Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Serendipidade, bricolagem, consiliência:

métodos de trabalho e de investigação

Exibindo página 3 de 4
Agenda 10/12/2005 às 00:00

É Preciso Crescer Junto, Naturalmente

            Desse modo, como nós também vimos, é urgente entender o desenvolvimento tecnológico como um processo sócio-metabólico — até mesmo porque já ocorre(ra)m muitas interferências decisivas na constituição jurídica e na escritura política tradicional. Por um lado, há o caso clássico de que se opera o adensamento de uma grave crise institucional do Estado-Nação, em termos de representação, de legitimidade e de soberania. É preciso buscar uma base mais estrutural entre Estado e Sociedade.

            Por outros meandros, é preciso não sucumbir ao individualismo, ao niilismo, aos relativismos exacerbados — e é por isso que a pesquisa, a educação, o trabalho e a consciência política e jurídica de cada um interessa a todos.

            Com o objetivo de se analisar esse quadro global de transformações, a bricolagem, a serendipidade e a consiliência, como três métodos combinados com criatividade, além da vocação e da paixão pela ciência, formam um conjunto promissor e uma ótima maneira de se conciliar com o mundo real/virtual. Não fica devendo nada em termos de consciência acerca do objeto investigado ou das imprecisões do mundo real/virtual [18].

            Pode-se ver em profundidade e ao mesmo tempo ampliando o raio de ação da lateralidade da visão, pois ainda que a investigação possa ser oblíqua (com objeto definido, mas não definitivo ou engessado), só se perde no ambiente raso aquele ingênuo e despreparado. Isto se deve ao fato de que é muito bem possível aplicar-se o método de ler a contrapelo, vasculhando os escaninhos do poder e do establishment, como queria Benjamin (1987).

            O mais interessante ou estimulante, todavia, é que o autor/leitor não se vê limitado à leitura tipo quadro-a-quadro, sucessiva, hierárquica, como homem médio [19], mediano ou medíocre. Vemo-nos compungidos a ampliar a visão para o movimento do quadro-em-quadro, em movimento, inclusive com muitos quadros (sociais, políticos, pessoais) que não estão enquadrados. Ou, então, de modo similar, quando re-enquadramos a relação Estado/Sociedade a partir de visões pluridimensionais, multifocais e não mais pelo olhar bifocal [20] (Débray, 1994).

            Neste sentido, esse movimento não deixa de constituir um belo meio de se tecer uma consciência ampla, elevada ao cubo, em que o social, o psíquico, o ambiental — o mais verdadeiramente humano — estejam reunidos, como conjunto complexo articulado em rede (Guattari, 1991).

            A serendipidade, portanto, é um modo especial de ver o mundo, pois se busca trazer o mundo para perto da vida — fazendo com que a vida global seja parte do nosso mundo. Isso, aliás, é o que torna a tarefa da pesquisa uma construção viva, porque assim imprimimos nossas impressões, mas também nossas imprecisões [21].

            Por fim, podemos dizer que, em razão de tantas buscas e tentativas, a indicação bibliográfica sempre será variada e extensa. Por isso, a conclusão é um convite para que se verifique a bibliografia consultada e assim se estimulem novas pesquisas. A conclusão é um convite para novas e boas leituras — sempre vale a pena.


Adendos

            Neste último item, os comentários do autor sempre virão em notas de pé de página, assim como os interlocutores serão apresentados em breve currículo. Depois, seguirão seus comentários, que virão cercados por aspas e em tipo de letra diferente, para que seja assegurado de fato o destaque.


Comentários Realizados por Profissionais de Áreas Diversas

            1. Mucheroni, Marcos Luiz. Bacharel em Ciência da Computação pela UFSCar/SP, onde lecionou 10 anos, publicou inúmeros artigos nacionais e internacionais, é Doutor em Engenharia Elétrica (Poli-USP) e professor de Paradigmas de Linguagens (graduação e pós-graduação), na Faculdade de Informática da Fundação de Ensino "Eurípides Soares da Rocha" e Teoria do Caos e Cibercultura (mestrado em Ciência da Informação) na UNESP de Marilia.

            "Eu te encorajo por estes novos caminhos, está mais perto de uma mística do que imagina, quando usa Tao T.King e diz, "o verdadeiro significado do jarro está no seu vazio" é algo muito profundo e que eu concordo. Penso que é um confronto com o "poder argumentatório" do direito clássico, li certa vez que só há uma forma de enfrentar o oportunismo: calar-se e deixar que ele morra pela própria boca, já vi isto acontecer com muita gente e recentemente com aquela "esquerda" que não tem princípios e não luta por nada, a não ser o "contra".. . "não sei o quê". Mas prepare-se para ser chamado de pós-moderno, que é o xingamento atual para quem não quer entrar no mérito do que é debatido [22]".

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

            "Não conhecia o termo, mas creio que é este o caminho de se buscar alternativas à "autoridade de quem fala", e que é o verdadeiro sentido do direito positivo. No fundo, o juiz decide quando as normas não dão conta, ou seja, na maioria das vezes, porque o direito retilíneo só trata do homem retilíneo, ou seja não existe tal homem".

            "Parabéns, conte comigo, creio que o caminho da "serendipidade" é o único caminho de verdadeiros pesquisadores e gente honesta, que não tem pré-conceito dos estudos e coisas a discutir. Posso citar uns 10 casos na história da computação de "serendipidade", mas para citar um muito importante, o projeto ARPA (do pentágono americano) só foi desenvolvido porque o projeto Sputinik dos russos os pegou de surpresa, e a "moral de superioridade tecnológica" ficou abalada. Um psicólogo JCR Licklider, que trabalhava no projeto, convenceu os "militares americanos" de que a rede poderia aumentar a capacidade tecnológica (‘inteligência coletiva’) e, então, abriram para 4 universidades (Utah, California, Massachusets e Cambridge: aí para se popularizar foi um passo)".

            "Uma última coisa: o Braben, se for o David Braben ele é conhecido na computação por criar joguinhos de computador: fez o primeiro joguinho 3D bom, chamado the Acorn Archimedes e é o dono de uma empresa, a company Frontier Developments. Deixei os links para dar uma olhada".

            2. Gilberto Giacóia. Autor de referência nacional no Direito Penal, é coordenador do Mestrado em Direito na Faculdade de Direito do Norte Pioneiro, Jacarezinho-PR. Professor pós-doutor em Direito, é Procurador da Justiça no Estado do Paraná.

            Aplicando a clareza do método, em concisão assim se referiu aos ideais presentes no trabalho:

            "Trata-se de uma produção divertida (agradável mesmo de ler e refletir), moderna e bastante criativa. Uma extraordinária experiência didática, para não dizer mais de vida [23] e de ideal, e que pode ser recomendada aos alunos ou mesmo ser adotada pelos profissionais do Direito".

            3. Eduardo Akira Azuma. Bacharel em Direito, advogado e mestrando na área de Direito e Internet.

            "Acho que a pesquisa flui muitas vezes por laços improváveis e que, muitas vezes, é frutífera justamente por ser conduzida não a toque de caixa (como a preocupação quantitativa de dissertações de mestrado e doutorado de um determinado programa), mas sim de uma forma um tanto libertária, livre de pressões em torno de grupos de pesquisa, ou, como no cenário que vem à nossa mente de Isaac Newton levando uma maçã na cabeça em baixo da sombra de uma árvore".

            "E como reforço destas idéias expostas, o surgimento da Internet nos fornece várias lições, afinal, o próprio Castells reconhece que a história do surgimento da Net é fruto de uma mistura um tanto estranha entre Big Science (a ciência que envolve grandes quantias de dinheiro), pesquisas militares e a Cultura da Liberdade. A atmosfera em torno dos grupos de pesquisa era totalmente relaxada do ponto de vista da segurança, e a Arpanet era utilizada constantemente para conversa entre os estudantes (se pensarmos que hoje, em 2005, existem faculdades que restringem o uso de computadores dos seus laboratórios somente ao site da própria faculdade...)".

            "Outro ponto que achei interessante do texto é a ‘Serendipidade no cotidiano’. Além do esforço diário nos estudos para perceber que o cavalo encilhado está passando (ou seja, é preciso estudar muito para reconhecer que o cavalo está encilhado), penso que isto é também um exercício de Inteligência Coletiva, posto que estaríamos abertos para reconhecer que o conhecimento não está somente nos bancos das escolas, mas pode ser impulsionado por uma simples conversa com uma criança".

            "Como reconhece Robert Oppenheimer: ‘existem meninos que ainda brincam na calçada que poderiam resolver alguns dos meus mais espinhosos problemas de física; eles têm modos de percepção que eu perdi há quarenta anos".

            "Vou pensar mais no assunto (este texto foi elaborado no banho...rs.)".


BIBLIOGRAFIA

            ALVES, G. & MARTINEZ, V. Dialética do Ciberespaço: trabalho, tecnologia e política no capitalismo global. Bauru-SP : Editora Document Arminda, 2002.

            BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas – Magia e Técnica, Arte e Política. 3ª ed. São Paulo : Brasiliense, 1987.

            BRABEN, D. Ser Cientista: o Espírito de Aventura em Ciência e Tecnologia. Campinas-SP : Papirus, 1996.

            CASTELLS, M. O poder da identidade (A era da informação: economia, sociedade e cultura; v. 2). Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1999.

            CHAUÍ, M. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. São Paulo : Cortez, 1990.

            CLASTRES, P. A sociedade contra o Estado: pesquisas de antropologia política. 5. ed. São Paulo: Francisco Alves, 1990.

            DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro : Contraponto, 1997.

            DEBRAY, Régis. O Estado Sedutor: as revoluções midiológicas do poder. Petrópolis-RJ : Vozes, 1994.

            DELEUZE, Gilles. Conversações, 1972-1990. Rio de Janeiro : Ed. 34, 1992.

            ________O atual e o virtual. IN : ALLIEZ, Eric. Deleuze filosofia virtual. São Paulo : Editora 34, 1996.

            DELEUZE, Gilles & GUATARRI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 1. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995.

            EINSTEIM, Albert. Escritos da maturidade: ciência, religião, racismo, educação e relações sociais. (2ª edição). Rio de Janeiro : Editora Nova Fronteira, 1994.

            _______O poder nu. SãoPaulo : Rotterdan Editores Ltda, 1994b.

            GUATTARI, Félix. As três ecologias. Campinas, São Paulo : Papirus, 1991.

            GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro : Record, 2000.

            J. POSADAS. A ciência, os cientistas e a construção do socialismo. Editora Ciência, Cultura e Política, 1981.

            LEITE, M. A nova alquimia: E. O. Wilson propõe panacéia naturalista contra o caos pós-moderno. Folha de São Paulo, 22 mar 1998. Caderno 5, p. 4.

            LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência: o Futuro do Pensamento na Era da Informática. Rio de Janeiro :Editora 34, 1993.

            _____. Os perigos da "máquina universo". IN : PESSIS-PASTERNAK, G. Do caos à inteligência artificial: quando os cientistas se interrogam. São Paulo : Editora da Universidade Estadual Paulista, 1993.

            _____. O que é o virtual? São Paulo : Editora 34, 1996.

            _____. O digital e a inteligência coletiva. Folha de São Paulo, 06 jul 1997. Caderno 5, p. 3.

            _____. O inexistente impacto da tecnologia. Folha de São Paulo, 17 ago 1997. Caderno 5, p.3.

            _____. Todos dizem "eu estou aqui". Folha de São Paulo, 21set 1997. Caderno 5, p.3.

            _____. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. São Paulo : Edições Loyola, 1998.

            _____. A reencarnação do saber: o ciberespaço não é um mundo frio, mas o lugar de uma fervilhante população. Folha de São Paulo, 22 fev 1998. Caderno 5, p.3.

            _____. Um sistema auto-regulador: a internet tem sido capaz de criar mecanismos próprios de controle das informações. Folha de São Paulo, 12 abr 1998. Caderno 5, p.3.

            LÉVI-STRAUSS, Claude. O Pensamento Selvagem. Campinas, SP : Papirus, 1989.

            LÖWY, Michael. Método dialético e teoria política. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1975.

            MARTINEZ, V. C. A rede dos cidadãos: a política na Internet. Tese de doutorado. São Paulo : Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP), 2001.

            MÉSZÁROS, István. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. Boitempo Editorial ; Editora da UNICAMP : São Paulo : Campinas, 2002.

            MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo : Cortez; Brasília, DF : UNESCO, 2000.

            MÜLLER-HILL, B. Ciência Assassina : Como Cientistas Alemães Contribuiram Para a Eliminação de Judeus, Ciganos e Outras Minorias. Rio de Janeiro : Xenon, 1993.

            NEGRI, Antonio & LAZZARATO, Maurizio. Trabalho Imaterial: formas de vida e produção de subjetividade. Rio de Janeiro : DP&A, 2001.

            ORTEGA y GASSET, J. A Desumanização da Arte. São Paulo : Cortez, 1991.

            PESSIS-PASTERNAK, G. Do Caos à Inteligência Artificial: Quando os Cientistas se Interrogam. São Paulo : Editora da Universidade Estadual Paulista, 1993.

            PRIGOGINE, Ilya. As leis do caos. São Paulo : Editora da UNESP, 2002.

            RAMONET, I. O Pensamento Único. Jornal Em Tempo: publicação da tendência democracia socialista, abr. 1995, p. 20.

            ROBERT, H. O advogado. São Paulo : Martins Fontes, 1997.

            ROBERTS, R.M. Descobertas Acidentais em Ciências. Campinas-SP : Papirus, 1993.

            ROUANET, Sérgio Paulo. Democracia mundial. IN : Novaes, Adauto (org.). O avesso da liberdade. São Paulo : Companhia das Letras, 2002.

            SCHAFF, Adam. A sociedade informática. São Paulo : Brasiliense, 1992

            Tao te King: o livro do Tao e sua virtude: versão integral e comentários, de Lao Tsé. (2ª ed.). São Paulo : Attar, 1995, páginas 119 a 203.

            VIRILIO, Paul. O Espaço Crítico. Rio de Janeiro : Editora 34, 1993.

            ____. Velocidade e Política. São Paulo : Estação Liberdade, 1996.

            WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo : Cultrix, 1993.

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINEZ, Vinício Carrilho. Serendipidade, bricolagem, consiliência:: métodos de trabalho e de investigação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 890, 10 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7692. Acesso em: 22 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!