Taxistas X Motoristas de aplicativo: quem tem razão?
RESUMO:
Trata-se de artigo no qual se busca analisar no aspecto jurídico a polêmica existente entre os taxistas e os motoristas de aplicativos, em especial os da empresa Uber. O artigo estuda como a chegada do transporte individual de passageiros por meio de aplicativos gerou discussões acerca da legalidade do serviço prestado pelos motoristas dos referidos aplicativos, discussões essas fomentadas principalmente pelos taxistas, que foram diretamente atingidos com a chegada do Uber no Brasil. Para atingir os seus objetivos, o artigo faz uma análise da prestação do serviço público individual de passageiros, averiguando se o mesmo é apenas um serviço necessariamente público ou se pode ser prestado, de forma livre ou não, pela iniciativa privada. Assim, procuramos analisar a legislação sobre o tema em sua redação original, bem como em sua redação atual.
ABSTRACT:
Resume: His is an article that seeks to analyze the controversy among taxi drivers and application drivers, especially those of the Uber company, in the legal aspect. The article studies how the arrival of individual passenger transportation through applications generated discussions about the legality of the service provided by the drivers of the referred applications, discussions that were mainly promoted by taxi drivers, who were directly affected by the arrival of Uber in Brazil. To achieve its objectives, the article analyzes the provision of individual public passenger service, ascertaining whether it is only a necessarily public service or whether it can be provided, freely or not, by private initiative. Thus, we seek to analyze the legislation on the topic in its original wording, as well as in its current wording.
Palavras-Chaves: táxi – Uber – transporte individual
Keywords: taxi - Uber - individual transport
Sumário: Introdução, 1.Dos pontos polêmicos, 2.Do serviço de transporte individual de passageiros, 3.Da nova realidade legislativa. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Com o surgimento do transporte por meio de aplicativos, principalmente o fornecido pela empresa Uber, surgiu uma grande discussão sobre a legalidade da referida espécie de transporte de pessoas, polêmica existente principalmente entre os taxistas e os motoristas de aplicativo.
Frise-se, outrossim, que a polêmica em testilha não acontece apenas no Brasil, mas também em diversas partes do mundo. (WISNIEWSKI; ESPOSITIVO, 2016), tendo em vista a ampliação dos transportes de aplicativos em diversos países, bem como o crescimento no âmbito internacional da empresa Uber, que no ano de 2019 estreou na bolsa de valores com um valor de mercado de 82,4 bilhões de dólares.[1]
No mais, o estudo do tema é de extrema relevância devido ao fato do pano de fundo das discussões sobre o mesmo ser o próprio direito de locomoção das pessoas, que é um direito fundamental de todo cidadão,[2] o que faz as discussões decorrerem da política pública de transporte de passageiros adotada pelo Estado Brasileiro.
Assim, o presente artigo pretende, sob o prisma estritamente jurídico, fazer uma análise da referida situação. Passemos, então, a analisar os pontos polêmicos.
- DOS PONTOS POLÊMICOS
Durante vários anos no Brasil o serviço individual de passageiros foi realizado única e exclusivamente pelos motoristas de táxi, o que, a priori, era visto com naturalidade pela população, porém existia um grande descontentamento com o serviço prestado, principalmente no tocante ao valor cobrado pelo mesmo, bem como em virtude da quantidade insuficiente de profissionais prestando o referido serviço.
Com o surgimento da Empresa Uber no Brasil (seguida de outros aplicativos), os motoristas de táxis precisaram sair de sua zona de conforto e imediatamente começaram a defender a ilegalidade da nova forma de transporte de passageiros sob o principal argumento de que serviço de transporte individual só poderia ser prestado exclusivamente por meio da permissão concedida aos taxistas.
Os motoristas de aplicativo, por outro lado, conjuntamente com as próprias empresas para quem prestavam seus serviços, ou por meio do qual prestavam os seus serviços[3], começaram a argumentar que possuíam o direito de realizar a referida atividade sob o argumento principal de que o transporte individual de passageiros deveria ser livre para a iniciativa privada em virtude do fato da livre concorrência ser um princípio da ordem econômica expressamente previsto na constituição de 1988[4].
No mais, alguns autores passaram a defender a ausência de qualquer concorrência desleal realizada pelos motoristas de aplicativos e sim um estímulo da competitividade do mercado. (FERRER, 2017, pp. 779-797).
Diante desse cenário, uma questão não é passível de dúvida: os taxistas foram atingidos pela entrada dos aplicativos no mercado brasileiro, o que é algo natural, pois, como afirmam PAULO HENRIQUE SOUTO MAIOR SERRANO e RENATA FRANCISCO BALDANZA: “A mudança provocada pela introdução de um novo valor ou de uma nova necessidade no fluxo circular da economia cria a instabilidade e o consequente movimento posterior de busca do equilíbrio”. (SERRANO, BALDANZA, 2017, p.39.)
Sendo assim, urge a necessidade de analisar a questão do transporte individual de passageiro, principalmente a dúvida de se o mesmo é um serviço público que necessariamente deve ser prestado mediante delegação para um particular ou se realmente é uma atividade de livre prestação pela iniciativa privada.
- DO SERVIÇO DE TRANSPORTE INDIVIDUAL DE PASSAGEIROS
De antemão, urge frisar que conceituar uma atividade como serviço público não é uma tarefa fácil, pois, conforme leciona ODETE MEDAUAR, não é possível definir a priori todas as atividades que serão consideradas serviço público. (MEDAUAR, 1992.p.108.).
Além disso, a noção de serviço público, tal como afirma JAQUES CHEVALLIER (CHEVALLIER, 2017.p.19), está “saturada de significações múltiplas”, o que torna natural a existência de diversos conceitos dados pela doutrina.
Assim, ALEXANDRE SANTOS DO ARAGÃO divide os serviços públicos em quatros sentidos, quais sejam: a concepção amplíssima, a concepção ampla, a concepção restrita e, por fim, a concepção restritíssima. (ARAGÃO, 2013. ps.383-385).
De fato, algumas atividades necessariamente devem ser serviços públicos obrigatoriamente prestados por agentes públicos, como é o caso da segurança pública; outras atividades só são serviços públicos quando prestadas pela Administração Pública, tal como é o caso da prestação de serviços educacionais e outras atividades devem ser garantidas pelo Poder Público como serviços públicos, mas podem sem delegadas para a iniciativa privada, tal como acontece com o serviço de transporte coletivo de passageiros. Por outro lado, o serviço que não é público acaba sendo livre para a iniciativa privada, desde que respeitados também as limitações impostas pela lei.
De qualquer forma, como regra e ao menos na teoria, definir um serviço como público acabará sendo uma questão dentro da margem de discricionariedade do próprio Poder Público, devendo, no entanto, se respeitar os ditames legais.
Entretanto, falamos que “como regra” definir o que é ou não serviço público está dentro da margem de discricionariedade do administrador público porque, caso a lei defina um serviço como sendo público, não restará alternativa ao Poder Público a não ser respeitar os ditames legais e garantir a prestação, ainda que indireta, do serviço público.
ALEXANDRE MAZZA, por outro lado, adotando um critério meramente formal, afirma que será serviço público apenas o que a lei e a Constituição definirem como serviço público (MAZZA, 2015. p.82), seguindo a linha de outros autores que defendem decorrer a criação dos serviços públicos da previsão em lei (FREIRE, 2014.p.268.), de modo a só ser serviço público para os referidos autores o que estiver expressamente previsto em lei.
Não concordamos, no entanto, por completo com os referidos autores, pois, ainda que o administrador seja regido pelo princípio da legalidade, é possível ao mesmo definir alguma atividade como pública dentro dos limites legais, inclusive dentro dos limites orçamentários.
Assim, por exemplo, caso uma prefeitura decida fazer um mutirão de serviços básicos para a população carente, haverá um serviço público ainda que não exista previsão legal nesse sentido.
Desse modo, entendemos que são serviços públicos os expressamente previstos em lei e os assim definidos pelos administradores públicos dentro da margem de discricionariedade dada pela lei.
Especificamente em relação ao serviço de transporte individual de passageiros, a lei 12.587/2012, em sua redação original, previa dever ser o mesmo prestado por meio de um Termo de Permissão a ser concedido justamente aos taxistas, o que era corroborado pela lei 12.468/2011, que, ainda na atualidade, prevê o seguinte: “Art. 2º É atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, sete passageiros.”
Frise-se que as referidas legislações estavam em consonância com a lei reguladora dos serviços públicos, a lei 8987/95, que prevê ser possível a permissão de serviço público, diferentemente da concessão, ser concedida para pessoa física.[5]
Desse modo, por expressa opção do legislador, o serviço de transporte individual de passageiros era considerado um serviço público e que necessariamente deveria vir a ser delegado para uma pessoa física, no caso, os taxistas, fazendo com que o serviço público de transporte de passageiro fosse dividido em transporte coletivo, ordinariamente prestado por meio de uma concessão de serviço público e transporte individual, prestado por meio de uma permissão de serviço público.
A opção acima mencionada foi importante em alguns aspectos, principalmente no que tange uma maior segurança ao usuário em virtude da existência de um maior controle pelo Poder Público acerca de quem efetivamente estava prestando o serviço, bem como um maior controle estatal dos contingenciamentos no trânsito das grandes cidades brasileiras causados pelo transporte individual de passageiros.
Desse modo, existem duas grandes justificativas para o serviço individual de passageiros ter sido regulamentado como público, quais sejam: o primeiro é fatos dos consumidores não possuírem conhecimento prévio de como será prestado o serviço, uma vez que não conhecem pessoalmente o motorista nem o carro e o segundo é o fato do serviço atingir outras pessoas, pois gera congestionamento e ainda polui o meio-ambiente. (BARBOSA; PARANHOS; BALBINOT; CASTRO, 2018. p.798).
Frise-se, outrossim, que os municípios e os estados não podem legislar sobre transporte, nos termos do artigo 22, XI, da Constituição da República,[6] de modo que as leis municipais e estaduais que regulamentaram o transporte individuais de passageiros foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal-STF em diversas oportunidades. (ANDRIGHI, 2016. p.413).
Assim, em um primeiro momento, nosso entendimento era no sentido de que os taxistas, no aspecto legal, possuíam razão ao afirmarem que os motoristas de aplicativos eram uma espécie de “táxi pirata”.
De fato, a partir do momento em que a lei exigia a permissão para a realização do transporte individual de passageiros, quem realizava o mesmo serviço de outra forma o fazia ao arrepio da lei.
Naturalmente, não podermos comparar a atitude de quem usava Uber com a de quem adquire um produto “pirata”, pois nesse último caso o adquirente efetivamente cometia o crime de recepção ao adquirir um produto objeto de um crime.
No mais, frise-se a nítida existência de uma concorrência desleal, pois o motorista de aplicativo não possuía as mesmas exigências legais (e, naturalmente, os mesmos custos) do motorista de táxi, o que, naturalmente, permitia (tal como ainda se permite) a cobrança de um valor mais baixo pela prestação do serviço. Além disso, um taxista de uma praça não pode receber passageiro de outra praça, mesma situação não acontecendo com os motoristas de aplicativo.
Por outro lado, OLÍVIA MARTINS DE QUADROS OLMOS e RAFAELA BOLSON DALLA FAVERA atentam para o fato de que a opinião mais importante no referente à presente discussão é a dos usuários dos serviços de Uber ou Táxi. (OLMOS; FAVERA, 2015. p.11.), tendo em vista que a busca do interesse público primário é a junção dos interesses privados que nós temos como membros da sociedade, ou seja, “o somatório dos interesses privados em sua dimensão coletiva” (OLIVEIRA JUNIOR,2017. p.24).
Entretanto, sem querer diminuir a importância dos usuários, tendo em vista que eles efetivamente são os destinatários do serviço público, o fato é que a opinião dos mesmos naturalmente vai caminhar para a opção menos custosa, principalmente em se tratando de um país em desenvolvimento como o Brasil e que passa por uma grave crise econômica e social, de modo que para o usuário é irrelevante, como afirma JOAQUIM MIRANDA SARMENTO, quem presta o serviço público, mas sim se o serviço atende as suas expectativas (SARMENTO, 2013. p.41).
Desse modo, o que o cidadão vai querer é apenas um carro com motorista e com uma estrutura mínima suficiente para o levar de um lugar para o outro da forma mais barata possível, seja o automóvel um táxi, um Uber ou um 99 Pop, por exemplo.
Nesse sentido, em pesquisa realizada sobre o tema em conjunto com outros autores, CHRISTIANE LIMA PARANHOS concluiu que as pessoas optam pelo serviço do Uber e não pelo serviço do táxi de forma quase unânime em virtude do preço mais barato. (BARBOSA; PARANHOS; BALBINOT,2018, p.808.)
A ministra do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, por outro lado, afirma existir uma diferenciação entre o “transporte privado individual” e o “transporte público individual”, defendo que os taxistas exercem esse último, o que não impediria o exercício dos motoristas de aplicativos da primeira atividade mencionada pela referida jurista. (ANDRIGHI, 2016.p.414).
Não concordamos, no entanto, com a referida diferenciação, pois os motoristas de aplicativos exercem exatamente a mesma atividade dos taxistas, sendo efetivamente uma opção ao transporte das pessoas, não sendo por outra razão que uma infinidade de pessoas trocou o uso do táxi pelo uso do Uber ou de outros aplicativos de transporte individual de pessoas.
Inclusive, a ideia de criar o Uber surgiu quando os seus criadores, TRAVIS KALANICK e GARRET CAMP, perceberam a dificuldade em conseguir pegar um Táxi em Paris, França (FARIAS, 2016. p.31) e resolveram criar uma empresa inicialmente chamada de UBERCAB, onde, como afirma FERNANDO MEISTER VIEIRA DE FARIAS em estudo sobre tema, o prefixo “uber” significa superior ou super e o sufixo “cab” significa táxi, de acordo com a língua inglesa. (idem, ibidem, p.32), não existindo dúvida, assim, que a ideia dos criadores do Uber era criar uma nova e melhor espécie de Táxi.
No mais, o mencionado transporte individual privado seria o caso de duas pessoas firmarem um contrato personalíssimo de transporte, como acontece, por exemplo, com um transporte escolar ou até mesmo com um aluguel de veículo, o que não é o caso do Uber, no qual a pessoa solicita um veículo sem saber quem será o motorista, ou seja, ao invés de acenar com a mão, “acena” com o celular.
Assim, não há como ser seduzido pelos argumentos de que o Uber é apenas uma nova tecnologia, ou como afirmam GABRIEL RACHED e EDUARDO HELFER DE FARIAS, um “simples aplicativo de smartphone”. (RACHED; FARIAS, p.849), uma vez que a tecnologia se dá apenas para chamar o carro com o motorista e não para a realização do serviço prestado.
Outrossim, não podemos confundir a própria empresa Uber, que é uma startup(FREITAS, p.1423), com o serviço que ela viabiliza, qual seja: o transporte individual de passageiros.
Desse modo, não possuímos dúvida que até o ano 2018 os motoristas de aplicativos exerciam exatamente a mesma função dos taxistas, porém sem o preenchimento dos mesmos requisitos legais, exercendo, desse modo, de forma ilegal uma atividade devidamente regulamentada. Pensar de outra forma seria permitir, por exemplo, o surgimento de novas empresas de transporte coletivo de passageiros usando as mesmas linhas dos ônibus por meio de aplicativos, sem o recebimento, no entanto, de uma concessão de serviço público. Possibilidade na qual nunca se cogitou no Brasil.
Naturalmente, a realidade supramencionada não permitia, principalmente com violência, aos próprios taxistas impedirem o exercício da atividade dos motoristas de aplicativo, o que poderia configurar o crime de exercício arbitrário das próprias razões,[7] tendo em vista que a autotutela é uma forma primitiva de resolução de conflitos. (KELSEN, 2011, p.4).
- DA NOVA REALIDADE LEGISLATIVA.
Apesar de tudo que foi aludido no tópico anterior, em 2018 houve uma reviravolta legislativa quanto ao tema objeto do presente estudo, pois foi aprovada a lei 13.640/2018, popularmente conhecida como a “Lei do Uber”, alterando a lei 12.587/2012 e passando a prever expressamente a possibilidade de realização do transporte individual de passageiros por meio de aplicativos nos seguintes termos:
“Art. 4o Para os fins desta Lei, considera-se: X - transporte remunerado privado individual de passageiros: serviço remunerado de transporte de passageiros, não aberto ao público, para a realização de viagens individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede.”
Desse modo, na atualidade o Brasil expressamente permite a prestação do serviço de transporte individual de passageiros de duas formas, quais sejam: por meio de um serviço público delegado para pessoas físicas (taxistas) ou por meio de uma atividade privada prestada por empresas de aplicativos para usuários previamente cadastrados, ou seja: atualmente o referido meio de transporte pode ser público ou privado e não exclusivamente público mediante delegação tal como acontecia outrora.
Frise-se, outrossim, não estar o serviço de transporte individual de passageiros totalmente livre para a iniciativa privada, pois não é possível uma pessoa trafegar com o seu carro na rua atrás de clientes sem ser taxista ou sem estar vinculado e previamente cadastrado a um aplicativo, da mesma forma que o motorista de aplicativo não pode, diferentemente dos táxis, colocar o nome “Uber” no capô do carro e receber usuários na rua ou em pontos específicos para tal mister.
De qualquer forma, no presente momento os motoristas de aplicativos no Brasil não prestam mais um serviço de forma marginal e sim nos termos permitidos pela própria legislação pátria atualmente em vigor, devendo os taxistas procurarem se adaptar a essa nova realidade, não havendo como reverter a mesma, salvo por meio de nova alteração legislativa.
Também não há como negar que a nova realidade legal pode trazer alguns benefícios para a população, em espacial um melhor preço e o aumento de opções para a realização do transporte individual de passageiros.
Outrossim, algumas benesses continuam sendo usufruídas apenas pelos taxistas e não pelos motoristas de aplicativos, como trafegar em alguns munícipios nas faixas exclusivas para ônibus, o que é uma decorrência justamente do fato dos motoristas de táxis receberam uma permissão de serviço público, o que os torna, inclusive, agentes públicos no sentido amplo da palavra, sendo inseridos dentro da modalidade de “particulares em colaboração com a Administração” (MELLO, 2005, p.234).
Por outro lado, o serviço prestado pelos taxistas, conforme foi acima mencionado, possui um maior controle por parte do Poder Público da atividade exercida, diferentemente dos motoristas de aplicativos, cuja adesão ou desligamento ao serviço são realizados pela empresa intermediária, sem qualquer controle estatal.
CONCLUSÃO
Durante vários anos e por opção dos nossos legisladores, o transporte individual de passageiros só podia ser prestado por meio de uma permissão dada aos taxistas, o que, diga-se, muitas vezes implicava em uma acomodação desses últimos com a situação e, em contrapartida, com uma insatisfação dos usuários em virtude, principalmente, do alto preço cobrado em virtude da ausência concorrência.
Tirando os taxistas de sua zona de conforto, surgiram as empresas de aplicativos de transportes conjuntamente com os motoristas de aplicativos, porém, em um primeiro momento, esses últimos prestavam, no nosso entendimento, o serviço até então público de transporte individual de passageiros sem o respeito aos ditames legais, agindo de forma marginal no sentido técnico da palavra.
Entretanto, diante de tudo que foi estudado no presente artigo e com base na legislação atual, não há como negar: não há na atualidade qualquer ilegalidade no serviço prestado pelos motoristas de aplicativos, podendo os mesmos realizarem as suas atividades em regime de concorrência com os motoristas de táxis.
Ainda que se entenda, tal como entendemos, não ser justa e leal a concorrência entre os taxistas e os motoristas de aplicativo mesmo com os primeiros recebendo algumas benesses do Poder Público, essa é a nossa realidade legal no momento, não havendo como a mesma ser mudada, salvo por meio do Congresso Nacional, o que não se imagina ser algo possível de acontecer no momento, tendo em vista a recente alteração legislativa.
Naturalmente, a mudança na lei realizada em 2018 permitindo o serviço privado de transporte individual de passageiros decorreu do poderio econômico das empresas de aplicativos, em especial da própria Uber, o que, por exemplo, não aconteceu no passado em diversas cidades do Brasil com os motoristas de vans e kombis, o chamado “transporte coletivo alternativo”, pois esses últimos acabaram sucumbindo diante da força econômica dos empresários das grandes empresas concessionárias de ônibus, que acabaram conseguido impedir em várias localidades a continuidade do referido transporte alternativo que trazia benesses semelhantes às oferecidas pelos motoristas de aplicativos.
Assim, ao contrário do afirmado no início deste estudo, a definição se uma atividade é um serviço público ou privado acaba não sendo, na prática, uma situação escolhida pelo próprio administrador público dentro de sua margem de discricionariedade, nem muito menos pelos legisladores, tal como afirma boa parte da doutrina, mas sim algo definido em virtude da influência do Poder Econômico.
Diante da realidade supramencionada, ao que parece, os motoristas de táxis, por mais injusta que a referida situação possa parecer, tendem a ter o mesmo fim dos proprietários de locadoras de vídeo, não sendo um exagero afirmar que a profissão de taxista se tornou uma profissão em extinção e que não será utilizada pelas futuras gerações.
REFERÊNCIAS
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[1]Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2019/05/09/economia/1557399108_045920.html.
[2]Constituição da República Brasileira de 1988: XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;
[3]Aqui surge uma polêmica da existência ou não de vínculo empregatício entre os motoristas e as empresas do aplicativo, seria a chamada “uberização das relações trabalhistas”. Entretanto, e referida discussão foge dos objetivos do presente estudo.
[4]Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: Art.170: Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV - livre concorrência;
[5]Lei 8987/95:Art. 2o Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se: IV - permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.
[6]Constituição da República: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XI - trânsito e transporte;
[7]Código Penal Brasileiro: Exercício arbitrário das próprias razões. Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.