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Os limites da teoria da imprevisão e da sua inaplicabilidade

Agenda 20/04/2020 às 11:02

O propósito do Artigo é abordar alguns aspectos sobre os limites da Teoria da Imprevisão que notoriamente impõe-se atualmente em decorrência da pandemia do COVID-19, no âmbito dos negócios jurídicos de todo o país.

1.               INTRODUÇÃO

O presente trabalho dispõe do objetivo abordar o instituto da Teoria da Imprevisão em virtude da pandemia, Novo Covid 19, que atinge de forma relevante diversos países com grande influência no cenário econômico mundial e afeta também os negócios jurídicos no Brasil, gerando inseguranças jurídicas em algumas relações.

A fim de contribuir com o debate em questão apresentamos nosso posicionamento sobre os limites da teoria da imprevisão, suas limitações e nos casos de sua inaplicabilidade. 

2.               DAS CAUSAS E DOS EFEITOS DA TEORIA DA IMPREVISÃO

Não restam dúvidas que estamos vivenciando os efeitos da teoria da imprevisão motivada pelo evento que abalou o mundo e impactou profundamente a economia e as relações jurídicas de pacto continuado e diferido, com a pandemia causada pelo Novo Covid 19.

Muitos setores econômicos estão sofrendo os efeitos deste evento extraordinário. Os governos pelo mundo a fora decretaram o fechamento dos comércios, instituindo o lockdown e isolamento social.

Por esse motivo, muito tem se abordado sobre a importância das revisões contratuais de execução continuada ou diferida, que ocasionaram a onerosidade excessiva, evitando o enriquecimento ilícito de alguma das partes, desequilíbrios econômicos e contratuais.

O fato é que ricos e pobres, empresário e trabalhadores, consumidores e fornecedores, inquilinos e locatários, alimentantes e alimentandos, iniciativa privada e poder público, entre outras relações sociais estão sendo afetadas.

Assim, analisamos as publicações com grande técnica jurídica por meios de artigos das principais plataformas de website especializadas, profissionais dissecarem os artigos 478, 479, 480 do Código Civil atual, sem, contudo, em alguns artigos enfatizar os limites e não aplicação da em voga teoria da imprevisão.

Por esse motivo, trazemos, inicialmente, para pavimentar nossa abordagem, sucintamente, sobre os aspectos de causa e efeitos da Teoria da Imprevisão nos contratos sociais e comerciais.

Desse modo, ao analisarmos os termos do caput do artigo 478 do Código Civil/02 podemos extrair as principais causas e efeitos da teoria da imprevisão, in verbis:

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de ACONTECIMENTOS EXTRAORDINÁRIOS E IMPREVISÍVEIS, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

O pilar central da teoria da imprevisão consiste notoriamente no ACONTECIMENTO IMPREVISÍVEL E EXTRAORDINÁRIO. Assim, a causa de sua aplicação é o fato inesperado e extraordinário.

 

Os Efeitos são:

 

Neste contexto temos o fato inesperado e extraordinário, COVID-19, e sua possível aplicação em contrato de execução continuada ou diferida.

Porém, sua aplicação não é ilimitada, devendo ser aplicada com toda a cautela necessária, a fim de impedir ainda maior prejuízo a uma das partes envolvidas e que também sofrem com o acontecimento em exame, e que passaremos a expor.

3.               DOS LIMITES DA APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO

3.2         DA LIMITAÇÃO DOS EFEITOS DA TEORIA DA IMPREVISÃO

 

A nosso entender a extinção contratual é a exceção e a revisão um aditivo contratual, plano emergencial provisório e limitado, consoante os termos da Lei de Liberdade Econômica n. Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019.

A referida Lei de Liberdade Econômica trouxe alteração no Código Civil, artigo 421-A, incluindo especificamente, o inciso III, in verbis:

Art. 421-A.  Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que:

(...)

III - a revisão contratual somente ocorrerá de maneira EXCEPCIONAL e LIMITADA.

A regra é a observância do princípio pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e, por conseguinte, impõe ao Estado o dever de não intervir nas relações privadas.

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Ademais, o princípio da autonomia da vontade confere aos contratantes ampla liberdade para estipular o que lhes convenha, desde que preservada a moral, a ordem pública e os bons costumes, valores que não podem ser derrogados pelas partes.

A Teoria da imprevisão estudada sob a pandemia que atinge todas as relações e negócios jurídicos pelo mundo, leva-nos a refletir sobre seu caráter de um verdadeiro aditivo contratual e emergencial e não de simples revisão no pacto contratual principal.

Isso porque, A TEORIA DA IMPREVISÃO UM PLANO EMERGENCIAL, elaborado pelas partes ou pelo poder judiciário sendo provisório, devendo ser retomada a normalidade contratual inicial após cessarem os riscos e eventos extraordinários motivadores da sua aplicação.

Temos assim que a referida Teoria é o aditivo contratual provisório e emergencial que não deve alterar, necessariamente, o pacto inicial de forma permanente.

Portanto, o instituto em exame a nosso entender não serve para alterar substancialmente e definitivamente a relação contratual inicialmente estabelecida e sim enquanto durar o desequilíbrio provocado pelo evento extraordinário e excepcional.

3.3         DA INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA IMPREVISÃO AOS CONTRATOS DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA.

O E. Superior Tribunal de Justiça já pacificou a matéria, Informativo nº 0507, e inadmite a teoria da imprevisão, por serem aplicáveis apenas nas relações civis comuns. Sendo que nas relações de consumo a mera onerosidade excessiva diversa da inicial já viabiliza a revisão contratual, in verbis:

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA BASE OBJETIVA OU DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO.

A teoria da base objetiva ou da base do negócio jurídico tem sua aplicação restrita às relações jurídicas de consumo, não sendo aplicável às contratuais puramente civis. A teoria da base objetiva difere da teoria da imprevisão por prescindir da imprevisibilidade de fato que determine oneração excessiva de um dos contratantes. Pela leitura do art. 6°, V, do CDC, basta a superveniência de fato que determine desequilíbrio na relação contratual diferida ou continuada para que seja possível a postulação de sua revisão ou resolução, em virtude da incidência da teoria da base objetiva. O requisito de o fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido para a teoria da base objetiva, mas tão somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis que existiam no momento da celebração do negócio, ensejando onerosidade ou desproporção para uma das partes. Com efeito, a teoria da base objetiva tem por pressuposto a premissa de que a celebração de um contrato ocorre mediante consideração de determinadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso da relação contratual, determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as circunstâncias intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. Em que pese sua relevante inovação, a referida teoria, ao dispensar, em especial, o requisito de imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para as relações de consumo, que demandam especial proteção. Ademais, não se admite a aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito das obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do consumidor. De outro modo, a teoria da quebra da base objetiva poderia ser invocada para revisão ou resolução de qualquer contrato no qual haja modificação das circunstâncias iniciais, ainda que previsíveis, comprometendo em especial o princípio pacta sunt servanda e, por conseguinte, a segurança jurídica. Por fim, destaque-se que, no tocante às relações contratuais puramente civis, quer dizer, ao desamparo das normas protetivas do CDC, a adoção da teoria da base objetiva, a fim de determinar a revisão de contratos, poderia, em decorrência da autuação jurisdicional, impor indesejáveis prejuízos reversos àquele que teria, em tese, algum benefício com a superveniência de fatos que atinjam a base do negócio. REsp 1.321.614-SP, Rel. originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015.

Portanto, pela questão da vulnerabilidade inerente a relação de consumo não se fazem presente os requisitos da teoria da imprevisão, como já decidiu o E. STJ, sendo um limitação à Teoria da imprevisão.

3.4         DA NECESSIDADE DO ADIMPLEMENTO ATUAL DO CONTRATO ESTABELECIDO.

Ao buscar os efeitos da teoria da imprevisão, entendemos, que o requerente deva estar em dia com suas obrigações, sob pena de gerar ainda maior desequilíbrio econômico e contratual, para o contratante que já vinha sofrendo o ônus do inadimplemento.

Neste sentido é elucidado nos Comentários do Novo Código Civil de Ricardo Fiuza citando a primazia e o lapidar conhecimento de Regina Tavares da Silva, atenta, inclusive às regras de grande alcance do Código Civil Português a exemplo do art. 438, quando dispõe:

Aparte lesada não goza do direito de resolução ou modificação do contrato, se estava em mora no momento em que a alteração das circunstancias se verificou”.

A caracterização do inadimplemento anterior pode ser por má previsão de uma das partes contratantes, o que leva ao inadimplemento, não abrangido pela teoria da Imprevisão.

Neste sentido é o entendimento do E. STJ, consoante o informativo n. 0352 ao determinar a inaplicabilidade da teoria em exame pela má previsão das partes, in verbis:

LICITAÇÃO CONTRATO.PREJUÍZOS SOFRIDOS. TEORIA DA IMPREVISÃO.

Trata-se de recurso em que se discute a aplicação da teoria da imprevisão de modo a propiciar o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Primeiramente, o Min. Relator asseverou ser irrelevante o fato de o contrato ter sido firmado antes da vigência do novo Código Civil para a análise da mencionada teoria. Para o Min. Relator, não se mostra razoável o entendimento de que a inflação possa ser tomada, no Brasil, como álea extraordinária, de modo a possibilitar algum desequilíbrio na equação econômica do contrato, como há muito afirma a jurisprudência deste Superior Tribunal. Não há como imputar as aludidas perdas a fatores imprevisíveis, já que decorrentes de má previsão das autoras, o que constitui álea ordinária, não suportável pela Administração e não autorizadora da teoria da imprevisão. Caso fosse permitida a revisão pretendida, estar-se-ia beneficiando as apeladas em detrimento das demais licitantes que, agindo com cautela, apresentaram proposta coerente com os ditames do mercado e, talvez por terem incluído essa margem de segurança em suas propostas, não apresentaram valor mais atraente. REsp 744.446-DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 17/4/2008.

Portanto, um dos fatores a serem avaliados é o adimplemento no momento de se verificar e aplicar a teoria da imprevisão sob pena de gerar ainda maior desequilíbrio econômico e beneficiar a parte que não previu adequadamente os ônus contratuais ao longo do tempos.

3.5         DO RISCO REPETITIVO E PREVISÍVEL POSTERIOR AO ACONTECIMENTO INESPERADO.

O risco quando é repetitivo deixa de ser considerado risco inesperado e passa a ser um risco previsível no qual, entendemos, que as partes ao celebrarem o pacto devam levar em consideração a ocorrência no caso específico do COVID 19 e seus efeitos nefastos.

 

Desse modo, as partes devem se planejar de modo que em ocorrendo os riscos em exame possam estar preparada e contar com medidas para combater os desequilíbrios contratuais e econômicos.

Assim, o risco repetitivo deve estar no campo do planejamento e não mais no campo da imprevisão.

Esta matéria é abordada pela Doutrina do Doutor Giovanni Pacelli na obra Administração Financeira e Orçamentária 2ª Edição e faz referência à Lei de Responsabilidade fiscal, especificamente, ao tratar do Anexo de Riscos Fiscais – ARF, artigo 4º, §3º, in verbis:

Art. 4º [...]

§ 3o A lei de diretrizes orçamentárias conterá Anexo de Riscos Fiscais, onde serão avaliados os passivos contingentes e outros riscos capazes de afetar as contas públicas, informando as providências a serem tomadas, caso se concretizem.

Ao promover a 4º enquete em sua doutrina o autor questiona: Riscos repetitivos deixam de ser riscos?

“Solução

Sim. Riscos repetitivos deixam de ser riscos, devendo ser tratados no âmbito do planejamento, ou seja, devem ser incluídos como ações na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual do ente federativo. Por exemplo, se a ocorrência de catástrofe naturais – como secas ou inundações – ou de epidemias – como a dengue – tem sazonalidade conhecidas, as ações para mitigar seus efeitos, assim, como as despesas decorrentes, devem ser previstas na LDO (Lei de diretrizes orçamentárias) e na LOA do ente federativo afetado, e não ser tratada como risco fiscal no Anexo de Riscos Fiscais”.

5º Enquete do Autor: Precatório constam na ARF?

Solução

Não. Os precatórios decorrem de sentença com trânsito em julgado, assim, devem constar na LOA. No ARF constam apenas as demandas judicias em aberto.

Como o Código Civil é omisso quanto aos riscos repetitivos entendemos por bem fazer essa analogia ao termos aplicados na administração orçamentária pública e na prevenção de riscos inesperados e previsíveis.

 

Portanto, no contexto atual, quando o vírus COVID 19 deixar de ser o risco inesperado e passa a ser o risco previsível, sujeito a inaplicabilidade da Teoria da Imprevisão, deverá se tratado no campo do planejamento, como afirmado acima.

4.               DA CONCLUSÃO

 

A teoria da imprevisão não pode servir de arrimo para a resolução de qualquer negócio jurídico civil, devendo ser observados os limites de sua aplicação, principalmente na má previsão da partes e do adimplemento atual, e do risco repetitivo que não se enquadraria mais no âmbito de inesperado e sim do planejamento, e por fim os contrata de consumo não se aplicaria o tema.

5.               FONTES

http://www.planalto.gov.br

http://www.stj.jus.br/

Pacello, Gioanni, Administração Financeira e Orçamentária, 2º Edição.

Fiuza Ricardo, Novo Código Civil Comentado, 3ª Edição.

Sobre o autor
Brener Castro de Paiva

Advogado, há mais de 10 anos, pelo Escritório de Advocacia Paiva & Rocha Consultoria jurídica, e acadêmico de sistema de informações.

Informações sobre o texto

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