O artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal, prevê, como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Não é o que temos visto por aqui.
A luz da Constituição, da ética, da moral e do Direito, pessoas seguem inovando na prática delitiva, à custa da pandemia. Realizam licitações fraudulentas/ superfaturadas, sob o manto da contratação emergencial, prevista na Lei 8.666/93; pessoas furando a fila de prioridade de vacinas e, agora diversos casos de profissionais da saúde que simulam vacinar idosos.
Analisando estes absurdos casos, percebemos que a finalidade dos profissionais de saúde é enganar, ludibriar com o fim de obter vantagem ilícita. Dessa forma, vantagem almejada pode, suspostamente, ser averiguado em cada caso concreto, por exemplo, ter sido guardar a vacina (preparação biológica) consigo para posteriormente aplicar em si mesma ou em outra pessoa ou ainda vendê-la, com o fim de obter vantagem econômica. Portanto, podem ser tipificadas em ações de estelionato, previsto no art. 171 do CP, com qualificadora de aumento de pena por ter sido praticado contra pessoa idosa, na maioria dos casos? vejamos:
Art. 171 – Obter (ressalva, ação nuclear, o verbo), para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
Já o estelionato contra idosos é qualificadora previsto no §4º:
§ 4o Aplica-se a pena em dobro se o crime for cometido contra idoso.
Percebe-se que o art. 171 não menciona vantagem econômica, a doutrina majoritária entende que a natureza da vantagem para a configuração do delito de estelionato é indiferente – podendo ser vantagem econômica ou não econômica – bastando que ela seja ilícita, conforme prevê o caput.
Ademais, leciona Manzini “o crime de estelionato não é considerado um fato limitado à agressão do patrimônio de Tício ou de Caio, mas antes como manifestação de delinquência que violou o preceito legislativo, o qual veda o servir-se da fraude para conseguir proveito injusto com dano alheio, quem quer que seja a pessoa prejudicada em concreto.” (Manzini, apud E. Magalhães Noronha, Direito penal, cit., v. 2, p. 362.).
Previsto no título dos crimes contra o patrimônio, é imprescindível que o delito em estudo tende ter a vantagem ilícita sobre o patrimônio alheio, mas o que é patrimônio no direito penal? Em suma, abrange não só as coisas economicamente apreciáveis, mas também aquelas que, embora não possuam tal característica, tenham algum valor para seu proprietário ou possuidor, por satisfazer suas necessidades, sentimentos, usos ou prazeres.
Ora, onde está o patrimônio da vacina? Quem é o dono? Se refletirmos, o Estado ou Hospital particular adquiriram as vacinas, ou seja, compraram as vacinas para si com a finalidade de imunizar seus pacientes (hospital particular) ou a população (Estado/Ministério da Saúde), seguindo PNI (Plano Nacional de Imunização). Dessa forma, há as vacinas, que é, conforme vimos, patrimônio do Estado ou dos hospitais particulares (pois, foram compradas das fabricantes das vacinas) sendo aplicadas nas pessoas, com o objetivo de imunizá-las.
Após vermos que as vacinas são patrimônios públicos ou particulares, acerca da conduta do crime de estelionato, o agente emprega fraude para induzir a vítima em erro, ou seja, nesse caso, os pacientes em erro, de forma que ela tenha falsa percepção da realidade (a não aplicação da vacina) e o fraudador, aproveitando-se dessa situação, obtenha vantagem ilícita, neste caso, ou vender, obter para si ou para outrem. Portanto, a vítima tem que consentir com o erro e deixar que ocorra a obtenção da vantagem, em outras palavras, o paciente consente com a vacinação, mas se ilude mantando-se no erro achando que está imunizada.
Contudo, o crime de estelionato se consuma com a efetiva obtenção da vantagem ilícita, ou seja, caso não reste comprovada a obtenção da vantagem pelo profissional de saúde, restará ao órgão acusatório denunciá-la pela modalidade tentada do delito, de acordo com artigo 14, II, do CP.
Art. 14 - Diz-se o crime:
II - Tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
Porém, caso o profissional de saúde seja funcionário público, este poderá responder por prevaricação disposto no artigo 319 do Código Penal, ao invés de estelionato, por se tratar de funcionário público.
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
Ademais, ainda há o crime de Infração de medida sanitária preventiva, previsto no art. 268, CP, vejamos:
Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
Percebe-se que este delito tem a ação nuclear (verbo) infringir, tendo a finalidade de impedir a propagação ou introdução de doença contagiosa no qual o Poder Publicou determinou, ou seja, decretos como: o uso de máscaras (14.019//20 que altera a lei 13.979), lockdown (vários decretos), etc., mas não há em nenhum desses decretos medidas contra a fraude cometidas por agentes de saúde e no caput não tipifica casos de fraudes.
Dito isso, é imprescindível averiguar cada caso concreto, pois, depende de qual foi a finalidade do agente de saúde em não aplicar devidamente a vacina nos respectivos pacientes, vejamos:
- Se o profissional de saúde é funcionário público, mantem o paciente em erro fraudando a vacinação, se favorecendo do cargo para se beneficiar ou beneficiar alheios, este estará tipificado na prevaricação;
- Caso não seja funcionário público, mantem o paciente em erro fraudando a vacinação, obtendo para si ou para outrem tal vantagem ilícita, este estará tipificado no estelionato.
Então depende de cada caso concreto.
Dessa forma, há teses em que estes agentes de saúde estão tipificados no art. 268 (Infração de medida sanitária preventiva); e há teses, no qual eu sigo, em que estes agentes de saúde, dependendo de cada caso concreto, estão tipificados ou no estelionato ou na prevaricação.
Conforme vimos, a ação dos profissionais de saúde poderia se enquadrar a tipos penais já previsto no código penal, tal como Infração de medida sanitária preventiva, o estelionato ou prevaricação. Por todavia, os profissionais da saúde são garantes, nos exatos termos do art. 13, §2º, do Código Penal, ou seja, são responsáveis pela causação do resultado pelo risco assumido em face da posição de garantia.
Por fim, este delito, conhecido como “Vacina do vento”, há em tramite na Câmara dos deputados a PL (Projeto de Lei) Nº 496/2021 que tipifica agentes de saúde ou qualquer outra pessoa que tentar impedir o cidadão de filmar ou fotografar a aplicação, podendo ser punido com pena detenção de 6 meses a 2 anos.
As punições também valem para a obstrução dos outros direitos estabelecidos no projeto: a presença de um acompanhante durante a vacinação e o acompanhamento do ato de marcação do lote da vacina no cartão de vacinação.
As pessoas já estão receosas com a origem das vacinas, sua eficácia, desacreditando na ciência, e existem “profissionais” (se é que se pode chamar-se assim) agravando estes receios, com atitudes como essas dão créditos para as pessoas desacreditarem na ciência, isso, além de desumano, é lastimável!
REFERENCIAS:
Capez, Fernando, curso de direito pena, parte geral – editora Saraiva, 24º edição: https://amzn.to/3mud9As
Masson, Cleber, Direito Penal parte geral, Vol. 1 – editora Método, 14º edição: https://amzn.to/2HTdWvI
Capez, Fernando, curso de Direito Penal, parte especial. Ed. 13º, Saraiva - https://amzn.to/38PJwEO
Masson, Cleber, Direito Penal, parte especial. Ed. 14º, Metodo - https://amzn.to/30QbITT
FONTES: