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Responsabilidade civil do estado nos dias atuais

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Agenda 27/11/2018 às 13:59

A força normativa da e Constituição permite ao cidadão buscar socorro no Poder Judiciário quando ele se vê prejudicado pela Administração Pública por ação ou omissão e, inclusive, conseguir uma reparação financeira através da condenação judicial.

Atualmente, os meios de comunicação social divulgam a existência de grave crise econômica mundial o que tem provocado desemprego em massa para um enorme contingente de trabalhadores. Informam-nos também do incremento das agressões ao meio-ambiente com aumento da poluição ambiental e destruição de ecossistemas, colocando em risco a sustentabilidade da atividade e da vida humana no planeta.  Divulga-se também quase que diariamente casos de corrupção de servidores públicos em valores financeiros na casa dos bilhões desviados e enorme quantidade de pessoas envolvidas, prejudicando os negócios e propiciando uma concentração de renda mundial nas mãos de poucos, em detrimento da miséria de muitos. Isso sem falar nas populações de continentes inteiros que estão mergulhadas na miséria, nas doenças e nos conflitos bélicos, sem perspectivas de mudanças, o que nos indigna e desafia ao mesmo tempo. Sem falar nos milhões de refugiados políticos e econômicos, atores de uma tragédia anunciada.

Apesar desses problemas, atesta-se facilmente que o mundo caminha para um desenvolvimento civilizatório, uma evolução social globalizada nunca antes imaginada e causada principalmente pela admirável evolução das ciências, da tecnologia e da economia mundial nos últimos anos, tornando a vida humana muito mais fácil no planeta. Recentemente, inclusive, divulgou-se que há a previsão de alguns cientistas de que os recém-nascidos deverão viver um século de idade devido à evolução da ciência médica cada vez mais capaz de propiciar um envelhecimento longo, digno e produtivo.

Como visto acima, apesar do grande desenvolvimento econômico, progresso cientifico e evolução social atingido pela humanidade, estes não são socializados, generalizados ou democratizados. Muitos Estados que deveriam ser os motores ou os animadores do desenvolvimento e bem estar nacional pouco fazem para que estes cheguem efetivamente aos cidadãos. Ao contrário disso, muitos países que consagram o desenvolvimento e os direitos humanos em suas Constituições os desrespeitam acintosamente, seja de forma comissiva ou omissiva como a proclamar a impossibilidade ou a ineficácia de um Estado efetivo e dirigente.

No caso do Brasil, a Constituição de 1988 ampliou de forma nunca antes imaginada a tutela do Estado para com o cidadão. Nela, os direitos humanos como direito a saúde, a educação, a moradia, cultura, segurança e lazer, dentre outros, deixaram de ser um serviço público discricionário para ser um direito efetivo do cidadão, diferente das constituições anteriores, comprometendo todas as unidades federativas em competências comuns a respeito desses direitos. Ela inovou quando determinou como seu fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana, quando declarou entre seus objetivos a solidariedade, a justiça e a erradicação das desigualdades sociais e quando previu várias ações constitucionais que possibilitam efetivação de seus preceitos programáticos e a tutela dos direitos sociais. A Constituição atual é uma Constituição comprometida com os direitos humanos elegendo a dignidade humana como grande principio norteador e prevendo os meios concretos de sua efetivação.

Além disso, previu-se textualmente a possibilidade da Administração Pública ser responsabilizada civilmente por ações e omissões que causem danos ao cidadão, com seus órgãos e agentes devendo indenizar os prejuízos que causarem aos particulares no exercício da atividade administrativa. Conforme a Constituição em seu art. 37 § 6º:

"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

Fazendo um apanhado histórico do instituto da responsabilidade civil, já existiu no passado a teoria da não responsabilização do Estado pelos atos praticados pelos agentes que causassem danos aos particulares. Existiu a teoria da responsabilidade com culpa do Estado, chamada de subjetiva, segundo a qual existe a obrigação de indenizar apenas se os agentes tenham agido com culpa ou dolo. Existiu também a teoria da culpa administrativa pela qual é dever de o Estado indenizar o dano sofrido pelo particular somente no caso de comprovada existência de falha da atividade administrativa (o serviço público não funcionou ou funcionou mal e causou dano). Por fim, existe a teoria do risco integral, que jamais foi acolhida no Brasil, por meio da qual basta que exista o dano para que surja a responsabilidade civil, mesmo que o dano decorra de culpa exclusiva do particular. A teoria do risco integral jamais foi acolhida em quaisquer das constituições republicanas brasileiras.

No Brasil, adotou-se a responsabilidade objetiva do Estado e, para ela acontecer, basta apenas a existência do dano e do nexo causal entre o dano e a conduta do agente público. Mesmo o concessionário ou permissionário de um serviço público vão responder objetivamente perante os usuários. O Estado responde objetivamente ainda que o serviço público seja prestado por um delegatário do Poder Público e ainda responde civilmente por omissões.

Percebe-se que houve uma grande mudança de paradigma com a transformação que aconteceu com a compreensão da responsabilidade civil do Estado. Foi um instituto pertencente, na origem, ao Direito Privado e agora passa a ser aplicável ao Direito Público.  Isto acontece porque desde a Antiguidade existia a dicotomia clássica entre o Direito Público e o Direito Privado e competia ao Direito Público apenas garantir e efetivar a aplicação dos direitos fundamentais, isto é, os direitos de primeira dimensão, primordialmente o direito a liberdade e o direito a propriedade. E ao Direito Privado competia a regulamentação da relação entre particulares, sem a intervenção estatal, reinando em absoluto o princípio da autonomia privada, desconsiderando qualquer desigualdade que concretamente poderia surgir. Portanto, privilegiava-se o indivíduo como titular de direitos, desvinculados de suas relações sociais. Era o homem apenas objeto das relações jurídicas.

Na sua origem, a codificação das leis surgiu como a maneira de generalizar certas orientações importantes para a sociedade, a fim de que esta as compreendesse em sentido idêntico. Dessa maneira, em tese, oferecia segurança e uniformidade de comportamentos, principalmente entre os particulares. Em consequência, o centro do ordenamento jurídico passou a ser o Código Civil, reduzindo a Constituição a mera lei orgânica positivada. Inclusive tinha maior importância do que a própria Constituição, por trazer maior segurança às relações entre os homens. O Direito Civil codificado seria autossuficiente, não necessitando de outros textos para solucionar os conflitos.

O Código Civil era considerado um sistema fechado, axiomático dedutivo, gerando a autossuficiência do Direito Civil até recentemente. A interpretação e aplicação do direito não era de forma valorativa, mas apenas formal, resumindo-se em isolar o fato e aplicar a norma, sem qualquer ingerência de valores sociais. Era o racionalismo jurídico, sendo o juiz mero aplicador da lei. Logo, impossível, ao ver da época, uma inter-relação entre os Direitos Fundamentais e o Direito Privado, o que existia era tão somente uma hierarquia formal entre a Constituição e o Código Civil. Esta ordem jurídica provocou, porém, profundas injustiças individuais e sociais fazendo surgir as grandes revoluções e guerras mundiais que mudaram a situação mundial.

Atualmente, as Constituições contemporâneas deixam de ser um conjunto de normas que contém apenas elementos de Direito Público mas preveem também as relações entre os particulares. Exemplo disso é a nossa Constituição de 1988 onde seu Titulo I refere-se aos princípios fundamentais, o Titulo II aos direitos e garantia, o Titulo VII estabelece disposições sobre a ordem econômica e financeira e o Titulo VIII sobre a ordem social constituindo, assim, um verdadeiro corpo normativo de Direito Privado. Há também a previsão da Responsabilidade Civil do Estado por ações e omissões com obrigação de indenizar. E previu a tripartição de poderes ou funções do estado com o poder judiciário como guardião da constituição.

Com isso, apesar de existir certos Poderes da República responsáveis diretamente pelas políticas públicas, como o Poder Executivo e o Legislativo, conforme previsão constitucional, o Poder Judiciário como guardião da Constituição também está comprometido com esta efetivação. Ele pode obrigar o Poder Executivo e seus órgãos a determinadas práticas como indenizar por ações e omissões no seu múnus público, fazendo Justiça no caso concreto ao cidadão prejudicado pela Administração Pública.

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O fundamento do instituto da Responsabilidade Civil está no fato de que todo dano merece ser indenizado. A Responsabilidade Civil nasce de uma necessidade da sociedade na busca de um equilíbrio nas relações humanas pois não se pode aceitar que o causador de um dano fique sem qualquer consequência ou punição por seu ato danoso e, tampouco, que quem sofre o dano deva ficar sem qualquer reparação ou compensação. Portanto, a Responsabilidade Civil abrange tanto um aspecto jurídico quanto moral.

Com relação à Responsabilidade Civil do Estado, negar uma indenização pelo Estado ao cidadão por seus atos administrativos que causem danos, ou devido à omissão desses atos, é subtrair do poder público a sua função primordial de tutelar o direito e proteger a justiça. A responsabilidade civil do Estado passa para o campo do direito público, com base no princípio da igualdade de todos perante a lei, pois entre todos devem ser distribuídos equitativamente os ônus e encargos.  Se o dano foi causado pelo Estado, e este atua em nome da sociedade, então a responsabilidade acaba sendo desta, que deve suportar os custos pelos prejuízos, que, por conseguinte, serão distribuídos, indiretamente, a cada indivíduo. Assim, a justiça fica restabelecida, uma vez que o dano causado a um terceiro será absorvido por toda a sociedade.

O Estado pode ser definido como uma comunidade humana fixada num território e que, dentro das suas fronteiras, institui uma forma de organização do poder político soberano com o fim de garantir a segurança, a justiça e o bem-estar econômico e social.  As funções do Estado Contemporâneo, entre outras, são as funções políticas que visam promover a paz social, gerindo a administração pública e aplicando os recursos na satisfação das necessidades coletivas. São também as funções sociais que objetivam promover a melhoria das condições de vida e de bem-estar da população. E por fim, são as econômicas, pretendendo-se estabilizar a economia, garantir o seu bom funcionamento e promover o crescimento e desenvolvimento econômico.

O Estado deve promover a eficiência, a estabilidade e a equidade. Deve assumir-se como dinamizador, regulador, planificador e fiscalizador da atividade econômica. A Administração Pública engloba o conjunto de serviços aos quais compete desempenhar as atividades tradicionais do Estado. Não visam ao lucro mas a satisfação das necessidades coletivas como saúde, educação, segurança etc.

Por seu turno, a Constituição atual, que tem a função de organizar o Estado, é uma Constituição claramente comprometida com os direitos humanos. Ela elege a dignidade humana como grande principio norteador e prevê os meios concretos de efetivação, principalmente através do Poder Judiciário. E previu inclusive a responsabilidade civil da Administração Pública com seus agentes devendo indenizar os danos que causarem aos particulares no exercício da atividade administrativa.

Também chamada de Responsabilidade Civil do Estado, a Responsabilidade Civil da Administração Pública é objetiva, prescindindo de dolo ou culpa. Existindo o dano e existindo o nexo de causalidade entre a atividade administrativa e o dano sofrido pelo particular surgirá a responsabilidade civil da Administração. Trata-se de positivação da teoria do risco administrativo, por meio da qual se fundamenta que ao exercer sua atividade, o Estado cria riscos que deve suportar. Assim, mesmo no caso de funcionamento correto da atividade administrativa, poderá existir responsabilidade civil do Estado ou das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras do serviço público no caso de ação ou omissão que cause dano a um indivíduo.

Assim, é correto dizer que apenas deve ser comprovado o nexo causal entre o dano e a conduta do agente público para haver direito a reparação. Não só o concessionário, o permissionário ou o delegatário de um serviço público responde objetivamente perante os usuários do serviço público mas qualquer servidor público responde objetivamente apor suas ações e omissões.

Este é o Estado Democrático de Direito onde se busca a justiça material e a efetividade prática dos direitos humanos. Ele é marcado pela superação da dicotomia clássica entre Direito Público e Direito Privado pois as instituições do Direito Civil vinculam-se progressivamente ao Direito Público em um mundo econômico e jurídico cada vez mais inter-relacionado. A funcionalidade e, sobretudo, a eficácia do Direito Privado, exigem essa correlação. A ordem pública e a comunitária e, portanto, todas as entidades públicas e privadas encontram-se diretamente vinculados pelo princípio da dignidade da pessoa humana.

Na época atual de grave crise econômica mundial todos os Estados são chamados a intervir mais fortemente nas suas economias, seja no nível macroeconômico ou microeconômico. Isto para promover o crescimento e o desenvolvimento nacional através de ações de planejamento e mesmo prestar direta ou indiretamente os serviços de que o povo necessita se tornam imprescindíveis. Daí que a possibilidade de responsabilizar o estado e seus agentes por ações danosas ou omissões em suas funções vai se tornar um importante mecanismo para qualquer cidadão garantir seus direitos básicos essenciais. Ou ao menos uma justa compensação financeira por eventos danosos ou omissões injustificáveis que lhe cause prejuízo.

Por outro lado, percebe-se nos noticiários políticos um grande aumento das notícias de corrupção de servidores públicos que deixaram de lado o interesse público em nome de interesses particulares com desvios de verbas pública aos bilhões de reais quando não a simples malversação de dinheiro público por imprudência, negligência ou imperícia. Estes poderiam e deveriam ser responsabilizados civilmente por suas ações e omissões.

Por todo o exposto, salta aos olhos a importância e a atualidade do trabalho em questão. É grande a irresponsabilidade e a desídia dos servidores públicos em geral e dos governantes em particular no trato do dinheiro público e da coisa pública como um todo. Espera-se contribuir para esse debate onde princípios, direito e justiça estão envolvidos.


OS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS

Os direitos humanos fundamentais costumam ser classificados pela doutrina clássica como direitos humanos subjetivos com aplicação nas relações das pessoas com o Estado e com a sociedade, preceituados ou não nas Constituições.  Modernamente, entretanto, se entende que a natureza jurídica dele é dúplice, ou seja, os direitos fundamentais seriam os únicos direitos que ao mesmo tempo são direitos subjetivos e objetivos.

De um lado, eles são categorias especiais de direitos subjetivos porque ligados à condição de pessoa humana e, de outro lado, são partes integrantes dos direitos objetivos, da ordem jurídica uma vez que possuem a estrutura de princípios. De tão importantes que são os direitos fundamentais, a teoria moderna desses direitos prescreve que os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos podem preponderar até sobre a Constituição se eles forem mais benéficos à pessoa humana.

Os direitos fundamentais, desde o seu surgimento ainda no século XIII, passando pelas Constituições dos séculos XVII e XVIII até chegar aos dias atuais, atravessaram transformações significativas, especialmente no século XX, com o fenômeno da modernidade. A doutrina entende que são quatro as etapas dessas transformações: a primeira etapa teria sido a sua constitucionalização nas Declarações de Direitos que integraram as primeiras Constituições liberais e, posteriormente, nas Cartas liberais e democráticas que se foram sucedendo nos diversos países. A segunda fase caracterizou-se pela progressiva extensão dos direitos, passando pela liberdade, reconhecida, de forma mais ampla, como direito de associação, e pela consideração de direitos civis também como direitos políticos, chegando até o direito ao voto para homens e mulheres. A terceira etapa, que alcança o período atual, é a da universalização dos direitos, iniciada com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, representada pela transposição do Direito para fora dos limites internos de cada país, proporcionando ao indivíduo a possibilidade de invocar outras esferas superiores de justiça, inclusive contra o próprio Estado, o que o transforma em sujeito do direito internacional. Uma quarta etapa, mais recente, estende a proteção a direitos muito específicos, ligados a questões de sexo, idade, saúde, deficiências físicas e mentais, entre outras.

Como foi dito acima, os direitos fundamentais passaram por alterações na sua compreensão ao longo da história. Daí decorrem as diferentes gerações, ou gestações dos direitos fundamentais. Classicamente, são três as gerações dos direitos fundamentais e historicamente a Revolução Francesa é a origem e o fundamento deles. Os direitos fundamentais de 1º Geração seriam os direitos de liberdade e propriedade e são direitos influenciados pelo valor da liberdade. Seriam os direitos individuais de ir, vir e ficar: o direito à segurança, o direito à propriedade, patrimônio etc.

Os direitos fundamentais de 2º Geração seriam os direitos influenciados pelo valor da igualdade. Seriam os direitos sociais e visam à igualdade mesmo que utópica entre os trabalhadores, tais como a igualdade quanto à previdência social, a cultura, a educação o desporto etc.

Os direitos fundamentais de 3º Geração seriam os direitos influenciados pelo valor da fraternidade ou solidariedade. Seriam os direitos difusos, tais como o direito ao meio ambiente equilibrado e sadio, o direito à paz mundial, o direito às telecomunicações, o direito ao patrimônio público etc.

Alguns autores sustentam a existência da 4a Geração de direitos fundamentais relacionados ao processo de globalização, tendo como exemplo o amplo acesso à informação e o direito à democracia etc.

O conceito atual de Constituição como ápice do ordenamento jurídico e preocupada com a proteção aos direitos humanos só foi possível depois da consolidação do Estado Moderno, depois do surgimento da noção de soberania estatal. Na maioria dos países europeus, o Estado nacional só começa a se formar em meados do séc. XVI e final do séc. XV. Até então, não havia um poder único, não existia a ideia do Estado como titular do monopólio e do uso legítimo da força, centro único de produção de normas jurídicas, mas, ao contrário, o poder era fragmentado e desconcentrado.

Com a unificação do Estado vem à tona um movimento chamado de Iluminismo, e que foi um dos responsáveis pela unificação dos Estados Nacionais. O Iluminismo foi uma filosofia racionalista, buscava libertar o homem da tradição, do preconceito e alicerçar todo conhecimento humano na razão. O Iluminismo era essencialmente uma filosofia antropocêntrica, quer dizer, uma filosofia que centrava as suas preocupações na figura do homem, diferentemente do pensamento até então em que o centro das preocupações a religião.

Para proteger o homem e potencializar os valores humanitários, que eram o objetivo do iluminismo, era preciso, antes de tudo, limitar esse poder estatal que era um poder absoluto quando o Estado nacional se formou. O chamado Estado Absolutista se confundia com a figura do rei monarca que não conhecendo limites jurídicos, e sua atuação invariavelmente atropelava os direitos humanos.

Esse foi o nascimento do constitucionalismo que foi a expressão jurídica da preocupação com a proteção dos direitos humanos fundamentais. Para isso, a ideia era de criar uma determinada estrutura para o Estado, de tal sorte que ele não pudesse violar os direitos humanos. A tripartição e a separação de poderes surge para dividir o exercício do poder e com isso nenhum poder vai se sobressair, nenhum poder vai controlar os outros poderes e assim os direitos do homem não serão violados.

Além disso, o Estado vai ser limitado através da definição e positivação dos direitos fundamentais, que vão consistir em barreiras protegendo a autonomia privada da intervenção indevida do poder público. Esses direitos, nesse primeiro momento, vão consistir em deveres de abstenção estatal, o Estado vai garanti-los, vai protegê-los se omitindo, deixando de agir.

Então, o Estado mínimo foi quase que uma consequência dessa visão dos direitos humanos. O Estado se restringia ao desempenho de tarefas muito limitadas, ele protegia somente a propriedade, a segurança interna e externa. Com o passar do tempo foi se tornando claro que aquele modelo de Estado absenteísta, ausente, não bastava. O Constitucionalismo Liberal ao proteger apenas a propriedade privada, ao criar o arcabouço institucional necessário para o desenvolvimento apenas do comércio, da indústria e da atividade econômica como um todo, permitiu que o capitalismo se tornasse um capitalismo selvagem e desumano, com a injusta exploração econômica do homem como se fosse mercadoria. Naquela época, mulheres e crianças trabalhavam até 18 horas por dia com um salário miserável, sem nenhuma proteção da sociedade e do Estado.

Então começaram a surgir críticas a esse modelo de Constitucionalismo Liberal. Uma delas partiu do filósofo Karl Marx, muito influente até hoje. Para ele, a história das liberdades, da Revolução Francesa, do Estado de Direito, era só um artifício para esconder a dominação de uma classe social sobre a outra, estando dentro da superestrutura que visa dar um verniz de legitimidade a uma situação de exploração da burguesia sobre o proletariado. Surgiram várias outras críticas não tão radicais, como por exemplo, o Socialismo Utópico, a Doutrina Social da Igreja e outras mais.

Essas ideias ganharam um canal que pelo qual elas puderam ser trazidas para dentro do universo jurídico e para dentro do universo constitucional. Paralelo à consagração da ideia de igualdade, paulatinamente foi se estendendo o direito de voto a parcelas cada vez maiores da população e essas parcelas tinham agora como expressar as suas vontades através de mecanismos juridicamente institucionalizados. Uma das conquistas do iluminismo foi a recuperação do ideal democrático que tinha surgido na Grécia antiga.

A ideia brotou ali, mas a extensão do direito de voto e do poder político a parcelas cada vez maiores da humanidade foi fruto de lutas seculares e sangrentas. O deslocamento do eixo do poder político levou a que se incorporasse a noção de cidadania a parcelas cada vez maiores que tiveram como expressar as suas demandas. Então, por isso e por uma série de outras razões econômicas, a virada do século XIX para o século XX vai assistir uma mudança no paradigma de Estado que se refletiu diretamente no conceito de Constituição e de Constitucionalismo.

A Constituição até então era concebida apenas como uma limitação ao poder estatal. O papel das Constituições era estruturar o Estado e fortalecer o elenco de garantias individuais que impedissem que o Estado violasse as liberdades do homem, um papel relativamente reduzido. As Constituições eram apenas contenções ao poder estatal. Ora, com essas novas necessidades, essas novas demandas da sociedade, o Estado teve que crescer para atendê-las. Com esse crescimento o Estado abdicou do papel de mero espectador dos conflitos distributivos que se travavam no seio da sociedade civil e foi paulatinamente assumindo a função de regulador do mercado, de protagonista, inclusive do processo econômico.

Por outro lado, os direitos que as pessoas tinham em face do Estado foram também se alterando. Se até então os direitos humanos eram um direito a abstenção do Estado, com esse novo paradigma vão surgir outros direitos positivos, direitos cuja prestação vai consistir numa atuação comissiva, ativa, do poder público, como por exemplo, o direito à saúde, educação, previdência social, etc. São pretensões que demandam do poder público um crescimento, que demandam atuações positivas que para serem concretamente desempenhadas, necessitam de um Estado maior.

Foi essa a gênese do chamado Estado do Bem Estar Social, o qual projetou consequências extremamente importantes na compreensão do que é uma Constituição preocupada com a justiça. Se a Constituição, até então, regulava apenas as relações jurídicas entre cidadão e Estado, agora a Constituição passou a se ocupar com a sociedade. Então, o Estado vai passar também a agir para proteger o homem do próprio homem e com isso nós vamos ter o surgimento do direito social, do direito do trabalho a constitucionalização dos direitos privados. A Constituição passa também a ser o epicentro do ordenamento jurídico, o centro gravitacional em torno do qual giram todos os demais ramos do direito.

O novo conceito que corresponde ao Estado do bem estar social e a mudança no paradigma do Estado se refletiu na modificação do conceito de Constituição. A Constituição não é mais aquela norma que disciplina apenas as relações entre cidadão e Estado e que por isso tinha que ser mínima. A Constituição do Estado do bem estar social é ambiciosa, ela pretende ir além, estabelecendo metas e prescrevendo objetivos que as forças políticas vão ter que cumprir. Nasceram principalmente através das Constituições Mexicanas, Soviéticas e Alemã.

Por fim, após a segunda grande guerra mundial, sobreveio a instituição de outra forma de Estado que é o Estado Democrático de Direito, que no Brasil se materializou, ao menos formalmente, na Constituição de 1988. O Estado Democrático de Direito é concebido com base em dois fundamentos: respeito aos direitos fundamentais, aos direitos sociais e a democracia.

O Estado Democrático de Direito é, portanto, uma evolução em relação ao Estado Social, na medida em que o Direito é visto com instrumento necessário à implantação das promessas de modernidades não cumpridas pelo Estado Social. Desta forma, há um inevitável deslocamento do centro de tensão e decisão dos Poderes Legislativos e Executivo para o Poder Judiciário com a Jurisdição Constitucional.

O Estado Democrático de Direito e Constituição Dirigente são conceitos e institutos intimamente ligados; são instrumentos garantidores da conformação dos poderes constituídos com a finalidade precípua de implementarem as promessas de uma igualdade material. O Direito, portanto, assume relevante papel nessa empreitada, na medida em que é o instrumento de conformação social, frente à inércia dos outros poderes. Por outro lado, antiga separação de poderes de índole iluminista está em crise porque as urnas não possuem hoje um papel único de fonte de legitimação democrática do poder. Democracia e representação popular não são expressões sinônimas, pois a primeira significa antes de tudo vontade popular.

O tema direitos humanos vai interessar basicamente aos hipossuficientes, que são pessoas que precisam do Estado para que possam concretizar direitos humanos relacionados à igualdade, pois estão à margem da sociedade. Mas não a uma igualdade puramente formal, mas a igualdade em um aspecto mais profundo, uma igualdade que é traduzida numa possibilidade concreta de uma melhor qualidade de vida para as todas as pessoas com relação à saúde, a moradia, educação, lazer e a cultura, principalmente para aqueles que dependem do Estado para que possam concretizar essa igualdade.

O Brasil assinou a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, um ato importante para a efetivação dos direitos humanos em todo o mundo, bem como vários outros tratados internacionais a respeito. Esses documentos foram ratificados pelo Brasil no ano de 1992, que foi o ano também da ratificação do Pacto de São José da Costa Rica, que traz também uma série de compromisso do país com os direitos sociais. Com isso, há um comprometimento formal de nosso país com a comunidade internacional para implementar estes direitos, mas objetivamente falta concretizá-los na realidade social.

O fato é que até hoje em nosso país esses direitos não foram implementados. A população, em sua grande maioria, continua morrendo nos hospitais públicos devido ao atendimento médico deficiente e a falta de saneamento básico, a cultura existe apenas para uma elite social e mesmo o acesso à justiça é privilégio apenas de uma classe social, pois para sua implementação são necessários informação e educação, direitos sociais que também não são acessíveis a todos. Por outro lado, a Constituição de 1988 quis um bem estar social para todos e não apenas para a elite, se qualificando como uma Constituição compromissória, preocupada ainda que formalmente com todos os seus cidadãos. Disso trata-se a seguir.

Sobre o autor
Victor Manoel Romero da silva

Graduado pela UFRJ, Pós-graduado em Direito Público e Direito Privado AMPERJ ( Ministério Público), FESUDEPERJ (Defensoria Pública), CEPAD ( Magistratura Estadual e Federal), ESA OAB RJ Experiência em Tribunais Federais e Estaduais no Rio de Janeiro.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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