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Interpretação legislativa ou ativismo judicial?

Uma análise da ADPF 132/ADI 4277, que reconhece juridicamente a união homoafetiva

O objetivo deste estudo é analisar, à luz da hermenêutica jurídica com enfoque no ativismo judicial, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 132 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277

1     INTRODUÇÃO

O ativismo judicial é um fenômeno que há muito tempo vem sendo analisado e atualmente tem gerado maiores discussões, uma vez que o Judiciário está aparentemente muito mais à frente do que o poder Legislativo no que concerne à concretização dos anseios da população brasileira. Isso se dá, pois, o Legislativo não consegue atender a todas as demandas sociais para a criação de leis específicas e condizentes com a realidade e acaba sobrando para o Judiciário julgar com as leis até então existentes e interpretá-las da melhor forma possível, às vezes ampliando seus poderes de julgadores e invadindo a esfera Legislativa dos Poderes.

Um grande exemplo da atuação do Judiciário ampliando seus poderes de julgadores e quase fazendo o trabalho do Legislativo é no caso da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132 e Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277, votada em 2011, tendo como relator o Min. Ayres Britto. Tais ADPF e ADI versavam sobre o reconhecimento jurídico da união homoafetiva, utilizando o caso concreto dos funcionários do governo do Rio de Janeiro, onde o Governador, que foi o requerente da ação, buscava igualdade entre seus funcionários, almejando que os mesmos direitos jurídicos destinados aos cônjuges heterossexuais fossem destinados aos cônjuges homossexuais.

O tema em questão é de notória importância social, uma vez que relações homoafetivas existem e precisam ser levadas a sério, principalmente pelo Estado, que deve primar pelo bem-estar da sociedade e pela igualdade, assim como que a lei e direitos valham para todos de forma igual, o que não acontecia até a decisão proferida pelo Supremo. Outro ponto que se faz necessário analisar é o Ativismo Judicial, que vem tomando força e sendo bastante debatido, haja vista que deve haver a separação dos três poderes, mas também deve-se prezar pela efetivação de direitos que, como no caso a ser analisado, estava sendo negligenciado pelo poder Legislativo, levando tal assunto ao poder Judiciário para que pudesse dar provimento ou não a tal direito fundamental. Logo, a análise do papel da hermenêutica jurídica no que diz respeito ao julgamento de tal Ação se faz necessária para entender se a Hermenêutica é o que mantém um controle sobre o Ativismo Judicial, fazendo com que haja apenas uma amplitude da atividade interpretativa e não uma ampliação em demasia dos poderes do julgador, ultrapassando sua esfera e adentrando na esfera Legislativa.

O presente artigo se divide em dois capítulos. O primeiro busca trabalhar uma análise do Poder Judiciário, com foco no Ativismo Judicial, mas em outras questões também. Neste capítulo também se analisará o papel do Supremo Tribunal Federal na aplicação do direito e na possível crescente da judicialização; já o segundo capítulo fará uma análise da ADPF 132 e da ADI 4277, que versam sobre a equidade de direitos entre casais homossexuais com os heterossexuais, juridicamente falando.

De acordo com o objetivo pretendido pelo trabalho optou-se por uma pesquisa descritiva, em fontes secundárias tais como: levantamentos bibliográficos, através de livros específicos, artigos online, periódicos e publicações de estudiosos relacionadas ao assunto do objeto em questão. Através deste estudo bibliográfico será possível uma maior compreensão e envolvimento com o tema, possibilitando, assim, o contato com instrumentos que legitimam o objeto da temática. Portanto, a metodologia utilizada neste estudo será de cunho bibliográfico, onde terá como base: a Constituição Federal de 1988, Doutrina e Leis que tratam do tema. O presente estudo teve como parâmetro norteador as ideias de alguns autores que conseguiram conjugar didática, capacidade analítica e rigor científico, contribuindo assim, para a construção do alicerce teórico que fundamentou este estudo.

2     PODER JUDICIÁRIO: ATIVISMO JUDICIAL E OUTRAS QUESTÕES

Atualmente estamos inseridos em um Estado Democrático de Direito que surgiu como solução para outros modelos Estatais anteriores, tal como o Estado Liberal e o Estado Social, trazendo consigo uma descentralização do poder de decisões e até mesmo no que concerne à interpretação e aplicabilidade dos direitos presentes no Estado. Desta forma, foram estabelecidos limites e funções para cada poder, sendo de responsabilidade do Executivo a organização do Estado, ao Judiciário a aplicação de forma responsável do direito posto, sendo o Legislativo o responsável principal pela garantia das liberdades individuais do povo. (ALBUQUERQUE, 2011). Assim, ainda segundo o autor:

Nessa perspectiva de Estado, tem-se a lei como ponto de partida e fonte principal para interpretação das questões que penetram o campo jurídico. Assim, vale elucidar que o processo de positivação do direito, em que insere a lei como fonte racional do direito, implica em conceber aquela como norma de validez emanada de uma representação legitimada que instrumentaliza as valorações e expectativas de comportamento da sociedade civil. (ALBUQUERQUE, 2011).

Uma grande preocupação entre os doutrinadores e constitucionalistas é a questão do Ativismo Judicial, algo que pode acabar afrontando o princípio da separação dos poderes, pautado na justificativa de que o Judiciário está tomando o papel do Legislativo. Antes de se aprofundar no caso concreto, o da ADPF 132/ADI 4277, julgada em 2011, é preciso que se caracterize o ativismo judicial. Como elucida Marianna Chaves (2015), Ativismo Judicial é uma expressão criada em meados dos anos 40 nos Estados Unidos, onde classificava a atuação da Suprema Corte norte-americana que se consolidou nas décadas seguintes, marcadas por jurisprudências progressistas no que tangia sobre direitos fundamentais. Ainda de acordo com a autora, o ativismo judicial não pode ser excedido, devendo ser utilizado apenas em último caso, se justificando, dentre outros motivos, devido à inércia do poder Legislativo. Assim, é apenas uma forma proativa de se interpretar a Constituição, criando uma extensão do seu sentido e alcance.

De acordo com Gisele Cittadino (2002), a atuação dos tribunais reflete nos princípios da separação dos poderes e acaba interferindo na neutralidade política dos juízes, como elucida:

A ampliação do controle normativo do Poder Judiciário no âmbito das democracias contemporâneas é tema central de muitas das discussões que hoje se processam na ciência política, na sociologia jurídica e na filosofia do direito. O protagonismo recente dos tribunais constitucionais e cortes supremas não apenas transforma em questões problemáticas os princípios da separação dos poderes e da neutralidade política do Poder Judiciário, como inaugura um tipo inédito de espaço público, desvinculado das clássicas instituições político-representativas.

Assim, chegamos a um problema muito criticado: se o ativismo judicial for aplicado sem critérios, acabaríamos substituindo os agentes políticos (escolhidos pelo povo) por magistrados, que não exercitam o seu mandato através de representatividade do povo e sem legitimidade para praticar ações designadas aos demais poderes. Neste viés, os Ministros do STF, por exemplo, acabariam se sobrepondo à imagem da Presidência da República e os políticos do Congresso Nacional, que foram eleitos por vários brasileiros a serem representados. Roberto Gargarella (1996) falava:

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Como é possível que um minúsculo grupo de juízes, que não sejam eleitos diretamente pela cidadania (como o são os funcionários políticos), e que não estejam sujeitos a periódicas avaliações populares (e portanto gozam de estabilidade em seus cargos, livres do escrutínio popular) possam prevalecer, em última instância, sobre a vontade popular?

Isso nos faz entrar na discussão acerca da representação política. De acordo com Paulino Filho (2014), representação política possui três elementos coexistentes: “a representação da sociedade pelo poder de forma una, a representação da pluralidade social e a representação da maioria da comunidade no poder”. Assim, temos que, resumidamente, a representação social deve abarcar a todos de uma sociedade para que o máximo de vozes seja ouvido. Para Torres (1961) a representação é política é:

(...) aquela delegação que abrange a unidade espácio-temporal da comunidade nacional, não em seus interesses divergentes de opinião, classe, profissão ou região, mas, na plenitude de sua integridade e harmonia, unidade de dignidade, na identidade de propósitos de todos os cidadãos irmanados na mesma aspiração patriótica e na mesma fé nos destinos da coletividade nacional. Quem – pergunta finalmente – representará a Pátria, toda, inteira, perante o mundo, perante a história, perante o passado e o futuro? 

Nesse sentido, entende-se que a representação seria de caráter único, singular, representando as diferentes faces da sociedade de forma conjunta em uma amplitude maior e única, voltado à coletividade nacional. Daí a necessidade de haverem poderes no Estado que representem politicamente a sociedade. Porém, dentre os três poderes, apenas o Judiciário não é escolhido diretamente pela sociedade, através de voto, mas sim através de concursos públicos que analisam os conhecimentos e competências do magistrado, alguém que possui background capaz de ajudar na interpretação e melhor aplicação da Lei, produzida pelo Legislativo que, em tese, representa os anseios do povo.

Voltando à discussão sobre ativismo judicial, o judiciário, ou mais especificamente o STF “torna-se ativista quando manipula e modifica o alcance das interpretações das normas conforme sua própria concepção de moralidade pública, as quais afetam não apenas os agentes políticos, como a sociedade. ” (MARGRAF, 2015). O problema é enxergar a linha tênue entre a interpretação das normas, através da hermenêutica jurídica, e a interpretação pautada em concepções particulares ou pré-concebidas, ignorando a representação política. Ainda de acordo com Margraf (2015), o possível ativismo judicial exercido pelo Supremo Tribunal Federal era ignorado ou deixado de lado quando se tratava de assuntos única e exclusivamente atinentes à sociedade em si, não havendo descontentamento nem dos poderes Legislativos nem Executivos, mas isso mudou quando o Judiciário passou a afetar o funcionamento destes outros poderes, gerando discórdia e acusações de ativismo judicial.

O ativismo judicial está diretamente ligado à ideia de judicialização, que, segundo Barroso (2008):

Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo – em cujo âmbito se encontram o Presidente da República, seus ministérios e a administração pública em geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade. O fenômeno tem causas múltiplas. Algumas delas expressam uma tendência mundial; outras estão diretamente relacionadas ao modelo institucional brasileiro.

Enxerga-se então uma postura ativa advinda do poder Judiciário, ao interpretar a Constituição, havendo uma ampliação do sentido e importância, resultando na criação de um direito novo, não oriundo da forma tradicional de criação de direito, que é pelo Legislativo.

{C}3     {C}ADPF 132/ADI 4277: IGUALDADE E LIBERDADE

A Constituição Federal de 1988 nos traz diversos Direitos Fundamentais e se faz necessária uma discussão acerca dos direitos de grupos vulneráveis, como no caso estudado aqui, é muito necessário o debate e análise da estruturação política, jurídica e social dos homossexuais, levando-se finalmente à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 132 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 4277, depois de muita omissão do poder legislativo e da crescente necessidade do protagonismo do judiciário.

Este debate se faz necessário pela vontade de uma isonomia de direitos, atrelada à crescente vontade e anseio dos homossexuais de se fazerem ser ouvidos na sociedade e pela maior exposição pacífica dos mesmos. Sobre a comunidade homossexual e a sociedade brasileira, Oliveira (2010) nos diz que:

A comunidade gay representa um número que ultrapassa a casa dos 10 milhões de cidadãos em todo o Brasil. Isso tratando daqueles que se declaram homossexuais. Das classes baixas até as mais altas, temos casais que vivem e dividem o mesmo teto. Não é tão raro ver, hoje em dia, dos bairros simples, até os condomínios sofisticados, casais homoafetivos que levam uma vida como qualquer outro casal heterossexual.

Se o afeto é, assim, o regente das relações de família e, principalmente, por ele deve ser guiado o magistrado brasileiro no momento de verificação de um caso de família, não se deve diferenciar os casais brancos dos negros, ou pobres dos ricos, ou os casados dos que vivem em união estável, nem os homoafetivos dos heteroafetivos. Família é e vai ser sempre a base de formação de qualquer ser humano, seja ela firmada nas suas mais diferentes formas, numa dinâmica que lhe é própria.

É importante que se leve em consideração que os dados apresentados acima podem variar, ser maiores, tendo em vista que não se tem como dado aqueles que não se declaram homossexuais, assim, o grupo em questão representa uma parcela expressiva da sociedade ainda sem legítima eficácia de seus direitos. Dessa maneira, é notória a existência de interpretação do judiciário, sendo a ADPF 132 e ADI 4277 uma conquista disposta lentamente, uma vez que até no judiciário há a existência de incerteza na apuração de tais direitos, tendo como base o preconceito da sociedade e na insistência de se enraizar comportamentos e valores arcaicos da sociedade tradicional brasileira. Aos poucos, levando em consideração que tal matéria ainda não tem sua solução em definitivo, houve uma evolução no que concerne os direitos homoafetivos, sendo o judiciário brasileiro o grande palco das resoluções de conflitos, com ações ligadas à temática.

Isto posto, a ADPF 132 e ADI 4277 se caracterizam como referência histórica de uma luta dos homossexuais em busca da corroboração de direitos intrínsecos à sociedade. Sobre o assunto, Paulinho Filho (2014) nos mostra que:

O resultado da decisão e seus efeitos (...) são os reflexos de uma “enxurrada” de ações na busca de uma igualdade em relação a direitos e a busca de um mínimo existencial em relação a qualidade de vida por este grupo específico. A evolução doutrinária vem paralelamente a evolução da aceitação por parte do judiciário, bem verdade que a primeira se mostrou mais rápida e crescente nessa aceitação e incentivo, o que não retira a importância que a área jurídica desempenhou a passos lentos em relação à legitimação de direitos dos homossexuais.

Assim sendo, temos a figura do Legislativo se mostrando baseada e firmada pela omissão e ineficiência, o que justifica e apresenta o porquê de haver um crescimento considerável de ações no Judiciário referentes à consideração das uniões homoafetivas como sendo análogas às heteroafetivas, sendo levado ao judiciário a incumbência de resolver tal conflito que possui base política e claramente social.

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 178/DF foi ajuizada em 22 de julho de 2009, tendo por intento o reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. O pedido possuía fundamento no sentido de que, excluindo casais homoafetivos do conceito de entidade familiar se representaria uma ofensa aos preceitos fundamentais da ofensa à proibição de discriminação e aos princípios da igualdade, previstos na Constituição Federal. Tal Arguição foi recebida como uma Ação Direta de Inconstitucionalidade baseada na jurisprudência do Supremo. Logo, tal pedido foi reautuado como Ação Direta de Inconstitucionalidade e registrada sob o número 4.277, tendo como requerente o Procurador Geral da República versus o Presidente da República, visando às uniões estáveis homoafetivas a mesma proteção jurídica provida às uniões estáveis entre homens e mulheres pelo Código Civil, que diz, em seu art. 1723 que “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Resumidamente, o pedido de ambos versa sobre a técnica de interpretação constitucional do art. 1.723 do Código Civil de 2002, uma vez que há diferença entre texto normativo e norma jurídica, porque a norma jurídica não está expressamente no texto normativo, mas é parte da atividade de interpretação, o texto não possui consigo a norma jurídica, tal norma é formada através de enunciados linguísticos (MÜLLER, 2000).

Analisando a decisão, o Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 2011), ao analisar a proibição de discriminação das pessoas em razão do sexo, entendeu que a Carta Magna, em seu art. 3º, inciso IV, prevê "proteger o bem de todos" (BRASIL, 1988), autonomamente do sexo, ainda não havendo na Constituição Federal algo que determine o uso do sexo dos indivíduos, assim, não possuindo proibição legal. Ainda de acordo com a decisão (BRASIL, 2011), houve entendimento da corte, em se tratando do concito de família, que o tratamento constitucional da instituição Familiar não dispõe ao termo "família" nenhuma significação rigorosa ou até mesmo jurídica. Há um direito subjetivo de constituir uma família, não é uma interpretação reducionista. Reconhecer que as uniões homoafetivas são equiparadas à união estável é garantir segurança jurídica a estes indivíduos, de acordo com o Ministro Luiz Fux (BRASIL, 2011). O presente trabalho pretendia abordar minuciosamente cada uma das fundamentações da decisão proferida conjuntamente na ADPF 132/08 e ADI 4.277/09, mas por se tratar de um paper com laudas limitadas, nos limitaremos ao parágrafo supramencionado e partiremos ao (possível) ativismo judicial presente em tal decisão.

Levando em consideração que a decisão teve como base em suma Princípios Fundamentais, infere dizer que a decisão do STF se mostrou coesa por garantir proteção a direitos fundamentais mostrando eficácia nas normas constitucionais. Porém, apresentou uma desconfiança, por parte da doutrina e críticos juristas no que diz respeito à possível transposição de limites ao se expressar de forma ativista judicialmente ou até na judicialização da política. O jurista Luis Roberto Barroso (2008), apresenta uma grande proximidade entre ativismo judicial e judicialização da política “A judicialização e o ativismo judicial são primos. Vêm, portanto, da mesma família, freqüentam (sic) os mesmos lugares, mas não têm as mesmas origens. Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas.”. Assim, a Judicialização decorre do modelo constitucional que foi adotado, enquanto que o ativismo é uma postura do magistrado na atividade dos juízes, como já estudado no capítulo anterior.

Por conseguinte, apesar de o ativismo judicial ser visto de uma forma negativa, diante de um processo como o estudado aqui, os Ministros do STF não podem adotar uma postura voltada à concretização de princípios constitucionais se expressando de forma ativista, visto que assim estarão apresentando uma postura de visão emancipadora do Direito e tendo por grande objetivo a eficácia das normas constitucionais, sendo tal postura algo esperado pela Constituição aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, uma vez que lhes incube o poder de interpretes da Constituição, fazendo com que a mesma se mantenha eficaz e atual, se adequando aos fatos atuais da sociedade. De acordo com Barroso (2008), a Judicialização da Política é vista com bons olhos pelo mesmo, como pode-se notar:

É importante assinalar que em todas as decisões referidas acima, o Supremo Tribunal Federal foi provocado a se manifestar e o fez nos limites dos pedidos formulados. O Tribunal não tinha a alternativa de conhecer ou não das ações, de se pronunciar ou não sobre o seu mérito, uma vez preenchidos os requisitos de cabimento. Não se pode imputar aos Ministros do STF a ambição ou a pretensão, em face dos precedentes referidos, de criar um modelo juriscêntrico, de hegemonia judicial. A judicialização, que de fato existe, não decorreu de uma opção ideológica, filosófica ou metodológica da Corte. Limitou-se ela a cumprir, de modo estrito, o seu papel constitucional, em conformidade com o desenho institucional vigente. Pessoalmente, acho que o modelo tem nos servido bem. (BARROSO, 2008).

De acordo com Kelsen (2003), o papel da jurisdição constitucional é o de fazer a ponte entre o interesse das maiorias e das minorias, sem que isto implique em ofensa à democracia. Segundo ele, a democracia não pode ser entendida como a onipotência da maioria e o papel da jurisdição constitucional é o compromisso com a maioria e a minoria que, de tempos em tempos, se alterna sendo figura fundamental no equilíbrio entre elas. E, ainda, deste modo a jurisdição constitucional se opõe à ditadura da maioria, que não é menos perigosa que a ditadura da minoria.

Diante do exposto, é possível se concluir que o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, em 2011, ao julgar a ADPF 132/08 e a ADI 4.277/09 tem como pilar a judicialização da política, algo que não é de forma alguma negativo, mas necessário, e muito mesmo ser considerado ativismo judicial. Assim, os ministros decidiram de forma a afastar apenas a leitura do texto constitucional e do Códio Civil, fazendo uma interpretação à luz dos Princípios da Constituição e de interpretação da mesma, o que não poderia ser diferente.

4     CONCLUSÃO

O presente trabalho, ao longo dos capítulos expostos, teve por intento a apresentação dos motivos advindos da decisão do Supremo Tribunal Federal, votos proferidos no julgamento da ADPF 132 e ADI 4.277, em 2011, através do reconhecimento do tratamento jurídico igual aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, adequando-se à realidade social.

No primeiro capítulo se montou um plano de fundo para se falar do Poder Judiciário, bem como se conceituou o Ativismo Judicial. Apresentou-se também o conceito de judicialização, bem como demonstrou-se a preocupação advinda desta possível substituição do Poder Legislativo pelo Judiciário, onde o Legislativo não estava suprindo todas as necessidades do povo e sobrava para o Judiciário prover esse anseio da sociedade. Tal intervenção do judiciário trouxe a discussão acerca do princípio da separação dos poderes, bem como a falta de legitimidade do judiciário em promover um ativismo judicial, uma vez que não possui indicação através de voto legítimo para responder pelo anseio do povo.

No segundo capítulo adentrou-se na análise conjunta da ADPF 132/08 e ADI 4.277/09, onde houve uma discussão a respeito da interpretação do art. 1723 do Código Civil, que expressa o disposto no artigo 226 § 3º da Constituição Federal de 1988, que apresentavam taxativamente a União Estável como algo formado por homem e mulher apenas. O julgamento resultou na equiparação dos relacionamentos homoafetivos à união estável e possibilitou sua conversão em casamento. Houveram críticas doutrinárias acerca da possível Judicialização da Política e do Ativismo Judicial, mas se deve ter em mente que a Judicialização da política foi ensejada pelo modelo constitucional que adotamos, sendo de responsabilidade do Judiciário, mais especificamente o Supremo, de analisar lides. No caso o Supremo Tribunal Federals e mostrou ativista no sentido de dar ao texto legal uma interpretação baseada no texto Constitucional, garantindo efetividade de direitos fundamentais, não sendo possível que se considere tal ativismo algo ruim, mas racional, coerente e de acordo com o que é previsto pela Constituição Federal.

Por fim, é claro que não há democracia onde minorias estão sem direitos assegurados, desta forma, a interpretação dada ao artigo 1.723 do Código Civil a fim de equiparar uniões homoafetivas à união entre casais heterossexuais está de acordo com o que se busca com a Constituição de 1988, e ainda representa um respeito aos princípios de interpretação providos da mesma.

 

 

REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE, Diego Pablo Candeias de. Hermenêutica e reconhecimento da união homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal. 2011. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/hermenêutica-e-reconhecimento-da-união-homoafetiva-pelo-supremo-tribunal-federal>. Acesso em: 02 set. 2017.

 

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GARGARELLA, Roberto. A Justiça frente ao governo. Barcelona: Editorial Ariel, 1996.

 

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