tendência é considerar o interrogatório como meio de prova. Como tal, o acusado não pode deixar de responder às indagações que lhe forem feitas, está obrigado a responder e não pode invocar em seu benefício o direito ao silêncio. Confirmando seu viés inquisitorial, o Código de Processo Penal em vigor sempre considerou o interrogatório como meio de prova. A própria posição topográfica que o interrogatório ocupa no CPP, dentro do Capítulo III (“Do interrogatório do acusado”) do Título VII (“Da prova”) reforça esse entendimento. (LIMA, 2018, p. 679).
A segunda posição considera o interrogatório como meio de defesa, sob a luz da garantia ao silêncio, sem prejuízo ao réu, conforme consagrado no artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal. (BRASIL, 1988).
Trata-se do posicionamento adotado pelo renomado jurista Paulo Rangel, o qual elucida que:
Tem natureza jurídica de um meio de defesa, pois é dado ao acusado o direito constitucional de permanecer calado, sem que o silêncio acarrete-lhe prejuízos, pois o parágrafo único do art. 186 do CPP veda expressamente aquilo que a CRFB já fazia, mas precisava de uma lei para dar efetividade à Constituição, o que, por si só, caracteriza um absurdo incomensurável. Ademais, o interrogatório é realizado depois da oitiva das testemunhas, isto é, como instrumento de defesa. (2012, p. 570).
Imperioso se faz consignar que o parágrafo único do artigo 186 do CPP elucida que “o silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa”. (BRASIL, 1941). Considerando essa disposição, Capez (2016) entende que esse dispositivo normativo reforça a natureza jurídico-constitucional de autodefesa do interrogatório, sendo que o acusado decide se apresenta sua versão fática ou fica em silêncio.
Impende consignar quais são os consectários processuais ao se considerar o interrogatório como meio de defesa. Nesse diapasão, preconiza-se que:
[...] A primeira consequência, já reconhecida, é a impossibilidade de haver prejuízo ao imputado por ter invocado o direito ao silêncio, pois este não pode levar à presunção de culpa. Uma segunda seria a impossibilidade de condução coercitiva daquele que mesmo citado pessoalmente, deixa de comparecer ao ato. A ausência deve ser encarada como expressão da autodefesa, evitando-se o constrangimento de trazer o réu, mesmo a contragosto, para a audiência. Uma terceira consequência avistável é a impossibilidade de decretação da revelia do réu ausente, pois o não comparecimento não poderá trazer prejuízos processuais. (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 552).
Há, ainda, a doutrina que atribui ao interrogatório natureza mista, considerando-o como meio de prova e de defesa. Assim:
Na verdade, o interrogatório é essencialmente meio de autodefesa, porque eventualmente também pode funcionar como meio de prova, caso e quando o interrogando decida responder às perguntas formuladas. Na medida em que o magistrado pode se servir de elementos constantes do interrogatório para formar seu convencimento, também se trata de meio de prova. (LIMA, 2018, p. 679).
Por fim, há aqueles que defendem que o interrogatório pode ser visto como meio de defesa e, eventualmente, fonte de prova. Dessa forma, “quando o acusado opta por responder às perguntas formuladas, dando sua versão sobre os fatos, caberá ao juiz diligenciar sobre as fontes de prova por ele reveladas”. (LIMA, 2018, p. 679).
2.3 Momento para realização do interrogatório
É importante destacar que a Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, promoveu algumas alterações na sistemática concernente ao interrogatório com o fito de haver coadunação com a Constituição Federal.
Antes da entrada em vigor da aludida lei, o interrogatório era o primeiro ato da instrução processual, sendo que só depois o acusado era intimado para apresentação de defesa prévia, com a posterior inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa.
Com a reforma processual penal ocorrida em 2008, o interrogatório passou a ser concretizado ao final da instrução, conforme se infere na nova redação conferida ao artigo 400 do CPP, in verbis:
Art. 400. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado. (BRASIL, 1941).
No procedimento do júri, em ambas as fases, o interrogatório também passa a ser o último ato da instrução, consoante se depreende do disposto nos artigos 411, caput, e 474, caput, da Lei Adjetiva Penal.
Em que pese a modificação supramencionada, em determinados procedimentos especiais o texto legal continua prevendo o interrogatório como primeiro ato da instrução processual, como, verbi gratia, na Lei de Drogas (Lei n. 11.343/06, art. 57), Lei de Licitações (Lei n. 8.666/93, art. 104), no processo penal militar (CPPM, art. 302 c/c art. 404, caput) e no procedimento originário dos Tribunais (Lei n. 8038/90, art. 7º).
No entanto, quando do julgamento do Agravo Regimental na Ação Penal número 528, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a modificação introduzida pela Lei n. 11.719/08 no que tange ao momento do interrogatório deve ser aplicada nos processos de competência originária daquela Corte nos quais ainda o ato não foi realizado. Nesse sentido, à guisa de elucidação, colaciona-se ementa do aludido julgado:
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. INTERROGATÓRIO NAS AÇÕES PENAIS ORIGINÁRIAS DO STF. ATO QUE DEVE PASSAR A SER REALIZADO AO FINAL DO PROCESSO. NOVA REDAÇÃO DO ART. 400 DO CPP. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – O art. 400 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.719/2008, fixou o interrogatório do réu como ato derradeiro da instrução penal. II – Sendo tal prática benéfica à defesa, deve prevalecer nas ações penais originárias perante o Supremo Tribunal Federal, em detrimento do previsto no art. 7º da Lei 8.038/90 nesse aspecto. Exceção apenas quanto às ações nas quais o interrogatório já se ultimou. III – Interpretação sistemática e teleológica do direito. IV – Agravo regimental a que se nega provimento. (AP 528 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 24/03/2011, DJe-109 DIVULG 07-06-2011 PUBLIC 08-06-2011 EMENT VOL-02539-01 PP-00001 RT v. 100, n. 910, 2011, p. 348-354 RJSP v. 59, n. 404, 2011, p. 199-206).
Nessa mesma linha de entendimento, o Plenário da Corte Suprema, no julgamento do Habeas Corpus número 127.900, entendeu que o interrogatório também deveria ser exigido ao final da instrução no âmbito do processo penal militar. Nesse diapasão, colaciona-se o respectivo excerto ementário:
EMENTA Habeas corpus. Penal e processual penal militar. Posse de substância entorpecente em local sujeito à administração militar (CPM, art. 290). Crime praticado por militares em situação de atividade em lugar sujeito à administração militar. Competência da Justiça Castrense configurada (CF, art. 124 c/c CPM, art. 9º, I, b). Pacientes que não integram mais as fileiras das Forças Armadas. Irrelevância para fins de fixação da competência. Interrogatório. Realização ao final da instrução (art. 400, CPP). Obrigatoriedade. Aplicação às ações penais em trâmite na Justiça Militar dessa alteração introduzida pela Lei nº 11.719/08, em detrimento do art. 302 do Decreto-Lei nº 1.002/69. Precedentes. Adequação do sistema acusatório democrático aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988. Máxima efetividade dos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). Incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso. Ordem denegada. Fixada orientação quanto a incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum a partir da publicação da ata do presente julgamento, aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial, incidindo somente naquelas ações penais cuja instrução não se tenha encerrado. [...] 3. Nulidade do interrogatório dos pacientes como primeiro ato da instrução processual (CPPM, art. 302). 4. A Lei nº 11.719/08 adequou o sistema acusatório democrático, integrando-o de forma mais harmoniosa aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988, assegurando-se maior efetividade a seus princípios, notadamente, os do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). 5. Por ser mais benéfica (lex mitior) e harmoniosa com a Constituição Federal, há de preponderar, no processo penal militar (Decreto-Lei nº 1.002/69), a regra do art. 400 do Código de Processo Penal. 6. De modo a não comprometer o princípio da segurança jurídica (CF, art. 5º, XXXVI) nos feitos já sentenciados, essa orientação deve ser aplicada somente aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso dos autos, já que há sentença condenatória proferida em desfavor dos pacientes desde 29/7/14. 7. [...]. (HC 127900, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 03/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-161 DIVULG 02-08-2016 PUBLIC 03-08-2016).
No referido julgado, o STF firmou orientação no sentido de que a regra descrita no artigo 400 do CPP deve ser aplicada, a partir da publicação da ata do julgamento susomencionado, aos processos penais militares, eleitorais e a todos os outros procedimentos penais especiais, cuja instrução ainda se encontra em pendência. (STF. HC 127.900/AM. Rel. Ministro Dias Toffoli. DJe: 03/08/2016).
2.4 Características do interrogatório
Consoante mencionado alhures, o interrogatório é um ato personalíssimo, traduzindo a ideia de que deve ser exercido pessoalmente pelo acusado. Importante aduzir que se, no polo passivo da demanda, figurar pessoa jurídica, o interrogado será seu representante legal.
A segunda característica do interrogatório consiste no fato de ele ser ato contraditório. Nesse sentido, aduz-se que:
Antes da Lei n. 10.792/03, o interrogatório era um ato privativo do juiz, sendo inviável que as partes pudessem intervir na realização do ato processual, o que se mostrava incompatível com o princípio do contraditório e da ampla defesa. Afinal, caso o acusado confessasse a prática do delito, ter-se-ia uma prova nos autos que não havia sido submetida ao contraditório. Ademais, não se assegurava ao defensor do acusado o direito de fazer reperguntas, obstando que o advogado esclarecesse pontos relevantes para a defesa. Com a entrada em vigor da Lei n. 10.792/03, e a consequente alteração do art. 188 do CPP, o interrogatório passou a se submeter ao princípio do contraditório, possibilitando a interferência das partes. (LIMA, 2018, p. 684-685).
Além disso, faz-se mister asseverar que o interrogatório trata-se de um ato assistido tecnicamente, sendo imprescindível a presença de advogado para a validade do ato. Nessa esteira de entendimento, o artigo 185 do CPP dispõe que “o acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado”. (BRASIL, 1941).
Outra característica do ato processual estudado é a oralidade, uma vez que o acusado deve responder às perguntas oralmente, com o fito de imprimir fidelidade e espontaneidade ao interrogatório. Não obstante, o réu poderá fazer consulta a breves apontamentos. Não é despiciendo consignar que algumas pessoas são portadoras de necessidades especiais, o que importa na realização do interrogatório de maneira diversificada, conforme prevê o artigo 192 do Código de Processo Penal, in verbis:
Art. 192. O interrogatório do mudo, do surdo ou do surdo-mudo será feito pela forma seguinte:
I – ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente;
II – ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito;
III – ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo dará as respostas.
Parágrafo único. Caso o interrogando não saiba ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sob compromisso, pessoa habilitada a entendê-lo. (BRASIL, 1941).
Para o estrangeiro que não falar a língua nacional, o interrogatório será realizado através de intérprete, conforme aduz o artigo 193 do CPP. (BRASIL, 1941).
Ademais, o interrogatório tem cunho individual, sendo que “havendo mais de um acusado, serão interrogados separadamente”, conforme preconiza o artigo 191 do Código de Processo Penal. (BRASIL, 1941).
Trata-se, ainda, de ato bifásico, uma vez que o artigo 187 aduz que “o interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos”. (BRASIL, 1941). Nesse sentido, a primeira fase visa colher informações sobre a vida pregressa do réu e a segunda está relacionada à imputação que lhe fora feita.
O ato também deve ser provido de espontaneidade, de forma que:
O interrogatório deve ser livre de pressões ou constrangimentos. A intimidação pelo juiz ou órgão acusador não é admitida, sob pena de invalidação do ato. Da mesma maneira, se o magistrado advertir que o silêncio será interpretado em prejuízo do interrogado, haverá nulidade, contudo meramente relativa, cabendo a demonstração do prejuízo. (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 557).
Assim, não deve existir influência indevida que possa macular a liberdade de autodeterminação do acusado.
Consigna-se, ainda, que deve ser garantida a publicidade do interrogatório judicial, em atendimento ao conteúdo disposto no artigo 5º, inciso LX, e artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Não obstante, há algumas exceções a essa regra, quais sejam: defesa da intimidade, interesse social na manutenção do sigilo e imprescindibilidade à segurança da sociedade e do Estado. (BRASIL, 1988).
2.5 Local de realização do interrogatório
Caso o réu se encontre em liberdade, o interrogatório, em regra, será realizado na sala de audiências do Fórum. Entrementes, no que tange ao acusado preso, o referido ato processual poderá se concretizar de três formas:
a) pessoalmente, dentro do presídio em que se encontra, mas desde que haja segurança para todas as pessoas envolvidas no ato;
b) por videoconferência;
c) pessoalmente, no fórum: de acordo com o art. 185, §7º, do CPP, será requisitada a apresentação do réu preso em juízo nas hipóteses em que o interrogatório não possa ser realizado no interior do presídio ou por videoconferência. (LIMA, 2018, p. 691).
Faz-se mister salientar que o interrogatório por videoconferência é medida excepcional, devendo ser fundamentado pelo juiz e ser necessário para a consecução de uma das finalidades constantes nos incisos do §2º do artigo 185 do CPP, quais sejam:
I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
VI – responder à gravíssima questão de ordem pública. (BRASIL, 1941).
Em que pese a disposição normativa a respeito dessa modalidade de interrogatório, surgiram algumas controvérsias a respeito de sua (in) constitucionalidade, sendo que tal celeuma resta assim resolvida por Renato Brasileiro de Lima (2018, p. 698):
A nosso juízo, a realização do interrogatório por videoconferência não atende somente aos objetivos de agilização, economia e desburocratização da justiça. Atende também à segurança da sociedade, do magistrado, do membro do Ministério Público, dos defensores, dos presos, das testemunhas e das vítimas, razão pela qual não pode ser tachada de inconstitucional.
Destarte, em que pese os direitos e garantias individuais servirem como diretrizes limitadoras da atuação proveniente do Estado, não se revestem de caráter absoluto, podendo sofrer restrições consubstanciadas na lei e no princípio da proporcionalidade.