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Penhora de direitos em alienação fiduciária: imprescindibilidade de prévia anuência do credor

Agenda 25/04/2019 às 18:26

Alicerçado no entendimento uníssono que considera possível a penhora dos direitos do devedor provenientes de contratos de Alienação Fiduciária, o presente trabalho propõe-se a explorar a pertinente discussão acerca do assunto.

RESUMO

Alicerçado no entendimento uníssono que considera possível a penhora dos direitos do devedor provenientes de contratos de Alienação Fiduciária, o presente trabalhor propõe-se a explorar a pertinente discussão acerca da prévia necessidade de anuência do credor. Dessa forma, através de aprofundada pesquisa doutrinária e Jurisprudencial, constatou-se ser indispensável a anterior anuição do credor, visto ser a Alienação Fiduciária espécie de Negócio Jurídico de natureza personalíssima, para que a restrição se efetive.

Palavras-chave: Penhora de direitos. Prévia anuência credor.

          Depreende-se da exegese do artigo 789 do Código de Processo Civil que o devedor responde com a totalidade do seu patrimônio, quer seja presente ou futuro, pelo adimplemento de suas obrigações. Entretanto, há ressalvas legais, compreendidas pelas hipóteses de impenhorabilidade, que obstam a penhora do bem de forma relativa, pois em casos específicos podem ser relativizadas.

             Outrossim, a partir do exposto, discute-se a doutrina e Jurisprudência pátria acerca da viabilidade e possibilidade jurídica da referida constrição recair sobre bens alienados fiduciariamente, bem como sobre os direitos decorrentes de tais contratos.

            Não se pode olvidar que está sedimentado na doutrina o entendimento uníssono que considera ser impossível a penhora do bem alienado fiduciariamente, o que não poderia ser diferente dada conjuntura dos fatos, pois, o credor fiduciário possui a propriedade do imóvel, cabendo ao devedor apenas a posse indireta. Todavia, esse adquire direitos sobre o bem a medida em que realiza os pagamentos das parcelas, sendo-lhe estes direitos passíveis de sofrer constrição.

            Posta assim a questão, analisar-se-á justamente a possibilidade de que a penhora recaia sobre os direitos que o devedor fiduciário adquire à medida que realiza a quitação dos pagamentos e, a imprescindibilidade da anuência do credor fiduciário para que a penhora de direitos se efetive.

            Destarte, há de se ponderar, a priori, que o contrato de alienação fiduciária possui natureza personalíssima, ou seja, o credor fiduciário ao favorecer ou firmar contrato com o devedor fiduciário leva em consideração suas condições econômicas e pessoais, sendo essas determinantes para a concretização do Negócio Jurídico.

            Ora, pois, é notório que nesse tipo de contrato as características pessoais do contratante são relevantes e atuam como causa para a formalização do mesmo. À vista disso, conclui-se que a analise prévia das condições econômicas e pessoais permite ao credor firmar contrato de forma mais segura e adequada ao perfil do devedor visando o adimplemento da dívida, pois, embora assista ao credor a possibilidade de permanecer com o bem diante do inadimplemento, seu interesse primeiro é sempre o adimplemento da dívida.

            Nesse sentido destacarmos o entendimento Jurisprudencial externado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a seguir transcrita:

PROCESSO CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSE DIRETA. DEVEDOR FIDUCIANTE. BEM QUE NÃO PERTENCE AO PATRIMÔNIO DO DEVEDOR. IMPOSSIBILIDADE DE CONSTRIÇÃO. DIREITOS ORIUNDOS DO CONTRATO INTUITU PERSONAE. IMPOSSIBILIDADE DE PENHORA. 1 - Na alienação fiduciária há desmembramento da posse: o devedor fiduciante tem a direta e o fiduciário a indireta e a propriedade resolúvel do bem. Se a res não integra o patrimônio do devedor, não pode ser penhorada.
2 - Os direitos oriundos do contrato de alienação fiduciária não podem ser penhorados, porquanto, tratando-se de contrato intuitu personae, seus direitos não são livremente cessíveis.
(Acórdão n.154852, 20010020059537AGI, Relator: ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 11/03/2002, Publicado no DJU SEÇÃO 3: 12/06/2002. Pág.: 173)

            Assim sendo, corroborando com o acertado entendimento segundo o qual é passível de ser penhorado direitos oriundos do contrato firmado pelo devedor fiduciário, encontra-se respaldo legal no artigo 11 da lei 6.830/80, cujo teor segue transcrito:

Art. 11, da lei nº 6.830/80. A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem; I - dinheiro; II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa; III - pedras e metais preciosos; IV - imóveis; V - navios e aeronaves; VI - veículos; VII - móveis ou semoventes; e VIII - direitos e ações. (Grifo nosso).

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            Tal entendimento coaduna com Jurisprudência uníssona dos Tribunais que admitem a constrição em comento, como se revelam as ementas adiante transcritas:

 
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE COBRANÇA - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PENHORA - BEM IMÓVEL COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - IMPOSSIBILIDADE - POSSIBILIDADE DE PENHORA SOMENTE DOS DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE ORIUNDOS DO CONTRATO. Os bens gravados com alienação fiduciária não podem sofrer impedimento judicial para eventual garantia de obrigação que poderá ser imputada ao devedor fiduciante. Embora não seja possível a penhora de bem alienado fiduciariamente, por não integrar o patrimônio do devedor, a jurisprudência permite a penhora dos diretos que o devedor tem sobre o bem alienado. V.v. - É possível a penhora de bem imóvel gravado com alienação, tendo em vista que, nos termos da Súmula 478 do Superior Tribunal de Justiça, o crédito relativo a cotas condominiais tem preferência sobre o crédito hipotecário.  (TJMG -  Agravo de Instrumento Cv  1.0000.18.096143-5/001, Relator(a): Des.(a) Alexandre Santiago , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 28/11/0018, publicação da súmula em 05/12/2018). Grifo nosso.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.617.051 - SP (2016/0198462-0) RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO RECORRENTE: DANIEL MERCHAN JACOMASSI RECORRENTE: JULIANA DE ALMEIDA FERNANDES JACOMASSI ADVOGADO: LUÍS CARLOS VIANNA ANDRADE  - SP114861 RECORRIDO  : CARVALHO & SANTOS COMERCIO DE ARTIGOS DO TABACO LTDA ADVOGADO : CELSO CORRÊA DE MOURA - SP176341 RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.  PENHORA. DIREITOS. POSSIBILIDADE. 1. "Como a propriedade do bem é do credor fiduciário, não se pode admitir que a penhora em decorrência de crédito de terceiro recaia sobre ele, mas podem ser constritos os direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária" (AgInt no AREsp 644.018/SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 02/06/2016, DJe 10/06/2016). Assim, a penhora não recaiu sobre o bem, mas tão-somente sobre os direitos que os Agravantes possuem sobre ele (ver pág. 27 deste autos e fl. 121 dos autos da execução). Igualmente a admitir essa constrição, confira-se os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: [...] Portanto, ainda que não se saiba se a propriedade será consolidada em nome do credor fiduciário ou se passará a pertencer aos Agravantes em decorrência do pagamento da dívida, a penhora sobre direitos que os demandantes possuem é possível, inadequada qualquer defesa, pelos Agravantes, neste momento, com amparo na Lei nº 8.009/90, porque, repita-se, o bem alienado fiduciariamente, por não integrar o patrimônio dos devedores, não pode ser objeto de penhora, como não o foi, enquanto os direitos objeto da constrição não são abrangidos pela legislação por eles invocada. Aliás, enuncie-se que o inciso XI do artigo 655 do Código de Processo Civil, autoriza a penhora sobre direitos. Ante o exposto, nego provimento ao recurso. (...).  4. Recurso especial provido. (REsp 1697645/MG, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/04/2018, DJe 25/04/2018) 3. Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial. Advirta-se que eventual recurso interposto contra esta decisão estará sujeito às normas do NCPC, inclusive no que tange à possível de fixação de multa (arts. 1.021, § 4º e 1.026, § 2º). Publique-se. Intime-se. Brasília (DF), 28 de junho de 2018. Ministro Luis Felipe Salomão Relator. (STJ -REsp:1617051 SP 2016/0198462-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 01/08/2018).

            Superada a questão acerca da possibilidade de penhora de direitos do devedor fiduciário, passa-se agora à análise da necessidade de prévia anuência do credor, em sua maioria instituições financeiras, para que a restrição se efetive. Dessa maneira, ter-se-á a penhora do direito de aquisição do domínio, afigurando-se, pois, como uma espécie de sub-rogação.

            Parte da doutrina e Jurisprudência, alicerçados em uma hermenêutica superficial e rasa da legislação pátria, consideram desnecessário o consentimento do credor para que ocorra a contrição sobre os direitos do devedor fiduciário. O referido entendimento encontra respaldo na ausência de previsão legal que estabeleça a necessidade de prévia anuência.

            Ora, pois, a fim de resguardar os direitos da parte exequente, é mister a expedição de ofício ao credor fiduciário, para que esse esclareça a atual situação do contrato de financiamento, bem como para que seja possível a penhora do crédito do executado, correspondente às parcelas já quitadas do referido negócio jurídico.

            É necessário não perder de vista a posição que a jurisprudência pátria vem assumindo diante da matéria sub examine, conforme se depreende das ementas abaixo transcritas:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. FGTS. PENHORA. BEM ALIENADO FIDUCIARIAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO CREDOR FIDUCIÁRIO. IMPRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO INTERESSE E DA UTILIDADE. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS HÁBEIS. I - Assente na jurisprudência desta Corte o entendimento de não ser possível a penhora de bem alienado fiduciariamente, não havendo impedimento, contudo, à constrição dos direitos do devedor fiduciante oriundos do contrato firmado com a instituição financeira. II - Ademais, é imprescindível à constrição dos direitos do devedor fiduciante a anuência do credor fiduciário e a demonstração das informações sobre o valor do débito, das quantias pagas, do prazo ainda existente e da viabilidade da eventual assunção do crédito integral em razão do pagamento do débito ainda existente, requisitos não satisfeitos na espécie. Precedentes desta Corte. III - Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TRF - 1 - AG: 21773 MG 2008.01.00.021773-9, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 10/08/2012, SEXTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.342 de 27/08/2012).

RECURSO ESPECIAL Nº 1.399472 -MG (2013/0269025-1) RELATORA: MINISTRA ASSUETE MAGALHÃES RECORRENTE FAZENDA NACIONAL ADVOGADO: PROCURADORIA- GERAL DA FAZENDA NACIONAL -  PR 000000O RECORRIDO: MIXFORT INSDÚSTRIA E COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO DE PRODUTOS AGROPECUÁRIOS LTDA ADVOGADO: SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS - SE 000000M DECISÃO. Trata-se de Recurso Especial, fundamentado na alínea a do permissivo constitucional, interposto pela FAZENDA NACIONAL, na vigência do CPC/73, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, assim ementado: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL AGRAVO VEÍCULO ALIENADO EM EXECUÇÃO FISCAL VEÍCULO ALIENADO FIDUCIARIAMENTE PENHORA SOBRE OS DIREITOS IMPOSSIBILIDADE NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO CREDOR FIDUCIÁRIO AGRAVO IMPROVIDO. 1. É incabível a penhora de bem alienado fiduciariamente por dívida do devedor -fiduciante para com terceiro, tendo em vista que o bem ainda não foi incorporado à sua esfera patrimonial. O que se admite é a constrição do direito resultante do contrato de alienação, de modo que, à medida que se vai pagando o financiamento, a parte disponível do executado vai aumentando, proporcionalmente. AGA 0008972-42.2010.4.01.000/PA, REL. Desembargador Federal Reynaldo Fonseca, 7ª Turma do TRF 1, DJF1 22.10.2010; AC 2001.31.00.000566-7/AP, Rel. Juiz Federal André Prado de Vasconcelos, 6ª Turma Suplementar do TRF1, DFJ1 28.09.2011; AC 2002.38.00.037383-9/MG, Rel. Desembargador Federal Leomar Barros Amorim de Sousa, Juiz Federal Convocado Cleberson José Rocha (conv.), 8ª Turma do TRF1, DJF1 08.08.2008) 2. Conquanto o devedor-fiduciante seja depositário, por deter a posse direta do bem, é imprescindível a anuência do credor-fiduciário para eventual constrição dos direitos inerentes ao contrato de alienação, na medida em que, na qualidade de proprietário resolúvel e possuidor indireto, é ele quem dispõe das ações que tutelam a propriedade de coisas móveis. (AGA 2008.01.00.034838-0/MG, Rel. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso, 8ª Turma do TRF1, DJF1 05.12.2008; AG 2002.01.00.032360-6/MG, Rel, Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso, 8ª Turma do TRF1, DJ 01.07.2005) 3. Agravo de instrumento não provido. (...). (STJ - REsp:1399472 MG 2013/0269025-1, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação; DJ 01/03/2018.

            Em virtude dos fatos apresentados, chega-se a conclusão de que nada obsta que os direitos adquiridos pelo devedor fiduciante sejam constritos e suportem os efeitos gerais da penhora, porém, em que pese não haver previsão legal que exija o prévio consentimento do credor, este deve, imprescindivelmente, ser comunicado da penhora e anuir com a mesma para que se efetive.


PENALTY OF RIGHTS IN CONTRACT OF FIDUCIARY ALIENATION -  IMPERATIBILITY OF PRIOR ANNUENCE OF THE CREDITOR

ABSTRACT

Based on the unanimous understanding that it is possible to seize the rights of the debtor arising from Fiduciary Alienation Agreements, this opinion proposes to explore the pertinent discussion about the creditor's prior consent. Thus, through in-depth doctrinal and jurisprudential research, it was found to be indispensable the previous annuity of the creditor, since the Fiduciary Alienation is a kind of Legal Business of a very personal nature, so that the restriction becomes effective.

Keywords: Attachment of rights. Previous creditor consent.

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Sobre o autor
Lincoln Nolasco

Advogado graduado pela Universidade Federal de Uberlândia/UFU em dez/2004. Procurador Federal licenciado Procurador Federal - 2009/2016 Procuradoria Seccional Federal de Uberlândia - MG Atuação em execuções fiscais, contencioso e consultorias autárquicas Licença a partir de 2017. Delegado da Polícia Federal 2009 Departamento de Polícia Federal Curso de Formação Academia Nacional de Polícia em Brasília - DF. Atividades relacionadas a polícia investigativa. Opção pela carreira de Procurador Federal. Procurador Federal 2006/2009 Procuradoria-Geral Federal Procuradoria Seccional Federal de Marília - SP e Procuradoria Seccional Federal de Uberlândia - MG Atuação em execuções fiscais, contencioso e consultorias autárquicas federais. Afastamento para carreira de Delegado da Polícia Federal. Agente da Polícia Rodoviária Federal - 2005/2006 Departamento de Polícia Rodoviária Federal - Delegacia da Polícia Rodoviária Federal em Rondonópolis - MT, Delegacia da Polícia Rodoviária Federal em Araxá - MG e Delegacia da Polícia Rodoviária Federal em Frutal - MG. Atuação em atividades policiais. Afastamento para carreira de Procurador Federal. Estagiário em Direito 2000/2004 Escritório de Advocacia Roberto Matos de Brito em Uberlândia - MG. Atividades jurídicas inerentes a direito imobiliário e bancário e contratos.

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