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Maconha Legal! Portugal liberal, após legalizar o uso medicinal, marcha para normatizar o uso recreativo

Portugal, prestes a liberação total do consumo da maconha

Agenda 09/02/2019 às 21:33

Portugal descriminalizou todas as drogas em 2001 e, numa década, foi relatado que o abuso de substâncias foi mitigado pela metade – isso, porém não significa que a queda no consumo de drogas tenha caído diretamente em razão dessa política liberalizante.

Portugal segue sua marcha pela legalização total do uso da Cannabis sativa, e já tem plantios legais do cânhamo, bem como de papoulas para produção de ópio, morfina etc.

Antes, porém, de abordar a realidade lusitana, lançaremos um breve olhar sobre o consumo de maconha em nível mundial.

Mapeando as nações onde mais se fuma maconha, curiosamente, não é a Holanda, famosa por seus coffeeshops, ou mesmo Portugal, os EUA ou o Uruguai, embora os citados tenham feito esforços para descriminalizar a droga nos últimos anos. De acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), essa distinção dúbia da nação que mais consome o cânhamo vai para a Islândia.

As estatísticas da UNODC sugerem que a cannabis é usada por 18,3% da população da Islândia (entre 15 e 64 anos). Os EUA (16,2%) e a Nigéria (14,3%) tiveram a segunda e terceira maiores taxas de consumo; enquanto o Reino Unido ficou em 26º na lista, seguido pela Irlanda. A Holanda está em 20º lugar. O Brasil não está nesta relação dos 30 maiores consumidores de maconha do mundo.

Vários países repensaram suas leis de cannabis nos últimos anos, na sequência alguns países onde a maconha é legal para fins medicinais

Holanda

Desde 2003 que a prescrição e a dispensa de cannabis é possível em farmácias. Há possibilidade de comparticipação por parte dos seguros de saúde.

Itália

Em 2013 a legislação passou a permitir a prescrição e dispensa em farmácias. Mais recentemente o Governo incumbiu o exército da produção de Cannabis.

República Checa

A aquisição é permitida em locais licenciados. Também pode ser feita a importação da planta desidratada ou preparações de cannabis desde que prescritas regularmente.

Dinamarca

Avançou com um programa experimental de 4 anos que permite a prescrição e tratamento com Cannabis.

Alemanha 

Médicos podem prescrever o vegetal desidratado ou extratos de cannabis e as despesas podem ser comparticipadas pelos seguros de saúde.

Portugal descriminalizou todas as drogas em 2001 e, numa década, foi relatado que o abuso de substâncias foi reduzido pela metade – isso porém, não significa que a queda no consumo de drogas tenha caído diretamente em razão dessa política liberalizante.

Com efeito, desde 2001, quem é surpreendido consumindo ou levando consigo até 10 doses de qualquer droga para consumo próprio em Portugal não é preso, tampouco condenado a pagar multa.

Por sua vez, a Lei nº 30/2000, foi a promotora dessas mudanças, todavia, segundo as autoridades portuguesas isso não implica entender que o uso e a posse de drogas tenham sido legalizados naquele país. O que a lei determina é que essa contravenção passe a ter caráter social e não criminal.

A meta da política pioneira de descriminalização do consumo de drogas adotada em Portugal foi - segundo o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) do governo federal - mudar a imagem que se tem do consumidor de drogas: de criminoso, ele passa a ser visto como alguém que precisa de apoio especializado.

Antes de 2001, o consumo ou posse de drogas na pátria de Fernando Pessoa poderia levar a uma pena de até 3 (três) meses de prisão ou multa, consoante o Centro Europeu de Monitoramento para Drogas e Dependência de Droga (EMCDDA). Conforme a quantidade de drogas em posse do usuário, a pena poderia ser de até 1(um) ano.

Atualmente, se alguém é pego com até 10 (dez) doses de uma droga para consumo pessoal e não exista suspeita de tráfico, a droga é apreendida e o caso é repassado para uma Comissão de Dissuasão da Toxicodependência (CDT). Esta, por seu turno, se encontra presente em cada um dos 18 distritos de Portugal.  A CDT é constituída por uma equipe multidisciplinar que inclui profissionais de saúde, de serviço social e de direito. (http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/08/portugal-descriminalizou-uso-de-drogas-em-2001-entenda-politica.html).

Pesquisas sugerem que o uso de drogas na população lusitana pode estar em declínio desde 2007, segundo o EMCDDA. Se, em 2007, a prevalência de adultos que já tinham usado droga alguma vez na vida era de 12%, em 2012, essa porcentagem caiu para 9,5%. Entre jovens adultos, a prevalência caiu de 17,4% para 14,5% no mesmo período.

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Em que pese os aparentes bons resultados, a política de descriminalização de Portugal não tende a ser uma "solução mágica" para os problemas de drogas do país, segundo um relatório do Centro Europeu publicado em 2011.

"O país ainda tem níveis altos de problemas relacionados ao uso de drogas e infecções por HIV e não mostra desenvolvimentos específicos na situação das drogas que o distinguiria claramente de outros países europeus que têm políticas diferentes", afirma o texto. (http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/08/portugal-descriminalizou-uso-de-drogas-em-2001-entenda-politica.html visto em 07.02.2019).

O Uruguai adotou uma abordagem semelhante - legalizou a maconha em 2013 - enquanto a Califórnia, Massachusetts e Nevada estão entre os mais recentes estados norte-americanos a votar pela legalização.  Contudo, ainda não há números que demonstrem as benfeitorias dessas liberações.

Na Terra de Camões, já é Lei desde janeiro de 2019, um regime jurídico que permite               prescrever cannabis in natura.

O partido socialista denominado Bloco de Esquerda (BE) propôs a atual lei portuguesa para uso de cannabis para fins medicinais, permitindo que o vegetal (desidratado ou fresco) e os seus derivados (óleo, resina, manteiga etc.) possam ser prescritos pelos médicos, comprados em farmácias. O citado partido quer ainda que a lei contemple a possibilidade de as pessoas doentes cultivarem a planta para consumo próprio.

Ainda pelo projeto, o valor e a comparticipação dependerão sempre do Governo e da publicação de uma portaria, assim como ocorre com os medicamentos para uso humano.

Regulamentação para o uso terapêutico da Cannabis publicada em Diário da               República

Pelo novel diploma, a prescrição e dispensa de medicamentos ou preparados à base do cânhamo apenas serão possíveis quando os tratamentos convencionais não funcionem. Decreto entra em vigor a partir deste mês (fevereiro/2019), mas, a Infarmed ainda não publicou a lista de doenças contempladas.

Cerca de sete meses após a lei ter sido aprovada no Parlamento luso, a regulamentação para a utilização de medicamentos, preparações e substâncias à base de cannabis foi publicada em 15.01.2019 no Diário da República Portuguesa.

Desde fevereiro/2019, os médicos podem prescrever derivados da mencionada planta para fins medicinais, consoante teor da Lei nº 33/2018, aprovada pelo Parlamento em 15/06/2018.

Os legisladores almejam que os derivados da maconha possam ser prescritos a doentes oncológicos, pessoas com doenças neuromusculares ou com formas graves e complicadas de epilepsia, entre outras patologias graves. 

Auto cultivo da maconha para doentes

A Lei também contempla a possibilidade da pessoa a quem foi prescrita a cannabis poder requerer uma autorização para cultivo, à semelhança do que acontece noutros países. As quantidades seriam limitadas. Os portugueses estão inspirados na legislação canadense, que tem uma fórmula de cálculo para fixar a quantidade a cultivar com base no número de gramas por dia prescritas pelo médico.

A prescrição da cannabis será feita através de receita médica especial e com base nela, acessará formulário próprio para pedir autorização para o auto cultivo. À exemplo do que ocorre noutros países, notadamente no Canadá, o indivíduo constará num banco de dados para controle do poder público.

Plantações legais de cannabis e de papoula

Existem em Portugal quatro plantações de substâncias controladas: duas de cannabis e duas de papoula de ópio.

Criada em abril de 2017, a Tilray Portugal, com origem no Canadá, onde produz cannabis medicinal desde 2014, obteve licenciamento em julho/2017 e iniciou o cultivo em outubro.  A sua unidade de transformação, em Cantanhede (Coimbra) tem quatro hectares para estufas e produção ao ar livre tem plano de investimento de 20 milhões de euros até 2020.

De outra mão, cumpre informar que a primeira multinacional a aportar em Portugal para plantar Cannabis foi a Terra Verde, empresa sediada no Reino Unido, que recebeu autorização do Infarmed em agosto de 2014. A plantação situa-se no distrito de Évora. A entidade licenciada possui uma área de cultivo, para o ano de cultivo de 2016, de 8,75 hectares, sendo a quantidade expectável de produto colhido de 21 toneladas informa o Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento). Salientando que o produto se destina integralmente a exportação para a Grã-Bretanha.

Cultivo de papoula de ópio

Por sua vez, no caso da papoula (Papaver somniferum) de ópio são duas as multinacionais que optaram por Portugal para aumentar a sua produção: a TPI Poppy growing, oriunda da Austrália e a Macfarlan Smith Limited - Sucursal de Portugal, proveniente da Escócia. O produto colhido por ambas as entidades se destina à exportação para o Reino Unido. Em razão da concorrência internacional, a MacFarlan, encerrou suas atividades em solo português (Alqueva) em dezembro de 2018. (http://www.lidadornoticias.pt/en/alqueva-empresa-escocesa-termina-producao-de-papoila-em-portugal/).

Vale ressaltar que a TPI é uma empresa australiana, criada em  2004, sendo uma das nove únicas instalações de narcóticos no mundo. A TPI é licenciada como processadora de papoulas na Austrália. Sendo uma das oito processadoras no mundo produzindo Narcotic Raw Material (NRM) que são as matérias-primas narcóticas (ópio, palha de papoula e concentrado de palha da papoula) que estão no Anexo II e são os materiais dos quais a morfina, codeína e tebaína são extraídas para fins de fabricação de várias substâncias controladas da Lista II (da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Ilícitas -  Austria-1988), para a insdústria farmacêutica internacional.

Para se ter uma breve visão da lucratividade do negócio legal do cultivo da papoula de Ópio, na Austrália, a TPI foi diretamente responsável por mais de US$ 80 milhões desde 2007. No final da safra de 2013, a TPI contribuiu diretamente com US$ 36 milhões para produtores de papoula tasmanianos desde que  licença para o cultivo foi concedida em 2007 para aquela região.

Apenas, a título de registro, uma das drogas mais possantes do mundo, a heroína foi medicinalmente fabricada pela primeira vez a partir do ópio em 1898 pela Bayer Pharmaceuticals da Alemanha como tratamento para a tuberculose.  Além disso, adveio anos mais tarde, um momento em que a dependência de morfina era excessiva como resultado da Guerra Civil, com cerca de 250.000 viciados nos Estados Unidos. Hoje, o maior produtor mundial da papoula do ópio é o Afeganistão.  

Resta saber se os portugueses vão se dar bem com essas medidas e leis liberalizantes, tanto com relação a maconha, quanto aos plantios de papoula para produção de ópio.

Em todos os países nos quais se permitiu o cultivo da papoula ou mesmo da coca, o tráfico de drogas explodiu. Pois, é acima de tudo uma questão das leis de mercado, onde o tráfico ilícito paga bem mais que os setores oficiais, isso ocorre, por exemplo, na fronteira brasileira, exatamente no Peru no qual a empresa estatal responsável pela compra das folhas da coca nunca conseguiu chegar nem perto dos preços pagos pelo mercado negro. É esperar para ver.

Sobre o autor
Jorge Bezerra

advogado, especialista em segurança pública e privada, Mestre em Direito (UNESP-Campus Franca/SP), autor de livros e vários artigos sociológicos, jurídicos e criminológicos, diversos cursos de pós-graduação e especializações em política criminal, criminologia e prevenção criminal no Brasil e no EUA, Áustria, República da China, Alemanha e França.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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