Faz parte da epopeia do gênero humano (voluntária ou involuntariamente) experimentar as sensações do medo e do sofrimento (ou seja, o receio do padecimento, da aflição, da angústia, do suplício, etc), mesmo que (necessariamente) imbuídas de uma (veemente) repulsa, associada ao desejo, simultâneo e contrapositivo, de obtenção (persistente) de um (utópico) estado de paz de espírito, conhecido, coloquialmente, por felicidade. Destarte, não é incomum, cotidianamente, ouvirmos a frase “o importante é ser feliz”, dita e repetida como se fosse um dogma irrefutável e, por via de consequência, o objetivo (único e) central da vida humana terrena.
Todavia, a verdade é que, - independentemente de nossas exteriorizações volitivas -, a felicidade é essencialmente uma condição (e, portanto, um correspondente e sempre presente efeito consequente) de nossas ações que, por sua vez, - em função de (nítidas e específicas) escolhas (associadas ao livre arbítrio) -, podem, ao reverso do desejado, conduzir ao sofrimento e à própria infelicidade.
Não por outra razão, a atribuição de uma importância capital relativamente às nossas (permanentes) opções, presumivelmente direcionadas ao pretenso propósito de encontrar (dentre tantas possibilidades) o verdadeiro caminho que possa (de fato) nos conduzir à felicidade e, simultaneamente, nos afastar do sofrimento.
Ainda assim, e não obstante a lógica de todo esse “processo mental”, é importante registrar que a felicidade não pode ser alcançada como simples “objetivo”, posto que somente a bondade, - ou mais precisamente as ações e as intenções nobres -, é que possui o verdadeiro condão de realizar, através da força do amor que todos trazem em seus corações, um estado de absoluta tranquilidade. Tal fato ocorre porque não é qualquer atitude (ou fato) que nos permite conduzir à felicidade; posto que a mesma (naturalmente) advém do bem e da consequente satisfação que a realização de atos de bondade traz aos nossos corações.
Portanto, felicidade e infelicidade são resultados últimos (ainda que não definitivos e, portanto, sempre passíveis de mutação) de nossas escolhas, assim como, em certa medida, o sofrimento também o é.
VIKTOR FRANKL, criador da logoterapia e uma das mentes mais brilhantes da centúria passada, certa feita lecionou, com mérita propriedade, que se a vida tem um propósito, logo o sofrimento igualmente o tem. FIÓDOR DOSTOIÉVSKI, grande escritor e filósofo do Século XIX (que sofreu imensamente durante sua vida), expressou, nesta toada, que seu único medo era de não ser digno de seu sofrimento, pois, segundo o mesmo, a dor era um importante fator de aprimoramento do espírito do homem.
Não por acaso, - e de forma muito diferente do senso comum -, o sofrimento atua como um indispensável elemento de “evolução e aprimoramento humano”, considerando, por derradeiro, que é através dele (e de sua experiência) que se expõe a beleza, que se alcança o refinamento e se exterioriza a grandeza.
Todas as nobres almas, seja no campo religioso, filosófico, artístico, ou seja, praticamente em qualquer alçada, foram consciências que sofreram profundamente. Todavia, foram, também e por efeito consequente, “essências” capazes de realizar a mágica da transformação, permitindo que o sofrimento se convertesse, em última análise, em fonte de grandeza e inspiração, e não de (indesejável) dor, obtendo, por fim, - e como natural resultado -, o tão almejado estado de felicidade.