O princípio da presunção de inocência do réu em julgamento

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07/06/2020 às 20:29
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Saber a dimensão do espectro do princípio da presunção de inocência é um desafio ainda presente na jurisprudência brasileira, porém, recentemente pacificado pelo STF.

 

O princípio da presunção de inocência do réu em julgamento

 

Resumo: Saber a dimensão do espectro do princípio da presunção de inocência é um desafio ainda presente na jurisprudência brasileira, porém, recentemente pacificado pelo STF.

 

Palavras-Chave: Princípio. Presunção da Inocência do Réu. Constituição Federal Brasileira de 1988. Direito Processual Penal. Direito Penal.

 

 

O princípio em referência está previsto no artigo 5º, LVII da Constituição Federal brasileira de 1988 lembremos que não possui caráter absoluto pois o próprio texto constitucional admite a prisão provisória[1] antes da condenação desde que preenchido todos os requisitos legais[2].

 

Cumpre ab initio proceder o reconhecimento doutrinário da teoria dos princípios que encontrou em Robert Alexy[3] um de seus principais estudiosos. Lembrando que toda espécie de norma que disciplinar um direito individual ou coletivo ou garanta a um direito a ser cumprido deverá ser observada na maior medida que possível.

 

Eis que a presunção de inocência do réu assume a estrutura normativa de princípio e, para tanto, basta que seu conteúdo primacial sirva de argumentação a um direito fundamental.

 

Diferentemente da regra que assume caráter descritivo sobre certas condutas e que enuncia o modus como uma ação deve ser produzida, descrevendo uma determinação positiva ou negativa.

O que nos faz perceber que a regra possui um âmbito de incidência mais restrito do que a do princípio que pode transcender à outras regras e, até mesmo a outros princípios.

 

As colisões de direitos fundamentais devem ser consideradas como uma colisão de princípios, sendo que o processo para solucionar tais colisões é a ponderação. Porém, totalmente diversa é a dimensão dos problemas no plano de regras, onde o que se realiza é a subsunção, visto que contêm determinações no contexto fático e juridicamente possível, sendo aplicáveis ou não.

 

Aliás, o mesmo doutrinador, em sua obra intitulada "Teoria dos Direitos Fundamentais" apresenta a Lei de Colisão[4] para resolver a colisão de princípios utilizando um julgado do tribunal constitucional, que diz respeito à não realização da audiência oral tendo em vista a saúde abalada do acusado que sofre sério risco de infarto do miocárdio.

 

E, nesse caso, há clara colisão entre o princípio da aplicação do Direito Penal que obriga a realização da audiência oral, com o princípio de proteção do direito à vida e integridade do acusado (que veda a realização de audiência oral).

 

A partir de então é que Robert Alexy passou a adentrar em sua tese, apoiando-se basicamente, no postulado da proporcionalidade. E que apresenta a notória vantagem desse caminho escolhido que é o poder de impedir o esvaziamento dos direitos fundamentais sem introduzir uma rigidez excessiva.

 

Recordemos que a máxima da proporcionalidade é constatada pelos critérios da adequação do meio usado para a persecução do fim, a necessidade desse meio usado e aplicação stricto sensu da proporcionalidade, ou seja, da ponderação.

 

Quanto ao conteúdo normativo e axiológico identifica um valor a ser preservado e prevalente e um fim a ser galgado, assim o princípio traz em seu âmago uma nítida decisão político-ideológica.

 

A presunção de inocência deve adequar-se às condições fático-jurídicas que surgem naturalmente das inescapáveis contradições normativas, quando surge a colisão de uma regra com outra ou de um princípio com outro, ou ainda, da colisão de uma regra com um princípio.

 

Percebe-se que coexistem limitações sistêmicas[5] da presunção de inocência como é o caso da prisão preventiva ou provisória determinada judicialmente, de sorte que que o referido princípio poderá ser contingenciado aos fatos e aos fundamentos jurídicos do caso concreto.

 

A presunção de inocência é, pois, um direito garantido a seu titular nos moldes prima facie ou conforme o mandado de otimização, o que significa afirmar que os agentes não tenham o dever de respeitar e promover aquele direito, mas apenas que isso deve acontecer na maior medida que possível. Possibilidade que se extrai diretamente dos casos concretos.

 

Afinal, os princípios, de acordo com Alexy são mandados de otimização, na medida em que determinam que algo seja realizado na maior medida que possível, dentro das possibilidades jurídicas reais e existentes.

 

Aliás, é este, exatamente o ponto decisivo de distinção entre as regas e princípios, os quais podem ser cumpridos em maior ou menor grau, conforme as possibilidades reais e jurídicas, sendo estas determinadas pelos princípios e regras opostos.

 

O princípio da presunção de inocência como norma-princípio, o que lhe confere a capacidade de irradiar seu conteúdo ao longo de todo ordenamento jurídico, necessário se faz, pois, identificar quais os elementos formadores de sua essência.

 

Vejamos: presunção é vocábulo advindo do latim praesumptio cujo verbo é praesumere que significa antecipar, tomar antes, ou por primeiro, prever, imaginar previamente.

 

Assim, o termo indica ser a presunção uma forma de se assumir antecipadamente, algo que ainda não aconteceu ou que se espera que aconteça.

 

Inocência cujo étimo é igualmente latino, inotentia, e, seu significado original era relacionado às práticas religiosas. Afinal, a inocência em seu campo canônico, era uma qualidade atribuída àquele ou aquela pessoa que nunca pecou.

 

Historicamente desde o século XII até o final do século XVIII, aplicou-se na Europa o chamado processo penal inquisitorial, de sólida base romano-canônica, onde a supremacia do poder estatal se sobrepunha ao direito de liberdade individual da pessoa, concentrando o Estado, naquele tempo, em uma só pessoa (juiz), o poder de instrução, acusação e julgamento.

 

Revelava-se, então, um Estado-juiz perverso e autoritário, não se possuindo a mínima garantia em face aos seus excessos. Existia tão-somente uma via de mão-única onde cabia ao Estado a total liberdade de fazer o que bem entendesse, enquanto que caberia ao imputado, somente o curva-se pacificamente diante da realidade colocada à sua frente, sendo aceitável também, até mesmo a prisão para a tortura, que era um meio usado para obtenção da confissão e, ainda, para revelar nomes de cúmplices, ou mesmo, ainda, uma eventual contradição.

 

Com o advento do século das Luzes, veio a laicização a pregar o racionalismo, vindo o termo divorciar-se de sua original concepção religiosa, passando a ser inserido no sentido filosófico de um estado ideal a ser conferido pelo cidadão.

 

Não se pode considerar racionalmente culpado acerca de um fato sem que se tenha antes a certeza, de seu cometimento, o que torna imperioso a demonstração de culpa.

 

A inocência mormente despida de seu caráter religioso passou então a assumir o enfoque racional, com fulcro principalmente nas ideias iluministas.

 

Historicamente, o princípio fora previsto pela prima vez em França de 1789, na Declaração dos Direitos Humanos e do Cidadão, em seu artigo 9º, in litteris: “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, caso seja considerado indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”. Tal dispositivo representa a primeira positivação da presunção de inocência.

 

E, em nossa Constituição cidadã e vigente, o referido princípio foi previsto pela prima vez no seu artigo 5º, inciso LVII. Apesar das mais diversas críticas e interpretações controvertidas, há sim compatibilidade entre o princípio da presunção de inocência e a prisão processual, desde que se demonstre o fumus boni iuris e o periculum in mora (ou periculum libertatis), ou seja, os quatro pressupostos do ar. 312 do CPP – garantia da ordem econômica, garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal.

 

Seguindo a trilha dos ideais iluministas e, com base nas premissas da Escola Clássica italiana[6], o doutrinador Francesco Carrara[7] erigiu a presunção de inocência em postulado fundamental do processo penal e, ainda a considerou como pressuposto para as demais garantias do processo.

 

Porém, em sentido diametralmente oposto, afirmava Manzini[8] que a finalidade específica do processo penal era mesmo conseguir a realização da pretensão punitiva derivada de um delito, através da utilização da garantia jurisdicional, isto é, a de obter, mediante a intervenção do juiz, a declaração de certeza positiva ou negativa, do fundamento da pretensão punitiva que faz valer pelo Estado, o Ministério Público.

 

Sendo a presunção de inocência uma norma a ser considerada no julgamento enquanto que como regra probatória, e não se esgota aí, passando a ser princípio de autônomo valor político de caráter geral, que tem como corolário não só a plenitude da prova, passando pela imparcial valoração de indícios, e terminando com a moderação na aplicação da prisão preventiva, que sob circunstância alguma poderá assumir natureza punitiva e que deve obedecer ao critério da stretta necessitá, caracterizado pelo fato de impor rigorosos limites à aplicação daquela e apenas de acordo com as necessidades do processo de , de forma  que a obtenção da verdade e a aplicação de uma eventual para se revelem possíveis.

 

Aliás, a principal fonte inspiradora da nossa Constituição vigente, a Constituição da República Portuguesa de 1976 que é apontada pelo ministro Gilmar Mendes do STF, uma notada e manifesta influência quanto aos direitos fundamentais e, também há, semelhanças quanto à matéria do controle de constitucionalidade.

 

No diploma legal lusitano em seu artigo 32, n.2 in verbis: "Todo o arguido se presume inocente até o trânsito da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível, com as garantias de defesa".

 

O preceito primário do referido princípio é um mandamento de ordem geral, de modo que todo indivíduo é considerado inocente por natureza.

 

Já o preceito secundário vem por meio de preposição (até ou senão) indicando a possível excepcionalidade capaz de subverter a ideia original que presume todo e qualquer sujeito é naturalmente inocente.

 

A formação do constitucionalismo brasileiro, na sua origem, acolheu o pensamento constitucionalista predominante na Europa do início do século XIX. Já a criação republicana do Supremo Tribunal Federal também se baseou na Corte Suprema Americana, tanto em relação às competências, como em relação à composição, forma de investidura, garantias e impedimentos.

 

Também sob a nítida influência do sistema constitucional norte-americano, foi a Constituição republicana de 1891 inaugurou o sistema de controle de constitucionalidade difuso ou incidental, típico do sistema do Common Law, da jurisdição universal (judicial review) que também havia influenciado outros países latino-americanos como o México de 1847 e a Argentina de 1860.

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Somente após a superveniência de fatos e fundamentos jurídicos que então passa o indivíduo ser reconhecido como culpado.

 

Basicamente o referido princípio é composto de três elementos, a saber: 1. Todo acusado é presumido inocente, porque assim o nasce; 2. O ônus da prova cabe à acusação e, não à defesa. Dessa forma, descabe, o acusado provar um estado natural de inocência que já lhe é presumido. Porém, incumbe à defesa apenas posicionar-se contra as provas produzidas e apresentadas pela acusação nos autos; 3. O estado de inocência somente pode ser alterado por meio de declaração do Estado. In casu brasilis, por sentença conforme bem preceitua o texto constitucional de 1988[9].

 

O vetor iluminista indicava pela presunção de inocência que a maioria dos homens é honesta e não criminosa e que a reconstituição probatória apenas se dirige ao provável, jamais à perfeição.

 

De modo que uma vez remanescendo dúvida sobre o cometimento ou não de crime, o razoável é manter o estado de inocência e, não reconhecer sua culpa que corresponde à exceção e não à regra.

 

No sentido é curial revelar que o princípio in dubio pro reo decorre do princípio da presunção de inocência, vez que por meio da carga probatória é possível atingir à convicção de quem realmente é o culpado pelo delito alegado pela acusação.

 

Ocorre que nem sempre a prova que fora produzida no processo é plena, a qual deixa dúvidas, omissões e rastros lacunares, não constituindo assim, em provas suficientes de autoria e materialidade delitiva.

 

Em caso de dúvida, o juiz não pronunciará o réu, mediante a presunção de sua inocência. E, in casu, o juiz atuará em favor do réu, pois não havendo certeza quanto à sua culpabilidade, não será este punido.

 

Conclui-se que diante da dúvida, não se tem o suficiente para a condenação, apesar do insaciável desejo pela impunidade. Por outro lado, o princípio in dubio pro societate, que aduz que na dúvida, decide-se em favor da sociedade, é defendido pela maioria de doutrinadores e da jurisprudência, no entanto, não está expresso no texto constitucional brasileiro vigente.

 

De sorte que não se admite que o magistrado decida a vida de um acusado em favor de outrem, sem considerar os seus respectivos direitos.  Conclui-se ser inviável a aplicação do referido princípio quando violar os direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana.

 

Neste princípio se extingue o contraditório e ampla defesa, permitindo que o réu vá a júri popular, submetendo-o consequentemente ao constrangimento em público, situação esta, que pode se agravar ao permitir que a sociedade o encare como delinquente, sendo que o mesmo ainda não usufruiu de todos os recursos hábeis para provar sua inocência, isto é, a sociedade poderá estar condenando um inocente contrariando o que exatamente preconiza o Direito que é a justiça, a qual muitas vezes, se torna uma utopia apregoada romanticamente pelos tribunais.

 

Nascendo a parêmia latina quilibet preasumitur bônus donec contrarium probetur (qualquer um se presume bom, até que se prove o contrário, e o ônus da prova cabe à acusação).

 

A prisão cautelar automática ou obrigatória relaciona-se diretamente à concepção de risco potencial, colocando em destaque a existência de verdadeira presunção de culpa quando se trata de determinados delitos considerados graves pelo Estado, ao ponto de cominá-los com o recolhimento obrigatório à prisão.

 

Conforme já afirmou o doutrinador Luigi Ferrajoli à perversão ais grave do instituto da prisão preventiva foi a sua mutação de instrumento exclusivamente processual, destinado à estreita necessidade instrutória para ser instrumento de prevenção e defesa social motivado pelas necessidades de impedir que o imputado cometa outros crimes.

 

É nesse sentido que se constata que um dos sintomas mais característicos dos sistemas processuais que rejeitam a presunção de inocência do réu é a admissão da prisão preventiva em inobservância à estrita necessidade instrutória, conforme afirmou Ferrajoli.

 

É sabido que o STF está no topo de todas as demais instâncias do Judiciário e tem como principal atribuição a guarda da Constituição Federal, conforme prevê o artigo 102, caput da CF/1988. Dessa forma, cabe a Corte Suprema impedir que quaisquer interpretações ou leis violem a Carta Magna, bem coo seus princípios e garantias nesta inseridas.

 

Porém, ocorre que, a decisão do STF em julgamento do HC 126.292[10] que ocorreu em 17.2.2016 deu ensejo à nova jurisprudência com interpretação diversa ao princípio da presunção de inocência.

 

Deu-se, portanto, a mitigação da presunção de inocência, vez que admitiu a execução da pena de prisão em segunda instância, antes de transitar em julgado a sentença, além de não ser cabível a análise do mérito no sentido de impor interpretação diversa da CF infringindo os princípios e direitos nesta previstos, que em razão disto, viola igualmente os princípios da ampla defesa e do contraditório que nos remete a uma atividade judiciária a um sistema inquisitório e a um Estado arbitrário.

 

Lembremos que não representa fundamento para a execução da pena, o clamor público ou mesmo a gravidade do delito, senão apenas os fundamentos e requisitos expressos em lei com a devida fundamentação jurídica para a aplicação de prisões e medidas cautelares, e que só devem ser executadas como medida excepcional uma vez que possibilita consequências irremediáveis, pois o aumento de encarceramento sem eficácia o que parece ser o fim da impunidade, também não contribui para a promoção da paz social.

 

Em resumo, pode-se afirmar que o sistema processual penal que se baseia na presunção de inocência do réu, o recolhimento preventivo do acusado é reconhecido como instrumento excepcional usado apenas quando outras medidas se mostrarem insuficientes às necessidades acautelatórias do Estado.

 

Nessa derradeira, quarta-feira, no dia 04 de abril de 2018, o STF confirmou seu entendimento que a pena de prisão poderá ser executada, mesmo antes do trânsito em julgado.

 

Por um placar estreito de seis votos contra cinco, que denegou o Habeas Corpus impetrado em prol do ex-presidente Lula. Reforçando-se que a pena seja concretamente executada, quando se esgotar a segunda instância de jurisprudência.

 

Foram mais de dez horas de julgamento, numa verdadeira maratona judicante, onde se confirmou a dita execução que não viola o preceito constitucional insculpido no artigo 5º, inciso LVIII.

 

Consagrou-se a vitória do voto do Ministro Relator Luiz Edson Fachin que denegou o HC sem que se configure uma teratologia ou mesmo abuso de autoridade.

 

O voto que atraiu maiores atenções foi o do Ministro Barroso e, ainda, o da Ministra Rosa Weber (que confirmou seu respeito ao princípio do colegiado, aderindo ao voto do Ministro Relator).

 

Ademais, as premissas teoréticas que se fincaram na racionalidade de suas próprias decisões e na obediência em seguir os próprios precedentes da Suprema Corte.

 

Salientou também que a revisão de posicionamentos jurisprudenciais da mais alta Corte judicial brasileira não pode ser um processo subjetivo, afinal, deve-se efetivamente “desfulanizar[11]” a decisão para se conseguir a real semântica do princípio da presunção da inocência do réu.

 

Registre-se que houve uma reclamação explícita da parte do Ministro Marco Aurélio que se dirigiu a presente do STF, como “mulher toda poderosa” e, ainda, consignou que venceu a estratégia.

 

Em face da resistência da Presidente do STF de se pautar primeiramente as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) que discutem sobre a prisão se pode ser executada antes do trânsito em julgado de maneira abstrata, sem observar casos concretos.

 

Afinal, para o vice decano o escorreito procedimento seria a Suprema Corte primeiramente definir a tese em abstrato nas ações de controle concentrado para depois aplicar o entendimento nos demais casos concretos[12].

 

Igualmente o Ministro Fux acompanhou o Ministro Relator, Fachin[13] que advertiu que o texto constitucional não pode ser lido literalmente pois que se a presunção de inocência for levada ao extremo, acarretará o descrédito do judiciário e plenifica a impunidade.


Sofremos da síndrome da justiça tardia e, no mesmo sentido, manifestou-se o constitucionalista o Ministro Alexandre de Moraes.

 

Cumpre sublinhar que nas primitivas vezes em que o STF decidira a mesma matéria, o Ministro Gilmar Mendes concordava integralmente com a tese de Fachin. Porém, nessa fatídica sessão de julgamento, mudou abruptamente seu entendimento para então afirmar que a pena de prisão deveria ser facultativa e somente executada após a decisão do STF.

 

Lembremos ciosos que as questões de fato somente são arguíveis processualmente nas duas primeiras instâncias de jurisdição e que, então as demais instâncias só atuariam no sentido de exercer o controle de constitucionalidade.

 

O derradeiro ministro a votar foi o decano e prestigiado ministro Celso de Mello e afirmou que o resultado que se esquadrinhava como sendo um “grande equívoco” e, que corresponderia a ser de fato inconstitucional e ilegal.

 

Posicionando-se contrário a relativização do princípio da prevenção da inocência do réu mesmo em prol do combate à corrupção e à impunidade. A preleção erudita do Ministro Celso Mello foi em defesa da jurisprudência da liberdade.

 

Enfim, foi a Ministra Cármen Lúcia a última a votar, para proceder o desempate, denegando-se o HC em questão. Reconheceu, então, que se tratava de uma matéria muito sensível onde se discute o espectro do princípio da presunção da inocência do réu bem como o significado do início da prisão diante da confirmação da sentença em segunda instância.

 

Proferiu seu visto que se inclina pelo mesmo entendimento que já era declarado desde 2009. E, somente em 2016 houve mutação jurisprudencial que coincidentemente ocorrera no ápice da Operação Lava Jato.

 

O entendimento que configurou o veredicto final confirmou que todos devem ser iguais perante a lei. Também por maioria do plenária se indeferiu o pedido de defesa de Lula, colocado como questão de ordem para impedir a prisão de Lula até que o SF julgasse o mérito das ADCs.

 

Ressalto ainda a fala poética do Ministro Barroso que in litteris: “A justiça, eu penso, está para alma como a alimentação está para o corpo. A gente tem que ser capaz de saciar essa demanda. Não é com espírito punitivo. Sou contra os vingadores mascarados, sou contra punitivismos em geral. (...)”. E garantismo não significa que ninguém nunca seja punido por coisa nenhuma, não importa o que tenha feito.

 

Desta forma, evita-se que a punição penal possa ser retardada por anos e décadas, e que o início de cumprimento da pena evita a morosidade processual e consequentemente a prescrição dos delitos. E, nesse caso, se tutela a segurança jurídica. Não se pode dar guarida a um processo penal ad infinitum para se enfim conseguir a execução da pena.

 

Referências:

 

GONÇALVES DIAS, Marco André Bonotto. Habeas Corpus 126.292:Prisão em segunda instância e a presunção de inocência no Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://repositorio.ufsm.br/bitstream/handle/1/12654/MARCO_ANDRE_BONOTTO_GONÇALVES_DIAS.pdf?sequence=1&isAllowed=y  Acesso em 6.4.2018.

 

LIMA, Ricardo Juvenal. A evolução histórica do princípio da presunção de inocência no processo penal brasileiro. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/166559+&cd=3&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br  Acesso em 5.4.2018.

 

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão - Teoria do Garantismo Penal. 4ª edição. São Paulo: RT, 2014.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

 

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto G. Valdés. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2002.

 

MENDES, Gilmar; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

 

WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 4ª Ed. 3ª Tir. Belo Horizonte: Del Rey Editora, 2009.

 

OLIVEIRA, Dannyele. Eficácia de Precedentes do Direito Brasileiro: Estudo do Princípio da Presunção de inocência. Disponível em: :https://dannyeleoliveira.jusbrasil.com.br/artigos/397139705/eficacia-de-precedentes-do-direito-brasileiro-estudo-do-principio-da-presuncao-de-inocencia%3Fref%3Dtopic_feed+&cd=3&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br Acesso em 6.4.2018.

 

Sobre a autora
Gisele Leite

Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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