Sumário: 1. Introdução. 2. Discurso de Ódio. 3. Liberdade de Expressão. 4. Análise Jurisprudencial. 5. Considerações Finais.
1. INTRODUÇÃO
A liberdade de expressão é um direito previsto no artigo 5º inc. IV, V, IX e o artigo 220 da Constituição Brasileira de 1988, que garante a todo e qualquer cidadão brasileiro, o direito de se expressar sendo vedado o anonimato. O Direito de liberdade de expressão está vinculado a garantia da dignidade da pessoa humana e à democracia, pois compreende a possibilidade de exteriorização de crenças, convicções, ideias, ideologias, opiniões, sentimentos e emoções, podendo ser manifesto pelos mais diversos meios informativos de hoje existentes.
O direito de liberdade de expressão, está presente no cotidiano das pessoas, principalmente na internet, permitindo que estejam conectados mundialmente a todo momento, sendo livre para expressar seus pensamentos e vontades dentro das mídias sociais de forma recorrente. Entretanto, essas mídias sociais tem se tornado um ambiente destinado para agressões verbais e manifestações de ideias agressivas, denominadas discurso de ódio.
O doutrinador Brugger define o discurso de ódio como sendo a utilização de palavras “que tendem a insultar, intimidar ou assediar pessoas, em virtude de sua raça, cor, etnicidade, nacionalidade, sexo ou religião ou ainda à sua potencialidade ou “capacidade de instigar violência, ódio ou discriminação contra tais pessoas.” (BRUGGER, 2007, p. 151).
É importante ressaltar, que o discurso de ódio como bem definido por Brugger (2007, p. 151) gera indefensibilidade de maneira significativa os objetivos da república, de construção de uma sociedade, justa e solidária, compromissada com a promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origens, raça, sexo, cor e idade de quaisquer outras formas de discriminação (Constituição Federal artigo 3º, inc. e IV). Portanto, esses casos necessitam de uma reflexão acerca da limitação do direito de Liberdade de Expressão em relação a esse conteúdo de ódio que atingem pessoas e grupos vulneráveis.
O discurso de ódio que sempre esteve presente na sociedade agora é replicado e amplificado nas redes sociais, gerando grande repercussão devido a sua capacidade de alcance, sendo propagado com maior facilidade. De acordo com a especialista Raquel Recuero o surgimento da Internet auxiliou as pessoas a difundirem as informações de forma mais rápida e mais interativa. Tal mudança “criou novos canais e, ao mesmo tempo, uma pluralidade de novas informações circulando nos grupos sociais.” (RECUERO, 2009, p. 116).
Seguindo as falas apresentadas, o presente estudo realizará análise do discurso de ódio nas redes sociais contemplando todo assunto inerente ao tópico, descrevendo a liberdade de expressão e mudanças ocorridas na sociedade juntamente com análise jurisprudencial.O tipo de pesquisa a ser realizada será uma Revisão de Literatura, baseado em pesquisa bibliográfica, inclui a investigação e leitura de livros e artigos científicos correlacionados à liberdade de expressão, discurso de ódio e dignidade pessoal e jurisprudência relacionada ao conflito de fundamentos. Por fim, a parte prática será demonstrada por meio de pesquisas de jurisprudências e julgados do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ) com pertinência ao assunto, buscando elucidar o problema encontrado na pesquisa e fazer uma perspectiva crítica. Nesse sentido, no primeiro capítulo será desenvolvida a base conceitual referente ao discurso do ódio e seu surgimento nas redes sociais e ordenamento jurídico.No segundo capítulo será tratado o direito da Liberdade de Expressão e sua previsão constitucional. Em um terceiro momento, será evidenciado uma análise jurisprudencial acerca do tema, com principais julgados que evidenciam a liberdade de expressão versus discurso do ódio.Por fim, serão tecidas as considerações finais sobre o tema.
Importante destacar, que o problema investigado no presente estudo está contido no livre acesso a mídias sociais e como sua utilização se tornou instrumento para o discurso do ódio, tendo como principal objetivo de análise do problema e desconforto social ao ponto de discussão entre a liberdade de expressão e o discurso do ódio.
2. DISCURSO DE ÓDIO
O indivíduo com objetivo de expressar uma ideia, um sentimento ou opinião utiliza diferentes formas de comunicação. Ele pode, por exemplo, se comunicar fazendo uso da comunicação escrita, das artes, da sua comunicação não verbal, por meio de símbolos ou do seu discurso. Variados meios de comunicação, disponíveis ao sujeito, possuem potencial de representação que, a partir de sua forma e seu conteúdo podem se manifestar de diferentes maneiras.
Neste sentido, ao se valer de diferentes estruturas comunicativas o ser se manifesta no mundo. Desde que o ser humano dominou as palavras uma ferramenta comunicativa bastante explorada é o discurso.
De acordo como define Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa para a palavra discurso de forma geral é: “Uma fala proferida para o público”, para a filosofia “Exposição de raciocínio que se desenvolve de modo sequencial e que vai de uma conceituação a outra, de acordo com uma concatenação lógica” e para a linguística “Comunicação oral ou escrita que pressupõe um locutor e um interlocutor.” (MICHAELIS, 2009, p. 01).
Conforme o pesquisador e criador da teoria Análise Crítica do Discurso (ACD) destaca que: "Implica ser o discurso um modo de ação, uma forma em que as pessoas podem agir sobre o mundo e especialmente sobre os outros, como também um modo de representação." (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91).
Mediante o exposto, nota-se que o discurso é uma ferramenta de comunicação capaz de modificar o ambiente no qual se está inserido, como também definir ou redefinir a relação entre locutor e ouvinte. Sendo de extrema importância essa ferramenta de comunicação.
Ocorre que o discurso tem sido utilizado nas redes sociais para atacar pessoas ou grupos vulneráveis com conteúdo de ódio, trazendo um grande desconforto social.
[...] o ódio existe, todos nós já nos deparamos com ele, tanto na escala microscópica dos indivíduos como no cerne de coletividades gigantescas. A paixão por agredir e aniquilar não se deixa iludir pelas magias da palavra. As razões atribuídas ao ódio nada mais são do que circunstâncias favoráveis, simples ocasiões, raramente ausentes, de liberar a vontade de simplesmente destruir (GLUKSMANN, 2007, p. 11).
O ódio se faz presente desde o início da história da humanidade e em todas as sociedades, é relatado nos contos religiosos (Caim e Abel), na mitologia (mitos de Édipo e Eros), é motivo para guerras e debates políticos extremistas. O ódio é um sentimento que funciona como matéria-prima alimentando as mudanças das estruturas sociais (CARCARÁ, 2017, p. 494).
Mandela parece perceber que o ódio é fruto da construção social, ou seja, a existência do ódio e a existência do amor se estabelecem através do processo de construção social, portanto o modo de constituição e (re) implantação na sociedade afetará A experiência de ódio e amor na comunidade (MANDELA, 1995, p. 493).
Isto significa que o estilo de vida coletiva do ser humano e suas relações criam sentimentos de pertencimento a algo ou algum lugar, gerando interesses em comum por motivos étnicos, sociais, econômicos, morais, religiosos dentre outros. Com criação desses laços na sociedade é inevitável que grupos de interesses e realidades distintas se gerem divisões. Entretanto a fragmentação desses grupos pode gerar pontos de conflitos, e contribuir para o surgimentodo discurso de ódio.
O discurso de ódio tem o objetivo de ofender as características do outro, não somente o indivíduo, mas, igualmente, a coletividade:
Genericamente, esse discurso se caracteriza por incitar a discriminação contra pessoas que partilham de uma característica identitária comum, como a cor da pele, o gênero, a opção sexual, a nacionalidade, a religião, entre outros atributos. A escolha desse tipo de conteúdo se deve ao amplo alcance desta espécie de discurso, que não se limita a atingir apenas os direitos fundamentais de indivíduos, mas de todo um grupo social, estando esse alcance agora potencializado pelo poder difusor da rede, em especial de redes de relacionamento (SILVA; BOLZAN, 2011, p. 446).
Neste sentido, quando o indivíduo manifesta seu ódio, é cristalino que este ato fere à dignidade da pessoa humana pois sua finalidade é diminuir a autoestima das pessoas. Vale lembrar que tal conduta é classificada como crime no Brasil e é considerado um atentado aos Direitos Humanos. Pois se tratade uma forma de pensamento, discurso ou posicionamento social que o indivíduo utiliza para incitação de violência contra grupos diferentes da sociedade. Tal ato visa discriminar as pessoas devido as suas diferenças, sejam elas quanto a raça, cor, etnia, religião, orientação sexual, deficiências, classe.
Compreende-se, assim, que o discurso de ódio retrata o descaso e a discriminação a grupos específicos. A discriminação é um ato de tratamento de desigualdade em relação as pessoas, e em contrapartida, a intolerância é uma atitude de não tolerar a existência do diferente, levando constantemente a atitudes de eugenia.
A Eugenia teve sua criação por meio de Francis Galton em 1883, definindo como: “O estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja físico ou mentalmente." (GOLDIM, 1998, p. 01).
Percebe-se que uma das fundamentações mais evidentes da eugenia é a dificuldade de aceitação das diferenças.
As diferenças são elementos de distinção ou identificação de grupos sociais entre si, como a cultura, nacionalidade, religião, entre outros. Portanto, a não aceitação às diferenças, podem gerar atitudes intolerantes caracterizando a eugenia, sendo aquele presente no século XX, que hierarquiza as raças humanas em termo de melhor qualidade genética.
Tal discurso está presente na sociedade contemporânea de maneira padronizada em certos elementos, surgindo a partir dos preconceitos sociais contra grupos específicos, e se exacerba o comportamento do ódio em relação a existência e ao convívio com essas pessoas na sociedade. O aspecto desse discurso é contrário ao multiculturalismo e o pluralismo humano, pois trata de forma hierárquica as pessoas, considerando algumas mais humanas que as outras, ou seja, desumanizar o outro por ser diferente.
Este comportamento é construído socialmente, baseado pelo preconceito histórico da humanidade, como preconceitos de gêneros, culturais, étnicos-raciais e com relação às deficiências e outros, não podendo ser visto como uma opinião. Isto porque, a opinião tem, por essência, conclusões e sentimentos de cada indivíduo, em contrapartida o preconceito é causado socialmente oriundo de cenários de domínio de um grupo sobre outro. Não podendo ser considerado o discurso de ódio como uma opinião, tendo em vista que ele incita a violência e o caos social.
Tal discurso discriminatório pode ser dividido em dois atos: (i) o de insultar ou (ii) o de instigar. O primeiro visa ofender diretamente a vítima ou grupo, e o segundo estimular outras pessoas a praticarem também essas ações:
[...] no sentido de dividir o tal discurso em dois atos: o insulto e a instigação. O primeiro diz respeito diretamente à vítima, consistindo na agressão à dignidade de determinado grupo de pessoas por conta de um traço por elas partilhado. O segundo ato é voltado a possíveis “outros”, leitores da manifestação e não identificados como suas vítimas, os quais são chamados a participar desse discurso discriminatório, ampliar seu raio de abrangência, fomentá-lo não só com palavras, mas também com ações (SILVA; BOLZAN, 2011, p. 448).
Dessa forma, é possível entender que o insulto está diretamente relacionado com à vítima, incluindo agressão à dignidade de alguém, pois possuem características comuns. A instigação dirige-se a possíveis “outros” leitores manifestantes, e não aos identificados como vítimas, sendo obrigados a participar este discurso discriminatório e alargar o âmbito, não só com palavras, mas também com ações de promoção.
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, dispõe de um rol não taxativo deDireitos Fundamentais e princípios que defendem a igualdade de todos, bem como ratificam os Direitos Humanos. A legislação brasileira criminaliza diferentes tipos de preconceitos na sociedade. Deste modo, como o discurso de ódio é um ato de caráter preconceituoso e que visa incitação à violência contra grupos sociais e minorias, logo tal conduta viola os princípios constitucionais e caracteriza em crime de acordo com a Leinº 7.716, de 5 dejaneiro de 1989 (Crimes de Preconceito ou Racismo).
Consequentemente, o discurso de ódio apresenta-se como uma espécie de violência cometida por meio do discurso verbal ou escrito, uma vez que apresenta como finalidade discriminar, ofender, diminuir, agredir outras pessoas por causa de suas condições sociais ou características étnicas, raciais, religiosas, culturais, de gênero e orientação sexual dentre outros. Pode-se, nesse contexto, afirmar que este tipo de conduta é antidemocrático e eugênico por violar o respeito à diversidade humana, à pluralidade, às liberdades civis e os direitos difusos da sociedade.
Atualmente no âmbito virtual, como por exemplo Instagram, WhatsApp , Twitter, Youtube, Facebook dentre outras redes sociais, tornou-se comum o discurso de ódio, pois algumas pessoas na internet agem como se os atos praticados neste meio não fossem passivos de consequências e punições, como exemplos frequentes de discurso de ódio, as manifestações contra políticos, contra times de futebol, com relação à condição sexual e religião, entre outras. Há quem também use o anonimato para disseminar mensagens preconceituosas pela internet utilizando-se de perfis falsos para propagar o ódio, visando esquivar-se de eventuais sanções.
O discurso de ódio é uma nova forma de propagação de conteúdos preconceituosos e ofensivos na internet, principalmente nas redes sociais causando enfoques polêmicos ao que tange a liberdade de expressão. De acordo com Samantha Meyer-Pflug, esse discurso: “Consiste na manifestação de ideias que incitam à discriminação racial, social ou religiosa em relação a determinados grupos, na maioria das vezes, as minorias.” (MEYER-PFLUG, 2009, p. 97). Nesse mesmo sentido:
[…] a identificação do discurso de ódio normalmente não se encontra de maneira explícita no ambiente virtual, visto que seus propagadores buscam implicitamente convocar e incentivar seus seguidores a cultivarem esse desprezo contra um determinado grupo social, com o argumento de estar exercendo um direito fundamental que é a liberdade de expressão (SILVA; BOLZAN, 2011, p. 456).
Conclui-se, portanto, que o discurso de ódio nas redes sociais vai além do âmbito da liberdade de expressão, constitui um abuso de direitos e é totalmente prejudicial aos direitos constitucionais. Ao se ultrapassar esses limites o ódio está estabelecido, trazendo prejuízo a outras pessoas em comum na sociedade.
3. LIBERDADE DE EXPRESSÃO
A Liberdade de Expressão é um direito indispensável e inerente à condição humana. Por meio dela, busca-se assegurar ao cidadão brasileiro o direito de liberdade de expressão de consciência, de crença, de culto, de acesso à informação jornalística, científica ou artística, estando todos intrinsecamente ligado à livre manifestação de pensamentos, ideias, opiniões e posicionamentos. O direito de Liberdade de Expressão visa assegurar a todas as pessoas uma existência digna dentro de uma sociedade plural e democrática. Nesse sentido:
A liberdade de expressão se trata de uma ramificação do direito fundamental à liberdade, tendo este, como escopo, a garantia, na condição de valor essencial à dignidade da pessoa, da existência de um espaço sem ingerência de terceiros, particulares ou Estado, no qual se propicie a qualquer indivíduo a possibilidade de realização de seus próprios objetivos, sem dever obediência a outrem (FREITAS; CASTRO, 2013, p.330).
A Liberdade de Expressão no ordenamento jurídico brasileiro, é garantida pela Constituição Federal de 1988, considerada cidadã, classificando a liberdade de expressão como um direito fundamental e inalienável, como previsto artigo 5ª nos incisos IV, VIII, IX e XVI do art. 5º e no art. 220, que trazem respectivamente as seguintes redações:
Art. 5º: IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.
[...]
VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa, ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.
[...]
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.
[...]
XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente (BRASIL, 1988).
E ainda o artigo 220:
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (BRASIL, 1988)
Desse modo, é notório que esse direito se fundamenta na proteção da manifestação de pensamentos, em vários sentidoscomo por exemplo filosófico, político, religioso, cultural, crença, dentre outros, respaldando-se ao que tange a cidadania e a democracia pregada e apoiada pelos Direitos Humanos em sua primeira dimensão , sendo consagrada pela Constituição Federal como Cláusula Pétrea. Nesse sentido:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - A forma federativa de Estado;
II - O voto direto, secreto, universal e periódico;
III - A separação dos Poderes;
IV - Os direitos e garantias individuais (BRASIL, 1988).
Diante disso, abarcados como cláusulas pétreas, os direitos e garantias individuais devem ser protegidos na sua integralidade. No entanto, com advento da liberdade de expressão gerando o discurso do ódio, muitos direitos passaram a serem reprimidos, afrontando o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
Como tudo que é novo atrai a atenção dos interessados, o advento da internet gerou grandes alvos ameaçadores e ideias acaloradas. O meio virtual vem despencando em sua liberdade de expressão discursos de cunhos maliciosos, desrespeitosos e constrangedores a dignidade da pessoa humana, sendo que esse direito é protegido e previsto no art. 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988, estando, portanto, as manifestações sujeitas a certos limites:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 1988).
Percebe-se que o todos os entes federados têm como seu fundamento a Dignidade da Pessoa Humana. Não se esperava menos, visto que é princípio norteador do Direito e vem reconhecer a cada pessoa, dentre todas as outras pessoas como iguais perante a sua dignidade e seu direito, por isso devem ser respeitadas enquanto indivíduo pertencente a sociedade.
Não obstante o texto constitucional tenha previsto direitos fundamentais que devem ser preservados, o exercício de tal direitos, contudo, não deve ser exercida de maneira absoluta. Isto significa que o exercício, mesmo dos direitos fundamentais, encontrará limitações.
No entanto, apesar da previsão dos Direitos Fundamentais a própria Constituição da República traz limitação a sua eficácia e aplicabilidade, visto que a maioria desses direitos dependem de uma norma posterior para regular. Nesse sentido:
[...] os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), havendo, muitas vezes, no caso concreto, confronto, conflito de interesses. A solução ou vem discriminada na própria Constituição (ex.: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição (LENZA, 2017, p. 1104).
É perceptível que não há critério em absoluto aos Direitos Fundamentais, sendo, por muitas vezes, limitado a diversas situações. Assim também ocorre com a liberdade de expressão.
Ao que se refere as limitações da liberdade de expressão, com fulcro no mesmo artigo constitucional prevê: “§ 2º: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.” (BRASIL, 1988).
Ademais, a proteção à privacidade está prevista no inciso X, que prevê: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou decorrente de sua violação.” (BRASIL,1988). Determinando, neste mesmo caráter de proteção que não é permitido ataques discriminatórios entre pessoas e seus bens, cujo o desrespeito poderá incidir determinadas sanções.
Percebe-se, assim, que, esse direito deve ser exercido sem ultrapassar os limites morais, éticos e legais. Ou seja, sem ofensas, difamações, calúnias e/ou injuriais, e sem citações de nomes em forma pejorativa. O direito deve ser exercido dentro de padrões de razoabilidade sob pena de incorrer não apenas em crimes, mas em abuso de direito.
O abuso de direito inclui o uso impróprio de direitos subjetivos para prejudicar outras pessoas. Em princípio, o indivíduo que age dentro dos seus direitos e com limites não prejudicará outrem. No entanto, o titular do direito subjetivo pode prejudicar terceiros ao fazer uso do direito, constituindo ato ilícito podendo surgir a obrigação de reparação ao dano ocorrido (AMARAL, 2003).
Diante disso, ao se utilizar a liberdade de expressão como direito, deve-se atentar aos limites para que não seja cometidos abusos e sejam prejudicados terceiros.
Importante ressaltar, assim, que termo ‘liberdade de expressão’ foi adotada no presente artigo para significar o direito e ‘abuso da liberdade de expressão’ para designar o seu uso lesivo. Nesse sentido:
Define a liberdade de expressão como o direito de cada indivíduo pensar e abraçar as ideias que lhe aprouver sem sofrer qualquer restrição ou retaliação por parte do Estado. De rigor, deve-se diferenciar liberdade de pensamento de liberdade de expressão. Esta última envolve, necessariamente, a externalização intencional do pensamento, enquanto aquela pode se realizar mediante atos internos (MEYER, 2009, p. 67).
Nas palavras deMeyer, essas manifestações de liberdade de expressão são atos internos, que não medem manifestações dos atos, violando o direito garantido e por ser isoladamente expressivo sem pensar no outrem.
E ainda nesse sentido:
Incluem-se na liberdade de expressão faculdades diversas, como a de comunicação de pensamentos, de ideias, de informações e de expressões não verbais (comportamentais, musicais, por imagem, etc.). O grau de proteção que cada uma dessas formas de se exprimir recebe costuma variar, mas, de alguma forma, todas elas estão amparadas pela Lei Maior (MENDES; BRANCO, 2017, p. 233-234).
Como observa-se, a proteção deve ser constante para que todos possam, da melhor forma possível, garantir sua liberdade de expressão sem transgredir direito alheio. Embora não seja admitido um controle prévio nas manifestações em qualquer âmbito, pode haver umalimitação posterior, que permita a devida responsabilização, ou seja, não se limitar a liberdade de expressão, mas sim os possíveis danos que podem ocorrem de seu uso demasiado.
O direito à liberdade de expressão deve levar em consideração: o direito à vida privada, à intimidade, à honra, à imagem, entre outros. Assim, toda manifestação de pensamento que agrida a outro cidadão deve ser contida e reprimida, pois não se consuma considerável parte integrante da liberdade de expressão, mas como uma ameaça a um direito constitucional.
O texto constitucional veda o anonimato justamente para propiciar a responsabilização dos atos praticados. É importante destacar que quando ocorre uma colisão de direitos fundamentais, ou seja, o exercício do direito fundamental de um cidadão se conflita com o exercício do direito fundamental de outro titular, os direitos, ainda que fundamentais, não podem ser considerados como absolutos. Deste modo, é notório que liberdade de expressão sofre limitações, não podendo ser exercida de maneira abusiva e ferindo os direitos alheios.
Nesse sentido:
A colisão de direitos fundamentais é um fenômeno contemporâneo e, salvo indicação expressa da própria Constituição, não é possível arbitrar esse conflito de forma abstrata, permanente e inteiramente dissociada das características do caso concreto. O legislador não está impedido de tentar proceder a esse arbitramento, mas suas decisões estarão sujeitas a um duplo controle de constitucionalidade: o que se processa em tese, tendo em conta apenas os enunciados normativos envolvidos, e, em seguida, a um outro, desenvolvido diante do caso concreto e do resultado que a incidência da norma produz na hipótese. De toda sorte, a ponderação será a técnica empregada pelo aplicador tanto na ausência de parâmetros legislativos de solução como diante deles, para a verificação de sua adequação ao caso (BARROSO, 2001, p. 04).
Dada uma situação particular, um conjunto de parâmetros pode ser desenvolvido para mapear o caminho a ser seguido pelo interpretador. Por um lado, esses são os elementos que devem ser considerados entre o equilíbrio da liberdade de expressão, como a dignidade, honra, intimidade, à vida privada e à imagem (BARROSO, 2001, p. 05).
Como se vê, para solucionar tal conflito de liberdade, não se trata de determinar qual dos direitos seria o de maior valor, mas, sim, ponderar sobre a maneira como os direitos estão sendo exercidos.
Em se tratando de limitações, entende-se que as restrições à liberdade de expressão e a direitos fundamentais devem vir estipuladas em lei. Não havendo uma lei, torna-se necessário que se recorra aos princípios e à ponderação entre os direitos envolvidos e os valores constitucionais.