Resumo: A alienação parental é um dos temas mais delicados tratados pelo direito de família, considerando os efeitos psicológicos e emocionais negativos que pode provocar nas relações entre pais e filhos. A prática caracteriza-se como toda interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos pais, pelos avós ou por qualquer adulto que tenha a criança ou o adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância. O objetivo da conduta, na maior parte dos casos, é prejudicar o vínculo da criança ou do adolescente com o genitor. A alienação parental fere, portanto, o direito fundamental da criança à convivência familiar saudável, sendo, ainda, um descumprimento dos deveres relacionados à autoridade dos pais ou decorrentes de tutela ou guarda.
Palavras chave: Alienação Parental. Síndrome da Alienação Parental. Falsas Memórias.
Abstract: Parental alienation is one of the most delicate issues dealt with by the family law, considering the emotional and negative psychological effects that may cause relations between parents and children. The practice is characterized as any interference on psychological training of the child or adolescent promoted or induced by one of the parents, grandparents or by any adult who has the child or teenager under your authority, guard or surveillance. The purpose of the conduct, in most cases, it is the child's link or harm the teenager with the parent. Parental alienation hurts, therefore, the fundamental right of the child to the family healthy living, being also a breach of the duties related to parental authority or guardianship or custody.
Key words: Parental Alienation. Parental Alienation Syndrome. False Memories.
Sumário: 1. Introdução; 2. A Alienação Parental e a Síndrome da Alienação Parental; 3. Consequências da Alienação Parental; 4. Alienação Parental X Abuso Sexual; 5. A Realidade da Alienação Parental no Brasil; 6. A Realidade da Alienação Parental na Argentina; 7. Conclusões.
1. INTRODUÇÃO
Um dos temas jurídicos de mais repercussão da vida social das pessoas, quando nos referimos aos temas controversos de Direito de Família em especial, é a questão da chamada "síndrome da alienação parental". Com efeito, tal problemática encontra, nos dias de hoje, estudo tanto nos campos social, psicológico e jurídico, sendo neste último objeto de análise tanto pelo direito civil como pelo direito penal.
Em apertada síntese, alienação parental é o processo desencadeado normalmente após uma ruptura conjugal, movido por vingança ou outros sentimentos primitivos, que visa afastar o filho do convívio com o genitor e sua respectiva família. Trata-se de um processo de destruição e descrédito moral do ex-parceiro, levando o filho a rejeitar e odiar seu genitor e sua família. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização, levando o filho a se afastar de quem ama e de quem também o ama. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo afetivo entre ambos, gerando infindáveis cicatrizes psíquicas ao infante e riscos imprevisíveis sobre o desenvolvimento futuro de sua personalidade.
Existem, pois, ex-cônjuges e ex-companheiros. Tudo porque vivemos em um mundo identificado por Bauman[1] como líquido, em que as relações afetivas tornaram-se fluidas, descartáveis. Se os relacionamentos entre casais passam pela senda da fugacidade e efemeridade, essas características jamais podem acometer também o vínculo paterno-filial. Em outras palavras, não podem existir "ex-pais".
E quando esse afastamento paterno-filial se dá por obra dolosa de um dos genitores, movido pela vingança da rejeição (olvidando o risco que todos temos ao ingressarmos em uma relação afetiva-conjugal: o risco do amor acabar, o risco de não dar certo), que através de um processo desmoralizante e abusivo, visa afastar o filho do convívio com o genitor e sua família, a lei deve ser severa em punir e assim prevenir tal comportamento.
2. A ALIENAÇÃO PARENTAL E A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL
Há que defina alienação parental e síndrome da alienação parental como sendo a mesma coisa. É certo que não o são. A princípio, parecem termos sinônimos, o que causa certa imprecisão e confusão quando na pesquisa doutrinária de tais termos. Para dirimir tal questão, utilizamos a definição de Richard Gardner[2], psiquiatra infantil especializado no tema, que foi o responsável por cunhar o termo SAP - síndrome da alienação parental, estabelecendo uma diferença conceitual entre eles, onde a própria alienação parental é um processo mais amplo, que poderá culminar em uma síndrome, ou seja, a alienação parental pode ser causada por diversas práticas isoladas, que visem ao afastamento dos filhos em relação ao genitor não-guardião, aqui identificado como o genitor que não detenha a guarda do filho. Já, a síndrome da alienação parental é uma subcategoria específica da alienação parental, resultante de uma combinação entre as ações decorrentes da programação parental, da ação destrutiva que degradará a relação afetiva, e a interação que tais ações causarão na própria criança, seus anseios e frustrações da relação parental propriamente dita.
Ela ocorre quando o genitor guardião, após a separação do casal, busca dificultar e até mesmo excluir o contato do filho em relação ao outro genitor através de várias formas de coerção, agressão, desencadeando um processo de destruição e desmoralização do genitor junto ao filho, utilizando-o como instrumento de sua vingança.
Vejamos o conceito da SAP, segundo o Gardner[3]:
“A síndrome da alienação parental (SAP) é um distúrbio que surge inicialmente no contexto das disputas em torno da custódia infantil. Sua primeira manifestação verifica-se numa campanha que visa denegrir a figura parental perante a criança, uma campanha que não tem justificação. Esta síndrome resulta da combinação de um programa de doutrinação dos pais (lavagem cerebral juntamente com a contribuição da própria criança para envilecer a figura parental que está na mira desse processo).”
A Síndrome da Alienação Parental também é conhecida como implantação de falsas memórias, na qual o alienador utiliza-se do filho abusado para inventar fatos negativos em relação à pessoa do outro genitor o que gera prejuízos incalculáveis na vida de ambos, prejuízos esses que serão melhores explanados no decorrer deste trabalho. Não resulta apenas das separações judiciais ou uniões estáveis. Com a evolução das famílias e dos tipos de relação familiar, os abusos também são verificados na relação de pais que nem se quer moram juntos com a criança, tendo o filho quando do namoro ou até mesmo de encontros casuais, o que não desqualifica o pai em relação ao filho.
É preciso estar atento, pois esse abuso pode ocorrer também em relação ao genitor que não é o guardião da criança. Ele pode se utilizar dos mesmos meios inescrupulosos visando obter vantagens sobre o outro genitor, sejam elas, a modificação da guarda, a desestruturação do ambiente familiar, ou até mesmo, por não ter mais acesso, a tentativa de obtenção de provas dentro da casa do outro genitor para que sejam utilizadas em uma futura disputa judicial.
Alexandra Ullman, quando citada por Xaxá[4], faz uma importante observação:
“Alguns entendem a Alienação como uma Síndrome por apresentar um conjunto de sintomas a indicar uma mesma patologia, enquanto que outra corrente exclui o termo Síndrome da definição por determinar que, como não há reconhecimento da medicina nem código internacional que a defina, não pode ser considerada uma Síndrome. Fato é que, independentemente de ser ou não uma Síndrome, assim subentendida, o fenômeno existe e cada vez mais é percebido e verificado independentemente de classe social ou situação financeira”.
É possível a reversão da Alienação Parental enquanto não se instala a Síndrome, com ajuda de terapias e do poder Judiciário e com o restabelecimento do convívio com o genitor Alienado. Porém, quando a Síndrome se instala, sua reversão se torna mais difícil e ocorre em pouquíssimos casos e ainda na infância.
A é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custodia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. É simplesmente a consequência reiterada do abuso realizado nos filhos, em que, em momento posterior, aquela alienação se transforma em uma síndrome. A síndrome nada mais é que o resultado dos efeitos emocionais maléficos causados na criança, já a alienação é toda a ação de um genitor para desqualificar o outro ente familiar.
O advogado Marco Antônio Garcia de Pinho[5], citado por Alan de Matos Jorge, define bem essa situação: "Cabe ressaltar que, tecnicamente, a Síndrome não se confunde com a Alienação Parental, pois que aquela geralmente decorre desta, ou seja, ao passo que a alienação parental se liga ao afastamento do filho de um pai através de manobras da titular da guarda, a Síndrome, por seu turno, diz respeito às questões emocionais, aos danos e sequelas que a criança e o adolescente vem a padecer.”
A alienação parental é muito mais comum do que se pensa, sendo cometida pelo alienador até mesmo sem a percepção real do que está fazendo. Existem graus dessa alienação, sendo que quando realizadas de forma leve é possível que os efeitos nem sejam notados ao longo da vida do filho. Na alienação de grau médio ou grave existem grandes propensões para que se traduza na temida síndrome em um futuro próximo. O importante é que na alienação parental é reversível, restabelecendo assim a convivência entre as partes, ao modo que, quando se instala a síndrome, raramente, se vê possível uma reversão.
3. CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL
Ambos, pai e mãe, devem sempre tentar proteger os filhos de discussões ou situações tensas. Ações que proíbam o exercício da maternidade ou paternidade não são bem-vindas aos pais e, muito menos, aos filhos. Os direitos ao desenvolvimento saudável e ao convívio familiar devem ser garantidos às crianças e adolescentes, bem como ter a participação do pai e da mãe em suas vidas.
Quando ocorre alienação parental, os filhos sofrem várias consequências e muitos transtornos podem se manifestar, tanto na infância, quanto por toda a vida adulta. Esta criança ou adolescente pode vir a apresentar problemas psicológicos (como a ansiedade, depressão e pânico), de relacionamento, de baixa autoestima, de adaptação a ambientes sociais e de comportamento (como mudança de emoções, violação a regras, agressividade e tendência ao isolamento).
Já o genitor alienado pode vir a sofrer transtornos de personalidade e psicológicos (como estresse e depressão). Em ambos os casos, é necessária ajuda psicológica e jurídica para que as vítimas sejam tratadas.
Andreia Calçada[6], psicóloga clínica jurídica, explica que o filho envolvido em alienação parental, como também em falsas acusações de abuso sexual, desenvolve sequelas graves. Segundo ela, a criança ou adolescente passa a se sentir dividido, como se precisasse escolher entre amar o pai ou a mãe, e não ambos em igual proporção. “Isso causa uma divisão interna e, consequentemente, uma fragilidade na estruturação de personalidade que pode gerar problemas de relacionamentos escolares, psicológicos e psiquiátricos”, diz, ressaltando que, quanto mais o filho precisar se aliar a um dos genitores, piores serão as consequências. A psicóloga chama a atenção também para a importância de tratamento de vítimas de alienação parental. Para ela, há certa resistência por parte dos adultos em procurarem ajuda psicológica, mas isto é necessário. “Normalmente a vida de alguém que sofre alienação parental fica destruída, pois essa pessoa passa a viver em função daquele litígio, fica muito tempo sem ver os filhos, tem a vida financeira indo para um abismo. E isso causa depressão e ansiedade”, afirma.
4. ALIENAÇÃO PARENTAL X ABUSO SEXUAL
Quando a separação de um casal não acontece de forma amigável, o filho pode ser utilizado como instrumento de agressividade e vingança direcionada ao ex-parceiro, muitas vezes gerando descrédito e desmoralização deste genitor. Falsas acusações são comuns em casos de alienação parental, sendo que a denúncia irreal de abuso sexual é a mais grave delas. Fazer com que o filho acredite que um de seus genitores abusa sexualmente dele faz com que gere o medo de encontros – o que, consequentemente, resulta no afastamento da criança ou adolescente do genitor alienado.
Para a advogada Sandra Vilela[7], a falsa acusação de abuso sexual “está em moda” no Brasil. Ela diz que, como a guarda compartilhada somente não é imposta obrigatoriamente no Brasil caso haja alguma questão grave envolvendo um dos genitores, como de abuso sexual, por exemplo, este tipo de falsa acusação tem aumentado em casos de guarda no país. “Pessoas que fazem isso têm desequilíbrio, porque isso destrói a vida da criança e do genitor. Para a criança há o mesmo prejuízo que se ela fosse realmente abusada, pois ela é influenciada a acreditar que aquilo aconteceu”, afirma.
No entanto, a acusação ou denúncia que pode ser falsa, na verdade pode ser verdadeira, pois, o abusador pode se aproveitar desta excludente para dizer que esta sendo vítima de acusação de alienação parental e acabar saindo impune deste crime, por isso em se tratando da questão de abuso sexual dentro da família devemos tomar muita cautela, para que não sejamos injustos e tomemos decisões precipitas e erradas em relação a esta questão.
Conforme Maria Berenice Dias[8] fundamenta claramente em sua obra:
A falsa denúncia de práticas incestuosas tem crescido de forma assustadora. Essa realidade perversa pode levar a um injustificado rompimento de vínculo de convivência paterno-filial. Mas há outra consequência ainda pior: a possibilidade de identificar como falsa denúncia o que pode ser uma verdade. Nos processos que envolvem abuso sexual, a alegação de que se trata de alienação parental tornou-se argumento de defesa. Invocada como excludente de criminalidade, o abusador é absolvido e os episódios incestuosos persistem.
Contudo Ana Carolina e Rolf Madaleno[9], diz que "existem técnicas de diferenciação de ambos os casos, que somente são verificadas após um longo acompanhamento com psicólogos, assistentes sociais, e até mesmo serventuários da justiça. Quanto ao comportamento das crianças e adolescentes, quando há de fato abuso ou negligência os mesmos recordam-se com facilidade dos fatos, sem necessitarem de ajuda externa. Mas, ao tratar-se de alienação parental, os mesmos necessitam de auxílio externo para recordar-se dos fatos". Ainda, quando são implantadas falsas memórias, há muita troca de olhares entre os parentes que estão na sala, é como se a criança pedisse aprovação, e não existem muitos detalhes.
Havendo abuso, percebe-se que a criança tem um conhecimento sexual inadequado para sua idade, às brincadeiras têm conotação sexual, ocorre confusão entre as relações sociais. "É comum haver o aparecimento de indícios físicos de agressões, lesões e infecções, podendo ocorrer distúrbios alimentares e sono alterado. Costumam apresentar sentimento de culpa, vergonha, sintomas depressivos, e até mesmo tentativa de suicídio".[10]
Por outro lado, nos casos de alienação parental, o conhecimento da sexualidade é adequado para a idade, não há indícios físicos de agressão, apesar de alguns alienadores provocarem hematomas para dar veracidade ao fato narrado. Não é comum apresentarem-se distúrbios funcionais, nem sentimento de culpa.
"Quanto ao genitor que denuncia o abuso, quando o fato é real, o mesmo tem consciência da dor e da destruição dos vínculos familiares, requer celeridade processual e pode ter sofrido abusos físicos e/ou emocionais do ex-cônjuge. Doutro modo ocorre quando os fatos são criados pelo genitor que denuncia, pois o mesmo não se importa com o transtorno que sua alegação causará a família, sendo a sua intenção ganhar tempo, interferido no processo com o intuito de atrapalhar e retardar a sentença. Há também diferença quanto ao genitor acusado, que nos casos de abusos verdadeiros, costumam apresentar distúrbios em outras áreas da vida, enquanto os genitores vítimas da alienação parental são aparentemente saudáveis nas demais áreas de suas vidas".[11]
5. A REALIDADE DA ALIENAÇÃO PARENTAL NO BRASIL
No Brasil, o advento da Lei da Alienação Parental (Lei Federal 12.318/2010), assim analisada, favorece o saudável convívio familiar, impede comportamentos ilícitos e abusivos, protegendo de forma integral a criança e o adolescente (art. 3º). Como nos explica Barros[12], "...o art. 2 da Lei 12318/10 considera como ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este...".
A nomenclatura genitor na referida lei, expõe claramente que os atos de alienação parental podem ter por alvo indistintamente pai ou mãe. A Lei, portanto, não trata do processo de alienação parental necessariamente como uma patologia, mas como uma conduta que merece intervenção judicial, sem cristalizar única solução para o controvertido debate acerca de sua natureza.
Exemplificativamente, algumas condutas que foram criminalizadas no parágrafo único do art. 2 da Lei[13] em comento:
“Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.”
Segundo Dias[14], o sentido do rol exemplificativo, que traz à tona condutas práticas que, em regra, tendem a frustrar a convivência saudável da criança e do adolescente, também é de imprimir caráter educativo à norma, na medida em que devolve claramente à sociedade legítima sinalização de limites éticos para litígio entre ex-cônjuges. A lei, além de contextualizar tais violações em eventual processo de alienação parental, viabiliza maior efetividade na implementação da garantia constitucional.
O exame do histórico do caso, contexto em que praticados os atos e eventuais repetições é importante indicador para diferenciar atos de alienação parental de falhas pontuais inerentes ao exercício sadio da paternidade ou maternidade, que constituem a natural formação do sujeito. Da mesma forma, condutas de aparente cooperação, de aparente cuidado com os filhos ou de respeito à vontade que lhes é atribuída, podem mascarar atos de alienação parental. Crianças e adolescentes devastados psiquicamente por atos de alienação parental podem mostrar-se aparentemente sadios, em análise superficial.
A percepção acurada do juiz e o exame de tais atos, com apoio técnico se necessário, são decisivos para que se faça a diferenciação e se evite tanto o aprofundamento de eventual processo de alienação parental explícito ou mascarado, como também a intervenção excessiva, a judicialização da convivência íntima.
Pode-se constatar que uma das inovações da Lei que regulamenta a alienação parental é a realização de perícias. Obviamente com deferimento de decisão judicial, ela é fundamental para a caracterização da alienação parental, pois assim o juiz tem mais segurança na realização do seu julgamento.
6. A REALIDADE DA ALIENAÇÃO PARENTAL NA ARGENTINA
Na Argentina, existe uma lei de nº. 24270[15], que foi apresentada pela Associação denominada APADESHI, no congresso Argentino, que pune com prisão as pessoas que impeçam ou obstruam contato dos filhos menores com seus pais. Em suma, trata-se de punição que poderá ser de um mês a um ano de prisão aos que impeçam o contato do filho com o outro genitor, entretanto se a criança for menor de dez anos ou possuir alguma deficiência, a pena aumenta de seis meses a três anos de prisão.
Assim, a Lei Argentina de número 24270, está assim tipificada:
“Art. 1º Será reprimido con prisión de un mes a un año el Padre o tercero que, ilegalmente, impidiere u obstruyere el contacto de menores de edad com SUS Padres no convivientes.
Si se tratare de un menor de diez años o de un Discapacitado, la pena será de seis meses a tres años de prisión.
Art. 2º En las mismas penas incurrirá el Padre o tercero que para impedir el contacto del menor con el Padre no conviviente, lo mudare de domicilio sin autorización judicial.
Si con la misma finalidad lo mudare al extranjero, sin la autorización Judicial o excediendo los limites de esta autorización, las penas de prisión se elevarán al doble del mínimo ya la mitad del máximo.
Art. 3º El Tribunal deberá:
1.- Disponer en un plazo no mayor de diez días, los medios necesarios para restablecer el contacto del menor con sus Padres.
2.- Determinará, de ser procedente, un régimen de visitas provisorio por un término no superior a tres meses o de existir, hará cumplir el establecido.. En todo los casos el Tribunal deberá remitir los antecedentes a la Justicia civil. Em todos os casos, o Tribunal deve enviar os registros para a Justiça Civil.
Art. 4º Incorpórase como inciso 3º del artículo 72 del Código Penal el siguiente:" Impedimento de Contacto de los Hijos Menores con sus Padres No Convivientes."
Artigo 4 º incorporados como n. º 3 do artigo 72 do Código Penal, como segue: "impedir o contacto de crianças com pais que vivem juntos."
Art. 5 º Esta Ley se tendrá como complementaria del Código Penal.16 - 09 - 93 Aprobada en Comisiones de Diputados.13 - 10 - 93 Media sanción Cámara de Diputados 03 - 11 - 93 Sancionada por la Cámara de Senadores.25 - 11 - 93 Promulgada por el Poder Ejecutivo.26 - 11 - 93 Publicada en el Boletín Oficial.
Artigo 5 º Esta lei será complementar ao Código Penal.16 - 09-93 comissões Diputados.13 Aprovado - 10-93 da Câmara dos Representantes pena de Mídia 03 - 11-93 Sancionada pela Câmara dos Senadores.25 - 11 - 93 promulgada pelo Ejecutivo.26 - 11-93 publicações no Diário Oficial.”
No mesmo entendimento, a Lei Argentina prevê também sanção prisional para aquele genitor que se mudar para o exterior sem autorização judicial para tanto ou se excedeu aos limites de tal autorização. Nesse caso a pena será de prisão de, no mínimo duas vezes e meia, o limite máximo. Por essa lei é exigida uma atuação rápida dos Tribunais no intuito de interceder e restabelecer rapidamente o contato perdido pelo genitor.
7. CONCLUSÕES
Apontadas as soluções para os problemas indicados durante o decorrer do próprio texto, podem surgir os seguintes questionamentos: Será que as Leis Brasileira e Argentina foram editadas antes do tempo, antes de o assunto estar maduro o suficiente? Será que as leis tendem a se tornarem letra morta?
Respondendo ao primeiro questionamento, entende-se que as Leis foram editadas, cada qual em seu contexto, com um certo atraso, uma vez que a realidade vivenciada por ambas, nos dois países, já existe há bastante tempo. Porém, é certo que ambas precisam de algumas alterações pontuais.
A visitação assistida deve ser sempre assegurada como medida mínima, quando não existir a certeza de que o abuso sexual praticado por um dos genitores ocorreu, devendo ser deixado de lado o afastamento total entre pai e filho, de maneira a assegurar uma possível reaproximação no caso da denúncia ser falsa.
A perícia psicológica ou biopsicossocial deve ser sempre realizada, não estando ao arbítrio do juiz a sua determinação, já que o magistrado, por maior que seja a sua experiência, não possui os conhecimentos e técnicas específicos dos profissionais da psicologia e assistência social necessários para atestar a existência da alienação parental. Devendo o juiz limitar-se a encaminhar o caso para a realização da perícia, ao vislumbrar indícios desse processo.
Além disso, deveria retornar a possibilidade de submissão do litígio à mediação, que traria menores consequências psicológicas às crianças e adolescentes, já que, por ser um recurso mais rápido do que um processo judicial, o tempo de atuação do genitor alienador se reduziria, diminuindo o período de doutrinação perante o menor.
Por fim, respondendo a segunda indagação, de que referidas Leis deixem de ter aplicabilidade, tornando-se letra morta em seus ordenamentos, essa apreensão pode ser totalmente revertida. Para isso, devem-se vencer dois problemas: a desinformação e o receio/resistência da sua aplicação. A falta de informação deve ser combatida a partir da associação dos profissionais que lidam diretamente com a alienação parental (juristas, assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras), ou indiretamente (professores, médicos e enfermeiros) com o próprio Estado. Esta entidade deve divulgar a temática, promovendo pesquisas, avaliações, estatísticas, palestras, materiais informativos, cursos de formação, de forma a estimular o aprendizado, vencendo, assim, a preguiça do seu estudo e aplicação.
Com relação à resistência, alguns magistrados insistem em não reconhecer formalmente o processo de alienação parental, em razão da falta de informação e do “ranço” conservador do Poder Judiciário que impossibilita a inovação e adequação do ordenamento jurídico às novas reclamações da sociedade. É preciso verificar que acima do medo de inovar e da relutância de ler sobre o tema, existem inúmeras crianças e adolescentes brasileiros que perdem a chance de conviver harmonicamente com ambos os pais, sem traumas, angústias e visão deturpada de sua própria vida.
Por mais que tais orientações não venham sanar totalmente o problema daa aplicabilidades da lei, são extremamente válidas, pois, além de minimizar as sequelas de ordem psicológica nas crianças e adolescentes, permitem que se identifique com maior segurança a existência do processo de alienação parental e o seu verdadeiro autor.
Os documentários “A Morte Inventada”[16] e “Borrando a papá”[17] tratam do tema da Síndrome de Alienação Parental, respectivamente, no Brasil e na Argentina. Foram editados intercalando depoimentos dos pais e filhos alienados e comentários de profissionais da área de Serviço Social, Psicologia e Direito. A realidade é dolorosa, mas contribui para o debate do tema, identificação dos sintomas, condutas, críticas a lentidão dos processos, perícias superficiais e a própria concessão de medidas protetivas de urgência que afastam os pais sem suporte probatório e sem contraditório.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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