Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Prazo decadencial no vício de produto e a teoria da vida útil

Agenda 30/12/2021 às 15:21

Discussão do prazo decadencial no vício do produto e teoria da vida útil

A expectativa do consumidor no tocante à qualidade dos produtos que adquire e dos serviços usufruídos deve ser preservada.

É sabido que o prazo decadencial para se reclamar de vício de produto durável é de 90 (noventa) dias, nos termos do art. 26, II, do CDC:

"Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§1° - Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito."

Isso porque, cuidando-se de vício aparente é certo que o consumidor deve exigir a reparação no prazo de noventa dias, em se tratando de produtos duráveis, iniciando a contagem a partir da entrega efetiva do bem e não fluindo o citado prazo durante a garantia contratual.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Porém, no que concerne ao vício oculto, o Código de Defesa do Consumidor, no § 3º do art. 26, adotou o critério da vida útil do bem, e não o critério da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício em um espaço largo de tempo, mesmo depois de expirada a garantia contratual.

Com efeito, em se tratando de vício oculto não decorrente do desgaste natural gerado pela fruição ordinária do produto, mas da própria fabricação, e relativo a projeto, cálculo estrutural, resistência de materiais, entre outros, o prazo para reclamar pela reparação se inicia no momento em que ficar evidenciado o defeito, não obstante tenha isso ocorrido depois de expirado o prazo contratual de garantia, devendo ter-se sempre em vista o critério da vida útil do bem.

Recentemente em decisão exarada pelo ministro Vilas Bôas Cueva no REsp nº 1.787.287-SP, o STJ reafirmou posicionamento acerca do assunto em questão.

Houve discussão quanto à verificação da responsabilidade da empresa fornecedora de produtos eletrodomésticos sobre vícios ocultos que somente foram notados pelo consumidor cerca de quatro anos após a compra, e três anos após o término da garantia contratual.

Eis o trecho do voto do eminente relator:

a dificuldade, no entanto, apresenta-se quando o defeito aparece após o prazo da garantia contratual, hipótese retratada nos autos. Nessas situações, em virtude da ausência de um prazo legal preestabelecido para limitar a responsabilidade do fornecedor, consagrou-se, a partir de valiosos provimentos doutrinários, o entendimento de que o fornecedor não é eternamente responsável pelos vícios observados nos produtos colocados em circulação, mas a sua responsabilidade deve ser ponderada, de forma casuística, pelo magistrado, a partir do conceito de vida útil do produto

Assim podemos concluir que, o vício apresentado no produto, conforme expresso no trecho do julgado supra, não é algo que decorre da utilização ordinária do bem, mas, sim, de uma anormalidade intrínseca a este, que somente será revelada com sua utilização a longo prazo.

Nasce daí, portanto, o direito do consumidor de ser reparado pelo prejuízo, dentro do prazo legal de 90 dias, mesmo que expirada a garantia contratual, pois, se o vício era até então desconhecido, jamais se iniciou a contagem do prazo decadencial


Bibliografia

REsp nº 1.787.287-SP, rel. ministro Ricardo Vilas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 14/12/2021

Sobre o autor
Rodrigo Almeida Chaves

Defensor Público do Estado do Acre, desde o ano de 2007 atualmente lotado no Subnúcleo do Superendividamento e Ações do Consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!