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Inconstitucionalidade da PEC 32/2020

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Agenda 27/04/2021 às 13:41

Apresenta informações sobre a inconstitucionalidade da proposta de Reforma Administrativa - PEC 32/2020.

O Órgão do Poder Executivo apresenta, em 03 de setembro de 2020, a Mensagem n. 504/2020, que submete à deliberação do Congresso Nacional o texto da Proposta de Emenda à Constituição n. 32/2020, acompanhada da Exposição de Motivos 47, do Ministério da Economia. Propõe a alteração no Texto constitucional, para adoção de um novo modelo de administração, apresentando redação para modificações de redação e acréscimo de redação da Constituição Federal, merecendo considerações preliminares quanto ao próprio ato administrativo, materializado na PEC 32/2020, que vem maculado pela ilegalidade decorrente de ausências dos requisitos de forma, motivo e desvio de finalidade.

A Exposição de Motivos 47/ME e a Proposta de EM 32/2020, constitui ato administrativo do Estado e, como tal, deve preencher os requisitos que conferem legalidade do ato, entre eles a forma prevista em lei, o motivo existente e a finalidade evidenciada pelo nexo de causalidade entre o motivo e o fim almejado. Inexistentes tais requisitos, o ato do Estado estará maculado pelo manto da ilegalidade, caracterizando desvio de finalidade e violando princípios constitucionais da legalidade e da moralidade estabelecidos no artigo 37, sendo passível de ataque por meio da Ação Popular, nos termos do inciso LXXII, do artigo 5º, da Lei Maior [Tema 836 de repercussão geral no ARE 824781 RG / MT]


Vício de forma

As matérias trazidas no corpo do ato administrativo não observam a regra do processo legislativo estabelecido no artigo 61, § 1ºe e 84 da Constituição, sendo inadequada a forma utilizada [PEC] para tratar de assunto afeto a normas infraconstitucionais, limitada a competência de cada Poder e do respectivo Ente Federado.

Constitucionalmente prevista no artigo 59 e 61, a forma para submeter ao Legislativo as modificações pretendidas, que terão alcance no âmbito de sua competência. Utilizando do processo legislativo adequado, por meio de Projeto de Lei encaminhado ao Poder Legislativo, com as justificativas cabíveis, pretendendo autorização legal para tratar de todas as matérias trazidas na PEC 32/2020 relativas ao capítulo da Constituição Federal que Trata da Administração Pública.

A falta de clareza na exposição de motivos, característico elemento surpresa, nos faz buscar no Texto Constitucional, Título III [da União] Capítulo VII [Da Administração Pública], seção I [Disposições Gerais] artigo 37, caput, da Constituição Federal a identificação do público alvo denominado na exposição de motivos como a “Administração Pública e todo o seu corpo de servidores: “ Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte” Determinado o público alvo, a Administração dos três Poderes, incluindo seus servidores e membros, conforme se extrai da seção II do mesmo Capítulo, que trata de “todos” os servidores públicos artigo 39, caput [ servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Município] e 39, § 4º [O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI]. Identificado o público alvo.

Todas essas matérias foram trazias na PEC 32/2020, que afetam as áreas de competências dos três Poderes, não comportam apreciação por meio de proposta de emenda constitucional por ferir a forma adequada a ser observada no processo legislativo e violar o artigo 60, § 4º, da Carta Federal.

O artigo 37 da CF/88 atribui a administração pública a cada um dos Poderes, no âmbito de suas respectivas competências, determinando observância aos princípios constitucionais e, também, de todos os §§ e incisos daquele artigo. A EC 19/98, alterou a regra de Exceção que confere ao Presidente da República a competência de lei para a “revisão geral anual”, alterou a redação do inciso X, do artigo 37, para deixar cristalino que os incisos devem estar compatibilizados com o que descreve o caput e, somente a revisão geral anual, sem distinção de índices a todos os servidores da União, é exceção à regra. Para tanto, iluminando a redação do inciso X daquele artigo, acresceu a primeira parte para deixar indene de dúvida que “a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso.”

A redação do artigo 84, III, em sintonia com a redação dos dispositivos trazidos no corpo da Constituição, estabelece a competência privativa do Presidente para iniciar processo legislativo, na forma e nos casos previsto na Constituição. No artigo 84, V, “ a” está a competência do Presidente, por meio de decreto, dispor sobre a organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar em aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos e, também, extinguir funções ou cargos públicos quando vagos. Trata-se de competência restrita à administração Federal do Poder Executivo [A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios] no conceito trazido no Decreto Lei n. 200/67, recepcionado pela CF/88.

No artigo 61, relativas as matérias que devem ser tratadas por meio de lei : “§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; II - disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria.

O Texto constitucional confere ao Presidente da República compete, por meio de lei, a criação de cargos, funções ou empregos públicos, dos servidores da Administração direta, ou seja, servidores do Poder Executivo, vinculados aos órgãos e Ministérios, que compõe a estrutura organizacional do Presidente da República.

O processo legislativo não foi observado, trazendo na PEC a matéria afeta ao regime jurídico, provimento de cargo e estabilidade [matérias trazidas no artigo 37, que o Constituinte originário inseriu na competência dos Poderes da República] sobre essas matérias, somente por meio de Projeto de Lei pode ser trazida para a apreciação do Legislativo, que a confrontará com as regras estabelecidas pelo Constituinte originário, assente-se: regras imutáveis por meio de emenda constitucional.

Não se confunde o conceito de Administração do Estado, que foi atribuída aos Poderes da República, com suas respectivas competências, artigo 1º, 2º da Constituição Federal/88, com o conceito de Administração Federal [constituída pela Administração Direta indireta de cada Poder, artigo 37, da Lei Maior]

Por pertinente transcrevo os conceitos cristalinos assentados no Decreto-Lei n. 200/67, que estabelece regras para fins de “reforma administrativa”:

“Art. 4° A Administração Federal compreende: I - A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Empresas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista. d) fundações públicas. Parágrafo único. As entidades compreendidas na Administração Indireta vinculam-se ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade.

O processo legislativo impõe a observância da Lei infraconstitucional como forma apropriada a ser utilizada para dispor sobre regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade, remuneração de servidor, criação e extinção de cargos e funções públicas deve vir tratada por meio de lei infraconstitucional, a utilização da Proposta de Emenda à Constituição não pode servir de instrumento para burlar a rigidez constitucional imposta pelo Constituinte Originário, violando a regra do processo legislativo. Evidente o Vicio de Forma que acarreta a inconstitucionalidade e encontra óbice de apreciação no artigo 60, § 4º, da CF/88.

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O motivo como requisito do ato administrativo é inexistente. Na Exposição de Motivo está assentado:

“(...) estudo do Banco Mundial (Um Ajuste Justo: Análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil), publicado em 2017, já evidenciava que o gasto público é engessado em categorias como folha de pagamento e previdência social, deixando pouco espaço para despesas discricionárias e de investimento. Mais recentemente, em outubro de 2019, novo estudo do mesmo Banco (Gestão de Pessoas e Folha de Pagamentos no Setor Público Brasileiro: o que os dados dizem), ao analisar dados sobre a folha de pagamentos do Governo Federal e de seis Governos Estaduais, corroborou a existência de uma série de distorções nos gastos com pessoal. (...)”

Em termos cristalinos colocados na exposição de motivos, o Banco Mundial se baseia na folha de pagamento do Governo Federal e dos “seis” Governos Estaduais, que apresentam “distorções”. Distorções, no Aurélio, quer dizer alteração, deturpação, deformação, deformidade, adulteração, desvio, desvirtuamento, disformidade. Nos exatos termos da exposição de motivos o Chefe do Poder Executivo traz a público que o estudo do Banco Mundial constatou que está havendo “adulteração” na folha de pagamento do Governo Federal e de seis Governos Estaduais. Esse motivo não tem qualquer nexo causal com o ato administrativo, mas reveste-se de constatação de ato de improbidade administrativa no âmbito do Poder Executivo, nas administrações anteriores ao ano de 2018, inclusive, considerando-se que a informação nos Estudos apontados data de 2017 e 2018.

O motivo que sustenta o ato [que o gasto com a folha de pagamento do servidor público, lato sensu, é a causa do colapso financeiro do Estado] está, portanto, divorciado do fato retratado no Estudo do Banco Mundial. Ao contrário, do que consta do motivo trazido nas exposições do ato administrativo, no estudo feito pelo Banco Mundial se constatou a existência de uma série de “distorções” com a folha de pagamento do “Governo Federal” e de “Governos de seis Estados” o que merece a atenção do Congresso Nacional, para levar o fato ao conhecimento do Tribunal de Contas da União, órgão competente para fiscalizar o desvirtuamento ou adulteração na folha de pagamento do Governo do Estado e dos Governos Federais, relativamente aos períodos de 2018 e anteriores [considerando que o estudo indicado data de 2017 e 2018 -conforme informado na exposição de motivos].

Na Exposição de Motivos 47/ME descreve a segunda causa de motiva a necessidade de alteração do Texto da constituição para instituir um novo modelo de serviço público,” resultado da “percepção do cidadão” e de “indicadores diversos”, que levaram à conclusão que o Estado custa muito e entrega pouco, necessitando medidas para evitar um colapso na prestação de serviço para a população e no orçamento público” [motivo].


Inexistência do motivo e desvio da finalidade são vícios presentes no ato

O termo que descreve a causa: como “percepção do cidadão”, só pode ser aferida por meio objetivo estabelecido no § 3º, II, do artigo 37 Constitucional [redação da EC n. 19/1998] que remete à lei ordinária a disciplina das formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: (i) as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; (ii) o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII. A Lei n.º 13.460/2017 veio a regulamentar o artigo 37, § 3º, inciso I, da Constituição Federal, disciplinando especialmente as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços. Conceitua manifestações de forma ampla, abrangendo reclamações, denúncias, sugestões, elogios e demais pronunciamentos de usuários que tenham como objeto a prestação de serviços públicos e a conduta de agentes públicos na prestação e fiscalização de tais serviços. No artigo 3.º estabelece a periodicidade mínima anual, para cada Poder e esfera de Governo publicar quadro geral dos serviços públicos prestados, que especificará os órgãos ou entidades responsáveis por sua realização e a autoridade administrativa a quem estão subordinados ou vinculados. O quadro geral deve conter os serviços públicos prestados por meio de estrutura própria, assim como os prestados por delegatários e terceirizados.

O mecanismo de informação aos usuários, tem como finalidade a garantia não só a defesa dos direitos do cidadão, mas também o exercício do controle social e o cumprimento do princípio da publicidade dos atos da Administração Pública, totalmente em harmonia com o que estabelece a Lei de Acesso à Informação.

No âmbito do Poder Executivo. Encontramos a ferramenta para o usuário registrar manifestações no Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo Federal. A ferramenta de acesso informa que pode ser utilizada para fazer denúncias, reclamações, sugestões, elogios ou solicitações a órgãos públicos federais informa a última modificação registrada no sistema em 24.04.2020 com a informação “sem avaliação”.

Na exposição de motivos, ao propor um novo modelo de serviço público, foi utilizado como motivo da falta de eficiência e baixa produtividade: “Também a OCDE lançou, em janeiro de 2019, Recomendação do Conselho sobre Liderança e Capacidade do Serviço Público, que, dentre outras questões, chama a atenção para a necessidade de que os serviços públicos sejam sistematizados de modo a adquirirem os elementos de agilidade e adaptabilidade condizentes com a natureza mutável do trabalho.

Nessa esteira, assevera a importância de que os termos e condições de trabalho no serviço público sejam transparentes, com definição clara e objetiva dos instrumentos legais que se aplicam às categorias de vínculos e ainda que funções e posições sejam claramente baseadas em fatores como a natureza do trabalho, considerações de mercado e necessidades de desenvolvimento de capacidade.”

A causa apresentada com base em recomendação também não é apta a detectar a existência de motivo para a proposta de alteração do Texto Constitucional Vigente, considerando que as providências relativas à sugestão do “Conselho de Liderança e Capacidade do Serviço Público” está relacionada ao tema Gestão Estratégica de Pessoas, ao se referir que o “os serviços públicos sejam sistematizados de modo a adquirirem os elementos de agilidade e adaptabilidade condizentes com a natureza mutável do trabalhoestá a orientar o Estado à valorizar e capacitar os seus servidores, buscando lideres, entre liderados, capazes de definir claramente os objetivos da gestão estratégica. Destacamos trechos da Recomendação do OCDE:

A Recomendação do Conselho sobre Liderança e Competência na Função Pública [OCDE, Recomendação do Conselho sobre Liderança e Competências na Função Pública, OCDE/LEGAL/0445] traz extensa recomendação que pode ser verificada no endereço eletrônico apontado na nota final: “II. RECOMENDA que os Membros e os Não-Membros que tenham aderido à Recomendação (adiante designados “Aderentes”) criem no seio da função pública uma cultura e uma liderança orientadas por valores, centrando-se na melhoria de resultados para a sociedade, através das seguintes ações: 1. Definir os valores da função pública e promover a tomada de decisão baseada em valores, nomeadamente mediante as seguintes ações: a. Clarificar e comunicar os valores fundamentais tidos em comum e que devem orientar a tomada de decisão na função pública; (...)2. Desenvolver a capacidade de liderança na função pública, nomeadamente através das seguintes ações: a. Clarificar as expectativas em relação aos dirigentes públicos para que sejam líderes politicamente imparciais das organizações públicas, confiáveis para concretizarem as prioridades do governo, e defenderem e incorporarem os mais elevados padrões de integridade, sem receio de represálias de natureza política; b. Considerar critérios baseados no mérito e em procedimentos transparentes na nomeação de dirigentes públicos, e responsabilizá-los pelo respetivo desempenho; c. Assegurar que os dirigentes públicos tenham o mandato, as competências e as condições necessárias para proporcionar assessoria imparcial baseada em evidências às autoridades políticas; e d. Desenvolver as capacidades de liderança dos atuais e potenciais dirigentes públicos. 3. Assegurar uma função pública inclusiva e segura que reflita a diversidade da sociedade que representa, designadamente mediante as seguintes ações: a. Comprometendo-se publicamente a promover um ambiente de trabalho inclusivo e respeitável, aberto a todos os membros da sociedade que detenham as competências necessárias; b. Pôr em prática medidas que assegurem a diversidade, inclusão e bem-estar, e realizar regularmente avaliações e análises comparativas (benchmarking), de modo a acompanhar o progresso dessas medidas, detectar e remover obstáculos (...). Assegurar um justo equilíbrio entre a continuidade do emprego e a mobilidade, a fim de apoiar a implementação de políticas e serviços para além de um ciclo político; b. Investir na previsão, inovação e competências e capacidades analíticas; e c. Dialogar com os grupos exteriores à função pública, a fim de definir padrões de qualidade e assegurar que as políticas e serviços correspondem às necessidades dos utilizadores. III. RECOMENDA que os Aderentes invistam nas capacidades da função pública a fim de desenvolver uma função pública eficaz e confiável, (...) a. Assegurar uma combinação adequada de capacidades, competências de gestão e conhecimentos especializados, que reflitam a evolução do trabalho no seio da função pública; b. (...) acompanhar a evolução das tecnologias e as necessidades da sociedade que servem; e c. Alinhar os processos de gestão das pessoas com as capacidades e competências identificadas (...) 3. Recrutar, selecionar e promover candidatos mediante processos transparentes, abertos e baseados no mérito, a fim de garantir tratamento justo e equitativo, (...); b. Realizar um processo de seleção rigoroso e imparcial, baseado em critérios e métodos apropriados ao posto de trabalho, no âmbito do qual os resultados são transparentes e objeto de impugnação; c. Preencher atempadamente as vagas existentes, de modo a manter-se competitiva e satisfazer as necessidades operacionais de pessoal. (...); b. Motivar e incentivar os trabalhadores para que sejam proativos no seu desenvolvimento pessoal e aprendizagem contínua, e proporcionar-lhes as oportunidades para realmente o fazerem; e c. Valorizar diferentes abordagens e contextos de aprendizagem, em função do tipo de perfil de competências, ambição ou capacidade de cada trabalhador. 5. Avaliar, premiar e reconhecer o desempenho, talento e iniciativa, designadamente através das seguintes ações: (...) b. Premiar o desempenho dos trabalhadores por meios apropriados e abordar o baixo desempenho como parte do enfoque coerente da gestão do desempenho; e c. Assegurar que os dirigentes tenham as capacidades e o apoio necessários para realizarem a gestão do desempenho e para identificarem e desenvolverem talentos. (...) [1]

A Recomendação, portanto, orienta a adoção de formas totalmente contrárias às medidas propostas por meio da PEC 32/90, que representam práticas ultrapassadas que tratam servidores como objetos, e coloca finança acima do ser humano, desvalorizando-o, humilhando-o e pisoteando sobre a sua dignidade.

A produtividade do Poder Judiciário é capaz de demonstrar que o motivo fundado em baixa produtividade é requisito inexistente no ato.

Consulta pública no site do Conselho Nacional de Justiça, encontramos dados precisos sobre a produção de servidores do poder Judiciários, além de lá também estar indicada as informações relacionadas às remunerações dos “servidores investidos em cargo de provimento efetivo”, elementos que refutam toda a Justificativa de ineficiência na prestação de serviço público, pelo menos no âmbito do Poder Judiciário. No site encontramos relatórios denominados “Justiça em Números”. O exemplar do ano de 2009, nas palavras do Ministro Cesar Peluso [2], [em notícia publicada em 14/09/2010] é pautado na “pesquisa, feita anualmente pelo CNJ desde 2005 e, traz informações relativas à movimentação processual, despesas, receitas e todo o funcionamento da Justiça Estadual, Federal e do Trabalho . Ainda naquele site, o registro pelo Ministro Dias Toffoli [3] – Presidente, destacando a evolução tecnológica adotada no Relatório, edição 2020, com informações relativas a 2019. Traz uma radiografia completa da Justiça, com informações detalhadas sobre o desempenho dos órgãos que integram o Poder Judiciário, seus gastos sua estrutura, os indicadores de desempenho e produtividade, as estatísticas por matéria do direito, além de números sobre despesas, arrecadações, estrutura e recursos humanos, ressaltando que “O Poder Judiciário finalizou o ano de 2019 com 77,1 milhões de processos em tramitação, que aguardavam alguma solução definitiva. Tal número representa uma redução no estoque processual, em relação a 2018, de aproximadamente 1,5 milhão de processos em trâmite, sendo a maior queda de toda a série histórica contabilizada pelo CNJ, com início a partir de 2009”. Destaca que o índice de produtividade dos servidores da área judiciária cresceu 14,1%, o que significa uma média de 22 casos a mais baixados por servidor em relação a 2018. O aumento da produtividade ocorreu de forma coordenada, pois foi verificada em ambos os graus de jurisdição. Noticia o lançamento do DataJud, em 2020, – Base Nacional de Dados do Poder Judiciário, ferramenta de captação e recebimento de dados, que reúne informações pormenorizadas a respeito de cada processo judicial em uma base única, de forma a permitir a extinção e simplificação de diversos cadastros e sistemas existentes, promovendo economia de recursos públicos e alocação mais produtiva da mão de obra existente. Destaca que essa inovação é fruto de do trabalho incessante e dedicado da equipe do CNJ, permitirá um avanço ainda maior na gestão de dados do Poder Judiciário, em direção à política de dados abertos com base na ciência de dados e no suporte fornecido pelas novas tecnologias de informação.

Não veio anexado à proposta a pesquisa qualquer documento capaz de demonstrar a baixa produtividade dos serviços prestados pelos órgãos vinculados aos Poderes da República. Conforme orientação do OCDE, a valorização do servidor, a competência e liderança deve ser priorizada por meio de treinamentos, avaliações de conhecimentos, diálogos, ambiente sadio, qualificação profissional, salário digno, reconhecimento do mérito com premiação, sugestões que não estão sendo observadas na PEC 32/2020 que mais representa a extinção da função pública do Estado, a privatização do serviço público, a desvalorização do servidor e o desrespeito aos Poderes da República.

Cristalina a incompatibilidade entre a causa narrada na EM n. 47/ME e ao ato administrativo materializado na Proposta de Emenda Constitucional 32/2020, configurando a ilegalidade ao ato administrativo, ante inexistência do requisito necessário à validade do ato e o desvio de finalidade ante a ausência do nexo de causalidade entro o motivo o ato praticado.

Apontada violação legal e a violação às cláusulas pétreas explicitamente trazidas no artigo 60, § 4º, da CF, resta inviabilizada a apreciação da PEC/32 pela Casas do Congresso Nacional.

Ação Popular, que pode ser utilizada por qualquer cidadão e o Mandado de Segurança cuja legitimidade é conferida aos parlamentares, são remédios aptos à obstarem o andamento da PEC 32.

A Lei 4.717/65 prevê em seu artigo 2º, que são nulos os atos lesivos ao patrimônio da União, quando deles se evidenciar: (i) a) incompetência; (ii) vício de forma; (iii) ilegalidade do objeto; (iv) inexistência dos motivos; (v) desvio de finalidade. Os conceitos atribuídos aos casos de nulidade são traçados no parágrafo único do mencionado artigo, a saber: o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência. A Proposta de Emenda Constitucional é ato vinculado à exposição de motivos, que deve vir acompanhado de documentos de onde se possa extrair a realidade fática anunciada como motivadora da proposta, em observância à Teoria dos Motivos Determinantes. A motivação em desacordo com a realidade dos fatos retratados na exposição de motivos, resulta em ato administrativo irremediavelmente inquinado de vícios de legalidade, de onde decorre a imoralidade de ato praticado em desacordo com a lei, violando o artigo 37, caput, da CF/88. A moralidade administrativa, constitui patrimônio imaterial da sociedade, sendo consequência do ato praticado sem observância do princípio da legalidade. Ação Popular prevista na Constituição Federal vigente, artigo. 5º, inciso LXXIII, e na Lei 4.717/65 o remédio jurídico apropriado para atacar o ato administrativo eivado do vício de legalidade, em decorrência da imoralidade administrativa caracterizada pelo ato ilegal. [Nesse sentido está o Tema 836 de repercussão geral no ARE 824781 RG / MT]

A ação popular, ajuizada contra o Presidente da República, o Presidente do Senado, o Presidente da Câmara dos Deputados, o Governador ou o Prefeito, será processada e julgada perante a Justiça de primeiro grau, Federal. Não obstante, O Supremo Tribunal Federal é competente para processar e julgar ação popular cujo pedido seja próprio de Mandado de Segurança coletivo contra ato de presidente da república, “ex vi” do artigo 102, I, d, da Constituição. [4]

Sobre a autora
Glauce de Oliveira Barros

É advogada – OAB-MS 17.979; pós-graduada pela UFMS e pelo ILFG; ex-Diretora-Geral de Coordenação Administrativa do TRT24; ex-Assessora de Desembargador do TRT24; servidora pública aposentada; Diretora de Assuntos Legislativos da ANAJUSTRA Federal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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