Os terrenos de marinha, ou da União, são identificados a partir da média das marés altas do ano de 1831, tomando como referência o estado da costa brasileira naquele ano.
Existem dois tipos de terreno de marinha:
aqueles em regime de ocupação, de que a União é proprietária e pode reivindicar o direito de uso quando quiser; e,
aqueles em regime de aforamento, ou seja, em que o morador do imóvel passa a ter um domicílio útil sobre o terreno de marinha e, nesse caso, a área fica “repartida” entre União e morador.
Conceito legal de terreno de marinha
Os terrenos de marinha estão conceituados no art. 2º, “a”, do Decreto-lei n. 9.760/46:
Art. 2º São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés. […].
Por ser terreno de marinha, a área pertence à União, nos termos do art. 20, VII, da Constituição Federal de 1988, e poderão ser aforados como prevê o mesmo Decreto.
Art. 64. Os bens imóveis da União não utilizados em serviço público poderão, qualquer que seja a sua natureza, ser alugados, aforados ou cedidos.
Logo, é possível construir em terreno de marinha. Mas atenção, construir sem autorização pode gerar penalidades, inclusive, de demolição.
A definição da linha do preamar médio é extraída do art. 2º do Decreto Lei nº 9760/46, é orientada pelos critérios temporal (preamar média do ano de 1831) e espacial (33 metros).
Art. 2º São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés;
b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.
Parágrafo único. Para os efeitos dêste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano.
Art. 3º São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha.
Apontados pela Constituição Federal como bens de propriedade da União (art. 20, VII, da Carta de 1988), os terrenos de marinha possuem particularidades que merecem ser observadas, uma vez que são regidos por institutos diferenciados daqueles exclusivamente aplicáveis aos bens particulares.
O fato de um imóvel estar situado em terreno de marinha, por si só, não impede o uso por particulares, pois não há, na legislação federal, óbice que o torne insuscetível de utilização pelo ocupante ou foreiro, salvo se inscritos após 10 de junho de 2014 e concorrerem ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de segurança nacional, de preservação ambiental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais e de implantação dos programas ou ações de regularização fundiária de interesse social ou habitacionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, das vias federais de comunicação e das áreas reservadas para construção de hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais autorizados na forma da lei, tudo conforme o disposto no art. 9º, I e II, da Lei n. 9.636/1998.
O Decreto-Lei n. 9.760/1945, que dispõe acerca dos bens da União, reserva um capítulo inteiro para a disciplina da “utilização dos bens imóveis da União” (Título III, arts. 64. e ss.).
É cediço que a natureza pública ou privada de um imóvel pode ser alvo de um provimento judicial ou administrativo em decorrência do domínio eminente do Estado sobre todas as coisas que se encontram em seu território, como é o caso da desapropriação, do tombamento, das servidões administrativas e das demais formas de intervenção na propriedade.
A demarcação dos terrenos de marinha, de igual maneira, é corolário desse domínio eminente e se materializa em procedimento administrativo, de natureza declaratória e de competência do Serviço do Patrimônio da União – SPU, regulado pelo Decreto-Lei 9.760 /46 (arts. 9º a 14).
Isto é, a demarcação de terreno de marinha é declaratória. Tratando-se de bem da União, independente da demarcação propriamente dita ou da homologação do ato, o era desde sempre, sendo a sua situação que caracteriza a faixa dos terrenos de marinha, e não a demarcação em si, que não acrescenta nem retira propriedade de ninguém.
Após a demarcação da linha de preamar e a fixação dos terrenos de marinha, a propriedade passa ao domínio público e os antigos proprietários passam à condição de ocupantes, sendo provocados a regularizar a situação mediante pagamento de foro anual pela utilização do bem.
Não restam dúvidas, portanto, quando cumpridos certos requisitos da outorga dos títulos de ocupação ou aforamento, que a legislação federal autoriza a utilização e, inclusive, prevê a possibilidade de edificar nesses terrenos.
Infração Administrativa
O Decreto-lei 2.398/87, que dispõe sobre obre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União, prevê penalidades para quem construir sem prévia autorização ou em desacordo com a concedida:
Art. 6º Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União.
§ 1 º Incorre em infração administrativa aquele que realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida , em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo.
§ 2 º O responsável pelo imóvel deverá zelar pelo seu uso em conformidade com o ato que autorizou sua utilização ou com a natureza do bem, sob pena de incorrer em infração administrativa.
§ 3º Será considerado infrator aquele que, diretamente ou por interposta pessoa, incorrer na prática das hipóteses previstas no caput.
§ 4 º Sem prejuízo da responsabilidade civil, as infrações previstas neste artigo serão punidas com as seguintes sanções:
I – embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação ;
II – aplicação de multa;
III – desocupação do imóvel; e,
IV – demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização.
Como se vê, construir em terreno de marinha é possível, desde que, autorizada pelo Poder Público.
Para isso, o interessado em construir em terreno de marinha deve procurar os órgãos públicos municipais para verificar a viabilidade de construção, que deve obedecer o plano diretor municipal, e além disso, respeitar a legislação ambiental e códigos de obras. Em alguns casos, também será necessário realizar o licenciamento ambiental.
Conclusão
A construção em terrenos de marinha – em especial por se tratarem, frequentemente, de áreas de preservação permanente – deve ser autorizada pelo órgão competente, e, como parte dos requisitos para a autorização, obedecer à legislação ambiental.
Logo, quem possui títulos de ocupação da área de marinha e pretende construir, deve possuir autorização da União para construir no local.
Frise-se que não deter tal autorização, implica na penalidade de demolição da construção, conforme se extrai do supracitado art. 6º do Decreto-lei nº 2.398/87.