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Demanda contratada de potência:

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Agenda 16/02/2006 às 00:00

CAPÍTULO 2 - A ENERGIA ELÉTRICA NO DIREITO

2.1 Classificação jurídica da energia elétrica

Álvares [51] afirma que "não há como adentrar a estudo que envolve a eletricidade, sem conhecer o fenômeno físico cuja utilização vai disciplinar, assim como regulamentar as repercussões econômicas".

Para tanto, contudo, não se faz mister um estudo minucioso do fenômeno, este da competência da eletrotécnica, até mesmo porque, como salientado por Campos [52], "juridicamente, só interessam os seus efeitos e capacidade". Porém, afigura-se necessário conhecer alguns aspectos da eletricidade, bem como do direito da eletricidade, uma vez que é por intermédio deles que se poderão regular e entender questões relevantes das normas pertinentes.

Exemplo disso, dado por Álvares [53], é o caso particular de tarifas de energia elétrica. No seu entender, o estabelecimento de parâmetros para fixação do valor a ser cobrado envolve necessariamente conhecimento minucioso sobre o fenômeno físico da eletricidade, notadamente a noção de potência, de demanda, de carga ligada, de fator de carga, de fator de potência, de kilowatt e kilowatt-hora, sem deixar de lado a utilização da corrente pelos usuários e a importância capital da participação econômica neste setor.

A eletricidade, na lição de Campos [54] "é o fenômeno físico de movimentação de elétrons (corrente), obtido em um condutor (fio), quando submetido a uma tensão (voltagem)". É uma conseqüência da conversão da energia e pode apresentar a forma estática, que é a eletricidade em repouso, e a forma dinâmica, a eletricidade considerada em movimento.

A eletricidade é colocada em movimento ao sofrer a aplicação de diferença de potencial nas extremidades dos condutores, formando a corrente elétrica, viabilizadora da produção de trabalho.

A potência, segundo Dawes apud Álvares [55], é a capacidade de produzir trabalho ou capacidade de consumir energia. A unidade utilizada para indicar potência elétrica é o watt, que equivale ao trabalho de um joule por segundo. Todavia, na prática, em razão do volume de energia considerado nas operações comuns, a medida utilizada é o quilowatt, unidade que significa mil watts.

Esta é bastante diferente do quilowatt-hora, que representa unidade de consumo, equivalente a um quilowatt usado durante uma hora.

Ante este conceito, ÁLVARES [56] conclui que "energia elétrica é uma grandeza igual ao produto da potência elétrica pelo tempo".

CAMPOS [57], na mesma linha de raciocínio, explicita o conceito de energia elétrica, concluindo como sendo a "que pode produzir trabalho e ser convertida em outra forma de energia, expressa em quilowatt-hora (Kwh); para seu cálculo, integra-se a função do gráfico da energia elétrica demandada, em Watts, versus tempo em horas".

Na outra ponta, está o conceito jurídico de eletricidade, muito mais amplo do que o eletrotécnico, pois envolve ainda suas conseqüências na sociedade humana, sem, todavia, o primeiro subsistir sem o último.

Nesse sentido, ÁLVARES [58] explica que:

Sem o fenômeno físico não há utilização e nenhuma repercussão econômica, mas por sua vez o fenômeno físico sem utilização continua sendo a eletricidade que não empolga ao direito, e, por sua vez, uma eletricidade utilizada sem repercussão econômica não tem substrato jurídico, pois falta justamente o interêsse (sic) que movimenta tôda (sic) a fenomenologia jurídica.

Significa dizer, que se é gerada energia elétrica (fenômeno físico de eletricidade) e utilizada por uma comunidade com vantagens econômicas, temos neste todo um fenômeno jurídico novo, que é a eletricidade, como figura jurídica.

Álvares [59] e Campos [60] têm posições semelhantes quanto ao conceito jurídico de eletricidade. Ambos consideram-no como abrangente de três elementos básicos: (i) o fenômeno físico da eletricidade; (ii) a utilização de corrente elétrica e conseqüente energia elétrica; (iii) a repercussão econômica.

Estes três elementos básicos quando se apresentam conjugados, quando funcionam relacionados, corporificam o conceito de eletricidade, como objeto de um Direito próprio, constituindo uma unidade fenomênica jurídica, que impõe a construção de um conceito jurídico da eletricidade.

Isto porque, com efeito, não é interesse do Direito a regulação do fenômeno físico da eletricidade, considerado em si, mas sim sua disciplina quando utilizado pelo grupo humano e regulando suas conseqüências econômicas.

Nada obstante o interesse jurídico sobre a eletricidade, a legislação brasileira específica não indicou expressamente como classificar-se a energia elétrica, cumprindo à doutrina e a leis de outras áreas fazê-lo.

Na doutrina, PONTES DE MIRANDA [61] foi precursor na conceituação da energia elétrica como bem móvel, em época na qual os juristas, perplexos com a aparição e as aplicações da energia elétrica, se apresentavam com bastantes dúvidas e vacilações, ao afirmar que "energia é coisa, como o ar, a água, a terra, tem-se de tratar como coisa, de cuja especificidade resulta específico o contrato de energia".

Mais recentemente, CAMPOS [62] apresenta igual entendimento, conceituando a energia elétrica como "resultado de conversões energéticas, a partir de fontes de origem diversas (hidráulica, térmica, solar, eólica etc.), em eletricidade, realizada por geradores, e transportada até o centro de consumo por meio de linhas de transmissão e distribuição, tendo, portanto, bem clara sua característica de bem móvel".

No campo legal, o Código Penal Brasileiro [63] foi o primeiro normativo nacional a equiparar a energia elétrica à coisa móvel no parágrafo 3º, seu artigo 155:

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

[...]

§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

O Código Tributário Nacional [64], por sua vez, no parágrafo primeiro de seu artigo 74, reconheceu o atributo de produto industrializado à energia elétrica, sendo certo que hoje ela faz parte da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, aprovada pelo Decreto nº 4.542/02 [65], sob o código 2716.00.

Mais recentemente, o novo Código Civil [66] assim dispôs:

Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:

I - as energias que tenham valor econômico;

[...]

O enquadramento legal e doutrinário da energia elétrica como bem móvel resta pacificado no sistema jurídico pátrio, de forma que hoje, não há mais dúvidas acerca de sua natureza jurídica.

2.2 Estágios da função elétrica

Segundo ÁLVARES [67], para o exercício da função elétrica, um organismo ou sistema elétrico compreende em geral os seguintes setores:

  1. central de geração, se hidráulica, situada nas fontes de energia ou, se térmica, situada nos centros de consumo;
  2. subestação elevadora, próxima à central de geração, e que transforma a energia dos alternadores à tensão de transmissão;
  3. linha de transmissão primária, partindo da subestação elevadora;
  4. subestação abaixadora primária, destinada a transformar a energia transportada pelas linhas de transmissão e entregá-la à rede primária de distribuição;
  5. rede primária de distribuição e subestações primárias que recebem e transformam a energia para entrega à rede secundária de distribuição;
  6. subestações secundárias ligadas aos centros de consumo ou aos grandes consumidores;
  7. rede secundária de distribuição ligada a cabines de transformação a baixa tensão;
  8. rede de distribuição em baixa tensão, que leva a corrente aos consumidores residenciais, iluminação pública, etc.

O Decreto nº 41.019, de 26 de fevereiro de 1957, que regulamentou os serviços de energia elétrica, sintetizou o exposto, dispondo:

Art. 2º São serviços de energia elétrica os de produção, transmissão, transformação e distribuição de energia elétrica, quer sejam exercidos em conjunto, quer cada um deles (sic) separadamente.

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Mister salientar que todos os estágios são substancialmente dependentes da geração, sendo a distribuição a fase de encerramento da função elétrica.

A produção ou geração é definida no artigo 3º, do Decreto nº 41.019/57 [68], como o estágio equivalente na transformação em energia elétrica de qualquer outra forma de energia, seja qual for a sua origem.

A transmissão consiste no transporte desta energia do sistema produtor às subestações distribuidoras ou na interligação de dois ou mais sistemas geradores.

ÁLVARES [69] complementa o conceito, afirmando que "transporte é o estágio da função elétrica referente ao recebimento da eletricidade em subestação elevadora e entrega da corrente nas subestações abaixadoras".

De um modo geral, esta é a característica principal de uma linha de transmissão: o transporte de energia elétrica em alta tensão e a grandes distâncias.

O transporte geralmente é feito entre uma usina geradora e uma rede de distribuição; mas pode também ser realizado entre subestações independentes, isto é, aquelas não necessariamente utilizadas no serviço de distribuição de energia elétrica ao público, como por exemplo, as que recebem grandes massas de eletricidade em alta tensão e as entregam a subestações abaixadoras de fábricas ou instalações industriais.

Significa dizer que o serviço de transmissão pode ainda compreender o fornecimento de energia a consumidores em alta tensão, mediante suprimentos diretos das linhas de transmissão e subtransmissão.

As subestações são postos de transformação, que remetem e recebem a corrente elétrica. Podem ser elevadoras, quando atuam elevando a voltagem da corrente para fins de transporte pelas linhas de transmissão, ou abaixadoras, mais predominantes no caso de distribuição, quando abaixam a voltagem para utilização conveniente dos usuários.

A essas subestações está ligada a rede de distribuição primária, que se compõe basicamente de postes, condutores, pára-raios e transformadores.

Dessa rede primária, partem geralmente as ligações para grandes consumidores industriais urbanos, em média tensão; igualmente a ela está ligada a rede secundária de distribuição, que alimenta usuários que se servem da energia elétrica em baixa tensão.

Como tensão de distribuição primária, o regulamento dos serviços de energia elétrica considera as voltagens de 2.300 e 13.200; e de distribuição secundária, voltagens trifásicas de 220 a 440 volts e monofásicas de 110 a 220 volts.

Nesta fase, entramos na distribuição, consistente no fornecimento de energia a consumidores em média e baixa tensão, ou, como afirma ÁLVARES [70] "estágio da função elétrica que abrange as atividades relativas ao fornecimento de eletricidade aos consumidores, desde as subestações até os medidores de corrente".

Quando a distribuidora entrega energia aos seus milhares de usuários, pequenos consumidores domésticos, comerciais e industriais, avulta a noção de serviço público, sendo vulgarmente considerada como sendo o próprio serviço, quando na realidade representa somente uma fase de um processo complexo.

De fato, a empresa geradora ao contratar a distribuidora, a respeito de fornecimento de energia elétrica, ou a concessionária de produção, ao fornecer energia em quantidades maciças a determinadas atividades industriais, convenciona não a prestação de um serviço, mas uma compra e venda.

2.3 Estrutura atual do mercado de energia elétrica

A exploração do serviço público de energia elétrica, aí compreendidos todos os assuntos relacionados, como organização dos serviços, desde a produção até a distribuição, é de competência exclusiva da União Federal, conforme dispõe o artigo 21, inciso XII, alínea "b" da Constituição Federal:

Art. 21 - Compete à União:

[...]

XII - Explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:

[...]

b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos.

Dessa forma, o serviço público de energia elétrica, quando não é exercido diretamente pela União, ela, na condição de poder concedente, delega a outrem a atividade, que a assume como concessionária. Daí, quando a concessionária exerce o serviço público de energia elétrica, é em nome do poder concedente que esse serviço será levado aos usuários, atuando como intermediário na relação entre estes e o poder concedente.

A atividade concedida terá que se submeter às exigências devidamente estabelecidas na lei, que devem ser cobradas discricionariamente pela autoridade outorgante da concessão; esta, por sua vez, poderá determinar a extinção da concessão por descumprimento contratual.

Com o processo de privatização, houve a desverticalização das diferentes esferas do setor elétrico, que passou a se dividir em quatro vertentes básicas: geração, transmissão, distribuição e comercialização.

O objetivo principal do modelo brasileiro foi separar o serviço de energia elétrica, que trabalha com a commodity e deve ser aberta à competição e às regras de livre mercado, daqueles que trabalham com o transporte da energia mediante rede aérea ou subterrânea, que devem ser reguladas pela administração pública.

Assim, a geração e a comercialização se tornaram setores competitivos e não regulados. Já a transmissão e a distribuição, como monopólios naturais, sofrem ação direta da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, incumbida de controlar os agentes atuantes, com o objetivo de garantir o livre acesso de todos os agentes ao conjunto das conexões e instalações de transmissão de energia elétrica do sistema interligado, denominado rede básica.

A rede básica dos sistemas interligados é conjunto de linhas de transmissão em tensões de 230 kilovolts ou superior e subestações que contenham equipamentos nas mesmas tensões, integrantes de concessões de serviços públicos de energia elétrica.

Instalações, com tensões inferiores, podem ser incluídas na rede, desde que interliguem áreas do Mercado Atacadista de Energia Elétrica - MAE, e em casos excepcionais, por propositura do Operador Nacional do Sistema Elétrico - ONS, mediante aprovação da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, quando as instalações forem consideradas relevantes para operação do sistema.

Para estas operações, a estrutura atual do mercado de energia elétrica conta, além dos geradores e distribuidores, com os seguintes participantes setoriais: comercializadores, consumidores livres, agência reguladora (ANEEL) e operador do sistema (ONS), cujas atividades conheceremos a seguir.

O sistema elétrico nacional é interligado, com exceção de alguns sistemas isolados na região norte. Por esta razão, é possível a troca energética entre os submercados, divididos em Sul/Sudeste/Centro Oeste e Norte/Nordeste.

Para melhor se entender, CAMPOS [71] esclarece:

A circulação do bem energia elétrica se faz através de um sistema nacional interligado, que é uma grande malha de linhas de transmissão e distribuição espalhadas pelo território brasileiro. Nesta malha conectam-se todos os geradores e os consumidores do país. Devido à impossibilidade de armazenagem da energia elétrica, toda geração é consumida instantaneamente.

O sistema nacional interligado, onde as transações com o bem energia elétrica se efetuam, pode ser entendido, analogamente, a um sistema de caixa único, onde todos os geradores injetam energia elétrica e todos os consumidores retiram a energia elétrica consumida, para depois, com base de dados de medições, realizar-se um balanço, apurando-se quem gerou e quem consumiu, objetivando um encontro de contas de caráter comercial.

As atividades de coordenação e controle das instalações de geração e transmissão de energia elétrica nos sistemas interligados brasileiros, já conceituadas no tópico anterior, são realizadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS, conforme determinação do Decreto nº 2.655 [72], de 2 de julho de 1988.

O ONS é uma associação civil, criada em 26 de agosto de 1998, por disposição do artigo 13, da Lei nº 9.648/98 [73], cujos integrantes são as empresas de geração, transmissão, distribuição, importadores e exportadores de energia elétrica, e consumidores livres. O Ministério de Minas e Energia é membro participante, com poder de veto em questões que conflitem com as diretrizes e políticas governamentais para o setor. Também tomam parte nessa associação dois representantes dos Conselhos de Consumidores, constituídos na forma da Lei nº 8.631, de 4 de março de 1993 [74].

É competência do ONS, fisicamente, proporcionar o intercâmbio energético entre todos agentes, sem levar em conta aspectos comerciais; visar à continuidade e segurança dos serviços públicos de energia elétrica; preservar sempre os interesses da sociedade.

A operação do sistema, de uma maneira geral, consiste na contratação e gerenciamento de serviços de conexão, transmissão e distribuição, determinação de níveis de produção, manobras em circuitos de transmissão etc.

Uma das formas de viabilizar estas funções são os CPST – Contratos de Prestação de Serviços de Transmissão, firmados entre a concessionária de transmissão e o ONS, que disponibiliza as instalações para que sejam utilizadas pelos contratantes do ONS e usuários da transmissão.

Já no campo das atividades de compra e venda de energia elétrica, a área de processamento destas operações é o Mercado Atacadista de Energia Elétrica – MAE.

O MAE é empresa de direito privado, submetida à regulamentação por parte da ANEEL e foi criado por intermédio da Lei nº 10.433 [75], de 24 de abril de 2002, em decorrência da política adotada pelo Governo Federal para reestruturação do setor elétrico brasileiro, que teve na competitividade seu pilar principal de sustentação.

Tem suporte legal e regras de funcionamento determinadas pela ANEEL, previstas na Convenção de Mercado.

Estão sob sua responsabilidade todas as atividades necessárias à administração do Mercado, inclusive financeiras, contábeis e operacionais, e todas elas são reguladas e fiscalizadas pela ANEEL.

Devem participar do MAE os concessionários ou autorizados de geração, importadores e exportadores, de capacidade igual ou superior a 50 KW. Também participam os agentes que exerçam atividade de comercialização de energia elétrica, cujo volume seja igual ou superior a 300 Gwh, tendo como referência o ano anterior. Podem participar ainda, a critério do MAE, concessionários, permissionários e autorizados de geração, comercialização importação e exportação que não atinjam os níveis exigidos acima, bem como os consumidores livres.

É no MAE que se processam as atividades comerciais de compra e venda de energia elétrica entre os agentes de mercado, por intermédio de contratos bilaterais e de um mercado de curto prazo, restrito aos sistemas interligados Sul/Sudeste/Centro Oeste e Norte/Nordeste.

Os contratos bilaterais, realizados com preços firmes, são contabilizados pelo MAE e liquidados diretamente entre as partes contratantes.

Estes contratos, nos termos do artigo 5º, da Resolução Normativa nº 249/98 da ANEEL [76], devem, ainda, ser lastreados por energia assegurada de usinas próprias e por contratos de compra de energia, também registrados no MAE.

O registro dos montantes de energia contratada, assim como dos dados de medição pelas empresas geradoras, distribuidoras e comercializadoras de energia elétrica no MAE, permite determinar quais as diferenças entre o que foi produzido ou consumido e o que foi contratado.

A comercialização dessa diferença é liquidada no MAE, ao Preço MAE, preço livre praticado pelo Mercado, para cada submercado (Norte, Sul, Sudeste e Nordeste) e para cada patamar (leve, médio e pesado), mensalmente. É o chamado mercado de curto prazo ou spot.

Todavia, não é permitido ao MAE comprar ou vender energia, além de não ter fins lucrativos. Na lição de CAMPOS [77], o MAE "não se confunde com os geradores e distribuidores. É pessoa jurídica distinta, de propósito específico, sendo-lhe vedado deter ativos vinculados a bens e instalações de energia elétrica. Atua como intermediador da compra e venda de energia elétrica entre produtores, fornecedores e consumidores. Funciona como uma bolsa de valores, onde fluxos financeiros e não físicos são vinculados individualmente a cada operação".

Por fim, há que se salientar que ao MAE foi incumbida outra função deveras importante. É nele que ocorre o processamento da contabilização da energia elétrica produzida e consumida no Brasil. Um mercado que conta com cerca de 500 milhões de Megawatts-hora por ano.

Basicamente, a contabilização do MAE leva em consideração toda a energia contratada por parte dos agentes e toda a energia efetivamente verificada (consumida ou gerada).

Não somente as atividades realizadas no MAE, mas toda a geração, transmissão, distribuição e a comercialização da energia elétrica, é regulada e fiscalizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, autarquia em regime especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia - MME, criada pela Lei nº 9.427 [78], de 26 de dezembro de 1996.

Além das atribuições já citadas, é de sua alçada atender reclamações de agentes e consumidores com equilíbrio entre as partes e em beneficio da sociedade; mediar os conflitos de interesses entre os agentes do setor elétrico e entre estes e os consumidores; conceder, permitir e autorizar instalações e serviços de energia; garantir tarifas justas; zelar pela qualidade do serviço; exigir investimentos; estimular a competição entre os operadores; assegurar a universalização dos serviços.

A agência tem por missão principal proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade.

2.3.1 Consumidores

Em razão da importância que têm na existência e funcionamento de todo este sistema, optou-se por tratar dos consumidores em seção separada.

Hoje o mercado se divide entre consumidores livres, com direito a escolher seu fornecedor, e consumidores cativos, vinculados à concessionária que atende seu endereço.

Consumidor livre é aquele que, nos termos da Lei nº 9.074/95, deixou de ser exclusivo de uma determinada concessionária de distribuição de energia elétrica, por possuir demanda igual ou superior a 3 Mega Watts e tensão de 69 mil volts. Nessa condição, adquire liberdade de escolha na contratação do fornecimento de sua energia e o contratado pode ser distribuidor de outra localidade ou até mesmo produtor independente de energia.

Fábricas, shoppings e indústrias são exemplos de consumidores enquadrados nesta categoria podendo, hoje, escolher de quem comprar energia.

KIRCHNER [79] ressalta que "ao assumir tal condição, o consumidor estará deixando de ser atendido pelo serviço público. Os princípios básicos da universalidade, impessoalidade e transparência não se aplicam ao produtor independente (seu novo fornecedor)".

Do outro lado, está o consumidor cativo. Nesse conceito enquadra-se qualquer pessoa física ou jurídica que solicite à concessionária o fornecimento de energia elétrica e assuma a responsabilidade pelo pagamento das faturas e demais obrigações fixadas em regulamentos pela ANEEL.

A Resolução nº 456/00 [80], da ANEEL divide os consumidores em dois grupos: "A" e "B", alta tensão e baixa tensão, respectivamente. O grupo A é subdividido conforme a faixa de tensão de fornecimento, de A1, cuja tensão é igual ou superior a 230 Kv a A4, com tensão entre 2,3 e 25 Kv e AS, inferior a 2,3 Kv subterrâneo. Já o grupo B é subdividido conforme a finalidade da atividade do fornecimento, entre B1 – residencial/residencial baixa renda e B4 – iluminação pública.

Os consumidores do grupo A, devem celebrar contrato de fornecimento, e os do grupo B, aceitar os termos do contrato de adesão, com a concessionária distribuidora local. Em todos os casos deve ser declarada a carga instalada na unidade consumidora.

O primeiro passo para que o consumidor do grupo B receba o fornecimento de energia elétrica é a formalização do pedido de fornecimento junto à distribuidora local. É importante ressaltar, que tal procedimento deve ser adotado mesmo que a energia a ser adquirida, não seja comercializada pela distribuidora local.

A relação comercial entre a concessionária e os consumidores do grupo B, deve ser definida em um contrato de adesão a ser encaminhado ao consumidor até a data de apresentação da primeira fatura.

O encerramento desta relação contratual será efetuado pelo consumidor, mediante pedido de desligamento da unidade consumidora, observadas as disposições do contrato, ou pela concessionária, quando houver pedido de fornecimento formulado por novo interessado, referente à mesma unidade consumidora.

Aos consumidores do grupo A é assegurada, no ato do pedido de fornecimento ou sempre que solicitada, a comunicação, por escrito, pela concessionária distribuidora local das opções disponíveis para faturamento ou sistema tarifário. São elas, a tarifa convencional e a horo-sazonal.

A tarifa convencional tem estrutura de cobrança diferenciada para o consumo e demanda de energia elétrica, sem levar em conta a hora do dia e o período do ano. Já a tarifa horo-sazonal leva em conta a hora do dia e o período do ano. A modalidade Azul diferencia valores, tanto para consumo como para a demanda; já a Verde diferencia somente o consumo e mantém a tarifa única para demanda.

Nos termos do artigo 53 da Resolução nº 456/00 [81] da ANEEL, os critérios de inclusão na estrutura tarifária convencional ou horo-sazonal aplica-se aos consumidores do Grupo "A", conforme as condições abaixo:

I - na estrutura tarifária convencional: para as unidades consumidoras atendidas em tensão de fornecimento inferior a 69 kV, sempre que for contratada demanda inferior a 300 kW e não tenha havido opção pela estrutura tarifária horo-sazonal nos termos do inciso IV;

II - compulsoriamente na estrutura tarifária horo-sazonal, com aplicação da Tarifa Azul: para as unidades consumidoras atendidas pelo sistema elétrico interligado e com tensão de fornecimento igual ou superior a 69 kV;

III - compulsoriamente na estrutura tarifária horo-sazonal, com aplicação da Tarifa Azul, ou Verde se houver opção do consumidor: para as unidades consumidoras atendidas pelo sistema elétrico interligado e com tensão de fornecimento inferior a 69 kV, quando:

a) a demanda contratada for igual ou superior a 300 kW em qualquer segmento horo-sazonal;

ou,

b) a unidade consumidora faturada na estrutura tarifária convencional houver apresentado, nos últimos 11 (onze) ciclos de faturamento, 3 (três) registros consecutivos ou 6 (seis) alternados de demandas medidas iguais ou superiores a 300 kW; e

IV - opcionalmente na estrutura tarifária horo-sazonal, com aplicação da Tarifa Azul ou Verde, conforme opção do consumidor: para as unidades consumidoras atendidas pelo sistema elétrico interligado e com tensão de fornecimento inferior a 69 kV, sempre que a demanda contratada for inferior a 300 kW.

2.3.2 Conceitos diversos

Ao final deste capítulo, cabe transcrever um trecho da Resolução nº 456/2000, da ANEEL, onde constam conceituadas diversas expressões interessantes a quem deseja conhecer melhor o setor elétrico, mas, sobretudo, relevantes ao estudo de caso que será levado a efeito no Capítulo quatro. São elas:

Sobre a autora
Érika Fernandes Flenik

advogada, pós-graduada em Direito Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FLENIK, Érika Fernandes. Demanda contratada de potência:: incidência de ICMS?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 958, 16 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7975. Acesso em: 22 dez. 2024.

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