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O Acordo e a Convenção de Schengen

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Agenda 08/01/2006 às 00:00

1.7 - S.I.S. - Sistema de Informações de Schengen

Nos seus artigos 92º a 101º, a Convenção de Schengen criou o Sistema de Informação de Schengen (S.I.S.), que consiste essencialmente num ficheiro informático, ao qual os estados membros terão acesso, e que pretende coordenar as medidas a tomar em matéria de segurança no espaço Schengen e a tornar mais eficaz a cooperação policial entre os estados Schengen.

No artigo 92º, a Convenção de Schengen define que este sistema será composto por uma parte nacional junto de cada parte contratante e por uma função de apoio técnico cuja responsabilidade cabe à República Francesa e que será instalada em Estrasburgo.

O S.I.S. "permitirá às autoridades designadas pelas parte contratantes, graças a um processo de consulta automatizado, disporem da lista das pessoas indicadas e de objectos, aquando dos controlos nas fronteiras e das verificações e outros controlos de polícia e aduaneiros efectuados no interior do estado em conformidade com o direito nacional, bem como apenas em relação à lista de pessoas indicadas a que se refere o artigo 96º, para efeitos do processo de emissão de vistos, da emissão de títulos de residência e da administração de estrangeiros, no âmbito da aplicação das disposições da presente convenção sobre a circulação de pessoas" [125].

Esquematicamente poder-se-à definir o S.I.S. como um sistema de registos informáticos que contém determinados tipos de dados, fornecidos pelos estados aderentes e que se destinam a ser consultados por estes.

É de realçar também, conforme vamos verificar no texto da Convenção nesta matéria, que o S.I.S. não dispõe de autonomia em relação às partes contratantes. O S.I.S. é apenas o instrumento que coloca em comum as diferentes informações fornecidas pelas partes contratantes. Na realidade existe um sistema central (C.S.I.S.) que é o banco de dados de referência e existem os sistemas nacionais (N.S.I.S.),onde são inseridos os elementos por cada parte contratante. Todos estes sistemas nacionais estão ligados a Estrasburgo e quando um operador nacional devidamente autorizado pretende consultar determinados dados pode fazê-lo através do C.S.I.S., que está sempre actualizado e que permite um acesso directo a esses dados, não tendo o operador interessado de esperar pela autorização do estado que originariamente inseriu os dados na base de dados, o que era o principal factor de atrasos nas trocas de informações. Os sistemas nacionais não comunicam directamente entre eles, mas sim por intermédio de um sistema central que possibilita o acesso aos dados solicitados, por um utilizador autorizado em apenas alguns minutos.

O S.I.S. não é portanto um sistema policial, ou um sistema europeu, mas sim um conjunto de sistemas nacionais com um apoio central em Estrasburgo. É no entanto a polícia a primeira beneficiária deste sistema, que lhe permite obter informações actuais com credibilidade e velocidade.

Face à eliminação das fronteiras internas, ter-se-á de criar um controlo nas fronteiras externas mais rigoroso, com maior e melhor cooperação policial, sabendo que os principais problemas que daí resultam são a imigração, aumento da criminalidade e a menor segurança do estado.

O S.I.S. responde a estas necessidades ao ter por objectivos, conforme prevê o artigo 93º da Convenção de Schengen, preservar a ordem e a segurança públicas, incluindo a segurança do estado, bem como aplicação das disposições da Convenção sobre a circulação de pessoas nos territórios das partes contratantes, com base nas informações transmitidas por este sistema.

É assim necessário haver um terminal informatizado do S.I.S. em cada fronteira exterior do espaço Schengen, que esteja apto [126] a fornecer informações e que possa aceder à central instalada em Estrasburgo.

No relatório de informação do Senado Francês de 28 de Junho de 1993, foi referido o atraso no S.I.S., realçando sobretudo as dificuldades técnicas para instalar o sistema central.

Os ministros e secretários de estado encarregados de colocar em funcionamento o S.I.S. declararam após uma reunião em Madrid em 30 de Junho de 1993, "que um S.I.S. operacional é condição indispensável para a eliminação do controlo nas fronteiras internas. Que importantes progressos foram realizados neste domínio, mas é necessário acelerar os trabalhos para permitir um funcionamento progressivo do S.I.S. de acordo com a evolução que os estados foram tendo nesta matéria e que os seus N.S.I.S. estejam operacionais".

O S.I.S. incluirá exclusivamente as categorias de dados que são fornecidas por cada uma das partes contratantes e necessárias para os fins previstos nos artigos 95º a 100º da Convenção, sendo essas categorias de dois tipos: pessoas e objectos.

A Convenção, no parágrafo 3º do artigo 94º, indica com precisão as informações máximas que podem ser inseridas no S.I.S. sobre uma pessoa [127]. Cria-se portanto um ficheiro de pessoas que nas diferentes partes contratantes podem pôr em causa os objectivos previstos no artigo 93º.

A alínea j) do parágrafo 3º do artigo 94º ("A conduta a adoptar") vai indicar o comportamento que o agente policial do outro estado deverá ter e que em regra é de deter a pessoa, assinalar a presença da mesma no seu território nacional ou mantê-la sob vigilância.

A Convenção prevê quais os comportamentos a adoptar nos diferentes casos, v.g. extradição [128], recusa de admissão [129], testemunhas [130] e pessoas a vigiar [131], sendo sempre medidas que têm efeito prático e não apenas teórico.

Quanto aos objectos que são inseridos no S.I.S., estes devem ser procurados para efeito de apreensão ou de prova em processo penal [132], e verifica-se que todos têm em comum o facto de possuírem um número de série alfanumérico [133] (excepto os documentos em branco).

Um sistema informático que permitisse o funcionamento das disposições previstas no S.I.S., teria de ter uma grande complexidade técnica. A França foi incumbida de instalar o sistema central do S.I.S. em Estrasburgo [134]. Após numerosas dificuldades técnicas, esse sistema informático está finalmente a funcionar. Os custos de instalação e utilização do sistema central serão repartidos pelas diferentes partes contratantes em percentagem determinada pela matéria colectável uniforme do imposto sobre o valor acrescentado na acepção do nº 1, alínea c), do artigo 2º da Decisão do Conselho das Comunidades Europeias, de 24 de Junho de 1988, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades. Os custos de instalação e de utilização da parte nacional do S.I.S. serão suportados individualmente por cada parte contratante [135].

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É referido que o S.I.S. terá uma capacidade de arquivar aproximadamente 800.000 fichas de pessoas e 6.700.000 fichas de objectos [136]. Apesar de confidencial serviços próximos do Secretariado Geral de Schengen, referem que existem hoje mais de 1 milhão de fichas relativas a pessoas.

1.7.1 - SIRENE - Supplementary Information Required at the National Entries

Os comportamentos permitidos nos artigos 95º, 96º, 98º e 99º da Convenção de Schengen, podem ter consequências muito graves pelo que foi decido criar um sistema de apoio, que ajude a tomar as decisões relativas aos comportamentos a tomar. Esse sistema é o SIRENE [137], que permite estabelecer um contacto com os diferentes estados membros, nomeadamente o estado que no caso concreto esteja em causa e saber qual o comportamento que este pretende para o caso em análise, ou ainda outras informações complementares indispensáveis.

Os artigos 39º, 46º e 108º da Convenção constituem a base legal do SIRENE.

Este sistema é na realidade uma parte da base nacional do S.I.S. de cada estado membro, que, quando solicitado, pode fornecer informações sobre o comportamento a adoptar. O SIRENE é constituído por funcionários ou magistrados, com dependência hierárquica do ministério onde trabalham e a indicação dos comportamentos a adoptar será feita pela pessoa com poderes para o acto no sistema jurídico interno. Por exemplo, se se tratar de uma extradição, acto que tem natureza judicial, terá de ser um magistrado a indicar o comportamento a seguir. Este sistema pretende em caso de descoberta de alguma situação prevista na base de dados, colocar em contacto os agentes que estão no local (polícia) com a entidade estrangeira requerente.

Para a organização do SIRENE, os estados têm muita liberdade para decidir qual a melhor solução, mas existe um manual que impõe certas condutas e procedimentos, que indica a forma de organização e serve simultaneamente de manual do utilizador.

O SIRENE será o único ponto de contacto possível entre os estados nestas matérias, pois ao nível da obtenção de informação esta é feita sem consentimento do mesmos.

Os casos em que o SIRENE poderá intervir e que estão previstos na Convenção de Schengen são os seguintes:

- Troca de informações anteriores a uma indicação, quer no caso de extradição [138], quer no caso de ameaça grave para a segurança interna e externa do estado [139].

- Troca de informações simultaneamente com inserção de uma indicação, no caso de detenção provisória com vista à extradição [140].

- Troca de informações em caso de dupla indicação, para evitar comportamentos contraditórios [141].

- Troca de informações após a sua validação, que permita a uma parte contratante recusar temporária ou definitivamente a execução de um comportamento a observar no seu território nacional [142].

- Troca de informações em caso de resposta positiva que permita ao utilizador final escolher o melhor comportamento a adoptar [143].

- Troca de informações relativas a estrangeiro não admissível, mas só informações sobre indicações ou supressões de indicações [144].

- Troca de informações no caso de impossibilidade de execução de um comportamento a adoptar [145].

- Troca de informações quando houver alteração da categoria da indicação [146].

- Troca de informações quando se verificar que um dado sofre de um erro de direito ou de facto [147].

- Troca de informações relativa aos direitos de acesso e rectificação de dados [148].

Verifica-se assim que toda a acção do SIRENE é efectuada sob rigorosas medidas de segurança e só nos casos expressamente previstos na Convenção.

O acesso ao sistema está regulado no artigo 100º e está limitado às entidades competentes para efectuar controlos fronteiriços, e outras verificações de polícia e aduaneiras, efectuadas no interior do estado, bem como a respectiva coordenação. Também em matéria de vistos e títulos de residência, as autoridades de cada estado membro podem de acordo com o seu direito nacional e nos termos em que este o preveja ter acesso aos dados. Prevê o artigo 100º nº 4º, que as partes contratantes comunicarão ao Comité Executivo a listagem das autoridades competentes a consultar directamente os dados e quais os dados que podem consultar em função das suas tarefas, pois este é outro princípio consagrado no artigo 100º parágrafo 3º, que diz que os utilizadores só podem consultar os dados que sejam necessários ao cumprimento das suas tarefas.

Em Portugal foi criado pelo D.L. 292/94 de 16 de Novembro o Gabinete Nacional SIRENE, na dependência do Ministro da Administração Interna e que prevê que as entidades utilizadoras do S.I.S. são: a Guarda Nacional Republicana, a Polícia de Segurança Pública, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, a Direcção Geral das Alfândegas, a Polícia Judiciária e a Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas [149].

Noutros estados o Gabinete Nacional SIRENE pode estar sob a dependência de outros ministérios e são outras forças policiais a utilizarem o S.I.S., o que confirma a ideia que será difícil uma coordenação destas actividades [150].

1.7.2 - Protecção dos dados pessoais e segurança dos dados no âmbito do S.I.S.

Durante o período em que se foi redigindo a Convenção, todas as partes concordaram que seria necessário prever um sistema em matéria de protecção de dados, uma vez que não havia uma uniformidade nas legislações dos diferentes estados. Havia estados que tinham a sua legislação nesta matéria, mas que era diferente entre eles, e havia estados que não a tinham. A Convenção nº 108 de 28 de Janeiro de 1981 do Conselho da Europa, sobre a protecção de pessoas face ao tratamento automatizado de dados de carácter pessoal, foi ratificada por alguns estados (casos da Alemanha, Luxemburgo e França), mas não foi ratificada por Portugal e pela Holanda, estados que têm legislação interna nesta matéria. Outros estados não ratificaram a convenção e não tinham legislação interna nesta matéria (caso da Itália e Bélgica) [151].

Havendo por parte das partes contratantes uma perfeita noção da importância que tem a protecção dos dados de carácter pessoal, e da diversidade de critérios e mesmo da ausência de legislação verificada entre os diversos estados, e dos problemas que isso poderia provocar, reuniram-se os representantes dos 5 estados iniciais de Schengen em 9 de Fevereiro de 1988 para discutir estas questões, fazendo sempre referência à Convenção nº 108 de 28 de Janeiro de 1981 do Conselho da Europa. Num segundo encontro sobre este tema, em 17 de Março de 1989, foi adoptada uma declaração comum prevendo que a entrada em vigor do S.I.S. deveria ser subordinada:

- À definição precisa, obrigatória e definitiva do conteúdo do ficheiro;

- À existência de um direito de acesso, de um direito de rectificação das informações e de um direito de eliminação das informações não pertinentes;

- À existência em cada estado membro de uma instância de controlo independente;

- À criação de um órgão comum de estudo e harmonização, composto por representantes dos órgãos nacionais de controlo;

- À associação dos órgãos de controlo já existentes quando da elaboração do S.I.S.;

- À consideração das disposições da Convenção do Conselho da Europa para a protecção de pessoas face ao tratamento automatizado de dados de carácter automatizado, como obrigações mínimas a respeitar.

Em resultado de todos os trabalhos e reuniões preliminares efectuadas, os artigos 102º a 118º da Convenção de Schengen foram redigidos de modo a permitirem a protecção dos dados de carácter pessoal e a segurança dos mesmos no âmbito do S.I.S.

As ideias essenciais deste sistema de protecção são as seguintes:

- Os dados só podem ser utilizados para os fins enunciados nos artigos 95º a 100º, não lhe podendo ser dado outro destino [152].

- Os dados devem ser exactos, actuais e a sua inserção no sistema deve ser lícita, e a parte contratante deve ser responsável por esses factos e só a parte contratante é autorizada a alterar, a completar, a rectificar ou a eliminar os dados que introduziu [153].

- Se verificar um erro, a parte contratante que introduziu esse registo deve corrigi-lo ou eliminá-lo e se for outra parte contratante a verificar que pode haver um erro, deve indicar o mais rapidamente possível a parte contratante que inseriu o registo, com o fim de esta verificar a situação e se necessário corrigir ou eliminar imediatamente o dado [154].

- Colaboração entre as partes contratantes quer para resolver os casos em que uma parte dá a informação de um possível erro sobre um dado e a outra parte contratante não concorda com essa indicação [155] e colaboração para os casos em que uma parte já introduziu elementos sobre uma pessoa e se depois outra parte pretender também inserir informações sobre a mesma pessoa, deverá acordar com a parte que fez a primeira inserção, a inserção de posteriores informações [156].

- Possibilidade de responsabilizar uma parte contratante pelo prejuízo causado pela exploração nacional do ficheiro do S.I.S. e consequente obrigação de indemnizar pela parte contratante que inseriu os dados, ainda que estes tenham sido utilizados por outra parte contratante excepto se esta o fizer em violação da presente Convenção [157].

- O direito de acesso aos dados que dizem respeito a uma pessoa, direito à rectificação ou eliminação de dados que lhe digam respeito, com base em erro de facto ou de direito e direito de instaurar uma acção judicial nomeadamente com o fim de rectificação, eliminação, informação ou indemnização [158].

- Os dados pessoais inseridos no S.I.S., serão conservados apenas pelo período considerado necessário para atingir os fins a que se destinam e no prazo máximo de 3 anos após a sua inserção, a parte contratante responsável pela inserção deverá apreciar a necessidade da sua conservação, prazo que será reduzido para 1 ano no caso de pessoas colocadas sob a vigilância da polícia [159]. Para os objectos os prazos são mais dilatados [160], o que se justifica perfeitamente, uma vez que os valores em causa são de outras características.

- Foi criada uma autoridade de controlo nacional, que terá acesso ao ficheiro nacional do S.I.S., e que deverá exercer um controlo independente e verificar que o tratamento e a utilização dos dados não atentam contra os direitos da pessoa em causa [161].

- Foi criada uma a autoridade de controlo comum, composta por dois representantes da autoridade nacional de controlo, com direito a um voto e que é encarregada da função de apoio técnico do S.I.S. [162].

- Para atingir uma harmonização mínima ao nível da protecção dos dados pessoais, as partes contratantes concordaram que o mais tardar, no momento da entrada em vigor da Convenção de Schengen, as diferentes disposições nacionais nessa matéria devem assegurar um nível de protecção nessa matéria pelo menos igual ao decorrente dos princípios da Convenção do Conselho da Europa de 28 de Janeiro de 1981, relativa à protecção de pessoas face ao tratamento automatizado dos dados pessoais e em conformidade com a Recomendação R (87) 15, de 17 de Setembro de 1987, do Comité de Ministros do Conselho da Europa, que tem por objectivo regulamentar a utilização dos dados pessoais no sector da polícia [163].

- Para finalizar, as partes comprometem-se a tomar as medidas adequadas de confidencialidade e segurança, necessárias à protecção do ficheiro, de modo a impedir o acesso e a utilização dos ficheiros por pessoas não autorizadas; impedir a cópia e alteração desses ficheiros, e garantir o controlo da introdução, da transmissão e do transporte dos dados.

Situação caricata é a que resulta do facto de, se por imposição da Constituição de um estado, ou da sua legislação, e como as próprias disposições do S.I.S. prevêem, qualquer pessoa nomeadamente um criminoso, poder pedir para saber o que consta da sua ficha no S.I.S., e se dela nada constar pode depois livremente circular no espaço Schengen.

Sobre o autor
Eugénio Pereira Lucas

professor adjunto da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Leiria - Instituto Politécnico de Leiria em Fátima (Portugal)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LUCAS, Eugénio Pereira. O Acordo e a Convenção de Schengen. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 919, 8 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7809. Acesso em: 27 nov. 2024.

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