As reações à decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, de requerer ao Banco Central o acesso a todos os relatórios de inteligência financeira produzidos nos últimos três anos são duplamente relevantes.
O ministro rejeitou um pedido apresentado pelo Procurador-Geral da República, Augusto Aras, e ampliou a solicitação de acesso aos relatórios financeiros de cerca de 600 mil pessoas produzidos nos últimos três anos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – rebatizado Unidade de Inteligência Financeira (UIF). A resposta de Toffoli à manifestação de Aras foi rápida e em tom provocativo. Agora, o presidente da Corte quer saber, também, quem no Ministério Público Federal e no órgão de controle teve e tem acesso a essas informações sigilosas.
Trata-se de uma verdadeira devassa em dados fiscais e de inteligência financeira.
Quais são os propósitos do presidente do STF ao tomar tal medida insólita e que soa abusiva e sem limites, sem qualquer transparência para fundamentá-la?
Algo próprio de Estados autoritários.
Algo que jamais houve na história judiciária do Brasil.
O presidente do Supremo Tribunal Federal ultrapassou todos os limites.
Há uma cortina de fumaça para o cerne da questão: quais foram as autoridades que acessaram esses dados sem o aval da Justiça? E sob quais fundamentos?
A medida judicial aqui historiada fere ao princípio da razoabilidade.
A razoabilidade é vista na seguinte tipologia:
a) Razoabilidade como equidade: exige-se a harmonização da norma geral com o caso individual;
b) Razoabilidade como congruência: exige-se a harmonização das normas com suas condições externas de aplicação;
c) Razoabilidade por equivalência: exige-se uma relação de equivalência entre a medida adotada e o critério que a dimensiona.
Não se pode eleger uma causa inexistente ou insuficiente para a atuação estatal. Os princípios constitucionais do Estado de Direito (artigo 1º) e do devido processo legal (artigo 5º, LIV), da Constituição exigem o confronto com parâmetros externos a elas.
Não se pode conviver com discriminações arbitrárias.
Há de se considerar uma razoabilidade interna, que se referencia com a existência de uma relação racional e proporcional entre motivos, meios e fins da medida e ainda uma razoabilidade externa, que trata da adequação de meios e fins. No caso em tela há absoluta dissonância entre os motivos, meios e fins da medida, de forma a aduzi-la como fora do razoável.
Proíbe-se o excesso.
Na aplicação do princípio há três elementos:
a) princípio da conformidade ou adequação de meios: a medida que pretende realizar o interesse público deve ser adequada aos fins subjacentes a que visa a concretizar. O controle dos atos do poder público que devem atender a "relação de adequação medida fim", pressupõe a investigação e prova de sua aptidão para e sua conformidade com os fins que motivaram a sua adoção;
b) princípio da necessidade: A ideia subjacente ao princípio é invadir a esfera da liberdade do individuo o mínimo possível. É o entendimento do Tribunal Constitucional Federal alemão que formulou a seguinte máxima: "o fim não pode ser atingido de outra maneira que afete menos ao indivíduo", extraindo-a do caráter de princípio das normas de direito fundamental. A opção feita pelo legislador, ou o executivo, deve ser passível de prova no sentido de ter sido a melhor e única possibilidade viável para a obtenção de certos fins e de menor custo ao indivíduo. O atendimento à relação custo-beneficio de toda decisão político-jurídica, a fim de preservar o máximo possível do direito que possui o cidadão. Canotilho (Direito Constitucional, 5ª edição, pág. 387) citou outros elementos integrantes ao princípio da necessidade, elaborados pela doutrina no intuito de operacionalizá-lo na prática: a) a necessidade material, pois o meio deve ser o mais poupado possível quanto à limitação dos direitos fundamentais; c) a exibilidade temporal pressupondo a rigorosa delimitação no tempo da medida coativa do poder público; d) a exibilidade pessoal que significa que a medida se deve limitar à pessoa ou pessoas, cujos interesses devem ser sacrificados.
c) Princípio da proporcionalidade em sentido estrito: Confunde-se com a pragmática da ponderação ou lei da ponderação. Decorre da análise do espaço de discricionariedade semântica (plurissignificação), vacuidade, porosidade, ambiguidade, fórmulas vazias presentes no sistema jurídico. Constitui requisito para a ponderação de resultados e adequação a adequação entre meios e fins. Deve-se analisar se o resultado obtido com a intervenção é proporcional à carga coativa da mesma.
Por tudo isso, essa sinistra medida cujos limites ainda não estão elucidados e cujos motivos são desconhecidos, o que é algo que soa estranho, dada a força da medida policialesca tomada, deve ser censurada.
Os direitos fundamentais foram atingidos por uma medida de quem tem como precípua missão a sua guarda.
O presidente do STF, dentro de um Estado Democrático de Direito, mostra que não tem limites e preparo ao exercitar algo que é próprio de um Estado Fascista, em que os fins justificam os meios.