RESUMO
Este artigo busca analisar, através das lentes constitucionais, as variadas interpretações previstas no texto normativo constitucional brasileiro, que determina os limites morais e/ou jurídicos, no que diz respeito à liberdade de expressão, contextualizando com a situação social brasileira hodierna e a chamada “Era da pós verdade’’. De maneira científico-filosófica, visa ainda debater a importância da garantia e manutenção da liberdade de expressão como um direito fundamental e suas implicações no mundo virtual. O método adotado para a coleta de dados foi o bibliógrafo (ADEODATO, João Maurício, 2011).
Palavras-chave: Constituição; Liberdade de expressão, Direitos fundamentais.
ABSTRACT
This article seeks to analyze, through constitutional lenses, how various interpretations used in the Brazilian constitutional normative text, which determine moral and / or legal limits, which do not respect freedom of expression, contextualize with a Brazilian social situation today and the so-called “Era”. of post truth ''. In a scientific-philosophical manner, the visa will still debate the importance of guaranteeing and maintaining freedom of expression as a fundamental right and its implications in the virtual world. The method adopted for data collection was the bibliographic (ADEODATO, João Maurício, 2011).
Keywords: Constitution, Freedom of expression, Fundamental rights.
1. INTRODUÇÃO
Classificada como um dos direitos fundamentais previstos na constituição, a liberdade de expressão é elemento inalienável aos sistemas democráticos, pois limita o abuso de poder e garante não só a possibilidade de cada indivíduo demonstrar sua opinião e expor seu pensamento, mas também a garantia de que este não será punido por realizar tais atos. Apesar desse direito está assegurado desde as primeiras três constituições, em 1967 a democracia perde espaço para o período ditatorial e a censura é um dos artifícios utilizados para a manutenção do autoritarismo. A título de exemplo, são os meios de comunicação que se tornaram submissos pelo Ato Inconstitucional n°.5 em 1968.
Diante dos embates ocorridos no processo histórico, finalmente a Carta Magna de 1988, reintegrou à parcela social o direito à liberdade de se expressar. Desde então, nota-se que tal direito é possibilitado de colidir com outros direitos, entregando ao passo que é importante proteger a liberdade de expressão, também é imprescindível que haja proteção aos outros direitos fundamentais igualmente assegurados constitucionalmente.
Hoje, com a crescente utilização da internet e de redes sociais na década de 2010, algo extremamente recente do ponto de vista jurídico, o Brasil passa a encontrar dificuldades de amparar em sua legislação os fatos e conflitos que envolvem a liberdade de expressão no mundo virtual, ambiente que abrange todos os temas e tem alcance quase universal não apenas no país, mas no mundo. Esse aumento de utilização das redes sociais e a rapidez de comunicação através destas, fomenta o que o filósofo Zygmunt Bauman nomeia de ‘’Relações Líquidas’’, ou seja, relações rápidas, moldáveis e efêmeras, tornando impossível que o sistema Legislativo brasileiro acompanhe as mudanças sociais e resolva os conflitos com a celeridade necessária.
É com base nesse contexto histórico-social que o estudo e análise dos direitos e obrigações acerca da liberdade de expressão se fazem necessários sobre o filtro da Constituição Federal de 1988 combinada à entendimentos de organizações nacionais e internacionais sobre do direito no mundo virtual e suas consequências no mundo real.
2. LIBERDADE DE EXPRESSÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL
Para a compreensão da complexidade do tema estudado, deve-se primeiro entender o conceito que rege a cerca de um direito chamado de fundamental. De forma básica, mas prática, podemos classificar os direitos fundamentais como os direitos humanos positivados na Constituição Federal de 1988, possuindo portanto algumas características muito importantes como: Inalienabilidade, Imprescritibilidade, Irrenunciabilidade, Universalidade. Esses preceitos elevam drasticamente a dificuldade de abordagem limitatória desses direitos, pois na teoria da um status ‘’superior’’ a estes sobre outros.
No ordenamento jurídico brasileiro cabe ressaltar cinco principais direitos fundamentais: direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Para o estudo deste trabalho é necessário foco no direito à liberdade, que ultrapassa o significado de ser livre para locomover-se aonde bem entender, e incide também sobre a liberdade individual de expressar seu pensamento, ideia, religião, e filosofias, sem ser impedido, ou caçado por tal ato.
Com essa breve contextualização, pode-se compreender as garantias constitucionais que esse direito possui hoje, entretanto, essa importância cresce ainda mais no Brasil por um simples fator: a recente saída de um regime ditatorial e uma consequente frágil democracia, considerada ainda jovem. É diante disso que a necessidade de defesa de características como as supracitadas deve ser priorizada em nosso ordenamento jurídico.
Partindo então para a análise da liberdade de expressão como um dos direitos fundamentais, cabe a referência no texto constitucional nos incisos IV e IX do Artigo 5º, os quais especificam que é livre a manifestação de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação independente de censura ou licença, mas que para isto é vedado o anonimato. Entende-se portanto que qualquer um, segundo o princípio da igualdade, é livre para expressar-se desde que não seja de forma anônima, a fim de que seja garantido justamente a punibilidade daqueles que por meio de sua manifestação de pensamento, causem danos, mesmo que morais, ao outro.
Vale ressaltar que no Art. 5° encontram-se as cláusulas pétreas da Constituição de 1988, as quais juristas defendem como imutáveis por meio de emendas constitucionais, ou seja, sendo necessário a instituição de uma assembleia constituinte para alteração das mesmas, e como é citado no livro ‘’Curso de Direito Constitucional’’:
A par disso tudo, a restrição ao direito de se expressar livremente representa um exercício de violência, por parte de quem promove a censura, seja o Estado ou o próximo, na medida em que viola a abrangência totalizante da dignidade da pessoa humana, visto que a liberdade propugna pela auto-realização da pessoa humana. (MENDES; COELHO; BRANCO, 2008, p. 359).
Ainda assim, em um país extremamente desigual como o brasileiro, garantir e propagar este direito é algo difícil. Seja pelo elevado número de analfabetos, que segundo pesquisa de 2019 do IBGE perfazem um total de 11,3 milhões de brasileiros, ou pela desigualdade no acesso a entretenimento, o Brasil é um país com certa dificuldade de se encontrar cidadãos críticos e politizados, e que, portanto, expressam uma opinião própria. O que por muitas vezes acontece é a reprodução de ideias alheias, fomentada pela alienação na sociedade brasileira, decorrente não apenas da chamada Indústria Cultural de Theodor Adorno e Max Horkheimer, mas também de um contexto político em que percebe-se uma grande polarização entre conservadores e grupos que defendem movimentos sociais, na qual é deixado de lado argumentos lógicos em detrimento do mero posicionamento contrário ao seu rival.
No contexto deste artigo, vale ressaltar a o Projeto de Lei lei 12.965/2014, conhecido como Marco Civil da Internet, que regula direitos e deveres na utilização da rede. Esta ajuda não apenas a garantir o direito a utilização da internet, mas, principalmente, estabelece limites às ações dentro do mundo virtual, no qual facilmente é possível adotar a máscara do anonimato, o que infringe a constituição como explicado anteriormente.
3. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O MUNDO VIRTUAL
A Constituição Federal permite concluir que a liberdade de expressão tem como desígnio a construção de um Estado essencialmente democrático, permitindo manifestações sejam elas do pensamento, artísticas, intelectuais e outras. Todavia, ao analisar as relações interpessoais no ambiente virtual nota-se que os conceitos de limite e respeito estão desconfigurados. Visto que tal liberdade, sendo um direito comumente assegurado, admite uma face nas redes sociais em que a ética e a moral sejam assoladas.
Não se pode negar, que a expansão da internet trouxe um avanço para o mundo no que diz respeito a comunicação instantânea, consequentemente a liberdade de expressão. Visto que, a parcela social passa a exercer um papel crítico e ativo através de determinados meios, ampliando a participação política, cultural e social. Entretanto, a proliferação de informações sejam elas verdadeiras ou não, conseguem alcançar quase todo o país, como ocorreu com as informações da operação Lava Jato, evidenciando a falta de interpretação pela lacuna expressa entre a liberdade de expressão e o cidadão ativo.
É muito comum que as pessoas confundam o resguardo de tais direitos, por não entender a delimitação dos direitos fundamentais para que um não se colida com o outro. Como a censura, contudo, a censura pressupõe uma exceção prévia a manifestação do pensamento ou, ainda, um silenciamento posterior com base em supostos ideológicos e/ou políticos o que é totalmente diferente da responsabilização de pessoas que abusam da liberdade de expressão ao ponto de lesarem outros direitos.
O que vem ocorrendo é fruto de uma interpretação errônea do texto normativo, pois toda e qualquer situação lesiva contra a honra de outrem, é caracterizada ilegal. O que é exemplificado por Puccineli Júnior: “O direito à honra compreende tanto a dignidade e a moral intrínseca do homem (honra subjetiva), como a estima, a reputação e a consideração social que as pessoas nutrem por determinado indivíduo (honra objetiva).”
Ademais, a atualização do mundo globalizado na era digital permite que os hábitos de navegação sejam monitorados para determinar as nossas tendências, o que propicia a reprodução massiva daquilo que apenas lhe convém individualmente. Tornando o indivíduo menos flexível para as opiniões divergentes da sua formação idealista e teórica. Por essa perspectiva fica explícito analisar que o indivíduo ao ser intitulado em uma única via de opiniões, se torna abstruso nas relações interpessoais da internet, fator este, que desencadeia a depreciação do texto normativo.
Frequentemente, observamos que o abuso no uso da liberdade de expressão no vasto mundo virtual abrange principalmente a esfera do anonimato, ao qual o indivíduo ataca outrem por meio dos discursos de ódio, seja individual ou em grupos específicos sem se identificar. Todos esses impasses têm em comum: um internauta que se expressa sem critérios de manifestações por achar que todas as expressões no ambiente virtual são providas de impunidade das normas sociais. A utilização do anonimato é um círculo vicioso, o indivíduo não se identifica e acha que tudo pode, logo, não será identificado e, consequentemente, pelos atos/abusos praticados.
A internet além de proliferar as informações “respaldadas na liberdade de se expressar”, abrange uma crescente nas práticas de bullying que nas redes são configuradas como cyberbullying(utilização do espaço virtual para intimidar e hostilizar uma pessoa). Esse ato também abrange situações que lesa a dignidade da pessoa humana, o que pode ser configurado como crime, já definidos pelo Código Penal em três tipos: injúria, calúnia ou difamação, se algum desses for praticado com o intuito de facilitar a propagação, ou seja, na presença de outras pessoas, o Código já estabelece um possível aumento da pena.
Dentre as inúmeras situações presenciadas no mundo sobre esse tema, ressalta a importância de analisar os sites de relacionamentos que abarcam todas as pessoas, muitas vezes sem predeterminação de faixa etária. Consequentemente, desencadeia uma pseudo liberdade de expressão em virtude do entretenimento, logo, os riscos de difamação, calúnia, injúria e crimes contra a honra como a propagação de conteúdos íntimos são de grandes proporções. Vale ressaltar que o fácil acesso na internet, contudo, permite que a liberdade de expressão na internet ainda seja um direito, mas que nem em todas as esferas pode ser resguardado, devido às delimitações “internas” direito admite independentemente da esfera virtual.
4. CONCLUSÃO
Certamente, a liberdade de expressão exige condições especiais, o que não significa que tal exercício permite ultrapassar certos limites de agir em relação aos outros direitos fundamentais que assegurem sobre a dignidade humana, uma vez que o direito à liberdade de expressão não é direito absoluto. Com o advento da lei O Marco Civil da Internet (Projeto de Lei 2.126 de 2011) e aprovado em 25 de março de 2014 na Câmara dos Deputados foi estabelecido uma série de direitos e deveres para os internautas, empresas com presença na internet e provedores de acesso, entre os princípios, há uma regulamentação sobre a liberdade de expressão. O direito dos usuários se expressarem continua fundamental, porém os indivíduos são responsabilizados pelos atos praticados na rede assim como na esfera física.
O projeto de lei 2.126 de 2011, e consequente Lei 12.965/2014, é portanto essencial para manter o equilíbrio entre direitos e deveres na sociedade brasileira no que tange a liberdade de expressão, visto que, como debatido, ao passo de que esse direito (liberdade para expressão) é essencial em uma democracia, a utilização de redes sociais com o intuito de propagar mensagens ofensivas é uma realidade no mundo contemporâneo.
Para que tais crimes sejam solucionados através da responsabilização, o ofendido precisa ultrapassar os limites digitais por meio das denúncias. No entanto, como mencionado nem sempre é possível identificar o usuário ou delimitar a colisão de um direito com o outro, portanto é imprescindível que os sites tenham sistemas de proteção com o objetivo de facilitar as deliberações judiciais. Ademais, a parcela virtual deve entender que mesmo com a utilização do anonimato, há um respaldo jurídico para todos e o respeito a honra além de fundamental deve ser inato.
5. REFERÊNCIAS
Andorfato, João Jacinto Anchê. Redes sociais: liberdade de expressão não é direito a ofensa. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/redes-sociais-liberdade-de-expressao-nao-e-direito-a-ofensa/. Acesso em: 10/12//2019.
Bastos, Athena.Direitos e garantias fundamentais: o que são e quais as particularidades?.Disponível em: https://blog.sajadv.com.br/direitos-e-garantias-fundamentais/.Acesso em: 10/12/2019.
Cavalcanti, Jessica Belber. O exercício da liberdade de expressão nas redes sociais. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/34282/o-exercicio-da-liberdade-de-expressao-nas-redes-sociais
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008.
Pontieri, Alexandre. Marco civil da internet - neutralidade de rede e liberdade de expressão. Disponívelem:
https://jus.com.br/artigos/70495/marco-civil-da-internet-neutralidade-de-rede-e-liberdade-de-expressao. Acesso em: 06/12/2019
Simões, Alexandre Gazetta. A abordagem constitucional da liberdade de expressão. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8017/A-abordagem-constitucional-da-liberdade-de-expressao. Acesso em: 10/12/2019.