Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

O princípio da presunção de inocência do réu em julgamento

.

Exibindo página 2 de 2
Agenda 07/06/2020 às 20:29

[1] É sabido que são provisórias a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão administrativa, a prisão por pronúncia, a prisão resultante de sentença condenatória recorrível e a prisão temporária, sendo esta derradeira disciplinada pela Lei 7.960/1989. Sublinhe-se que a Constituição Federal brasileira ainda admite também outras prisões, como a disciplinar, no caso de transgressão militar ou crime propriamente militar (art. 5º, LXI da CF/1988), a prisão durante o estado de defesa (art. 136, § 3º, I da CF/1988) e do estado de sítio (art. 139, II da CF/1988).

[2] Requer a lei brasileira a prova da existência do crime e indícios suficientes que o acusado seja o autor do delito imputado. Quando o crime deixa vestígios é curial para a prisão preventiva, o exame de delito ou, na impossibilidade, de prova testemunhal que os supras (artigos 158 e 167 do CPP).

[3] O objetivo de Alexy com sua teoria não é alcançar exatamente uma homogeneização de cada ordem jurídica fundamental. Em verdade, visa é descobrir as estruturas dogmáticas e revelar os princípios e valores que se escondem atrás das codificações e da jurisprudência. Posto que em qualquer lugar que existam direitos fundamentais, surgem problemas semelhantes, como por exemplo, as diferenças estruturais entre os direitos sociais e os políticos.

Enfim, a tese de Alexy pretende dar resposta ao questionamento de quem seria o titular dos direitos fundamentais, e se poderiam ser restringidos e qual deve ser a intensidade de controle da corte constitucional sobre o legislador.

No afã de obter cientificidade, defende que os direitos fundamentais possuem caráter de princípios, e, que eventualmente esses colidem, sendo necessária uma solução ponderada em favor de um destes.

[4] A fórmula básica do sopesamento, como é chamado o método de solução das colisões entre princípios, é: (P1 P P2) C →R A regra de solução (R) expressa que, nas condições representadas pela letra C, que dizem respeito ao peso dos princípios em jogo no caso concreto, o princípio P1 prevalece (P) sobre o princípio P2. Isso não significa dizer que esta solução poderá ser adotada numa situação futura semelhante, pois as condições fáticas e jurídicas podem ter se alterado.

[5] Conforme a lei de ponderação, há de se realizar em três âmbitos, a saber: 1. Definir a intensidade da intervenção, isto é, o grau de insatisfação ou afetação de um dos princípios;

2. Definir a relevância dos direitos fundamentais justificadora da intervenção, isto é, a importância da satisfação do princípio oposto; 3. Realizar a ponderação em sentido específico, ou seja, se a importância da satisfação de um direito fundamental justifica a não satisfação do outro.

[6] A Escola Clássica italiana surgiu no final do século XVIII e, baseando-se nos postulados iluministas, defendida um Estado Democrático Liberal, de total proteção aos direitos individuais em oposição ao absolutismo, à tortura e ao processo penal inquisitorial.

[7] Francesco Carrara (1805-1888) foi jurista italiano e político liberal que fora um dos principais doutrinadores da lei criminal e advogados na abolição da pena de morte do século XIX.

Carrara inicialmente seguiu Mazzini, mas se aproximou-se de grupos liberais mais moderados na década de 1840. Ele ajudou a organizar a ascensão de Lucca à Toscana, considerando-o o primeiro pequeno passo em direção à unidade nacional.

Após a unificação italiana, Carrara foi eleito para o parlamento em 1863, 1865 e 1867 e, fora um membro influente da comissão que prepara o Código Penal da Itália, o chamado Código Zanardelli, concluído em 1889.

[8] Vincenzo Manzini foi expoente da Escola Técnico-Jurídica que estigmatizou a presunção de inocência chegando a considerar como absurdo extraído do empirismo francês.

E, entendia que a presunção seria incompatível com qualquer tipo de procedimento criminal, sobretudo àqueles que afetam diretamente o direito de liberdade do cidadão sem que exista em seu desfavor uma sentença definitiva, tais como a prisão cautelar e a prisão em flagrante, porque se para a instauração de um processo e ou aplicação de qualquer medida segregadora faz-se preciso indícios suficientes de autoria e prova da existência do crime.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

[9] O princípio da presunção da inocência fora insculpido no texto constitucional brasileiro de 1988, tido como direito fundamental assegurado a todos os indivíduos acusados de uma infração penal. Desde de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos celebrada pela Assembleia Geral da ONU que acolheu o princípio da presunção de inocência, todavia, sua aplicação passou em albis no brasil.

Apenas em 1992 que o Brasil veio a aderir ao Pacto de São José da Costa Rica que fora celebrado em 1969, mediante a promulgação do Decreto 678, de 6.11.1992, cujo o artigo 8º que afirma literalmente: "Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa".

Ressalte-se, no entanto, que a Convenção Americana sobre Direitos Civis e Políticos celebrada pela Assembleia Geral da ONU em 16.12.1966 e ratificado pelo Brasil em 24.1.1992 também admitia o referido princípio, apesar de que alguns doutrinadores já sustentassem o seu reconhecimento em período anterior. De qualquer forma, o princípio naquela época carecia de maior efetividade.

[10] Até então, e desde 2009 (HC 84.078), o Princípio da Presunção de Inocência tinha como condão de impedir a execução da pena, mesmo se houvesse sentença de segunda instância recorrível. Era o entendimento construído naquele writ, desde a promulgação da Carta de 1988.

O centro da discussão jurisprudencial ora estudada se encontra no alcance do Princípio da Presunção de Inocência ou de não culpabilidade.  Para alguns doutrinadores o termo certo seria “não culpabilidade” porque a Constituição brasileira não explicitou o termo “presunção de inocência” já que consta na Carta que “ninguém será considerado culpado...”.

Nomenclaturas à parte, a questão continua sendo se o indivíduo pode ser começar a cumprir a pena após a segunda instância, ou seja, o marco temporal de quando o réu será preso, se após considerado analisada todas as provas e fatos ou após as pendências de todo e qualquer recurso válido ainda no processo. Nesse diapasão, compara-se o que diz também Pedro Lenza, sobre o réu que responde o processo em liberdade.

Denegaram a ordem de habeas corpus, sete ministros: Teori Zavascki, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. A favor da ordem mandamental, e vencidos, portanto, os ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Mas a decisão deste habeas corpus ora estudado, no que pese as várias argumentações dos excelsos ministros, possui uma forte dimensão hermenêutica.

[11] A expressão habeas corpus advém do latim e compõe-se dos vocábulos habeas que significa tomar e corpus corpo, os quais, em sua literalidade, significam tomem o corpo.

A doutrina majoritária vem aceitar a tese de que tem caráter jurídico de ação independente ou sui generis, vez que não pode ser considerado recurso, em face de sua instauração não necessita de estar vinculado a um processo pré-existente, requisito fundamental e inerente a qualquer recurso.

Nas palavras do Supremo Tribunal Federal, o habeas corpus possui preferência sobre qualquer outro instrumento, uma vez que “é a via processual que tutela especificamente a liberdade de locomoção, bem jurídico mais fortemente protegido por uma data ação constitucional”.

[12] O Estado preza não só pela celeridade, mas que o processo tramite de acordo com todos os requisitos processuais devidos, até se chegar na justiça adequada.  Questão importante é a discussão de quando termina a presunção de inocência ou de não culpabilidade, referencial para se presumir o réu culpado e assim cumprir a pena imposta pela jurisdição.

Essa discussão passa, nas exposições dos ministros, pela doutrina de maneira a avalizar seus pontos de vista, como por exemplos as estatísticas do sistema prisional, comparações com o sistema judiciário alienígena, e principalmente o fim do revolvimento da matéria fática no processo.  Muito debatido nos votos também é a questão do término de apreciação de fatos e provas em segunda instância, onde alguns ministros supõe a necessidade de iniciar o cumprimento da pena.

O contraponto para outros ministros é que apesar do termino de análise de fatos e provas, a Constituição garantiria somente a possibilidade de prisão após todos os recursos recorríveis, ou seja, uma leitura literal e garantista da Constituição.

[13] Em sua argumentação, expõe o ministro Fachin (STF, HC 126.292, p. 24-25) que admitir absolutariedade do inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal,  seria também admitir que a execução imediata da pena privativa de liberdade só poderia se operar quando o réu se conformasse e porventura deixasse de opor novos embargos  declaratórios, como se condicionada a uma aquiescência do réu, isso devido, segundo o ministro, ante à possibilidade de inúmeros recursos e os incipientes mecanismos para  repelir esses procedimentos protelatórios.

Sobre a autora
Gisele Leite

Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!