Resumo
O presente artigo tem como objetivo trazer, em linhas gerais, uma análise da decisão tomada pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1739641-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria que definiu a observância estrita e incondicionada do parcelamento tributário ao princípio da legalidade.
Da constituição definitiva do crédito tributário
O crédito tributário é constituído definitivamente pelo lançamento. O lançamento é o procedimento administrativo pelo qual a autoridade fiscal constata a ocorrência do fato gerador, determina a matéria tributável, o seu montante, o sujeito passivo e eventualmente a aplicação de multa.
É o que se extrai do artigo 142 do Código Tributário Nacional, verbis:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Tem como mote, a constituição definitiva do crédito tributário, o principal efeito de tornar certa, exigível e líquida a obrigação tributária que surgira com o fato gerador.
Tal exigibilidade imprime ao sujeito passivo a obrigação de quitar a obrigação imposta, e no caso de não adimpli-la, dá margem ao fisco para realizar os atos executivos expropriatórios concernentes a tal desiderato.
Após a constituição definitiva do crédito tributário pelo lançamento, resta a oportunidade para o sujeito passivo adimplir a obrigação, suspendê-lo, ou extingui-lo. Tratar-se-á abaixo da hipóteses de suspensão denominada parcelamento.
Do parcelamento tributário
O artigo 151 do Código Tributário Nacional trata das hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário.
Em específico tratar-se-á da hipóteses do inciso VI deste artigo, verbis:
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
I - moratória;
II - o depósito do seu montante integral;
III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo;
IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança.
V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial;
VI – o parcelamento.
Tem-se entendido o parcelamento como uma modalidade de política fiscal, de fornecer oportunidade aos devedores do Estado para pagar seus débitos em prestações, com o intuito de recuperação dos créditos tributários impagos trazendo os contribuintes para uma situação de regularidade.
Nesse sentido, estatui o artigo 155-A do Código Tributário Nacional que há a necessidade de criação de lei específica, verbis:
Art. 155-A. O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica.
§ 1o Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas.
§ 2o Aplicam-se, subsidiariamente, ao parcelamento as disposições desta Lei, relativas à moratória.
§ 3o Lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial.
§ 4o A inexistência da lei específica a que se refere o § 3o deste artigo importa na aplicação das leis gerais de parcelamento do ente da Federação ao devedor em recuperação judicial, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela lei federal específica.
Nesse sentido, quando a lei aduz ser lei específica, a lei é aquela formulada pelo ente tributante com competência para instituição do tributo. Respeitadas, portanto, as leis gerais do CTN, cada ente poderá formalizar legislações para o parcelamento dos créditos para sua recuperação.
A aludida lei específica deverá, obviamente, especificar não somente o prazo para parcelamento mas o número de parcelas, os tributos aos quais se aplica, as garantias exigidas e as condições para a utilização da benesse.
Tais requisitos estão previstos nos artigo 153 do Código Tributário Nacional, verbis:
Art. 153. A lei que conceda moratória em caráter geral ou autorize sua concessão em caráter individual especificará, sem prejuízo de outros requisitos:
I - o prazo de duração do favor;
II - as condições da concessão do favor em caráter individual;
III - sendo caso:
a) os tributos a que se aplica;
b) o número de prestações e seus vencimentos, dentro do prazo a que se refere o inciso I, podendo atribuir a fixação de uns e de outros à autoridade administrativa, para cada caso de concessão em caráter individual;
c) as garantias que devem ser fornecidas pelo beneficiado no caso de concessão em caráter individual.
Nota-se que a lei disporá sobre todos esses aspectos e é a própria lei quem delega à autoridade administrativa alguns elementos essenciais para a adesão ao parcelamento.
O princípio da legalidade deve ser observado de forma estrita, portanto.
Sobre a necessidade de delegação de alguns atos à autoridade administrativa, tem-se surgidos questionamentos no poder judiciário afeitos, especificamente, com o surgimento de imposições ou requisições administrativas que não encontram respaldo na lei de regência.
Por vezes, autoridades administrativas estabelecem alguns limites ao valor do parcelamento, condições não especificadas na lei, diminuição de parcelas ou negativa de garantias, tudo com base em atos normativos infralegais.
O Superior Tribunal de Justiça em sua 1ª Turma na análise do REsp 1.739.641-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 21/06/2018, definiu que as condições para a concessão de parcelamento tributário devem estrita observância ao princípio da legalidade. Logo, não é possível que atos infralegais imponham condições não previstas na lei de regência do benefício.
Portanto, o Código Tributário Nacional, ao prever a estipulação de lei específica para a definição de critérios para adesão a parcelamentos, teve como premissa o princípio da legalidade, de tal forma que, a limitação realizada por autoridades administrativas fazendárias não tem seu lugar, sendo vedada a imposição ilegal de limites e condições em atos normativos de hierarquia inferior à lei.
REFERÊNCIAS
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Os requisitos para o parcelamento devem ser fixados em lei específica e atos infralegais não poderão impor condições não previstas nesta lei. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/0c2a1b8eada4803abd90386df241cbf3>.
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 12. Ed. JusPodivm. Salvador. 2018