Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

O efeito blacklash das decisões judiciais

Agenda 28/02/2021 às 14:13

No dia 16/2/2021 o Min. Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, com fundamento no art. 53, § 2º, da Constituição Federal de 1988, determinou a prisão em flagrante do Deputado Federal Daniel Silveira nos autos do Inquérito n. 4.781/DF.

A motivação teve origem em um vídeo publicado pelo agente político na rede social youtube, que teria causado, em tese, ofensa aos princípios democráticos, republicanos e da separação de poderes, nesses termos: a) ataque frontal “aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, por meio de diversas ameaças e ofensas à honra”; b) propagação da “adoção de medidas antidemocráticas” contra a Corte Suprema, defendendo, inclusive, o AI-5; c) defesa da “substituição imediata de todos os Ministros”; e d) instigação da “adoção de medidas violentas contra a vida e segurança” dos membros da Corte Suprema (Inquérito n. 4.781/DF).

Segundo o Min. Alexandre de Moraes, o parlamentar teria praticado diversos crimes previstos na Lei n. 7.170/1973 (arts. 17, 18, 22, incisos I e IV, 23, incisos I, II e IV e 26), inafiançáveis de acordo com o art. 5º, XLIV, da CF/1988.

Mas, como “para cada ação existe uma reação”, poucos dias após a prisão do Deputado, o Poder Legislativo Nacional apresentou a Proposta de Emenda à Constituição n. 3/2021, conhecida como “PEC da Imunidade”, visando alterar a CF/1988 e, na prática, tornar quase impossível a prisão em flagrante de parlamentar.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Sem enveredar pelo mérito da decisão judicial e da constitucionalidade e moralidade da proposta legislativa, não há dúvida de que estamos diante do efeito blacklash, cuja tradução literal é "repercussão, folga, sacudidela".

Tal efeito ocorre quando o Poder Legislativo, impulsionado pela reação da sociedade ou por estar inconformado com determinadas decisões judiciais, edita leis ou emendas à Constituição Federal com o objetivo de esvaziar ou alterar provimento emanado do Poder Judiciário que versa sobre tema divergente ou que possui vertente ideológica polarizada.

Sobre o efeito blacklash, George Marmelstein prescreve:

“O backlash é uma reação adversa não-desejada à atuação judicial. Para ser mais preciso, é, literalmente, um contra-ataque político ao resultado de uma deliberação judicial.

Tal contra-ataque manifesta-se por meio de determinadas formas de retaliação, que podem ocorrer em várias ‘frentes’: a revisão legislativa de decisões controversas; a interferência política no processo de preenchimento das vagas nos tribunais e nas garantias inerentes ao cargo, com vistas a assegurar a indicação de juízes ‘obedientes’ e/ou bloquear a indicação de juízes ‘indesejáveis’; tentativas de se ‘preencher o tribunal’ (‘court-packing’) por parte dos detentores do poder político; aplicação de sanções disciplinares, impeachment ou remoção de juízes ‘inadequados’ ou ‘hiperativos’; introdução de restrições à jurisdição dos tribunais, ou a ‘poda’ dos poderes de controle de constitucionalidade.” (Marmelstein, George. Curso de direitos fundamentais. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 3).

Marianna Montebello Willeman, ao analisar o tema, conceitua o citado efeito “como o movimento de intensa reprovação ou rejeição de uma decisão judicial, acompanhado da adoção de medidas de resistência tendentes a minimizar ou a retirar sua carga de efetividade.” (Constitucionalismo democrático, backlash e resposta legislativa em matéria constitucional no Brasil. Disponível em <https://www.direitodoestado.com.br/artigo/marianna-montebello-willeman/constitucionalismo-democratico-backlash-e-resposta-legislativa-em-materia-constitucional-no-brasil>. Acesso em 28/2/2021).

Essa retaliação político-jurídica, no entanto, não impede que a nova norma jurídica seja analisada pelo Poder Judiciário mediante provocação, a fim de aferir a sua validade, em razão do que dispõe o art. 5º, XXXIV, ‘a’, e XXXV, da CF/1988.

No mais, embora o efeito blacklash, sob certo ponto de vista, possa colocar em risco a segurança jurídica, pois “contesta” decisões do Poder Judiciário, órgão responsável por zelar pela aplicação correta da legislação e pela concretização das garantias fundamentais e dos direitos previstos na Carta Magna, necessário ressaltar que ele é uma materialização do Estado Democrático de Direito, princípio fundamental.

Sobre o autor
Fabiano Leniesky

OAB/SC 54888. Formado na Unoesc. Advogado Criminalista. Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal. Pós-graduado em Advocacia Criminal. Pós-graduado em Ciências Criminais. Pós-graduado em Direito Probatório do Processo Penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!