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Liberdade de expressão e discurso de ódio nas redes sociais

RESUMO

No cenário político atual, o direito à liberdade de expressão não é um privilégio e sim um direito fundamental. Com o objetivo de prover a necessária proteção contra a repressão governamental, a maior parte dos governos democráticos confere a sua população esse direito. Entretanto, algo que acontece de forma recorrente é a pouca ou nenhuma regulamentação no âmbito da rede mundial de computadores, deixando nas mãos das próprias plataformas, onde o conteúdo é produzido, a regulamentação do que pode ser introduzido no sistema. O propósito deste artigo é justamente analisar a limitada regulamentação sobre esse direito e quais os seus limites definidos em lei. É uma pesquisa qualitativa e bibliográfica, sob a luz da Constituição Federal de 1988, que resultou no encontro do efetivo limite à liberdade de expressão.

PALAVRAS-CHAVE

Liberdade de Expressão. Discurso de ódio. Choque de Princípios Fundamentais.

ABSTRACT

In the existing political context, freedom of speech isn't a privilege, but rather a fundamental human right. In order to provide the necessary protection from government repression, most democratic governments afford most of their population this freedom. However, something that happens rather frequently is the existence of little to no regulamentation in the scope of th2e world wide web, leavingit in the hands of the platforms themselves, where the content is created, the regulamentation of what can be introduced in the system. The purpose of this article

is precisely the analysis of the limited regulamentation about that freedom, and what the law defines as its limits. Its a qualitative and bibliographic research, under the scope of the Federal Constitution of 1988, that resulted in the discovery of the effective limits of the freedom of speech.

KEYWORDS

Freedom of Speech. Hate Speech. Clash of Fundamental Principles.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa abordar a liberdade de expressão e o discurso de ódio. O primeiro refere-se ao direito que permite às pessoas expressarem suas opiniões sem medo de represálias. Autoriza, similarmente, o recebimento e a transmissão das informações por variados meios, de forma independente e sem censura, ou seja, significa o direito de expressar opinião pessoal ou coletiva, sempre com respeito e amparada pela veracidade das informações.

Já o discurso de ódio, também chamado de hate speech, refere-se a palavras que tendam a insultar, intimidar ou assediar pessoas em virtude de sua raça, cor, etnicidade, nacionalidade, sexo ou religião, ou que têm a capacidade de instigar a violência, ódio ou discriminação contra tais pessoas. (Brugger, 2007, p.2)

A principal finalidade da liberdade de expressão é o seu desempenho como instrumento da soberania popular para construir e manter um autogoverno democrático, por exemplo, ao contribuir para informar os eleitores e garantir um racional debate público, conforme disse James Madison. (Edward G. Hudon, Imprensa e liberdade, p. 22, 1965)

O objetivo geral deste projeto é analisar o choque de princípios e direitos fundamentais de liberdade e os específicos são: estudar os fundamentos da liberdade de expressão na qualidade de direito individual e coletivo; identificar quais os limites da liberdade de expressão de acordo com a CF/88; e, por fim, entender a repercussão negativa da liberdade de expressão que incentiva o discurso de ódio, pois com esse estudo será possível conceber respostas a respeito do tema sob a luz da Carta Magna, fonte principal do direito.

Neste trabalho existem dois problemas de pesquisa: qual o limite da liberdade de expressão? Essa liberdade é efetivamente um direito individual ou coletivo? Acredita-se que o presente problema tem como hipótese o seguinte: o limite da liberdade de expressão é, na realidade, os direitos de personalidade do outro. A segunda hipótese é que a liberdade de expressão tem uma dimensão individual e uma dimensão social.

Este projeto se tratará de uma pesquisa de natureza qualitativa, de cunho bibliográfico e documental. O primeiro capítulo tratará dos fundamentos da liberdade de expressão na qualidade de direito individual e coletivo; já o segundo, tratará dos limites da liberdade de expressão segundo a CF/88; e, por fim, o terceiro tratará da repercussão negativa da liberdade de expressão que incentiva o discurso de ódio.

Espera-se que este trabalho auxilie com uma melhor compreensão do tema, de forma concisa, e esteja disponível para consumo fora do mundo acadêmico, devido à sua relevância.

O direito de poder expressar opiniões e ideias é, de longe, um dos grandes avanços da humanidade, os indivíduos de uma sociedade, tendo liberdade de utilizar de atos de fala, de maneira livre, são capazes de socializar seus pontos de vista, refletirem, tornarem-se seres críticos, possibilitando, assim, o desenvolvimento de uma sociedade livre e democrática.

A liberdade de expressão é um direito reconhecido pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em todas as suas modalidades - liberdade de manifestação do pensamento, de expressão artística, de ensino e pesquisa, de comunicação e informação e expressão religiosa - e garante que os cidadãos possam expressar suas opiniões, divulgar fatos, bem como compartilhá-los, também garantindo que veículos de imprensa exerçam o seu papel informativo sem sofrerem censura, como já aconteceu no país em tempos passados.

A Constituição brasileira de 1988 foi elaborada após o fim da ditadura militar no Brasil, período este que foi marcado por um momento de supressão de direitos, inclusive o direito à liberdade, e a censura era algo comum. Com o fim da ditadura militar e a elaboração de uma nova constituinte, esta cuidou de assegurar os direitos que foram previamente impedidos de prosperar, inclusive a liberdade de expressão. E, ao consagrar o direito à liberdade de expressão em sua constituição vigente, o Brasil está alinhado com demais países democráticos. Tôrres explica que:

Na ordem jurídica contemporânea, a liberdade de expressão consiste, em sentido amplo, num conjunto de direitos relacionados às liberdades de comunicação, que compreende: a liberdade de expressão em sentido estrito (ou seja, de manifestação do pensamento ou de opinião), a liberdade de criação e de imprensa, bem como o direito de informação (2013, p. 62).

É um direito reconhecido por diversos textos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 que, em seu art.19, destaca que a liberdade de opinião e expressão é um direito de todos os indivíduos. O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em seu art. 19, trata da liberdade de expressão, sendo ratificado pelo Brasil no ano de 1992, e, ainda, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que em seu art.13 trata da liberdade de pensamento e expressão, convenção esta que também foi ratificada pelo Brasil em 1992. Assim como os documentos supracitados, diversos outros documentos garantem a liberdade de expressão.

Segundo Freitas e Castro (2013), uma das primeiras aspirações na modernidade (século XVIII), no que se refere à dignidade humana, foi a afirmação da liberdade como valor essencial à condição humana. Um espaço sem ingerência de terceiros, de modo a garantir a qualquer indivíduo a realização de seus próprios objetivos, sem o dever de obediência a outrem. Naturalmente, a consciência da liberdade como um poder de autodeterminação necessário à dignidade do ser humano é contemporânea às concepções ideológicas liberais do século XVIII, marcadas pela afirmação da burguesia frente ao absolutismo da monarquia de então. É importante ressaltar que a liberdade para os gregos era unicamente a prerrogativa conferida aos cidadãos de participar das decisões políticas e nisso diferenciava-se do liberalismo clássico. (COULANGES, 1971).

Para Silveira (2007), a liberdade de expressão se constitui como uma ferramenta para a legitimidade dos poderes, funcionando como um verdadeiro termômetro da democracia em determinada sociedade, já que se trata de um elemento essencial para o seu exercício. Portanto, é um direito que é indissociável da democracia, já que em um Estado considerado como Democrático de Direito, a liberdade deve ser garantida em suas mais diversas esferas e devem ser garantidas e respeitadas as mais diversas visões acerca do mundo vivido, mesmo que essas visões sejam minoritárias.

A autora alinha-se com a teoria propugnada por Owen Fiss (2005), denominada de posição intermediária, segundo a qual a fixação dos limites da liberdade de expressão exige uma análise que harmonize a garantia da autonomia individual e a promoção do debate democrático, ou seja, o exame deve envolver tanto o aspecto defensivo quanto o protetivo do direito fundamental da liberdade de expressão. Ela não pode ser dissociada dos demais direitos fundamentais, em especial dos direitos sociais, pois estes dão amparo fático ao direito fundamental da liberdade de expressão e asseguram sua efetividade.

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A liberdade de expressão e comunicação é um direito fundamental subjetivo, uma vez que visa garantir a autorrealização da dignidade da pessoa humana, bem como autoriza instituições a veicularem informações em massa, garantido, ainda, a liberdade de receber, emitir e compartilhar informações verídicas sem que haja impedimentos (FARIAS, 2001), isto é, o direito à liberdade de expressão apresenta uma dualidade, já que é um direito individual e também coletivo. Ainda segundo Farias:

O caráter dual dos direitos fundamentais diz respeito à dupla natureza ou função dos mesmos. Quer isso significar que, além da função subjetiva de proteger a pessoa humana nas relações representadas por posições ou status jurídicos, os direitos fundamentais possuem uma função objetiva: constituem um valor objetivo para a comunidade independentemente de sua função subjetiva (2001, p. 30).

Do ponto de vista individual, tem-se o direito à liberdade de expressão, que visa garantir que os cidadãos possam se expressar de maneira livre, desde que não venham a ferir outros direitos fundamentais, e, assim, sejam capazes de construir uma sociedade democrática em que há o respeito às mais diversas opiniões, crenças etc. Já do ponto de vista coletivo, o direito à liberdade visa garantir que meios de comunicação possam veicular informações, opiniões, notícias, bem como grupos organizados também possam se valer da liberdade de expressão para disseminação de suas ideias. A finalidade é que a população tenha acesso à veracidade de fatos e, assim, tenha condições de construção de suas opiniões individuais.

Observa-se que a liberdade, quanto ao seu conteúdo, caracteriza-se por não haver submissão a outrem, no fato de não estar sob o controle de terceiros e de não sofrer restrições impositivas, venham elas do Estado ou de outro indivíduo. Verifica- se, portanto, uma inequívoca conotação de restrição dirigida a todos em sociedade, assegurando ao indivíduo o exercício da sua autodeterminação. (BURDEAU, 1972)

A liberdade de expressão tem como cerne a liberdade de pensamento, que é a esfera íntima do ser humano, seu direito de pensar para si próprio, antes da externalização de opinião; entretanto, esta não é tutelada, pois trata de matéria somente pertinente ao indivíduo. O que o direito tutela, na realidade, é a Liberdade de Manifestação de Pensamento, que é o compartilhado, que se dirige ao público, alcançando também a palavra escrita, inclusive quando vindo da imprensa. Portanto, a Liberdade de Pensamento ganha expressão como uma liberdade primária, da qual outras liberdades são derivadas (COLLIARD, 1972).

Essa liberdade, então, possui um caráter público e um sigiloso; e quando esse pensamento é emitido e essa informação chega à imprensa, desdobra-se na Liberdade de Imprensa, tutelada pelo Direito de Informar. Ambos equivalem ao direito de veicular sem censura os pensamentos e fatos. Nesse momento, é perceptível o deslocamento do direito de informar, que é uma liberdade individual, de uma esfera meramente particular, para uma que é generalizada, que se dirige a todos de forma indiscriminada: o Direito da Coletividade à Informação.

Ao estudar a relação Estado-indivíduo e quais comportamentos o sujeito pode tomar frente ao dever ser estatal, encontram-se três possibilidades: a obrigação de realizar um ato, a obrigação de não realizar um ato e a escolha da conduta mais adequada e é nessa última categoria que se encaixam as liberdades: é um direito à autodeterminação, reconhecido pelo Estado (Freitas, 2013). Nesse contexto, a liberdade é contraponto da legalidade, ou seja, existe o direito de exercer essa autodeterminação, até que uma lei determine uma atribuição ou proibição.

O direito às liberdades é um elemento intrinsecamente ligado à própria noção de ser das pessoas, sendo então considerado um direito universal pela ONU, consagrado em seu artigo 3º. Independente das circunstâncias, as liberdades devem respeitar o universo legal que habitam, portanto, estas submetem-se às leis de cada país, as quais decidem de que forma esses direitos interagem e coexistem. Dessa forma, por ser uma decisão proveniente da soberania popular, a lei possuiria legitimidade indiscutível para limitar os direitos que ela mesma garante, indicando as condutas intoleráveis.

O direito à liberdade de expressão não é um direito absoluto, isto quer dizer que, uma vez que coexiste com outros direitos garantidos pela Constituição Federal, esse direito deve ser ponderado, a fim de que o direito à liberdade de emitir opiniões, ideias, não venha a ferir outros direitos. Conforme a Teoria de Colisão dos Direitos Fundamentais, deve-se ponderar a aplicação para que não haja detrimento de um direito em favor de outro.

Como tratado anteriormente, a liberdade de expressão pode ser vista de uma ótica individual e coletiva e ambas possuem limitações, como será analisado a seguir.

A primeira limitação à liberdade de expressão aqui abordada é a proibição de anonimato, que está disposta no próprio artigo que trata da liberdade de expressão, o art.5º, IV, da CF/88, que dispõe que é livre a manifestação de pensamento, desde que não seja no anonimato.

A proibição de discursos racistas também é uma das limitações da liberdade de expressão. Segundo a lei 7.716/89, art.1º, serão punidos os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, e no art. 5º, XLII, a prática de racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sendo repudiado no art.4º, VIII, ambos da CF/88, portanto, não é permitido se valer do direito à liberdade de expressão para emitir e/ou compartilhar discursos racistas.

O direito de resposta é uma limitação à liberdade de expressão assegurado no art.5º, V, da CF/88, pois o garante de maneira proporcional à ofensa, além de indenização, seja por dano moral, material e/ou à imagem. Isto é, além do direito à resposta, aquele que ultrapassa os limites da liberdade de expressão também pode ser responsabilizado civil e penalmente pelos danos causados pela conduta.

A CF/88, em seu art. 223, dispõe que cabe ao poder executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal (BRASIL, 1988). Essa disposição constitucional se trata de um limite claro à liberdade de expressão coletiva, uma vez que as atividades de rádio e televisão necessitam de uma concessão para o funcionamento, cabendo ao poder executivo outorgar e renovar.

O art. 220 da CF/88, em seu caput, traz que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição (BRASIL, 1988), e no §3º do mesmo dispositivo, em seu inciso I, diz que compete à lei federal regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao poder público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada (BRASIL, 1988). E, sobre o tema, autorizado pela Constituição Federal, através dos dispositivos supramencionados, o Estatuto da Criança e Adolescente, em seu art. 75, traz que o poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada (BRASIL, 1973). A Constituição, portanto, possibilita a limitação da liberdade de expressão coletiva em detrimento de outros direitos, como o caso elencado pelo ECA.

Uma outra restrição é quanto à publicidade de produtos nocivos à saúde ou ao meio ambiente, sendo uma outra limitação à liberdade de expressão coletiva e que está prevista no art. 220, § 3º, da CF/88, que dispõe que a lei federal estabelecerá restrições dessa natureza.

Segundo o art. 5º, inciso VI, é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias; já o inciso VIII do mesmo artigo diz que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa fixada em lei, determinando, assim, um limite à liberdade religiosa.

E, por último, a observância obrigatória de princípios na formulação da programação, prevista no art. 221 da CF/88, que dispõe que a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos princípios elencados ao longo dos incisos daquele artigo. Princípios estes como preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, promoção da cultura nacional e regional e estímulo, respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, dentre outros.

Embora a liberdade de expressão venha a ser uma grande conquista democrática, há, também, uma repercussão negativa dessa garantia constitucional, que ocorre quando o direito à liberdade de expressão extrapola seus limites e acaba por ferir outros direitos fundamentais garantidos constitucionalmente.

O discurso de ódio se caracteriza por qualquer expressão que desvalorize, menospreze, desqualifique e inferiorize os indivíduos. Trata-se de uma situação de desrespeito social, uma vez que reduz o ser humano à condição de objeto (FARIAS, 2007, p. 80). E é preciso deixar claro que o discurso de ódio não é amparado pelo direito à liberdade de expressão, uma vez que uma opinião que fere a imagem, a religião, a crença, dentre outros direitos individuais, não pode ser considerada como exercício do direito à liberdade de expressão.

Assim, a palavra veiculada oralmente, dirigida ao público, trará impacto imediato, mas, se impressa e publicada, poderá promover um dano que permanecerá ao longo do tempo. Consequentemente, é possível afirmar que um discurso consoante o meio de divulgação escolhido promoverá maior impacto (LEAL DA SILVA et al., 2011). Nesses casos, ter-se-ia, com o advento das novas tecnologias (internet), a viabilidade de um prejuízo em escala mundial, trazendo ainda uma dificuldade maior no que se refere à questão do anonimato e sua investigação de autoria. (MACHADO, 2002).

Como é sabido, nenhum direito é absoluto, os direitos devem coexistir e possuem limites. E esse é um exemplo claro de que, assim como outros direitos, a liberdade de expressão possui limitações. É o que concluiu o Superior Tribunal Federal STF, quando decidiu que atos de cunho racista não estariam abrangidos pelo direito fundamental aqui abordado, em acórdão que possui a ementa a seguir destacada:

Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência,manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal.

14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. (BRASIL, 2003)

Com o advento da internet e o amplo acesso pela população, bem como a popularização das redes sociais, essas acabaram se tornando um meio de propagação dos discursos de ódio. Discursos marcados pela intolerância, que acabam por violar outros direitos, causando danos morais e psicológicos aos sujeitos atingidos e que já são considerados crime pela legislação brasileira.

A lei 7.716 de 1989 define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, punidos os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Isto é, a referida lei pune discursos de ódio e em seu art. 20 dispõe:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa. (...)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza.

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. (BRASIL, 1989)

O discurso de ódio é tipificado na referida lei, como foi possível observar através do trecho destacado, sendo agravado quando o crime for cometido através de meios de comunicação social ou publicação de qualquer maneira, como dispõe o parágrafo segundo do art. 20 da Lei 7.716/89.

Ademais, atualmente, encontra-se em tramitação no Congresso Nacional o projeto de lei 7582/2014, de autoria da deputada Maria do Rosário (PT/RS), que define os crimes de ódio e intolerância e cria mecanismos para coibi-los, nos termos do inciso III do art. 1º e caput do art. 5º da Constituição Federal, e dá outras providências. Esse projeto tem o objetivo de provocar alterações no Código Penal, a fim de punir aqueles que, de alguma forma, discriminarem, por meio de um discurso de ódio ou pelo compartilhamento e divulgação de conteúdo de cunho discriminatório, inclusive, quando ocorrer no meio virtual. A intenção é a ampliação da Lei supramencionada.

Percebe-se, portanto, que a legislação brasileira ainda não está totalmente preparada para combater o discurso de ódio no âmbito virtual, mas há um movimento para que seja mais fácil identificar os sujeitos praticantes e para que haja uma punição mais severa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O direito à liberdade de expressão é garantidor da liberdade de manifestação de pensamento sem temor de represálias. Já o discurso de ódio é a extrapolação desse direito, utilizando-o para manifestar ideias que incitam a discriminação, muitas vezes de grupos inseridos nas minorias sociais, em razão de sua raça, cor, etnicidade, nacionalidade, sexo ou religião.

Todos os indivíduos, com o progresso de suas personalidades, têm o direito de desenvolver suas próprias opiniões, constituir suas crenças, conceber seus pensamentos e ideais e, consequentemente, possuem o direito de expressá-los, caso contrário, estes gozariam de pouca ou nenhuma relevância. A expressão é parte integral da evolução de ideias, da investigação pessoal e da autoafirmação e a sua supressão é uma afronta à dignidade humana.

Este trabalho, cujo objetivo geral foi a análise do choque de princípios e direitos fundamentais de liberdade e como objetivos específicos o estudo dos fundamentos da liberdade de expressão como direito individual e coletivo; identificação de quais os limites da liberdade de expressão de acordo com a CF/88; e, por fim, buscar compreender a repercussão negativa da liberdade de expressão que incentiva o discurso de ódio; efetivou-se, pois houve a demonstração que a efetiva limitação do direito à liberdade de expressão é o direito de personalidade do próximo e, conforme a Teoria de Colisão dos Direitos Fundamentais, deve-se ponderar a aplicação para que não haja detrimento de um direito em favor de outro e que esta garantia também possui caráter dual, com facetas individual e coletiva.

A relevância da temática ascende exponencialmente, especialmente considerando o momento de instabilidade político-social vivido no momento e com a aproximação das eleições presidenciais, em que a principal finalidade do direito à liberdade de expressão se sobressai, sendo esta a sua função de instrumento da soberania do povo para a construção e manutenção de governos democráticos que representem a população e que auxiliem a manutenção de um debate racional sobre todos os assuntos. Possíveis linhas de aprofundamento para futuros pesquisadores do mesmo assunto seriam o aperfeiçoamento comparativo entre o direito brasileiro e o existente em outras nações, inclusive sobre quais pessoas possuem essas liberdades; o estudo da factível da regulamentação dos conteúdos postados no ambiente virtual, entre outros, é de grande valia para o debate sobre a liberdade de expressão e os limites impostos a ela.

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Sobre as autoras
Paloma Torres Carneiro

Professora orientadora. Mestre em Direito Universidade Católica de Brasília (UCB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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