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Estudo acerca da legislação ambiental, com ênfase na tutela jurídica da flora brasileira

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Agenda 03/09/2005 às 00:00

CAPÍTULO 2

DIREITO AMBIENTAL

2.1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Direito Ambiental é o instrumento jurídico próprio para a aplicação da legislação protetora do meio ambiente. Ensina Paulo Bessa Antunes que o Direito Ambiental integra o novo Direito Econômico, através do qual "é possível que o Estado fomente ações e condutas cuja finalidade será a produção de determinado resultado econômico e social concreto". [30]

Direito Ambiental é, pois, uma concepção da ordem jurídica que penetra em todos os ramos do Direito, na medida que trata de direito humano fundamental, que cumpre a função de integrar os direitos à qualidade de vida saudável, ao desenvolvimento econômico e à proteção dos recursos naturais.

Entendo que o Direito Ambiental pode ser definido como um Direito que se desdobra em três vertentes fundamentais, que são constituídas pelo direito ao meio ambiente, direito sobre o meio ambiente e direito do meio ambiente. [31]

A Constituição Federal dedica ao Direito Ambiental o artigo 225 do capítulo VI, no qual garante que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, por ser um direito à vida; impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo; especifica a competência do Poder Público para garantir esse direito, inclusive o de definir os espaços territoriais a serem especialmente protegidos; prevê sanções para os infratores; orienta para a educação ambiental em todos os níveis e determina que a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional.

A partir desses conceitos, todo um arcabouço legal foi elaborado com o objetivo precípuo de garantir as qualidades ambientais, cujos preceitos serão analisados nesta pesquisa.

2.2 MULTIDISCIPLINARIEDADE DO DIREITO AMBIENTAL

A característica multidisciplinar do Direito [32] possibilita que conceitos de disciplinas extrajurídicas ofereçam parâmetros reais para se tutelar juridicamente o ambiente natural. Desta forma, a Física, a Biologia, a Geologia, a Medicina e a Nutrição, entre outras ciências, muito têm a contribuir para as bases jurídicas do Direito Ambiental e não podem deixar de ser aplicadas à produção legislativa.

A Física oferece argumentos científicos que justificam a defesa do ambiente vegetal, por seus conceitos sobre energia. Aplicados à ecologia, eles explicam a importância vegetal na transferência energética entre os níveis tróficos dos ecossistemas. [33]

Segundo esses preceitos, a vida é transferência de energia, que não pode ser criada nem destruída. A energia que chega ao planeta sob a forma de luz é equivalente à radiação térmica que o deixa. Sem essa transferência energética não há vida nem sistemas ecológicos. Analisando o fenômeno na biosfera, a ecologia explica porque a redução da cobertura vegetal provoca o aquecimento do planeta. [34]

Quanto menos vida, menor a quantidade de energia armazenada no planeta e em conseqüência maior a quantidade de dispersão. Este fenômeno, associado à redução da qualidade atmosférica, forma uma camada de gás carbônico que dificulta a dispersão da radiação térmica e resulta em um planeta superaquecido.

A partir desta análise ecológica, observa-se a importância da cobertura vegetal, segundo ensinamento de Odum:

Define-se produtividade primária de um sistema ecológico, de uma comunidade ou de qualquer parte deles, como a taxa na qual a energia radiante é convertida, pela atividade fotossintética e quimiossintéticas de organismos produtores (na maior parte, plantas verdes), em substâncias orgânicas. [35]

Verifica-se a relevância da vegetação na manutenção da vida no planeta, pois consiste na transformação de luz solar em energia viva, transferida para cadeias ecológicas ditas superiores até chegar ao homem, na forma de alimentos.

Quanto ao índice de produção energética, o planeta está repleto de regiões de baixa produtividade, como os desertos, oceanos, calotas polares e campos naturais, em razão da escassez de nutrientes. As regiões de alta produtividade são os deltas pluviais, estuários, áreas costeiras, regiões de subsolo rico (origem glaciária) e regiões de solo vulcânico [36], razão pela qual o Brasil tem importância ecológica fundamental, pois apresenta na quase totalidade de seu território regiões de alta produtividade, justificando o entendimento mundial que torna prioritária a defesa florestal, tendo em vista a Convenção sobre Diversidade Biológica, firmada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio/92.

2.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Outra idéia que veio reforçar o movimento ambientalista na busca de defesas para o meio ambiente foi a noção de desenvolvimento sustentável, a qual pressupõe a idéia de futuro, ou seja, é preciso atender às necessidades do presente sem destruir as riquezas naturais para que as próximas gerações também possam ter as suas próprias necessidades atendidas.

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Atividade econômica, meio ambiente e bem-estar social formam a base na qual se apóia o desenvolvimento sustentável. Sua definição engloba não apenas o impacto da atividade econômica sobre o meio ambiente, mas preocupa-se especialmente com as conseqüências dessa relação na qualidade de vida e no bem-estar da sociedade, do ser humano, hoje e no futuro.

A partir do objetivo primordial de promover a harmonia entre o homem e natureza, e dos seres humanos entre si, e do objetivo específico de utilizar inteligentemente os recursos naturais, o desenvolvimento sustentável requer consenso internacional; mobilização da sociedade consciente, incluindo o poder público e a iniciativa privada; e decisões nos âmbitos político, econômico, social e, conseqüentemente, jurídico.

Entre elas, ressaltam-se a participação do cidadão nos processos decisórios; a geração de excedentes e conhecimento técnico confiável e constante; o estabelecimento de sistemas de produção comprometidos com a obrigação de preservar a ecologia e foco nas soluções não poluidoras ao buscar o avanço tecnológico. Além disso, exige o fortalecimento do sistema social, tornando-o capaz de solucionar as tensões provocadas pelo implemento das novas idéias; do sistema internacional, ao estimular padrões sustentáveis de comércio e financiamento; e do sistema administrativo, ao torná-lo ágil na aplicação das correções de rumo que se fizerem necessárias. [37]

2.4 PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL

Os princípios do Direito Ambiental objetivam basicamente proteger a vida em quaisquer de suas formas e garantir um padrão de existência digno aos seres humanos desta e das futuras gerações, assim como conciliar os dois elementos anteriores com o desenvolvimento econômico ambientalmente sustentado (caput do artigo 255 da Constituição Federal).

O mais importante e fundamental princípio do Direito Ambiental é oprincípio do direito humano fundamental, ou seja, os seres humanos constituem o centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável e têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com o meio ambiente (Princípio 1 da Declaração do Rio, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio/92).

A seguir, vem o princípio democrático, através dos direitos à informação e à participação, que asseguram aos cidadãos o direito de participar da elaboração das políticas públicas ambientais. Esta participação ocorre através das iniciativas legislativas, como a iniciativa popular, o plebiscito e o referendo; medidas administrativas, como o direito de informação, o direito de petição e o estudo prévio de impacto ambiental; e as medidas judiciais, representadas pela ação popular e pela ação civil pública.

O princípio da precaução determina que não sejam produzidas intervenções no meio ambiente sem a certeza de que não serão adversas à natureza. A qualificação de uma intervenção como adversa está vinculada a um juízo de valor que requer a análise de custo/benefício do resultado da intervenção, explicitando sua relação com o lançamento de substâncias desconhecidas ou pouco estudadas. A Costa Rica, por exemplo, reconhece o princípio in dubio pro ambiente, [38] ou seja, o país resguarda o meio ambiente em primeiro lugar, deixando os demais interesses em segundo plano.

O princípio da prevenção é semelhante ao da precaução, mas distingue-se deste pois aplica-se a impactos ambientais já conhecidos e, portanto, com um histórico de informações já consolidado. Esta base de conhecimentos sobre determinada intervenção na natureza permite que o licenciamento ambiental torne-se o principal instrumento de prevenção dos danos. Conhecendo previamente os prejuízos que determinada atividade poluente causa ao ambiente, pode-se licenciá-la, desde que definidos os parâmetros a serem respeitados pela empresa.

O princípio do equilíbrio determina que os aplicadores da política ambiental e do Direito Ambiental devem valorar os gravames que uma determinada medida tem sobre o ambiente e sua utilidade para a sociedade, não permitindo que haja um excessivo ônus ambiental. Este princípio coloca na balança os fatores positivos e negativos da atividade impactante ou intervenção ambiental e o produto desta comparação permite a avaliação do lucro social em relação ao meio ambiente.

Com respaldo constitucional no artigo 225, § 1°, V, o princípio do limite se expressa quando o poder público define parâmetros máximos de emissão de partículas ou ruídos, determinando padrões aceitáveis de contaminação e fixando limites capazes de permitir o desenvolvimento industrial e, simultaneamente, preservar o ambiente. Muitas vezes os parâmetros utilizados são estabelecidos com base na capacidade industrial e tecnológica de reduzir a poluição e não em índices capazes de proteger a vida e o ambiente. Tais parâmetros são importantes para que se possa definir quando determinada intervenção ambiental torna-se insuportável para a sociedade, permitindo a cominação de penalidades e possibilitando a responsabilização de seus agentes.

O princípio da responsabilidade busca impedir que a sociedade arque com os custos da recuperação de um ato lesivo ao ambiente causado por um poluidor identificado, ensina Paulo de Bessa Antunes:

A responsabilização por danos ao meio ambiente deve ser implementada levando-se em conta os fatores de singularidade dos bens ambientais atingidos, da impossibilidade ética de se quantificar o preço da vida e, sobretudo, que a responsabilidade ambiental deve ter um sentido pedagógico tanto para o poluidor como para a própria sociedade, de forma que todos possamos aprender a respeitar ao meio ambiente. [39]

Este princípio determina que cabe ao proponente do projeto arcar com as despesas do Estudo de Impacto Ambiental, das medidas mitigadoras propostas e da recuperação do dano ambiental, entre outras.

Em seguida vem o princípio do poluidor pagador que visa imputar ao poluidor o custo

social da poluição gerada. [40] Este princípio parte da premissa de que, além do produto a ser comercializado, são produzidas "externalidades negativas". [41] que são recebidas pela população ao se contabilizar este prejuízo no custo de produção. A aplicação do princípio do poluidor pagador procura corrigir este custo adicional. O princípio não objetiva, por certo, tolerar a poluição mediante um preço, nem se limita apenas a compensar os danos causados, mas sim, precisamente, evitar o dano ao ambiente. [42]

Como ensina Édis Milaré:

Nesta linha, o pagamento pelo lançamento de efluentes, por exemplo, não alforria condutas inconseqüentes, de modo a ensejar o descarte de resíduos fora dos padrões e das normas ambientais. A cobrança só pode ser efetuada sobre o que tenha respaldo na lei, pena de se admitir o direito de poluir. Trata-se do princípio do poluidor-pagador (poluiu, paga os danos), e não pagador-poluidor (pagou, então pode poluir). A colocação gramatical não deixa margem a equívocos ou ambigüidades na interpretação do princípio. [43]

No Brasil, este princípio consagrado na Declaração do Rio em 1992, encontra-se normalizado na Política Nacional do Meio Ambiente, no inciso VII do artigo 4°, quando determina a imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados.

Entende Paulo de Bessa Antunes que:

[...] os recursos ambientais como água, ar, em função de sua natureza pública, sempre que forem prejudicados ou poluídos, implicam em um custo público para sua recuperação e limpeza. Este custo público, como se sabe, é suportado por toda a sociedade. Economicamente, este custo representa um subsídio ao poluidor. O PPP (princípio do poluidor pagador) busca, exatamente, eliminar ao reduzir tal subsídio a valores insignificantes. [44]

Deve-se incluir no custo de produção esta despesa ambiental, onerando o produto e transferindo para o consumidor o real ônus do impacto causado. Esta é a única forma de se incluir no preço de mercado o prejuízo causado ao ambiente. Para tornar seu preço competitivo, a empresa terá de buscar alternativas mais baratas para lançar seu produto. Como prevenir é sempre menos oneroso do que remediar, o consumidor irá pagar mais caro pelo produto que tenha um custo ambiental maior do que outro equivalente.

Obviamente, devem ser observadas também as técnicas de concorrência entre os produtores, ou seja, todos devem estar sujeitos às mesmas condições de produção, no que tange à tutela ambiental, sob pena de se premiar aquele que não tem qualquer controle de poluição em detrimento do que tem custos mais elevados porque investe em técnicas e procedimentos de controle da poluição.

Tal situação de isonomia somente é possível se houver regulamentação aplicada aos setores produtivos e fiscalização eficiente, de forma a permitir que os produtores concorram em posição de equilíbrio e igualdade no que tange à administração do dano ambiental.

A supremacia do interesse público na proteção do meio ambiente, em relação ao interesse privado, é um princípio geral do Direito Administrativo que proclama a superioridade dos interesses coletivos, os quais deverão prevalecer sobre os interesses dos particulares, razão pela qual é considerado pressuposto de estabilidade social.

A proteção ambiental, por ser de natureza pública, prevalecerá sobre os interesses individuais privados, ainda que legítimos, uma vez que a preservação do meio ambiente tornou-se condição essencial para a existência da vida em sociedade e, em conseqüência, para a manutenção dos direitos individuais. [46]

Rege ainda a proteção do meio ambiente o princípio a indisponibilidade do interesse público porque se trata de bem que pertence a todos indistintamente e não integra o patrimônio disponível do Estado. Assim, o meio ambiente é sempre indisponível em função da necessidade de preservação ambiental, tendo em vista as gerações vindouras. Em outras palavras, as gerações atuais não podem dispor dele, protegido que está pela imposição constitucional de se transferir o patrimônio ambiental às futuras gerações.

O meio ambiente é igualmente insuscetível de apropriação, seja pelo Estado, seja por particulares, por ser um bem essencialmente incorpóreo e imaterial, que representa um conjunto de condições, influências e interações físicas, químicas e biológicas que abriga e rege a vida.

Os elementos corpóreos que o compõem eventualmente podem ser apropriados ou utilizados, sobretudo para fins econômicos, com as limitações previstas em lei e com a condição de que essa utilização não leve à sua apropriação individual como bem imaterial. [47]

Consagrado na Rio/92 e consolidado na expressão desenvolvimento sustentável, o princípio da garantia do desenvolvimento ecologicamente sustentável objetiva incluir a proteção ambiental como parte integrante do processo global de desenvolvimento, situando a tutela do meio ambiente no mesmo plano de importância de outros valores econômicos e sociais protegidos pelo ordenamento jurídico.

Há, assim, necessidade de se conciliar valores como o exercício das atividades produtivas; direito de propriedade; desenvolvimento econômico; garantia do pleno emprego e exploração dos recursos naturais com os valores que reflitam o pensamento atual de preservação ambiental, tais como preservação e restauração dos processos e sistemas ecológicos; utilização racional dos recursos ambientais; controle das atividades poluidoras e preservação da biodiversidade e da integridade do patrimônio genético de cada país.

Não se pode, portanto, relegar a proteção jurídico-ambiental a questão de importância secundária. Deve-se respeitar a opção da sociedade pela preservação do meio ambiente, visando satisfazer também as necessidades das futuras gerações. [48]

A propriedade privada, por exemplo, tem função social, pois ao proprietário se impõe o dever de exercer o seu direito de propriedade também em benefício da coletividade O que legitima o exercício do direito de propriedade é o cumprimento da função social por seu titular, nos termos da Constituição Federal. Como conseqüência, faz com que o direito de propriedade seja exercido para beneficiar, além de seu titular, à coletividade e ao meio ambiente, não constituindo um simples limite ao exercício do direito já que autoriza que se imponham comportamentos positivos para que a propriedade se adeqüe ao interesse social de preservação.

Este princípio fundamenta a imposição ao proprietário, pela via judicial, da obrigação de recomposição da área de vegetação de preservação permanente, mesmo tendo ele sido ou não o responsável pelo desmatamento, ainda que jamais tenha existido vegetação na área. Os proprietários devem-se sujeitar a ela, em qualquer circunstância, por força deste princípio conforme determinam as diretrizes de proteção.

Do estudado se extrai que não existe direito adquirido na exploração agrícola dos referidos espaços protegidos, uma vez que a Constituição só reconhece o direito de propriedade se cumprida sua função sócio-ambiental, não havendo, portanto, direito à degradação.

Há obrigação de florestamento das áreas de preservação permanente - as matas ciliares, por exemplo - independente de ação efetiva, bastando a omissão ilícita. Cabe aos proprietários das terras, ainda que públicas, plantar a floresta ou reflorestar as áreas de preservação permanente, pois estas não podem ser exploradas por nenhuma atividade, só sendo admitida a supressão total ou parcial das florestas de preservação permanente com prévia anuência do Poder Executivo para execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, quando estritamente necessários, conforme determinação do Código Florestal. [49]

Sobre o autor
Pedro de Vasconcelos

biólogo, bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Santa Úrsula/RJ, bacharelando em Direito pela Universidade Estácio de Sá/RJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VASCONCELOS, Pedro. Estudo acerca da legislação ambiental, com ênfase na tutela jurídica da flora brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 792, 3 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7225. Acesso em: 24 nov. 2024.

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