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A temática do aborto à luz do ordenamento jurídico brasileiro.

A transcendental sobrepujança do direito à vida

A legalização do aborto é um assunto muito discutido e polêmico nos dias atuais, tendo em vista que afeta o direito das mulheres no que tange à disposição de seu corpo...

 
“[...] há muitas maneiras de se evitar uma gravidez indesejada, e abortar não é uma delas. Essa atitude além de infringir o direito à vida do nascituro, ainda causa sérias consequências para a gestante, sejam psicológicas ou físicas. Geralmente, as mulheres que praticam tal ato, se arrependem posteriormente e carregam esta culpa pelo resto da vida, gerando doenças psicossomáticas como depressão, ansiedade, dentre outras. Além de causarem sérios prejuízos ao seu corpo, pois por meio de um único aborto, a depender das complicações, podem até mesmo perder a vida. Caso abortem por diversas vezes, podem causar prejuízos irreversíveis aos seus aparelhos reprodutivos, vindo, em certos casos, a desenvolver infertilidade, não podendo mais ter filhos, perdendo a oportunidade, que em dado momento almejaram de serem mães e construírem suas famílias[...]”

RESUMO. A legalização do aborto é um assunto muito discutido e polêmico nos dias atuais, tendo em vista que afeta o direito das mulheres no que tange à disposição de seu corpo. Por um lado, há aqueles que defendem os direitos femininos em manter ou não uma gestação, já outros não concordam com este ponto de vista, considerando que o feto possui direito à vida, consagrado na Constituição Federal, e que infringiria os preceitos morais da sociedade, além de ocasionar um problema de saúde pública, caso a descriminalização seja concedida.  Esse artigo tem por finalidade a análise do crime de aborto em si, as divergentes opiniões sobre o tema e a melhor solução com base no ordenamento jurídico pátrio, embasando a pesquisa em doutrinas, leis e jurisprudências.

Palavra-chave: Feto. Vida. Aborto. Descriminalização.

ABORTION: DESCRIBING OR NOT IN THE LIGHT OF BRAZILIAN LEGAL ORDINANCE

                                                ABSTRACT

The legalization of abortion is a very controversial and controversial subject nowadays, since it affects women's right to dispose of their bodies. On the one hand, there are those who defend women's rights to keep or not to gestation, while others do not agree with this view, considering that the fetus has the right to life, that consecrated in the Federal Constitution, and that would violate the moral precepts of society, in addition to causing a public health problem if decriminalization is granted. Its purpose is to analyze the crime of abortion itself, divergent opinions on the subject and the best solution based on the legal order of the country, based on research in doctrines, laws and jurisprudence.

Keyword: Fetus. Life. Abortion. Decriminalization

 

1 INTRODUÇÃO

 

A gravidez indesejada é um fato vivido por muitas mulheres na atualidade, geralmente, não por falta de acesso a métodos contraceptivos ou conhecimento sobre o assunto, mas por descuido do casal, quanto ao momento da prática da conjunção carnal, pois não se protegeram de forma adequada.

Atormentadas pela iminente chegada de um bebê, algumas mulheres optam pela realização de manobras abortivas, acreditando ser essa a solução do problema. Entretanto, via de regra, isso não acontece. Primeiramente, pelo fato da prática do aborto ser considerada criminosa no Brasil, onde gestante e médico, caso descobertos podem ser presos. A depender da maneira que esse for praticado, como normalmente ocorre em clínicas clandestinas por pessoas despreparadas, pode haver sérias sequelas para a saúde da mulher, e, em alguns casos vindo até mesmo a falecer, tornando a situação um problema de saúde pública. Outro fato corriqueiro é a culpa que se abate nas mulheres que efetuam tal crime, levando-as a desenvolver depressão, como tantas outras moléstias psicossomáticas. Abstrai-se que a prática do aborto é uma ação que pode envolver sérias consequências, tanto para a mulher quanto para a sociedade de um modo geral.

Em contrapartida, há movimentos feministas que defendem a igualdade entre homens e mulheres, tendo elas o direito de dispor seu corpo da forma que julgar correto, devendo decidir sobre a interrupção ou não de uma gravidez.

A legislação brasileira, apesar de criminalizar o aborto, permite algumas exceções, sendo quando a gravidez colocar a vida da mãe em risco; quando for fruto de estupro; ou quando o feto sofrer anencefalia. Discute-se, recentemente, quanto a interrupção da gravidez para gestantes que contraíram o zica vírus, ou a descriminalização do aborto, quando praticados até a terceira semana de gestação. Percebe-se que a legislação pátria não é rígida quanto ao assunto, sendo passível alteração.

Assim, através da análise dos entendimentos dos legisladores, doutrinadores e magistrados, demonstrar-se-á a necessidade ou não da descriminalização do aborto.

 

2 DIREITOS DO NASCITURO

 

O Código Civil (CC) brasileiro foi confeccionado no intuito de resguardar direitos intrínsecos das pessoas no que tange às relações interpessoais e jurídicas, como, por exemplo, o direito à vida, à personalidade, à propriedade, entre outros. Contudo, para discorrer sobre esses, faz-se necessário conceituar quem é seu titular, ao caso, o que é a pessoa; assim sendo, esse é todo o ser humano nascido com vida.

Constata-se que todo o ordenamento jurídico gira em torno da pessoa e de suas relações em sociedade, tendo em vista que o direito foi criado pela própria humanidade. A Constituição Federal Brasileira (CFB) colocou a pessoa humana como destinatário dos direitos ali dispostos, resguardando de maneira suprema, protegido por cláusula pétrea o direito à vida, como elenca o caput do Art. 5°.

O direito à vida é tão importante pois alguém só será um titular de direitos, se primeiramente existir, sendo necessário que seja gerada, surgindo, então, à figura do nascituro. Pode-se dizer que o nascituro é o ser concebido de seres humanos, mas que ainda não nasceu está no ventre materno. Apesar desse não ser considerado ainda uma pessoa, o CC buscou conceder certos direitos a esses no intuito de resguardar sua condição fragilizada.

A primeira discussão a ser levantada é se o nascituro possui direito a personalidade. Como conceito, à luz dos ensinamentos de Clóvis Beviláqua (1999, p. 81) tem-se que:

a personalidade jurídica tem por base a personalidade psíquica, somente no sentido de que, sem essa última não se poderia o homem ter elevado até a concepção da primeira. Mas o conceito jurídico e o psicológico não se confundem. Certamente o indivíduo vê na sua personalidade jurídica a projeção de sua personalidade psíquica, ou, antes, um outro campo em que ela se afirma, dilatando-se ou adquirindo novas qualidades. Todavia, na personalidade jurídica intervém um elemento, a ordem jurídica, do qual ela depende essencialmente, do qual recebe a existência, a forma, a extensão e a força ativa. Assim, a personalidade jurídica é mais do que um processo superior da atividade psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de pôr em movimento o aparelho jurídico, e que, portanto, é modelada pela ordem jurídica.

 

Assim, a personalidade civil é direito irrevogável, intransferível, irrenunciável, conferido a pessoa pelo fato de nascer com vida, sendo entendimento utilizado pelos tribunais superiores, que nascer com vida é o ato de nascer e efetuar a primeira respiração. 

Neste contexto, segundo Pablo Stolze (2012, p. 111) há três vertentes doutrinarias principais que discorrem sobre a personalidade. A primeira, Teoria Natalista, defende que a personalidade civil somente se adquire após o nascimento da pessoa com vida; A segunda, Teoria Concepcionista, defende que o nascituro adquire personalidade civil desde a sua concepção; A terceira, Teoria da Personalidade Condicional entende que os direitos do nascituro estão em um estado suspensivo, caso este realmente venha a nascer com vida, seus direitos passaram a surtir efeitos no ordenamento jurídico, porém, caso nasça morto esse direito deixa de estar suspenso e passa a ser extinto.

O artigo 2° do CC elenca que: “A personalidade civil da pessoa começa do seu nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.          

No que diz respeito a estas teorias, não há uma que predomine sobre a outra, tanto que pela leitura da primeira parte do artigo 2°, presume-se que o código adotou a Teoria Natalista, contudo, pela leitura da segunda parte, presume-se que o código adotou a Teoria Concepcionista. Depreende-se, então, que a aplicação destas teorias ocorre de forma mitigada, ou seja, conforme a melhor solução do caso concreto se adota ora uma ora outra.

Em um viés de esclarecimento sobre a personalidade do nascituro, Silvio Rodrigues (1998, p. 36 ) ensina que:

A lei não lhe concede personalidade, a qual só lhe será conferida se nascer com vida. Mas, como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico desde logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus.

Importante destacar desta reflexão que, segundo ou outra  concepção, o ponto em comum é que para a obtenção da personalidade o ser humano necessita nascer com vida, sendo então a proteção do direito à vida pelo ordenamento jurídico algo imprescindível ao nascituro.

Assim como na jurisprudência, os tribunais não possuem entendimento pacífico a respeito de qual teoria adotar, porém se busca sempre a efetuação da justiça para melhor atender a situação. A fim de exemplificar o assunto em debate, segue alguns julgados dos tribunais.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“EMENTA: Seguro-obrigatório. Acidente. Abortamento. Direito à percepção de indenização. O nascituro goza de personalidade jurídica desde concepção. O nascimento com vida diz respeito apenas à capacidade de exercício de alguns direitos patrimoniais. Apelação a que se dá provimento (5 fls.) (Apelação Cível n. 70002027910, sexta câmara cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, julgado em 28/03/2001)”.

Superior Tribunal de Justiça:

“DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. MORTE. ATROPELAMENTO. COMPOSIÇÃO FÉRREA. AÇÃO AJUIZADA 23 ANOS APÓS O EVENTO. PRESCRIÇÃO INEXISTENTE. INFLUÊNCIA NA QUANTIFICAÇÃO DO QUANTUM. PRECEDENTES DA TURMA. NASCITURO. DIREITO AOS DANOS MORAIS. DOUTRINA. ATENUAÇÃO. FIXAÇÃO NESTA INSTÂNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I — Nos termos da orientação da Turma, o direito à indenização por dano moral não desaparece com o decurso de tempo (desde que não transcorrido o lapso prescricional), mas é fato a ser considerado na fixação do quantum. II — O nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstância de não tê-lo conhecido em vida tem influência na fixação do quantum. III — Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado desde logo, inclusive nesta instância, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando inconvenientes e retardamento da solução jurisdicional.” (STJ, 4.ª T., REsp 399028/SP; REsp 2001/0147319-0, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 26-2-2002, DJ 15-4-2002, p. 232).
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Investigação de paternidade. Alimentos provisórios em favor do nascituro. Possibilidade. Adequação do quantum. 1. Não pairando dúvida acerca do envolvimento sexual entretido pela gestante com o investigado, nem sobre exclusividade desse relacionamento, e havendo necessidade da gestante, justifica-se a concessão de alimentos em favor do nascituro. 2. Sendo o investigado casado e estando também sua esposa grávida, a pensão alimentícia deve ser fixada tendo em vista as necessidades do alimentando, mas dentro da capacidade econômica do alimentante, isto é, focalizando tanto os seus ganhos como também os encargos que possui. Recurso provido em parte (Agravo de Instrumento n. 70006429096, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 13/08/2003).

 

Dentre os direitos dos nascituros, tem-se direito à vida, á filiação, à saúde, à integridade física, a ser contemplado em doações, à alimentos gravídicos, a receber seguro DPVAT em determinados casos, a danos morais em algumas situações, etc.

 

3 DO CONCEITO DE ABORTO

                        

A prática do aborto, apesar de estar criminalizada pelo Código Penal (CP), é um delito corriqueiro no país, tendo em vista o número de mulheres que contraem uma gravidez indesejada e em seu pensamento não encontram outra solução que não praticar tal ato, seja por conta própria ou com a ajuda de terceiros em clínicas clandestinas.

Contudo, é necessário, precipuamente, esclarecer o conceito de aborto. Aníbal Bruno (1976, p. 160) ensina que:

Segundo se admite geralmente, provocar aborto é interromper o processo fisiológico da gestação, com a consequente morte do feto. Tem-se admitido muitas vezes o aborto ou como a expulsão prematura do feto, ou como a interrupção do processo de gestação. Mas nem um nem outro desses fatos bastará isoladamente para caracterizá-lo.

Tem-se, portanto, que o aborto em si é a interrupção da gestação, de forma que não haja a continuação da concepção do feto, sendo este expelido do ventre materno, vindo a óbito. Entretanto, como elucidou Aníbal Bruno, o fato de um aborto ocorrer não é suficiente para consumar o crime de aborto, tendo em vista que, em certas circunstâncias, como em uma gravidez de risco, o aborto pode ser provocado pelo próprio corpo da mulher, sem que esta assim deseje, sendo considerado um aborto natural.

Já para o direito penal, em específico, o aborto é a interrupção da gravidez provocada por uma ação violenta de alguém que resulta na morte do feto.

A vida se inicia com a concepção ou com a fecundação, ou seja, a partir do momento em que o óvulo feminino se encontra com o espermatozóide masculino e é fecundado; Entretanto, para fins de proteção da lei penal a vida somente terá relevância, para termos de penalização, após a nidação, ou seja, após a implantação do óvulo já fecundado no útero, o que ocorre 14 dias após a fecundação.

Assim, desde a nidação até o momento do parto, toda a intervenção que resultar na morte do produto da concepção é aborto. A partir do início do parto qualquer ação que gere efetiva lesão ao direito à vida do feto será considerado homicídio ou infanticídio a depender da situação.

 

3.1 Classificação Doutrinária

 

Quanto à classificação conferida pela doutrina ao crime de aborto, conforme entendimento de Rogério Greco (2017, p. 172) tem-se que o sujeito ativo é a gestante ou terceiro que realizou as manobras abortivas com ou sem o consentimento da gestante. O sujeito passivo é o feto ou o embrião.

É um delito que pode ser praticado por qualquer meio escolhido pelo agente. É tido como um crime doloso, pois nenhum das modalidades de aborto prevê a figura culposa. É um crime próprio no que diz respeito a gestante em estado puerperal e é um crime comum nas hipóteses em que podem ser praticadas pelo terceiro.

Tem-se por crime comissivo, ou seja, por regra geral, envolve uma ação, sendo também um crime de dano, exigindo-se uma efetiva e concreta lesão ao bem jurídico. É um crime material, pois requerer para sua consumação a morte do feto.

O objeto jurídico diz respeito a qual bem jurídico está sendo protegido, neste caso sendo a vida do feto, tendo por objeto material o feto ou embrião e a gestante nos casos em que puder sofrer lesão corporal gravíssima ou morte.

É um crime instantâneo. Pode ser monossubjetivo, sendo praticado por uma única pessoa, e pode ser plurissubsistente porque vários atos podem fazer parte da conduta descrita na norma.

 

4 DAS TIPIFICAÇÕES DO ABORTO NO CÓDIGO PENAL

 

É preciso recorrer a legislação pátria para compreender por qual modo a prática do aborto é considerado um fato típico. O legislador dedicou no Título primeiro, Dos crimes contra a pessoa, da Parte Especial do Código Penal, um capítulo exclusivo para tratar sobre os crimes praticados contra a vida da pessoa, cujo um deles é o objeto de estudo desse capítulo.  

Precipuamente, é importante esclarecer que, via de regra, o CP adota a Teoria Monista, essa determina que todos os indivíduos que de alguma maneira contribuírem para a realização de um crime, terão sobre si recaídas a pena estabelecida para o mesmo. Contudo, o crime de aborto é uma exceção a esta regra, tendo em vista que a lei prevê dois tipos penais diferentes, para punir de formas distintas sendo duas pessoas que estão envolvidas nesse crime. Estudar-se-á, a seguir, todas as modalidades do aborto.

 

4.1 Do auto aborto

 

A primeira tipificação prevista sobre o tema foi o auto aborto, ou seja, aquele praticado por livre e espontânea vontade da gestante em que pratica as manobras abortivas ou, com seu consentimento, através da ajuda de um terceiro pratica o crime, qual seja o Artigo 124 do referido código: “Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.”. Assim, tem-se que o artigo 124 se direcionar a punir a atividade criminosa da gestante em ambos os casos, portanto, este artigo prevê um crime de mão própria, só podendo ser praticado pela gestante, admitindo participação de outrem.

 

4.2 Do aborto praticado por terceiro

 

A segunda tipificação diz respeito ao aborto praticado por um terceiro à gestante, conforme dispõem o Artigo 125 do CP: “Art. 125. Provocar aborto, sem consentimento da gestante: Pena - reclusão de 3 (três) a 10 (dez) anos.”. Neste caso, pode-se enquadrar um médico que pratica o aborto em uma gestante contra sua vontade, ou o namorado que administra à gestante um remédio abortivo sem o conhecimento dessa. 

Há ainda o aborto praticado por terceiro, tendo o consentimento da gestante, sendo essa menor de 14 anos, o que aumenta a pena máxima estipulada, deixando de ser detenção e passando a ser reclusão, como visto no Artigo 126 do CP: “Art. 126. - Provocar aborto com o consentimento da gestante:   Pena - reclusão, de um a quatro anos.”.    

O Artigo 126 engloba a exceção à Teoria Monista retro mencionada, tendo em vista que este terceiro que pratica o crime com o consentimento da gestante responderá por este artigo e a gestante que solicitou seu auxílio responderá pelo Artigo 124.

Já o parágrafo único do Artigo 126 determina que: “Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.” Aqui, ainda que o aborto tenha sido cometido com o consentimento da gestante, o legislador equipara a conduta praticada como se fosse cometido sem seu consentimento, respondendo o terceiro na pena do Artigo 125.

 

4.3 Da qualificadora do aborto

 

Em relação às tipificações dos Artigos 125 e 126, o legislador estabeleceu a qualificadora do Artigo 127, sendo que, quando o aborto for praticado por terceiro e a gestante sofrer lesão corporal grave em razão dos métodos executados pelo mesmo a pena será aumentada em um terço, ou se falecer a pena será calculada em dobro.

Da qualificadora determinada pelo Artigo 127, depreende-se a ocorrência de um crime preterdoloso, ou seja, o autor inicia a ação com uma vontade determinada, com o dolo de praticar o aborto, entretanto por circunstâncias alheias à sua vontade ocorre uma lesão corporal ou a morte da vítima e o autor responderá pelo resultado diverso do pretendido a título de culpa, daí o nome preterdoloso, sendo a junção de dolo no antecedente e culpa no consequente. Deve-se ressaltar que, caso haja “animus necandi” ou “animus laedendi”, o agente irá responder por concurso de crimes.

Um assunto muito discutido sobre o tema foi a indagação se a utilização de métodos  anticoncepcionais ou a ingestão da pílula do dia seguinte seria considerado uma forma de aborto. Como visto anteriormente, o entendimento estabelecido é que a gravidez se inicia com a nidação, sendo a introdução do óvulo fecundado no útero, que ocorre algo em torno e 12 a 15 dias após o ato sexual, assim todos os métodos contraceptivos agem antes da ocorrência da nidação, não podendo então ser considerados métodos abortivos.

4. 5 Hipóteses permitidas de aborto

O CP previu no Artigo128 dois fatos atípicos, ou seja, uma situação em que a prática do aborto é permita sendo estas a serem estudadas a seguir.

 

4.5.1 Aborto necessário

 

 A primeira hipótese a do aborto necessário ou terapêutico: “Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:   Aborto necessário   I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;”

O primeiro requisito é que o aborto seja praticado por um médico, o segundo é que haja um perigo eminente à vida da gestante, o terceiro, sendo de suma importância, é que a realização do aborto deve ser imperiosamente o único meio de salvar a vida da gestante. Importante ressaltar que a doutrina tem entendido não ser necessário o consentimento da gestante, assim como é desnecessária a autorização judicial.

 

4.5.2 Aborto resultante de estupro

 

O segundo inciso do Artigo 128 prevê que: “Art. – 128... Aborto no caso de gravidez resultante de estupro: II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.”. Abstrai-se desse artigo que o primeiro requisito é que este aborto seja praticado por médico, a gravidez ser resultante de estupro, é necessário haver prévia autorização da gestante ou de seu representante legal.

Relevante sobre o caso é que não há a necessidade de se haver uma sentença transitada em julgado condenando o indivíduo pelo crime de estupro, tão pouco precisão de autorização judicial, contudo, o médico deve ser criterioso a realizar tal procedimento arquivando certidão, boletim de ocorrência, cópia do inquérito policial para verdadeiramente analisar se está perante uma gravidez advinda de estupro.

4.6 Aborto do feto anencéfalo

Por meio da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n° 54, cujo relator foi o Ministro Marco Aurélio Mello, o STF entendeu que é permitida a interrupção da gravidez do feto anencéfalo, tendo em vista sua comprovada pouca expectativa de vida, sendo, portanto, uma conduta atípica. Neste sentido, segue a ementa do julgado:

ADPF - ADEQUAÇÃO - INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ - FETO ANENCÉFALO - POLÍTICA JUDICIÁRIA - MACROPROCESSO. Tanto quanto possível, há de ser dada seqüência a processo objetivo, chegando-se, de imediato, a pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. Em jogo valores consagrados na Lei Fundamental - como o são os da dignidade da pessoa humana, da saúde, da liberdade e autonomia da manifestação da vontade e da legalidade -, considerados a interrupção da gravidez de feto anencéfalo e os enfoques diversificados sobre a configuração do crime de aborto, adequada surge a argüição de descumprimento de preceito fundamental. ADPF - LIMINAR - ANENCEFALIA - INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ - GLOSA PENAL - PROCESSOS EM CURSO - SUSPENSÃO. Pendente de julgamento a argüição de descumprimento de preceito fundamental, processos criminais em curso, em face da interrupção da gravidez no caso de anencefalia, devem ficar suspensos até o crivo final do Supremo Tribunal Federal. ADPF - LIMINAR - ANENCEFALIA - INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ - GLOSA PENAL - AFASTAMENTO - MITIGAÇÃO. Na dicção da ilustrada maioria, entendimento em relação ao qual guardo reserva, não prevalece, em argüição de descumprimento de preceito fundamental, liminar no sentido de afastar a glosa penal relativamente àqueles que venham a participar da interrupção da gravidez no caso de anencefalia.
 

O feto, este anencefálico tem morte cerebral, sendo portanto um natimorto cerebral, logo não possuindo vida no sentido de que esteja tutelado pela norma penal do aborto. Assim, sem vida não há que se falar em crime de aborto. Neste sentido, conforme entendimento do relator Ministro Marco Aurélio Mello, a exclusão é de tipicidade formal.

Este julgado desencadeou relevantes consequências, tendo em vista que, ao descriminalizar o aborto de um anencéfalo, sendo o fato considerado atípico não se pode mais abrir inquérito para os casos de anencefalia comprovada, não cabe ação, ainda menos condenação. Se houver algum inquérito em andamento, o mesmo tem que ser trancado, arquivado. Se houver Ação Penal em andamento deve ser encerrada.

Os indivíduos que já estão cumprindo pena em execução em razão desse delito a mesma deve ser interrompida de imediato, pois a decisão do STF é de interpretação conforme a Constituição. Essa decisão equivale a um “abolicio criminis”, tendo, portanto, efeitos favoráveis ao agente.

De outro lado, não há mais a necessidade de autorização judicial para realizar este tipo de aborto, transferindo a responsabilidade ao médico, cabendo a este manter os documentos necessários para constatar a anencefalia e a inviabilidade da vida, para se evitar qualquer responsabilização penal posterior. Deste modo, o médico possui amparo legal para proceder com o aborto. Observa-se que a responsabilidade em autorizar este tipo de aborto foi retirada das mãos do magistrado e repousa de maneira exclusiva nas mãos dos médicos.

Importante ressaltar que a decisão de proceder com o aborto nos casos de feto anencéfalo é da mulher, podendo decidir interromper ou prosseguir com a gestação, mesmo que o feto não possua longa expectativa de vida.

5 ANÁLISE DA LEGALIZAÇÃO DO ABORTO À LUZ DA LEGISLAÇÃO PÁTRIA 

O Código Penal foi instituído no país por meio do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940, durante o Governo de Getúlio Vargas, passando a vigorar somente em janeiro de 1942. Apesar de ser uma legislação antiga, precedendo ainda a Constituição Federal, é a única que legislou sobre o assunto. Assim, somente após 1940 é que o tema passou ter uma repercussão ampla.

O aborto já foi colocado em pauta algumas vezes no Congresso Nacional, por exemplo, o Projeto de Lei 1135/91, proposto pelos ex-deputados Sandra Starling e Eduardo Jorge. O projeto tinha por intenção alcançar a descriminalização do aborto quando efetuado pela gestante ou nas hipóteses em que houvesse seu consentimento. Ou, que fosse legalizado o aborto, quando realizado por médico até a 12° semana de gestação por vontade da gestante, e até a 20 ° semana se a gravidez fosse fruto de estupro.  Finalmente em 7 de maio de 2018 o projeto foi posto a votação, e por um placar unanime de 33 votos contrários o Senado rejeitou o mesmo.

 

6 A DESCRIMINALIZAÇÃO OU NÃO À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

 

A 1° turma do STF através da análise do Habeas Corpus n° 124306 do Rio de Janeiro decidiu que a interrupção da gravidez até o terceiro mês de gestação provocado pela própria gestante ou com seu consentimento não é crime.

Este julgado apesar de não ser um entendimento definido pelo Tribunal acaba por abrir precedente, pois todos os advogados certamente se basearam neste julgado para buscar defender seus clientes.

É interessante destacar que, no caso em tela, ao julgar sobre a prisão preventiva desses médicos, entendendo que não cometeram crime se o aborto se deu até o terceiro mês, o Poder Judiciário de maneira atípica está atuando dentro das funções do Poder Legislativo, visto que cabe a este criar novas legislações, criminalizar ou descriminalizar determinado fato. Para elucidar o assunto, segue a ementa da decisão proferida pelo Ministro Barroso:

Ementa: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA SUA DECRETAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DA INCIDÊNCIA DO TIPO PENAL DO ABORTO NO CASO DE INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GESTAÇÃO NO PRIMEIRO TRIMESTRE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. O habeas corpus não é cabível na hipótese. Todavia, é o caso de concessão da ordem de ofício, para o fim de desconstituir a prisão preventiva, com base em duas ordens de fundamentos.
2. Em primeiro lugar, não estão presentes os requisitos que legitimam a prisão cautelar, a saber: risco para a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal (CPP, art. 312). Os acusados são primários e com bons antecedentes, têm trabalho e residência fixa, têm comparecido aos atos de instrução e cumprirão pena em regime aberto, na hipótese de condenação.
3. Em segundo lugar, é preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade.
4. A criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a 2 igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria.
5. A tudo isto se acrescenta o impacto da criminalização sobre as mulheres pobres. É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbitos.
6. A tipificação penal viola, também, o princípio da proporcionalidade por motivos que se cumulam: (i) ela constitui medida de duvidosa adequação para proteger o bem jurídico que pretende tutelar (vida do nascituro), por não produzir impacto relevante sobre o número de abortos praticados no país, apenas impedindo que sejam feitos de modo seguro; (ii) é possível que o Estado evite a ocorrência de abortos por meios mais eficazes e menos lesivos do que a criminalização, tais como educação sexual, distribuição de contraceptivos e amparo à mulher que deseja ter o filho, mas se encontra em condições adversas; (iii) a medida é desproporcional em sentido estrito, por gerar custos sociais (problemas de saúde pública e mortes) superiores aos seus benefícios.
7. Anote-se, por derradeiro, que praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo trata a interrupção da gestação durante o primeiro trimestre como crime, aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália.
8. Deferimento da ordem de ofício, para afastar a prisão preventiva dos pacientes, estendendo-se a decisão aos corréus.
 

Como visto, o primeiro plano de discussão neste Habeas Corpus se deu sobre a possibilidade ou não da desconstituição da prisão preventiva, que foi concedida, tendo em vista, à luz das regras processuais penais. Entretanto, o Ministro Barroso foi além, desconsiderou o aborto até o terceiro mês um crime.

Este julgado acaba por gerar prejuízos sociais de grande valor, tendo em vista que ao descriminalizar o aborto praticado por médicos com o consentimento da gestante até o terceiro mês de gestação permite que clínicas particulares de aborto sejam criadas.

Partindo deste ponto de vista, como não há uma legislação específica sobre o assunto, apenas mero julgado, não existe uma Norma da Agência Nacional de Saúde (ANS) regulamentando a existência de uma clínica de aborto. Assim, como se daria a fiscalização, quais são os critérios sanitários, como seria o acompanhamento psicológico, clinico, cirúrgico e pós-cirúrgico que a gestante deve se submeter na clínica para que possa realizar tal procedimento.

Desta forma, a gestante ao se submeter a um aborto em uma clínica particular não estaria resguardada pela legislação pátria, que tem por objetivo criar uma rede de proteção aos direitos dos cidadãos.

No julgado supramencionado, o Ministro justifica que o aborto deve ser legalizado, pois infringe diversos direitos femininos como os sexuais e reprodutivos, retira da mulher a escolha de manter ou não a gravidez que inevitavelmente trará modificações físicas à mesma, e ainda afirma que a descriminalização desse crime deve ocorrer em função de se alcançar uma igualdade entre o sexo feminino e masculino.

            Quanto aos direitos sexuais e reprodutivos há uma vasta proteção dos mesmos no ordenamento jurídico, tendo, por exemplo, a criminalização da prática do estupro, criando reprimenda à homens que submeterem mulheres a prática de atos sexuais sem sua vontade.

Existe ainda grande preocupação do Estado em se respeitar a liberdade sexual dos indivíduos, para tanto, desde o ensino fundamental, é instituído como ementa para os professores lecionarem a estruturas dos aparelhos reprodutivos de ambos os gêneros, como se dá o ato sexual, todas as fases de uma gestação, quais são as doenças sexualmente transmissíveis, possíveis métodos contraceptivos. Inclusive, o Estado, em uma ação proativa, distribui camisinhas em postos de saúde, para que qualquer pessoa possa ter acesso a esses métodos.

Na sociedade moderna, por meio da educação nas escolas, todas as crianças desde cedo, sejam componentes de classe financeira baixa, média ou alta, recebem orientação sobre as questões sexuais, formando então adultos que possuem conhecimento mínimo sobre o assunto, capazes de escolher suas ações e conviver com a consequência das mesmas.

Neste sentido, se uma mulher, realizar o ato sexual sem a utilização de nenhum método contraceptivo, está conscientemente assumindo o risco de engravidar, foi uma escolha dela. Caso a mesma engravide, não seria justo, correto e legal, eliminar com uma vida em desenvolvimento, apenas pelo fato de que esta não deseja ser mãe. Se não fosse essa sua intenção, não praticasse sexo sem a devida proteção. Todos na sociedade têm de assumir a responsabilidade pela prática de seus atos.

Caso contrário, se fosse permitido o aborto até o terceiro mês de gestação, grande quantidade de mulheres não se preocuparia com a utilização destes métodos contraceptivos, apenas realizariam as manobras abortivas para se livra do problema.

            Neste contexto ainda, uma ação proativa do Estado é a concessão do direito a realizar a cirurgia de Laqueadura (para mulheres) e Vasectomia (para homens). É um procedimento, segundo a Lei n° 9.263, permitindo que pessoas de ambos os sexos, com mais de 25 anos, ou que já tenham 2 filhos. Ressalta que este procedimento é realizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) gratuitamente. Aqui, verifica-se a legislação procurando estabelecer igualdade entre homens e mulheres.

            O SUS, de acordo com a Portaria n° 3.265, do Ministério da Saúde, passa a disponibilizar a implantação do Dispositivo Intrauterino (DIU) de cobre para mulheres que acabaram de ter filho ou sofrer aborto. Sendo o DIU um método contraceptivo que libera algumas substâncias inviabilizando o útero para receber espermatozóides e suceder a fecundação com o óvulo.

            No julgado, outro argumento usado é que a descriminalização deve ser procedida, pois é inevitável que os abortos sejam realizados, ao menos desta forma; seria praticados de maneira segura e que o Estado deveria investir mais em educação sexual. Mas, em contraposição a este argumento, os legisladores devem se embasar na real situação econômica brasileira, considerando que tal legalização afetará a sociedade como um todo e que a máquina pública, principalmente no que  diz respeito à saúde pública, está em déficit. 

            Se na maioria dos hospitais do país falta o básico como medicações e macas, o Estado não possui meios econômicos para arcar com a legalização do aborto, pois teria que ter fundos para custear tal procedimento gratuitamente. Assim, não tendo esses meios e apenas legalizando, as pessoas com melhores condições financeiras procurariam clínicas abortivas particulares, e as de baixa renda se submeteriam as clínicas clandestinas se expondo a risco, como ocorre na prática. E ainda, levar-se em consideração que a educação sexual já tem sido efetivada em todo o país.

            O Ministro Barroso elucidou que a legalização deve ser realizada, pois as mulheres de baixa renda poderiam ter acesso ao procedimento de forma gratuita e não devendo se submeter a procedimentos que coloquem sua vida em risco. Não é necessário ter dinheiro para se prevenir, sendo que métodos contraceptivos são distribuídos em postos de saúde.

                      

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos dias de hoje, geralmente as mulheres engravidam por não serem cautelosas, praticarem o ato sexual com seus parceiros sem utilização de nenhum método contraceptivo, que pode ser facilmente adquiridos, somente depende do querer do casal. O nascituro não pode arcar com sua vida por tal atitude irresponsável, tendo em vista que o legislador, assim como a sociedade, reconheceram que este possui direito à vida, à personalidade, à propriedade, respeitados os requisitos legais.

O ordenamento jurídico pátrio não é rígido, insuscetível à mudanças, pois através de novas lei ou jurisprudências tenta-se acompanhar as mudanças no pensamento e nas atitudes de todo o coletivo.

Precipuamente, ao criminalizar o aborto, o legislador não o fez de forma absoluta, compreendeu que em determinados casos, a vida da mãe é mais importante que a do feto, e ainda em uma situação de estupro, reconheceu que a dor emocional que pode advir da perpetuação da gestação de uma mulher que foi violentada, pode acarretar maiores prejuízos que benefícios, permitindo essa modalidade de aborto.

Mais recentemente, o Superior Tribunal Federal mudou seu entendimento e aprovou a interrupção da gravidez de feto anencéfalo, pois se constatou que este não possui expectativa de vida.

Percebe-se que o Estado busca conscientizar a população sobre as questões que envolvem o ato sexual, e ainda permite que a mulher tenha autonomia sobre seu corpo, permitindo a realização da Laqueadura e implantação do DIU gratuitamente pelo SUS, a distribuição em postos de saúdes de camisinhas e métodos anticoncepcionais. Todas essas ações e concessões estatais permitem que o casal possua autonomia para realizar seu planejamento familiar, quantos filhos querem ter e quando os desejam ter.

Há muitas maneiras de se evitar uma gravidez indesejada, e abortar não é uma delas. Essa atitude além de infringir o direito à vida do nascituro, ainda causa sérias consequências para a gestante, sejam psicológicas ou físicas. Geralmente, as mulheres que praticam tal ato, se arrependem posteriormente e carregam esta culpa pelo resto da vida, gerando doenças psicossomáticas como depressão, ansiedade, dentre outras.

Além de causarem sérios prejuízos ao seu corpo, pois por meio de um único aborto, a depender das complicações, podem até mesmo perder a vida. Caso abortem por diversas vezes, podem causar prejuízos irreversíveis aos seus aparelhos reprodutivos, vindo, em certos casos, a desenvolver infertilidade, não podendo mais ter filhos, perdendo a oportunidade, que em dado momento almejaram de serem mães e construírem suas famílias.

Por meio dos exemplos compilados acima, considerando que já foram discutidos em capítulos próprios, percebe-se que o nosso ordenamento jurídico busca, na medida do possível, dizer o direito ao caso concreto da forma que melhor solucione a lide e ainda leva em consideração as condições em que a sociedade se encontra. Assim, também o Estado vem buscando promover ações no sentido de ajudar a sociedade a se conscientizar a evitar a pratica do crime de aborto.

 

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Portaria n° 3.265, de 1° de dezembro de 2017. Diário Oficial da União. Altera o Anexo XXVIII da Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017, que dispõe sobre a ampliação do acesso ao Dispositivo Intrauterino Tcu 380 (DIU de cobre) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt3265_07_12_2017.html. Acessado em: 10 de setembro de 2018.

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Sobre os autores
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Mayara Marques Pesso

Bacharela em Direito pela Faculdade Presidente Antônio Carlos - Unipac - Campus Teófilo Otoni-Minas Gerais.

Cristiane Xavier Figueiredo

Advogada em Minas Gerais. Professora de Direito Civil e Direito Empresarial do Curso de Direito na Faculdade Presidente Antônio Carlos – FUPAC – Teófilo Otoni/MG

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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A legalização do aborto é um assunto muito discutido e polêmico nos dias atuais, tendo em vista que afeta o direito das mulheres no que tange à disposição de seu corpo. Por um lado, há aqueles que defendem os direitos femininos em manter ou não uma gestação, já outros não concordam com este ponto de vista, considerando que o feto possui direito à vida...

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