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A isenção da multa compensatória do locatário pela devolução antecipada do imóvel

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Agenda 14/04/2021 às 12:54

Conclusão

Este estudo teve como tema principal a isenção da multa compensatória devida pelo locatário que deseja entregar o imóvel antes do término do período aprazado para a vigência do contrato de locação, prevista no parágrafo único do art. 4º da Lei 8.245/91.

Conforme visto, o dispositivo legal supracitado prevê que o locatário ficará isento da multa compensatória quando for obrigado a se mudar para outra localidade, em razão de transferência profissional imposta por seu empregador. O desiderato dessa isenção legal é garantir maior equilíbrio contratual em situações muito específicas, nas quais o pagamento da multa compensatória poderia implicar em prejuízo insuportável ao locatário.

De fato, se o empregador determinou a transferência do locatário para trabalhar noutra localidade, obrigando-o a se mudar, este não terá alternativa a não ser resilir o contrato de locação. Afinal, sendo a transferência uma imposição, o locatário não poderá desobedecê-la sem correr o risco de perder o emprego que lhe sustenta e garante, inclusive, o pagamento do aluguel.

Não se exige análise do elemento anímico do agente acerca da transferência, ou seja, se ele a desejava ou não. O que deve ser levado em conta é se ele tinha a opção de aceitá-la ou recusá-la livremente, bem como se não foi ele o responsável em incutir na mente do empregador, por meio de pedidos anteriores, o desejo de transferi-lo.

Essa transferência, em regra, não pode ser temporária. No entanto, a temporariedade deve ser analisada à luz do caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. Deve-se analisar as circunstâncias do caso concreto, entre elas, o período de contrato a ser cumprido em comparação com o período da transferência, a distância entre as localidades, os meios de transporte disponíveis, o tempo de locomoção e os custos necessários para o transporte. Em suma, deve-se analisar se haverá a efetiva necessidade de mudança do locatário para outra localidade.

Além disso, tendo em vista a proteção à entidade familiar, a isenção legal também deve ser garantida quando o cônjuge ou companheiro do locatário for transferido de forma impositiva por seu empregador. Sendo a família considerada o núcleo de nossa sociedade, não se pode querer impor a separação do casal em prol da proteção do contrato.

Assim, em que pese o fato de o parágrafo único do art. 4º da Lei 8.245/91 apresentar um rol taxativo, isso não significa dizer que a ele deva ser dada uma interpretação literal. Faz-se necessária uma interpretação teleológica do dispositivo, visando interpretá-lo à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da função social do contrato e da proporcionalidade.


REFERÊNCIAS

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______, Superior Tribunal de Justiça. REsp: 77457 SP 1995/0054709-0, Relator: Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Data de Julgamento: 04/10/2001, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 04/02/2002 p. 576. RT vol. 800. p. 217.

______, Superior Tribunal de Justiça. REsp: 1353927 SP 2012/0196796-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 17/05/2018, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/06/2018)

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______, Tribunal de Justiça de São Paulo -TJSP. Apelação n. 9151471-08.2003.8.26.0000, 26ª Câmara, Rel. Norival Oliva, Comarca não informada, j. 18.04.2005.

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Notas

1Nesse sentido, vide: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - PRELIMINAR - FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - REJEIÇÃO - LOCAÇÃO RESIDENCIAL - RESCISÃO CONTRATUAL ANTECIPADA - COMPROVAÇÃO DO DÉBITO - MULTA RESCISÓRIA - PERCENTUAL DE 20% DO PERÍODO CUMPRIDO DO CONTRATO - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. - Verificando-se que houve a rescisão unilateral e antecipada do contrato de locação por parte do locatário, é possível a incidência da multa compensatória, considerando-se equitativamente o período cumprido do contrato, nos termos do art. 4º da Lei nº 8.245/91. - A fixação da multa compensatória em 20% (vinte por cento) não se mostra abusiva, inexistindo razão para redução, todavia, a forma de sua incidência deverá obedecer o artigo 4º da lei 8.241/91.- Sentença reformada em parte. Recurso provido parcialmente. (AgRg no AREsp 578.523/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/02/2015, DJe 03/03/2015).

2 Nesse sentido: LOCAÇÃO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. CLÁUSULA CONTRATUAL RESOLUTIVA. OBSERVÂNCIA. PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA. ALUGUERES. DESCUMPRIMENTO PELA LOCATÁRIA. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA N. 283/STF. INCIDÊNCIA. 1. O locatário, durante o prazo determinado, poderá devolver o imóvel alugado mediante o pagamento da multa pactuada, ex vi do disposto no art. 4º da Lei n. 8.245/91. Por sua vez, o art. 56. da referida norma legal, dispõe que "o contrato por prazo determinado cessa, de pleno direito, findo prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso". 2. Havendo previsão contratual de liberação de eventuais ônus da rescisão em face da natureza do negócio avençado, este deve ser respeitado, em homenagem ao princípio pacta sunt servanda.(...). 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no Ag: 1277790 SP 2010/0027109-3, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 23/11/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/12/2010)

3 Nesse sentido, vide decisão do Superior Tribunal de Justiça: “A hipótese prevista no parágrafo único do dispositivo, é inegável, porque reveladora do caráter excepcional atribuído pelo legislador, sufraga a única possibilidade legal de o locatário vir a ser dispensado do pagamento da multa. Não se há, pois, até mesmo em respeito à explícita taxatividade de que se reveste o parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 8.425/91, de conferir-lhe interpretação outra”. (STJ - REsp: 77457 SP 1995/0054709-0, Relator: Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Data de Julgamento: 04/10/2001, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 04/02/2002 p. 576. RT vol. 800. p. 217).

Sobre o autor
Igor Ladeira dos Santos

Sócio fundador do Escritório Jander Maurício Brum & Igor Ladeira dos Santos Advogados Associados. Formado em direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF; Especialista em Direito Imobiliário pela Universidade Cândido Mendes. Corretor de imóveis. Foi editor do periódico jurídico da UFJF - Alethes. Áreas de estudo aprofundado: Direito Imobiliário; Direito Sucessório; Direito Civil e Direito do Consumidor.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Artigo elaborado como requisito para a obtenção do título de Especialista em Direito Imobiliário pela Universidade Cândido Mendes.

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