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O concubinato na pensão por morte

Agenda 16/01/2020 às 22:31

O presente artigo visa analisar a possibilidade de recebimento do benefício previdenciário da pensão por morte pela(o) concubina(o) juntamente com o cônjuge ou companheiro sobrevivente.

Introdução

O presente artigo visa fazer uma análise sobre a possibilidade de recebimento da pensão por morte pela concubina no direito brasileiro.

Deste modo, é necessário uma abordagem sobre os aspectos gerais dos benefícios previdenciários, analisando todo o histórico da Previdência Social. Assim sendo, será exposto os beneficiários legais de tais benefícios e, o entendimento atual da doutrina e jurisprudência acerca destes.

Atualmente, a doutrina trata sobre o concubinato em duas óticas. A primeira delas é chamada de concubinato puro, e a segunda concubinato impuro. Ambos dizem respeito à companheira, porém no impuro as partes possuem uma restrição impeditiva, no concubinato puro um homem e uma mulher, livres, sem nenhum impedimento, conviviam sem estarem casados efetivamente.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, foi reconhecido o concubinato puro como união estável, de modo que a jurisprudência atual reconhece com os mesmos direitos do casamento civil.

O Código Civil, em seu art. 1727 estipula que "as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato". Apesar da Constituição Federal comparar o concubinato puro com a união estável, o termo mais aplicado pela doutrina é de "companheira", pois reconhece tal relacionamento como entidade familiar assim como no casamento. Afinal, quando fala-se em concubinato, entende-se como pessoas impedidas de casarem-se, o que muitas vezes não é o caso de quem vive em união estável.

Neste diapasão, o objetivo central do estudo é verificar a possibilidade de recebimento da pensão por morte de quem convivia em concubinato. Utilizou-se parar chegar à conclusão, a revisão bibliográfica, onde analisa-se o tema a partir de obras já publicadas sobre o tema. 

Breve histórico sobre previdência social

Com a publicação do Decreto Legislativo 4.682/23, Lei Eloy Chaves, a qual determinou a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões - CAP, para os empregados das empresas ferroviárias, tem-se o início da previdência social no Brasil.

Em 1990, com a Lei 8.029, a partir da fusão do Instituto Nacional de Previdência Social - INPS e do Instituto Nacional de Previdência Social - IAPAS, é criado o INSS, Instituto Nacional do Seguro Social, autarquia do Governo Federal responsável pelo pagamento dos benefícios previdenciários.

A previdência social é um seguro destinado à cobertura de certos infortúnios, de situações sociais que prejudicam ou inviabilizam a capacidade de autossustento dos trabalhadores e de seus dependentes. Visa à proteção principal do trabalhador regido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.

Benefícios previdenciários e a pensão por morte

Antes de adentrarmos ao estudo dos benefícios em espécie, cabe destacar os tipos de segurados amparados pela previdência social e os seus dependentes.

Estão previstos entre os art. 11 a 16 da lei 8.213/91. São eles:

Obrigatórios: Empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso, contribuinte individual e segurados especial.

Facultativo: enquadram-se todos aqueles que não são obrigatórios, mas querem contribuir para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS, afim de usarem os benefícios. Podemos usar como exemplo os estudantes a partir de 16 anos e os desempregados.

Já os dependentes, previstos no art.16 da referida lei, são divididos em classe. Na primeira classe temos o cônjuge, companheiro(a) e o filho mão emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido de qualquer idade. Estes são considerados dependentes preferenciais, pois preterem os demais. Na segunda classe tempos os pais e na terceira classe o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido de qualquer idade.

Os dependentes que não são da primeira classe somente possuem tal direito se comprovada dependência econômica e se não houver dependentes na classe anterior.

Após breve análise dos dependentes e segurados é possível iniciar o estudo sobre os benefícios previdenciários, dando ênfase no benefício de pensão por morte.

Atualmente na legislação previdenciária, podemos visualizar 24 benefícios no total. Quais sejam:

Como podemos observar, são vários os benefícios trazidos pela legislação, porém o objeto de estudo do presente trabalhado se restringe apenas à Pensão por Morte, que estudaremos à seguir.

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O benefício da Pensão por Morte está previsto no art. 74 da Lei 8.213/91, que diz que será devido ao conjunto de dependentes do segurado que vier a falecer, sendo aposentado ou não.

 Os dependentes se classificam em 1ª classe, 2ª classe e 3ª classe. Os dependentes de 1ª classe são o cônjuge sobrevivente, companheiro, filho não emancipado menor de 21 anos ou inválido de qualquer idade. Os de 2ª classe são os pais e os de 3ª classe são os irmãos menores de 21 anos ou inválidos de qualquer idade.

O art. 16, parágrafo 1º da lei prevê que a existência de dependentes de qualquer uma das classes, seguindo a ordem, exclui o direitos das demais, ou seja, se existirem dependentes na 1ª classe, exclui o direito da 2 e 3ª classe ao benefício.

O enteado e o menor tutelado equipara-se a filho desde que comprovada a dependência econômica do mesmo em relação ao de cujos.

O referido benefício não exige carência mínima para obtenção do direito, bastando apenas que, no momento da morte, havia qualidade de segurado por parte do falecido.

Cabe destacar que caso haja mais de um beneficiário na mesma classe, o benefício será dividido em cotas iguais, conforme art. 77 da Lei 8.213/91.

O concubinato como relação conjugal

O termo concubinato pode ser conceituado como união livre entre homem e mulher sem estarem casados, conforme art. 1.727 do Código Civil. O termo ao longo dos anos tinha um peso muito preconceituoso, eis que trazia em seu bojo a ideia de traição na relação conjugal. Atualmente, o termo é considerado como uma sociedade de fato entre pessoas, não tendo concepção de uma sociedade conjugal como a conhecida união estável e o casamento civil, eis que afrontam o dever de fidelidade e não possuem a intenção de constituição familiar pública.

A Doutrina e Jurisprudência majoritária possuem o entendimento de que a união paralela ou simultânea, não geram efeitos de união estável, de acordo com  posicionamento da Ministra do Supremo Tribunal Federal Carmen Lúcia:

[...]Pede-se seja obrigatório o reconhecimento, no Brasil, da legitimidade da união entre pessoas do mesmo sexo, como entidade familiar, desde que atendidos os requisitos exigidos para a constituição da união estável entre homem e mulher (DUAS PESSOAS) e que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis estendam-se aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo.

O STF e o STJ já se manifestaram sobre o tema.

COMPANHEIRA E CONCUBINA – DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. UNIÃO ESTÁVEL – PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato. PENSÃO – SERVIDOR PÚBLICO – MULHER – CONCUBINA – DIREITO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. (STF, RE 397762/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ. 11.09.2008)

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCUBINA. PENSÃO. RATEIO COM A VIÚVA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. "A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato", sendo certo que a "titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina (RE 590.779, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, STF, Primeira Turma, DJe  26/3/09)

2. Hipótese em que o Tribunal de origem reconheceu, com base no conjunto probatório dos autos, que o falecido servidor não era separado de fato, tendo estabelecido dois núcleos familiares concomitantemente, com sua esposa e com a ora agravante. (STJ, AgRg no Ag 1424071/RO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª T, DJe  30.08.2012)

Se um amante não se equipara a um cônjuge pela legislação civil, obviamente também não se equiparará perante a legislação previdenciária, conforme podemos abstrair do art. 226, parágrafo 3º da Constituição Federal, onde limita a constituição familiar a duas pessoas "Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento."

O concubinato atualmente, restringe-se ao que a doutrina classificou como concubinato impuro ou adulterino, ou seja, relacionamento amoroso extraconjugal envolvendo pessoas casadas que descumprem o pacto de fidelidade e de monogamia. Cabe destacar que, parte da doutrina e jurisprudência, possuem entendimento de que o concubinato pode gerar sim relações previdenciárias.

Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari entendem que:

Nos casos em que o cônjuge falecido mantinha, ao mesmo tempo, a(o) esposa(o) e a (o) concubina(o), deve ser avaliado o conjunto probatório para verificar se a(o) requerente viveu e dependeu do(a) segurado(a) até o falecimento deste(a). Restando demonstrada a situação de concubinato a mesma deve ser reconhecida para fins previdenciários, não sendo impedimento para tanto a existência simultânea de esposa(o).

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região também já se manifestou a favor do concubinato como entidade familiar.

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE ESPOSO E COMPANHEIRO. RESTABELECIMENTO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADA. RATEIO DEVIDO ENTRE ESPOSA E COMPANHEIRA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Embora o falecido mantivesse o vínculo jurídico formal com a esposa/autora até a data do óbito, também manteve união estável com a corré até seu falecimento, possuindo duas famílias de forma concomitante, não desistindo ou renunciando a qualquer desses relacionamentos, ambas fazendo jus a pensão por morte a ser dividida em partes iguais. 3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar  o benefício em favor da parte autora, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5014655-53.2014.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/08/2019)

Conclusão

Apesar da jurisprudências e opiniões doutrinárias trazidas acima, é importante destacar que, atualmente no ano de 2019, está em julgamento no STF o RE 1045273 envolvendo o tema e com repercussão geral reconhecida, desta forma não há ainda por parte da jurisprudência uma uniformização sobre o tema, havendo tribunais contrários e a favor sobre a questão.

Todavia, até que se julgue o referido RE na Corte Suprema, concluímos conforme posicionamento atual do STF e STJ supracitado, que não há a possibilidade de reconhecimento do concubinato impuro (adultério) como entidade familiar e, consequentemente, não há que se falar em rateio entre a concubina(o) e companheira(o) ou cônjuge sobrevivente.

REFERÊNCIAS

ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 3ª Edição. São Paulo: Leud. 2007.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 14ª ed. Florianópolis: Conceito, 2012.

PARIZATTO, João Roberto. Os Direitos e Deveres dos Concubinos.  Leme/SP. Editora de Direito. 1996.

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 13ª Edição. Niterói: Impetus. 2011.

Sobre o autor
Mauricio Cardoso Silva

Advogado; Pós-Graduado em Direito Previdenciário; MBA em Segurança Pública.

Informações sobre o texto

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