A aquisição de lote sempre foi um excelente negócio no mercado brasileiro dado ao alto poder de valorização que o bem imóvel tem. Com a crescente valorização dos condomínios de lotes mais afastados dos grandes centros, muitos negócios são feitos e por consequência, muitos processos são ajuizados para dirimir as mais variadas questões envolvendo as operações de compra e venda.
No presente texto vamos abordar entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da rescisão de contrato de compra e venda de lote e as consequências para as partes, em especial a indenização pela fruição do bem.
Primeiramente, quando falamos em rescisão de um contrato regra geral ela é motivada pelo não cumprimento de uma obrigação por uma das partes. Neste caso, responderá o devedor pelas perdas e danos, conforme determina o art. 389 do Código Civil:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Por perdas e danos, define o Código Civil, salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar (art. 402).
A taxa de fruição cabe ser esclarecida conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
5. Quanto ao tema, a jurisprudência das Turmas componentes da Segunda Seção tem ressaltado que o retorno ao estado anterior pode ensejar, além da devolução do bem ao vendedor e do preço ao comprador, ressalvado o percentual de retenção, a condenação do promissário comprador a ressarcir o promitente vendedor pelo tempo que utiliza o imóvel, dele auferindo vantagens.
6. Conforme o sólido entendimento do STJ, esse tempo de utilização do imóvel é indenizado por meio da taxa de ocupação, cuja natureza jurídica coincide com a de aluguéis e se justifica pela vedação ao enriquecimento sem causa. (REsp 1936470/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/10/2021, DJe 03/11/2021)
O elemento central da questão então é que a rescisão contratual faz com que as partes retornem ao estado anterior à celebração do contrato, ou seja, vendedor recebe o bem e comprador recebe o que pagou, descontado ou acrescido o que foi convencionado em contrato. Só que, quando se fala em compra e venda de imóvel, muita das vezes o comprador exerce a posse efetiva do bem enquanto o contrato de compra e venda ainda encontra-se em cumprimento. Havendo então a sua rescisão, a posse do imóvel deixa de ser justa e passa a dispensar atenção para a vedação ao enriquecimento sem causa:
8. Nesse sentido, em importante julgado a respeito da matéria, a 3ª Turma asseverou que a utilização do imóvel objeto do contrato de promessa de compra e venda enseja o pagamento de aluguéis pelo tempo de permanência, [...] sob pena de enriquecimento sem causa [de forma que] o ressarcimento é devido por força da determinação legal segundo a qual a ninguém é dado enriquecer sem causa à custa de outrem, usufruindo de bem alheio sem contraprestação (REsp 1.613.613/RJ, 3ª Turma, DJe 18/06/2018) (grifos acrescentados).
9. Na mesma linha, a e. 4ª Turma consignou em julgado igualmente relevante que a verba para ressarcimento da ocupação, em boa verdade, consubstancia simples retribuição pelo usufruto do imóvel durante determinado interregno temporal, rubrica que não se relaciona diretamente com o rompimento da avença, mas com a utilização do bem alheio [... e com ...] os benefícios eventualmente auferidos pelo comprador durante o período em que ocorreu o usufruto do bem. (REsp 955.134/SC, 4ª Turma, DJe 29/08/2012) (grifos acrescentados).
Mas e quando o bem adquirido é um lote sem construção, como mensurar então o enriquecimento sem causa? Neste ponto o STJ entendeu que não cabe discutir um dano hipotético, pois a inexistência de qualquer construção no terreno afasta a possibilidade de se mensurar de forma clara o enriquecimento de uma parte e empobrecimento da outra:
15. A exigência desses requisitos foi referendada pela jurisprudência da e. Corte Especial, que, em recente julgamento, consignou que "a pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos [...] (EREsp 1.523.744/RS, Corte Especial, DJe 13/03/2019) (grifos acrescentados).
16. A diminuição patrimonial do lesado, requisito para a obrigação de indenizar relacionada à vedação ao enriquecimento sem causa, corresponde: a) ao deslocamento indevido de um bem anteriormente incorporado ao patrimônio do sujeito ao patrimônio de um terceiro; ou b) ao impedimento do ingresso uma vantagem que certa e seguramente adentraria no patrimônio do sujeito e que, sem justificativa, é acrescida a patrimônio alheio.
(...)
20. Em consonância com essa orientação, a jurisprudência desta Corte salienta que não se pode deferir reparação por lucros cessantes se estes, em casos como o dos autos, configuram-se como dano hipotético, sem suporte na realidade em exame, da qual não se pode ter a previsão razoável e objetiva de lucro, aferível a partir de parâmetro anterior e concreto capaz de configurar a potencialidade de lucro (REsp 846.455/MS, 3ª Turma, DJe 22/04/2009 (grifos acrescentados), pois não se compreende[m] nesta rubrica danos hipotéticos, baseados em mera expectativa de ganho, a depender de fatos eventuais e circunstâncias futuras (EDcl no AgRg nos EDcl no REsp 790.903/RJ, 4ª Turma, DJe 10/02/2014) (grifos acrescentados).
Ainda que a indenização por perdas e danos seja cabível às rescisões de contrato de compra e venda, é necessário analisar se o dano é efetivo, se trata de um lucro cessante (o que razoavelmente deixou de lucrar) ou se é meramente um dano hipotético (sem qualquer prova de que o dano existiu ou poderia existir).
O exercício da posse de um terreno, ou de um lote de terra nua para ser passível de indenização por taxa de fruição depende de prova de existência de construção sobre o terreno, o que viabilizaria a aferição de eventual enriquecimento sem causa por parte do comprador. A inexistência de construção afasta a possibilidade concluir que o vendedor auferiria proveito com a cessão de uso e posse do terreno a terceiros, se não o tivesse concedido ao comprador. Do outro lado da moeda, a inexistência de construção retira do comprador a possibilidade de auferir vantagem ou proveito da sua posse, o que afasta o requisito do enriquecimento sem causa.