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Ética medica e aspectos éticos jurídicos da recusa do paciente Testemunha de Jeová em receber sangue

Agenda 27/10/2021 às 14:20

Resumo: Atualmente muitos médicos recorrem as transfusões de sangue como tratamento primordial e seguro desrespeitando muitas vezes a vontade de seu paciente de recusar tal tratamento e procurar por um melhor. As Testemunhas de Jeová por dogmas religiosos que ferem sua consciência buscam tais tipos de tratamento visando um método que além de mais seguro que as transfusões de sangue respeite seu direito de escolha.

Palavras-chave: Transfusões de sangue. Ética Médica. Testemunhas de Jeová. Alternativas.


1. Introdução

Os Médicos enfrentam desafio crescente, que tem se tornado uma grande questão em debate sobre a saúde. Existem mais de meio milhão de Testemunhas de Jeová nos Estados Unidos (mais de 250.000 no Brasil) que não aceitam transfusões de sangue. O numero de Testemunhas, e dos que se reúnem com elas, vem aumentando.

Embora, antigamente, muitos médicos e autoridades hospitalares considerassem a recusa de uma transfusão um problema jurídico para administrar o tratamento que achavam ser clinicamente aconselhável, recentes publicações médicas revelam que tem ocorrido mudança de atitude. Tal se deve possivelmente a maior experiência no campo de cirurgia em pacientes com baixa taxa de hemoglobina, e pode ser que reflita também a crescente percepção do princípio legal de consentimento conscientizado.

1.1. Testemunhas de Jeová e posicionamento adotado

Religião estabelecida em 1870 por Charles Taze Russel junto de associados, que possuíam o nome de Estudantes da Bíblia, defende com base em princípios bíblicos a não existência de uma Trindade (baseiam-se nos textos de 1 Coríntios 08:06 que afirma a existência de um só Deus este sendo Jeová o Pai; e o texto de João 14:28 onde Jesus afirma ser menor que o Pai não podendo assim haver uma igualdade entre ele).

Consideram a Bíblia a Palavra de Deus e creem que seus 66 livros foram inspirados, estando historicamente corretos. Têm por base as Escrituras Hebraicas (Velho Testamento) e as Escrituras Gregas Cristãs (Novo Testamento), compreendendo-as em seu sentido literal, exceto quando as expressões ou o contexto obviamente indicam que o sentido é figurado ou simbólico.

Recebem o nome de Testemunhas de Jeová por darem testemunho acerca do Deus Todo Poderoso e Criador do Universo, ou seja, Jeová (nome omitido na maioria das Bíblias sendo substituído por títulos como Deus e Senhor) e por se basearem no texto bíblico de Isaías 43:10.

Hoje, são mais de 8 milhões de fiéis em mais de 240 países. Defendem a abstenção a participação político-administrativa governamental.

O Conselho de Anciãos existe em cada comunidade de Testemunha de Jeová, o qual também examina os casos de transgressão dos dogmas. Algumas decisões, evidentemente, são de cunho pessoal em não havendo proibição expressa.

As Testemunhas de Jeová aceitam tratamento médico e cirúrgico. Com efeito, há entre elas dezenas de médicos, e até mesmo cirurgiões. Mas as Testemunhas são pessoas profundamente religiosas e acreditam que a transfusão de sangue lhes é proibida por passagens bíblicas como estas: Somente a carne com a sua alma seu sangue não deveis comer. (Gênesis 9:3, 4); [Tendes] de derramar seu sangue e cobri-lo com pó (Levítico 17:13, 14); e: Que se abstenhamda fornicação, e do estrangulado, e do sangue (Atos 15:19-21).1

Embora estes versículos não estejam expressos em termos médicos, as Testemunhas consideram que proíbem a administração de transfusão de sangue total, de papas de hemácias, e de plasma, bem como de concentrados de leucócitos e de plaquetas. Entretanto, o entendimento religioso das Testemunhas não proíbe de modo absoluto o uso de componentes, como a albumina, as imunoglobulinas e os preparados para hemofílicos; cabe a cada Testemunha decidir individualmente se deve aceitar a esses. 2

As Testemunhas crêem que o sangue retirado do corpo deve ser inutilizado, de modo que não aceitam a autotransfusão de sangue retirado de antemão e guardado. As técnicas de coleta ou de hemodiluição intra-operatórias que envolvam guardar o sangue para ser reposto, lhes são inaceitáveis. Entretanto, muitas Testemunhas permitem o uso de equipamento de diálise, do coração-pulmão artificial (não se empregando sangue como volume de escorva), e o reaproveitamento intra-operatório, caso a circulação extracorpórea seja ininterrupta; o médico deve consultar o paciente sobre o que a consciência deste lhe dita. 2

As Testemunhas de Jeová portam um documento legalmente válido com diretrizes que proíbem que transfusões de sangue lhes sejam dadas, independentemente das circunstâncias. O documento é elaborado de acordo com as leis locais e contém a decisão pessoal do portador quanto a frações de sangue (hemoderivados), procedimentos envolvendo o uso do próprio sangue e outros assuntos de natureza médica. Em alguns lugares, a lei permite que o paciente também use esse documento para nomear um procurador, ou representante legal, autorizado a tomar decisões médicas ou a ser consultado em nome do paciente caso este esteja incapacitado de fazer isso.


2. O código de Ética medica

No entanto, tais posições podem gerar um conflito entre a consciência do paciente e a do médico. O artigo 56 do Código de Ética Médica muitas vezes tem sido citado para apoiar a ideia de que o médico pode desrespeitar as decisões feitas de antemão pelo paciente no que tange ao seu tratamento de saúde, e praticar um ato médico que o paciente considera impróprio para si, se o paciente estiver em iminente risco de vida.

A razão para essa desconsideração para com as crenças individuais, segundo alguns pensadores, seria a beneficência. Porém, Sprung e Eidelman escreveram que a "beneficência requer que o médico faça o que beneficiará o seu paciente, de acordo com a visão do paciente e não com a visão do médico".3 Nesse sentido,portanto, o respeito à autonomia e a beneficência contribui harmoniosamente pelo bem-estar do paciente como um todo.

Para algumas pessoas, contudo, talvez seja difícil acatar a recusa de um tratamento médico com base em princípios religiosos, pois pode parecer um ato de suicídio e, naturalmente, o suicídio é algo que dificilmente será aceito pela sociedade e pela Medicina.

Garizábal escreveu que atribuir a idéia de suicídio aos casos de recusa de transfusões de sangue é fruto duma "confusão". Ele escreve: "O mero fato de recusar um tratamento não pode ser considerado como uma maneira de morrer. O suicida que deseja morrer (...) cumpre a decisão de acabar voluntariamente com a vida. Ao contrário, e por fidelidade à sua consciência, abster-se de usar um meio curativo não significa a intenção de matar-se. Sua vontade é outra".4 Na verdade, ao escolher tratamento isento de sangue, as Testemunhas de Jeová não estão exercendo o direito de morrer, mas o direito de escolher a que tipo de tratamento se submeterão.

Inúmeros relatórios de grandes operações feitas em pacientes que são Testemunhas mostram que muitos médicos podem, em boa consciência e com êxito, ajustar-se à solicitação de que não se use sangue. Por exemplo, em 1981, Cooley analisou 1.026 operações cardiovasculares, 22% delas feitas em menores de idade. Ele decidiu que o risco da cirurgia em pacientes do grupo das Testemunhas de Jeová não tem sido significativamente maior do que no caso de outros.5 Kambouris 6 fez uma comunicação sobre grandes operações em Testemunhas, a algumas das quais se havia negado tratamento cirúrgico urgentemente necessitado, devido à sua recusa em aceitar sangue. Disse ele: Todos os pacientes obtiveram garantias antes do tratamento de que suas crenças religiosas seriam respeitadas, não importando as circunstâncias da sala de cirurgia. Esta diretriz não produziu resultados desfavoráveis.

Quando o paciente é Testemunha de Jeová, além da questão de decisão, entra em cena a consciência. Não se pode pensar apenas na consciência do médico. Que dizer da do paciente? As Testemunhas de Jeová encaram a vida como uma dádiva de Deus, representada pelo sangue. Elas crêem no mandamento da Bíblia, de que os cristãos têm de abster-se de sangue (Atos 15:28, 29). 7Assim sendo, caso um médico violasse paternalisticamente tais convicções religiosas profundas, e bem antigas, do paciente, o resultado poderia ser trágico. O Papa João Paulo II tem comentado que obrigar alguém a violar sua consciência é o golpe mais doloroso infligido à dignidade humana. Em certo sentido, é pior do que infligir a morte física, ou matar.8

2.1. Consentimento esclarecido

Para que o paciente tenha condições de decidir se um tratamento médico é aceitável segundo o seu próprio plano de vida, se baseando em crenças, aspirações e valores próprios, ele precisa ser corretamente informado das intenções e recomendações de seu médico e ter uma visão clara de como tais recomendações afetam seus próprios valores. Então, é dada ao paciente a possibilidade de consentir ou não no tratamento proposto.

Segundo Segre 9, o consentimento esclarecido (ou informado) é uma expressão do "ato autônomo". Este ato é caracterizado como "uma decisão, e um ato, sem restrições internas ou externas, com tanta informação quanto o caso exige, e de acordo com a avaliação feita por uma pessoa no momento de tomar a decisão".

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O consentimento esclarecido está na pauta das discussões sobre ética médica na atualidade e o propósito de se requerer este consentimento é o de promover a autonomia do indivíduo na tomada de decisões com relação a assuntos de saúde e tratamento médico. O direito de consentir ou recusar está baseado no princípio do respeito à autonomia. Para o consentimento ser uma autorização válida, ele deve ser baseado na compreensão e ser voluntário.10

A doutrina do consentimento esclarecido é, na verdade, uma doutrina jurídica que apóia muitos dos nossos ideais sobre direitos individuais. Mas a ênfase indevida nas suas origens e funções jurídicas pode encobrir o fato de que o consentimento esclarecido não é meramente um conceito jurídico, mas também e sobretudo ético e moral.

Na tomada de decisão em conjunto quanto a que tipo de tratamento um paciente receberá, ou se é que receberá algum tratamento, o papel do médico será o de explicar as várias opções de diagnóstico ou tratamento que existem para aquele caso e os riscos e benefícios de cada uma delas. Um "padrão subjetivo" requer do médico uma abordagem informativa apropriada a cada indivíduo.11 As informações partilhadas devem incluir, mas não se limitar a objetivos diagnósticos e terapêuticos, os riscos envolvidos no procedimento, alternativas existentes e possibilidades de êxito do tratamento.Transfusões de sangue são realmente seguras?

Milhões de pessoas já doaram sangue ou o aceitaram. Em 1986-87, o Canadá, com uma população de 25 milhões, teve 1,3 milhão de doadores. [No] ano mais recente de que dispomos de estatísticas, de 12 a 14 milhões de unidades de sangue foram usadas em transfusões, apenas nos Estados Unidos. The New York Times, 18 de fevereiro de 1990.

Mesmo há 30 anos, os patologistas e as equipes dos bancos de sangue foram aconselhados: O sangue é como dinamite! Pode trazer muitos benefícios ou muitos malefícios. A taxa de mortalidade resultante da transfusão de sangue equivale à da anestesia com éter ou à da apendicectomia. Diz-se que há aproximadamente uma morte em cada 1.000 a 3.000, ou, possivelmente, 5.000 transfusões. Na área de Londres, informa-se haver uma morte para cada 13.000 frascos de sangue transfundido. Revista New York State Journal of Medicine,de 15 de janeiro de 1960. No começo do século 20, os cientistas aprofundaram o entendimento do homem sobre a complexidade do sangue. Ficaram sabendo que existem diferentes tipos sanguíneos.

Compatibilizar o sangue do doador com o sangue do paciente é algo necessário nas transfusões. Se alguém com sangue do tipo A receber o do tipo B, poderá apresentar grave reação hemolítica. Esta pode destruir muitas hemácias e matá-lo rapidamente. Ao passo que a classificação do tipo sanguíneo e os testes de compatibilização são agora uma rotina, ainda acontece erros.

Os fatos mostram que a questão da incompatibilidade vai muito além o Dr. Douglas H. Posey Jr., em seu artigo Transfusão de Sangue: Usos, Abusos e Riscos, declara: Há cerca de 30 anos, Sampson descreveu a transfusão de sangue como um procedimento relativamente perigoso[Desde então] pelo menos 400 antígenos adicionais das hemácias foram identificados e caracterizados. Não resta dúvida de que tal número continuará a aumentar, porque a membrana da hemácia é tremendamente complexa. Revista Journal of the National Medical Association, de julho de 1989.

Há cientistas que estudam atualmente os efeitos do sangue transfundido sobre o sistema de defesa, ou imunitário, do corpo. Quando os médicos realizam um transplante de coração, do fígado, ou de outro órgão, o sistema imunológico do receptor pode detectar a presença do tecido estranho, e rejeitá-lo. Todavia, uma transfusão é um transplante de tecido. Mesmo o sangue que tenha sido devidamente compatibilizado pode causar a supressão do sistema imunológico. Numa conferência de patologistas, destacou-se o ponto que centenas de comunicados médicos têm relacionado as transfusões de sangue com as reações imunológicas. Artigo Aumentam os Argumentos Contra as Transfusões, revista Medical World News, de 11 de dezembro de 1989

Uma tarefa básica pertencente ao seu sistema imunológico é defendê-lo das infecções. Assim, é compreensível que alguns estudos mostrem que os pacientes que recebem sangue são mais propensos à infecção. O Dr. P. I. Tartter promoveu um estudo de cirurgias colorretais. Dentre os pacientes que receberam transfusões, 25 por cento contraíram infecções, em comparação com 4 por cento dos que não receberam nenhuma transfusão. Ele comunica: As transfusões de sangue estavam ligadas a complicações infecciosas quando ministradas na fase pré-, intra- ou pós-operatóriaO risco duma infecção pós-operatória aumentava progressivamente conforme o número de unidades de sangue ministradas. (Revista The British Journal of Surgery, de agosto de 1988)

Médicos conscienciosos e muitos pacientes estão preocupados com as doenças veiculadas pelo sangue depois de considerar as doenças mais conhecidas, o livro Techniques of Blood Transfusion (Técnicas da Transfusão de Sangue; 1982) considera outras moléstias infecciosas associadas às transfusões, tais como a sífilis, a infecção por citomegalovírus e a malária. Daí, ele diz: Várias outras doenças também têm sido comunicadas como sendo transmitidas pela transfusão de sangue, inclusive infecções com o vírus do herpes, a mononucleose infecciosa (vírus de Epstein-Barr), a toxoplasmose, a tripanossomíase [doença do sono africana e a doença de Chagas], a leishmaniose, a brucelose [febre ondulante], o tifo, a filariose, o sarampo, a salmonelose, e a febre de carrapatos do Colorado.

Um segundo motivo de preocupação é que o sangue coletado em um país em que prolifere determinada doença pode ser usado em local bem distante, onde nem o público nem os médicos estão alertas a seus perigos. Com o aumento das viagens tem se aumentado o risco de um produto de sangue conter uma doença estranha em decorrer de tal fato um infectologista avisou: Os estoques de sangue talvez precisem ser submetidos a testes de detecção, para impedir a transmissão de várias moléstias que não eram, anteriormente, consideradas infecciosas, inclusive a leucemia, o linfoma e a demência [ou mal de Alzheimer]. Periódico Transfusion Medicine Reviews, de janeiro de 1989.

Embora tais risco causem grande temor na sociedade outros tem gerado muito mais medo como por exemplo a contaminação com o vírus da hepatite. Os médicos há muito sabem que uma forma mais branda de hepatite (tipo A) é transmitida por alimentos ou águas contaminados. Daí, eles discerniram que uma forma mais grave espalhava-se por meio do sangue, mas eles não dispunham de nenhum teste para detectá-la no sangue. Por fim, cientistas brilhantes aprenderam a detectar pegadas deste vírus (tipo B). Já no início da década de 70, alguns países realizavam testes sanguíneos preventivos. Não demorou muito para ficar claro que milhares que tinham recebido sangue aprovado nesses testes ainda contraíam hepatite. Muitos, depois de uma doença debilitante, ficaram cônscios de que seus fígados estavam lesados. Mas, se o sangue tinha sido testado, por que isto estava acontecendo? O sangue continha outra forma, chamada de hepatite não-A, não-B (sigla em inglês, NANB). Durante uma década, ela assolou as transfusões entre 8 e 17 por cento dos transfundidos na Espanha, nos Estados Unidos, em Israel, na Itália e na Suécia a contraíram. Em abril de 1989, o público foi informado de que estava então disponível um teste para a NANB, agora chamada de hepatite C para a infelicidade de todos, pesquisadores italianos comunicaram ter encontrado outro vírus da hepatite, um mutante, que poderia ser responsável por um terço dos casos. Algumas autoridades, comentou o boletim Harvard Medical School Health Letter (de novembro de 1989), preocupam-se de que o A, o B, o C, e o D não sejam todo o alfabeto dos vírus da hepatite; ainda podem aflorar outros. O jornal The New York Times (13 de fevereiro de 1990) declarava: Os peritos têm fortes suspeitas de que outros vírus possam causar a hepatite; se descobertos, eles serão designados hepatite E, e assim por diante.

Citando o problema de custos, um dos diretores da Cruz Vermelha Americana teceu o seguinte comentário perturbador: Simplesmente não podemos continuar a adicionar teste após teste para cada agente infeccioso que poderia ser disseminado. Revista Medical World News, de 8 de maio de 1989.

Mesmo o teste para a hepatite B é falível; muitos ainda a contraem através do sangue. Ademais, ficarão as pessoas satisfeitas com o anunciado teste para a hepatite C? A revista The Journal of the American Medical Association(5 de janeiro de 1990) mostrava que pode passar um ano antes que os anticorpos da doença sejam detectáveis por meio desse teste. Neste ínterim, as pessoas que receberem transfusões desse sangue poderão enfrentar fígados lesados e a morte.


3. O sangue submetido ao teste de HIV é seguro?

Tal questão surgiu na Nigéria quando uma recém-nascida adquiriu a doença por ter recebido uma transfusão de sangue em um dos hospitais mais importante do país.

De acordo com o diretor-médico do hospital, a menina apresentou icterícia logo após seu nascimento. Uma exsanguineotransfusão foi prescrita, e o pai doou algumas unidades de sangue que foram incompatíveis com o da garota, devido a tal fato administrou-se sangue do banco de sangue do hospital. Não demorou muito e constatou-se que o bebê tinha HIV, embora o teste do país desse negativo. Segundo o hospital, na época da transfusão, o sangue havia sido examinado e considerado soronegativo para HIV.

Então, como é que o bebê foi infectado? O governo nigeriano investigou a controvérsia e concluiu que a possível fonte da infecção foi o sangue transfundido. O jornal Nigerian Tribune citou um virologista que disse: Quando o sangue foi doado, o doador estava no período da janela imunológica da infecção por HIV.

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças, dos Estados Unidos, descreveram a janela imunológica do HIV da seguinte forma: Pode levar algum tempo para que o sistema imunológico produza anticorpos suficientes para serem detectados pelo teste de anticorpos, e esse tempo pode variar de pessoa para pessoa. Esse período costuma ser chamado janela imunológica. A maioria das pessoas desenvolve anticorpos detectáveis entre duas e oito semanas (a média é 25 dias). Mesmo assim, é possível que alguns demorem ainda mais a desenvolver anticorpos detectáveis. Em casos bem raros, pode levar até 6 meses.

Portanto, o fato de o sangue ter sido testado contra o HIV não garante que seja seguro.

Alternativas para a transfusão12

Embora a maioria dos cirurgiões afirme só ter dado sangue quando isso era absolutamente necessário, diminuiu rapidamente o emprego de sangue, por parte deles, depois que surgiu a epidemia de AIDS. Um editorial do periódico Mayo Clinic Proceedings (setembro de 1988) dizia que um dos poucos benefícios da epidemia foi que resultou em várias estratégias por parte dos pacientes e dos médicos para evitar a transfusão de sangue. Um dirigente de banco de sangue explica: O que deveras mudou foi a intensidade da mensagem, a receptividade dos clínicos à mensagem (por causa da maior percepção dos riscos), e a demanda para que se considerassem as alternativas. Periódico Transfusion Medicine Reviews, de outubro de 1989.

Observe que existem alternativas! Isto se torna compreensível quando examinamos os motivos pelos quais se transfunde sangue.

A hemoglobina contida nos glóbulos vermelhos transporta o oxigênio necessário para a boa saúde e a vida. Assim, caso uma pessoa tenha perdido muito sangue, pareceria lógico apenas repô-lo. Normalmente, dispõe-se de cerca de 14 ou 15 gramas de hemoglobina em cada 100 centímetros cúbicos de sangue. (Outra forma de medir sua concentração é o hematócrito, que comumente é de cerca de 45 por cento.) A regra aceita era de transfundir um paciente antes duma operação se sua taxa de hemoglobina fosse inferior a 10 (ou um hematócrito de 30 por cento). A revista suíça Vox Sanguinis (março de 1987) noticiou que 65% dos [anestesiologistas] exigiam que os pacientes tivessem uma taxa pré-operatória de hemoglobina de 10 g/dL para a cirurgia eletiva.

Mas, numa conferência sobre a transfusão de sangue, realizada em 1988, o Professor Howard L.Zauder perguntou: Como Foi que Obtivemos um Número Mágico? Ele declarou expressamente: A etiologia dessa exigência de que o paciente deva ter 10 gramas de hemoglobina (Hgb) antes de receber anestesia está envolta em tradição, está revestida de obscuridade e não é comprovada por evidência clínica ou experimental. Imagine só os muitos milhares de pacientes submetidos a transfusões que foram motivadas por uma exigência obscura, não comprovada!

Alguns talvez fiquem imaginando: Por que será que um nível 14 de hemoglobina é normal, se a pessoa consegue passar com muito menos? Bem, a pessoa dispõe assim de considerável reserva da capacidade de transporte de oxigênio, de modo que esteja pronta para algum exercício ou trabalho pesado. Estudos feitos de pacientes anêmicos até mesmo revelam que é difícil detectar um déficit na capacidade de trabalho, com concentrações de hemoglobina tão baixas quanto 7 g/dL. Outros têm encontrado evidência de apenas uma moderada redução do desempenho. Contemporary Transfusion Practice (A Prática Transfusional Contemporânea), 1987.

Enquanto que os adultos se ajustam a uma baixa taxa de hemoglobina, que dizer das crianças? O Dr. James A. Stockman III diz: Com poucas exceções, os bebês prematuros apresentarão um declínio da hemoglobina do primeiro ao terceiro mêsAs indicações de transfusão no berçário não estão bem definidas. Deveras, muitos bebês parecem tolerar níveis notavelmente baixos de concentração de hemoglobina, sem nenhuma dificuldade clínica aparente. Revista Pediatric Clinics of North America, de fevereiro de 1986.

Tais informações não significam que não se precisa fazer nada quando uma pessoa perde muito sangue num acidente, ou numa operação. Caso a perda seja rápida e acentuada, cai a pressão arterial da pessoa, e ela pode entrar em choque. O que se precisa basicamente é que se faça cessar a hemorragia e se restaure o volume do sistema circulatório. Isso impedirá o choque e manterá em circulação as restantes hemácias e outros componentes do sangue.

A reposição do volume do plasma pode ser conseguida sem se usar sangue total ou plasma sanguíneo.* Diversos líquidos que não contêm sangue constituem eficazes expansores do volume do plasma. O mais simples de todos é a solução salina, que é tanto barata como compatível com o nosso sangue. Existem também líquidos dotados de propriedades especiais, tais como a dextrana, o Haemaccel, e a solução de lactato de Ringer. A hidroxietila de amido (HES; amido-hidroxietil) é um mais recente expansor do volume do plasma e pode ser seguramente recomendado para aqueles pacientes [queimados], que objetem a produtos de sangue. (Journal of Burn Care & Rehabilitation, janeiro/fevereiro de 1989) Tais líquidos apresentam vantagens definitivas. Soluções cristalóides [tais como a solução salina normal e o lactato de Ringer], o Dextran e o HES são relativamente atóxicos e baratos, prontamente disponíveis, podem ser estocados à temperatura ambiente, não exigem testes de compatibilidade e estão isentos do risco de doenças transmitidas pela transfusão. Blood Transfusion TherapyA Physicians Handbook (A Terapia da Transfusão de Sangue Manual do Médico), de 1989.

Talvez pergunte, porém: Por que funcionam bem os líquidos de reposição não-sanguíneos, uma vez que eu preciso de glóbulos vermelhos para fazer com que o oxigênio seja transportado por todo o meu corpo? Conforme mencionado, a pessoa dispõe de reservas para o transporte de oxigênio. Caso perca sangue, acionam-se maravilhosos mecanismos compensatórios. Seu coração bombeia mais sangue em cada batimento. Visto que o sangue perdido foi substituído por um líquido adequado, o sangue agora diluído flui mais facilmente, mesmo nos pequenos vasos. Em resultado de mudanças químicas, mais sangue é liberado para os tecidos. Estas adaptações são tão eficazes que, se somente a metade de suas hemácias permanecerem, o transporte de oxigênio poderá ser até cerca de 75 por cento do normal. Um paciente em repouso utiliza apenas 25 por cento do oxigênio disponível em seu sangue. E a maioria dos anestésicos reduz a necessidade de oxigênio do corpo.

Os médicos também podem ajudar seus pacientes a formar mais glóbulos vermelhos. Como? Por lhes darem concentrados de ferro (no músculo ou na veia), que podem ajudar o corpo a produzir glóbulos vermelhos três a quatro vezes mais rápido do que o normal. Recentemente, outra ajuda tornou-se disponível. Seus rins produzem um hormônio chamado eritropoietina (EPO), que estimula a medula óssea a produzir hemácias. Acha-se agora disponível a EPO sintética (recombinante). Os médicos podem ministrá-la a alguns pacientes anêmicos, ajudando-os assim a produzir mui rapidamente os glóbulos vermelhos de reposição.

Mesmo no decorrer duma cirurgia, cirurgiões e anestesiologistas peritos e conscienciosos podem ser de ajuda por empregar métodos avançados de conservação do sangue. Nunca é demais enfatizar o uso de técnicas operatórias meticulosas, tais como o bisturi elétrico para minimizar a hemorragia. Às vezes é possível aspirar e filtrar o sangue que flua em um ferimento, repondo-o depois em circulação.

Pacientes num aparelho coração-pulmão, tendo como volume de escorva um líquido isento de sangue, podem beneficiar-se da hemodiluição resultante, perdendo menos glóbulos vermelhos.

E existem outros meios de ajudar. Resfriar um paciente, para reduzir suas necessidades de oxigênio durante a cirurgia. A anestesia hipotensiva. A terapia para melhorar a coagulação sanguínea. A desmopressina (sigla em inglês, DDAVP) para abreviar o tempo de sangramento. Os bisturis a laser. Verá essa lista aumentar, à medida que os médicos, bem como os pacientes preocupados, procuram evitar as transfusões de sangue. Esperamos que o leitor jamais perca grande quantidade de sangue. Mas, se perder, é bem provável que médicos peritos consigam cuidar de seu problema sem usar transfusões de sangue, que apresentam tantos riscos.

O artigo Grande Substituição Quádrupla da Articulação em Membro das Testemunhas de Jeová (Orthopaedic Review, agosto de 1986) falou de um paciente anêmico em adiantado estado de degeneração, tanto dos joelhos como dos quadris. Utilizou-se a dextrana ferrosa antes e depois da cirurgia, feita por etapas, que teve êxito. A revista British Journal of Anaesthesia (1982) noticiou a respeito duma Testemunha de 52 anos, com taxa de hemoglobina inferior a 10. Empregando-se a anestesia hipotensiva para minimizar a perda de sangue, ela recebeu uma prótese total do quadril e do ombro. Uma equipe cirúrgica da Universidade de Arkansas (EUA) também empregou esse método em cem substituições do quadril de Testemunhas e todos os pacientes se recuperaram. O professor que dirige esse departamento comenta: O que aprendemos destes pacientes (Testemunhas), empregamos agora em todos os nossos pacientes em que fazemos a prótese total do quadril.

A neurocirurgia (operação do cérebro) sem o emprego de sangue tem sido realizada em numerosos adultos e crianças, por exemplo, no Centro Médico da Universidade de Nova Iorque, EUA. Em 1989, o Dr. Joseph Ransohoff, chefe do departamento de neurocirurgia, escreveu: Está bem claro que, na maioria dos casos, evitar produtos que contenham sangue pode ser conseguido com um risco mínimo para os pacientes que têm princípios religiosos contra o uso de tais produtos, especialmente se a cirurgia puder ser realizada de forma expedita e com tempo operatório relativamente curto. De considerável interesse é o fato de que eu muitas vezes esqueço que o paciente é Testemunha até a hora de lhe dar alta hospitalar, quando eles me agradecem por eu ter respeitado suas crenças religiosas.


Conclusão

Com base no artigo exposto acima pode-se perceber que as Testemunha de Jeová não querem como resultado de sua recusa, pela transfusão de sangue, a morte mas sim buscam outras alternativas que trarão menos riscos para sua saúde e que além de serem mais benéficas respeitarão seus valores religiosos, tais valores não podem ser desconsiderados ou minimizados por outrem, sobretudo pelos profissionais de saúde, a despeito dos melhores e mais sinceros interesses destes profissionais. Certamente, os profissionais de saúde estarão agindo dentro dos limites da ética médica ao respeitar as crenças religiosas de seus pacientes, provendo-lhes tratamento médico compatível com tais crenças.


Referências Bibliográficas

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Tópico tirado inteiramente do site jw.org no link: https://www.jw.org/pt/publicacoes/livros/como-pode-o-sangue/Alternativas-de-qualidade- para-a-transfus%C3%A3o/

Site Jw.org nos links:

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Periódico Transfusion Medicine Reviews, de janeiro de 1989

Techniques of Blood Transfusion (Técnicas da Transfusão de Sangue; 1982)

Artigo A Ética Médica e o respeito as Crenças Religiosas de Zelita da Silva Souza e Maria Isabel Dias Miorim de Moraes

Artigo Aspectos Éticos e Jurídicos da recusa do paciente Testemunha de Jeová em receber transfusão de sangue de Tereza Rodrigues Vieira

Revista The British Journal of Surgery, de agosto de 1988

Revista Medical World News, de 11 de dezembro de 1989

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Revista New York State Journal of Medicine,de 15 de janeiro de 1960.

The New York Times, 18 de fevereiro de 1990.

Algumas paginas do livro Direito Médico do doutrinador Genival Veloso de França


Abstract: Currently, many doctors resort to blood transfusions as a primary and safe treatment, often disrespecting their patient's will to refuse such treatment and look for a better one. Jehovah's Witnesses, because of religious dogmas that hurt their conscience, seek such types of treatment aiming at a method that, in addition to being safer than blood transfusions, respects their right to choose.

Keywords: Blood transfusions. Medical Ethics. Jehovah's Witnesses. Alternatives.

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